Acórdão nº 0797/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelARAGÃO SEIA
Data da Resolução08 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A Fazenda Pública, inconformada, recorreu da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé (TAF de Loulé) datada de 23 de Abril de 2014, que julgou procedente a impugnação judicial que A………………….., SA havia deduzido contra as liquidações adicionais de IVA referentes aos períodos de Março a Dezembro de 2011, e respectivos juros.

Alegou, tendo concluído como se segue:

  1. A questão decidenda é aferir se o acesso ao green integra, ou não, o conceito de espectáculo, prova desportiva, manifestação desportiva ou divertimento público, para aferir qual a taxa de IVA aplicável; b) Na redacção inicial do CIVA, a Lista I incluía a verba 2.13 que previa a sujeição à taxa reduzida os bilhetes de entradas para espectáculos de ópera, ballet, concerto, teatro, circo, revista, sessões de cinema e bilhetes de entrada para espectáculos e manifestações desportivas; c) A AT, então DGCI, entendia que tal verba incluía não apenas os bilhetes de ingresso naqueles espectáculos mas igualmente a utilização de instalações destinadas à prática desportiva e a espectáculos ou outros divertimentos públicos (Cfr. Ofício Circulado n.° 30088, de 2006/01/19); d) Aderindo a este entendimento, o legislador alterou a letra da verba que passou a ter a numeração 2.15 destinando a taxa reduzida a espectáculos, provas e manifestações desportivas, prática de actividades físicas e desportivas e outros divertimentos públicos com as excepções ali previstas, não aplicáveis ao caso concreto; e) Assim, indubitável se torna que, com esta redacção da verba 2.15 à Lista I do CIVA, os “green fees” se encontravam sujeitos à taxa reduzida (então 5%); f) Acontece que, com o OE para 2011, a verba 2.15 sofreu nova alteração passando a prever a sujeição à taxa reduzida a espectáculos, provas e manifestações desportivas e outros divertimentos públicos com as mesmas excepções não aplicáveis in casu, vindo a ser revogada na íntegra a expressão “prática de actividades físicas e desportivas” com a entrada em vigor do OE para 2012; g) O entendimento da impugnante é que os “green fees” são devidos pela participação numa prova desportiva, porque o golfe é um desporto auto regulado que pressupõe que os praticantes tenham conhecimento das regras específicas e internacionais e capacidade técnica comprovada através de certificado sendo que um jogador não federado não pode ter acesso a um campo de golfe; h) Esse entendimento que também foi corroborado pelo Mm.° Juiz “a quo” não tem qualquer suporte legal, porquanto, i) Conforme dispõe o art.° 9º n.° 2 do CC, não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso sendo que na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (n.° 3 do citado art.°); j) A questão que importa sim dirimir é se os “green fees” são pagamentos devidos pela participação em provas desportivas ou pela prática de actividades desportivas, para saber se estamos perante sujeição à taxa reduzida de IVA ou à taxa normal; k) Das consultas efectuadas através do motor de busca Google e da Wikipédia resulta que o “green fee” é um pagamento devido pela utilização do campo para jogar, ou seja, para praticar golfe e não, como entendeu a ora recorrida, para fazer parte de uma prova desportiva; l) O facto dos jogadores/clientes dos campos de golfe terem de dominar as regras do jogo e possuírem um certificado específico não conferem à prática do desporto a classificação de prova desportiva; m) Além disso, existem outros desportos (ex: a equitação, o mergulho, o xadrez, entre outros) que exigem certificados para a sua prática e, quanto ao conhecimento das regras do jogo, é condição sine qua non da prática de qualquer desporto seja ele qual for; n) Na verdade, o que distingue a “prova” ou “manifestação desportiva” da “prática desportiva” é o carácter de competição e a existência de uma entidade terceira que julgue, aprecie ou classifique os competidores e ateste o cumprimento das regras como árbitros, fiscais, juízes ou outros. Provas serão os campeonatos, torneios ou taças ou outros eventos desportivos com idêntica natureza; o) Para os efeitos previstos no Decreto Regulamentar n.° 2-A/2005 de 24 de Março, consideram-se provas desportivas as manifestações desportivas realizadas total ou parcialmente na via pública com carácter de competição ou classificação entre os participantes, consoante se trate duma prova ou da simples prática desportiva; p) Assim sendo, os “green fees” são pagamentos devidos pela prática duma actividade desportiva, que é jogar golfe, e como tal face à redacção aplicável aos factos da verba 2.15 da Lista I anexa ao CIVA, estas prestações de serviços estão sujeitos à taxa normal de IVA; q) Nem o facto da interpretação da AT ter sido outra no passado com outras redacções da verba ora em análise obriga à manutenção da mesma face às alterações legislativas entretanto ocorridas; r) O entendimento da AT sobre a interpretação de normas tributárias não é estanque nem imutável no tempo, adequa-se às alterações legislativas ocorridas e, mesmo perante a mesma letra da lei, pode o entendimento ser alterado, salvaguardando-se os efeitos já produzidos quanto aos contribuintes a quem tais interpretações se destinam, mas podendo vir a ser alterados ex tunc; s) As normas comunitárias não tem aplicabilidade directa no ordenamento jurídico português, ou seja, os Estados Membros têm a possibilidade de transposição ou não duma Directiva de IVA, caso o não façam daí não se retira que haja violação do primado do direito comunitário sobre as normas internas do CIVA; t) A interpretação do pensamento do legislador ao suprimir do texto legal em 2011, a expressão “prática de actividades físicas e desportivas” tem de ser relevada e conjugada com o próprio conceito de “provas e manifestações desportivas”, para se descortinar se a prática do golfe cabe neste dois últimos conceitos; u) Aqueles dois conceitos pressupõem a competição em campeonatos, torneios ou taças ou outros eventos desportivos com idêntica natureza e os “green fees” são pagamentos devidos apenas pela prática de actividades desportivas; v) Segundo a douta sentença recorrida é entendimento da FP que a interpretação correcta da verba 2.15 da Lista I anexa ao CIVA (Lei n.° 55-A/2010, 31/12) com a supressão pelo legislador da expressão “prática de actividades físicas e desportivas” é integrar as “provas e manifestações desportivas” apenas às entradas ou bilhetes de ingresso pagos pelos espectadores para tais eventos e já não às quantias pagas pelos praticantes para usufruírem de instalações desportivas; w) Tal não corresponde à verdade, uma vez que o que a Fazenda Pública sustenta é que as prestações de serviços respeitantes à entrada em campos de golfe para a sua utilização por golfistas/jogadores não constituem nem provas, nem manifestações desportivas (por não existir carácter de competição) sendo que o art.° 32° da LBAFD equipara estas duas realidades.

    x) A douta sentença ao decidir, como decidiu, incorreu em erro de julgamento por violação do disposto no art.° 18.° do CIVA e verba 2.15 à Lista I do CIVA e art.° 9º n.° 2 do CC.

    Pelo exposto e pelo muito que V. Ex.ªs doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente revogada a sentença recorrida, só assim se fará JUSTIÇA Contra-alegou a recorrida, tendo concluído: A.

    Bem andou o Tribunal a quo ao julgar que não se encontravam verificados os pressupostos de facto e de direito dos actos de liquidação adicional de IVA impugnados pela Recorrida, por se ter de concluir que os green fees representam a contrapartida pelo acesso a «provas ou manifestações desportivas» e que, por isso, estavam, em 2011, incluídos na Verba 2.15 da Lista anexa ao Código do IVA e sujeitos à taxa reduzida deste imposto e não à taxa normal, como sustenta a Fazenda Pública.

    B.

    Nesta medida, foi com base na melhor interpretação das disposições legais em apreço, e em face dos factos dados como provados, que o Tribunal a quo determinou a anulação das liquidações oficiosas adicionais de IVA e de juros compensatórios, por estas serem ilegais por violação do disposto nos artigos 18.° e Verba 2.15 da Lista anexa ao Código do IVA, decisão que terá de ser mantida.

    C.

    O presente recurso foi apresentado pela Fazenda Pública por esta parecer não se conformar com a decisão a quo, contudo, analisando as alegações juntas aos Autos pela mesma, constata-se que a Fazenda Pública não apresenta, efectivamente, quaisquer argumentos susceptíveis de pôr em causa a fundamentação e as conclusões plasmadas na sentença recorrida.

    D.

    Ademais, no presente recurso, a Fazenda Pública não questiona qualquer dos factos considerados provados pelo Tribunal a quo, pelo que terão ser estes e não outros a sustentar qualquer decisão a emitir neste recurso.

    E.

    Em suma, o recurso apresentado pela Fazenda Pública não logra pôr em causa a decisão emitida pelo Tribunal a quo, acabando apenas por insistir — dir-se-ia por teimosia e com a motivação de arrecadação de receita — nas liquidações de imposto em crise, razão pela qual o recurso se encontra, manifestamente, fadado ao insucesso.

    F.

    Primeiramente, apesar de a Fazenda Pública o pretender ignorar, cumpre salientar que a versão da Verba da Lista anexa ao Código do IVA em crise que foi aprovada em 1984 (ao tempo Verba 3.13), e que determinava a aplicação da taxa reduzida do IVA, designadamente, aos «bilhetes de entradas em espectáculos ou manifestações desportivas», nunca chegou a vigorar, tendo a mesma sido alterada antes da entrada em vigor do Código do IVA em 1986, mediante a Lei n.° 42/85, de 22 de Agosto, passando aquela a ter a redacção que se manteve até 2012 e que determinava que os «Espectáculos, manifestações...

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