Acórdão nº 0763/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Abril de 2015

Data22 Abril 2015
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 743/12.6BELLE 1. RELATÓRIO 1.1 A Fazenda Pública (adiante Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que, julgando procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade denominada “A…………, S.A.” (adiante Impugnante ou Recorrida), anulou as liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) que lhe foram efectuadas pelo Serviço de Finanças de Loulé com referência aos meses de Março a Outubro de 2011 por ter considerado que a taxa de imposto aplicável na tributação dos green fees (Contrapartida cobrada pelos proprietários dos campos de golfe aos praticantes pelo acesso aos campos de jogo(greens) para a prática do golfe.

) é a normal e não a reduzida, que foi a cobrada pela sociedade naquele período.

1.2 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.

): «1- A verba 2.15 da Lista I anexa ao CIVA não comporta a interpretação e aplicação que a douta sentença recorrida lhe deu.

2- Já pela sua letra, porque a frase “prova ou manifestação desportiva” se refere a um evento desportivo, supõe uma competição; não pode ser invocada com a acepção de simples prática desportiva.

3- E, a significação técnica das palavras green fees não exprime e envolve essa hipótese, antes vale como a contraprestação da disponibilidade do campo para a prática da modalidade.

4- Já porque a sua integração no sistema jurídico não é de molde a afectar o seu sentido e alcance, de forma a abranger a situação controvertida.

5- Com efeito, afigura-se-nos, que as conexões estabelecidas na douta sentença emitida se revelam inadequadas para deduzir lógico-objectivamente o conteúdo seguido e aplicado.

Assim, pelo exposto, e, principalmente, pelo que será suprido pelo Douto Tribunal, deve ser revogada a sentença sub judice, como é de JUSTIÇA».

1.3 A Impugnante contra alegou, com a formulação do seguinte quadro conclusivo: «I. Vem o presente recurso interposto contra a Sentença proferida, em 23 de Abril de 2014, no âmbito do processo de impugnação judicial que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé sob o n.º 743/12.6BELLE, a qual julgou totalmente procedente a Impugnação Judicial apresentada pela ora Recorrida contra os actos de liquidação adicionar de IVA n.ºs 12102973, 12102975, 12102977, 12102979, 12102981, 12102983, 12102985, 12102987 e respectivos juros compensatórios n.ºs 12102974, 12102976, 12102978, 12102980, 12102982, 12102984, 12102986, 12102988, relativos aos períodos de 03/2011 a 10/2011, no valor total de € 665.678,90 (seiscentos e sessenta e cinco mil, seiscentos e setenta e oito euros e noventa cêntimos).

  1. Não se conformando com tal decisão, a Fazenda Pública vem, em síntese, alegar que os green fees mais não são do que "o valor que cada jogador paga para dar uma volta ao campo” e não “a participação numa prova ou manifestação desportiva”.

  2. Alegando, ainda, que “É um erro supor que uma norma pode ser interpretada isoladamente, sem olhar às conexões e relações que tenha com outras normas do mesmo sistema legal. Porém, na falta dos elementos ou indicações em contrário como no caso, importa favorecer e letra do preceito a interpretar. Ora, esta não comporta o entendimento da fórmula prova ou manifestação desportiva sustentada pelo tribunal recorrido” IV. Porém, entende a Reclamante que tais argumentos não são susceptíveis de pôr em causa as doutas conclusões expressas na sentença recorridas qual a Recorrida adere integralmente.

  3. Pelo contrário, entende a Recorrida que a interpretação da Verba 2.15 com recurso aos elementos, meios, factores ou critérios, de forma harmónica e não isoladamente, permitirá concluir que o jogo de golfe tem natureza desportiva por se encontrar organizado no âmbito de uma federação desportiva titular do estatuto de utilidade pública desportiva, organização na qual a Recorrida se insere, reunindo, assim, as condições para a prática do logo de golfe nas suas instalações – os greens que explora.

  4. Na verdade, a evolução da redacção da referida Verba 2.15 da Lista I, mesmo antes da alteração que passou a incluir a “prática de actividades físicas e desportivas”, sempre acolheu a tributação dos greens fees à taxa reduzida; VII. Pelo que, aos green fees – taxa de acesso aos greens pagas pelos golfistas que pretendem jogar nos campos da Recorrida – deve ser aplicada a taxa reduzida de IVA ao abrigo do disposto na Verba 2.15 do Código do IVA.

  5. A Recorrida louva-se, assim, na sentença recorrida, a qual julgou bem a causa, sub judice, devendo ser mantida na íntegra, com as legais consequências.

Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, sempre com o douto suprimento de V. Exas., deverá ser julgado improcedente o recurso apresentado pela Fazenda Pública, e assim, confirmada a douta Sentença recorrida, nos seus exactos termos».

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja declarada a incompetência deste Tribunal em razão da hierarquia ou, assim não se entendendo, seja concedido provimento ao recurso, revogada a sentença e mantidas as liquidações impugnadas, com a seguinte fundamentação (As notas que no original estavam em rodapé serão transcritas no texto, entre parêntesis rectos.

): «[…] Como refere o ilustre Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa 1 [1 Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6.ª edição, I volume, página 224], “A jurisprudência tradicional do STA quanto à delimitação da sua competência em relação à dos Tribunais Centrais Administrativos vinha sendo no sentido de ser a efectuada com base nos fundamentos do recurso, devendo entender-se que o recurso não tem por fundamento exclusivamente matéria de direito sempre que nas conclusões das respectivas alegações, que fixam o objecto do recurso (art. 684.º, n.º 3, do CPC), o recorrente pede a alteração da matéria de fáctica fixada na decisão recorrida ou invoca, como fundamento da sua pretensão, factos que não têm suporte na decisão recorrida, independentemente da atendibilidade ou relevo desses factos para o julgamento da causa.” “Mais recentemente o STA, por razões pragmáticas, passou a adoptar o entendimento de que, perante as conclusões das alegações de recurso que não estejam suportadas em factos estabelecidos no probatório fixado na sentença recorrida, haverá que ponderar se tais conclusões se traduzem efectivamente em novos factos que contrariam os fixados ou em novas ilações de facto deles retiradas (caso em que se verifica excepção dilatória de incompetência do STA para conhecimento do recurso) ou se, pelo contrário, estão em causa factos, em abstracto, irrelevantes para a decisão da questão decidenda ou meras ilações jurídicas retiradas dos factos fixados, caso em que o STA será ainda competente para conhecer do recurso” 2 [2 Obra citada, página 226].

São juízos de facto as ilações que o tribunal retira da factualidade apurada que não envolvem a interpretação de regras jurídicas ou a aplicação da sensibilidade jurídica do julgador.

Ora, da conjugação das conclusões 2) e 3), resulta que a recorrente sustenta a ilação ou juízo de facto de que os green fees em causa são pagos pela utilização do green para a mera prática de actividades desportivas, o que contraria a ilação de facto tirada pela sentença recorrida, em função da factualidade apurada, de que os green fees são pagos pela utilização do campo de golfe para participar numa prova desportiva.

Assim sendo, como nos parece que é, o STA é, pois, incompetente em razão da hierarquia para conhecer do presente recurso, sendo competente par o efeito o TCAS.

O recorrente poderá requerer a remessa do processo ao Tribunal competente, nos termos do estatuído no artigo 18.º/2 do CPPT.

Se assim não for entendido, então, parece-nos que o recurso deve ser provido.

Vejamos, pois.

Nos termos do disposto na verba 2.15 da Lista I do CIVA, na redacção introduzida pela LOE para 2011, estão sujeitos a taxa reduzida, espectáculos, provas e manifestações desportivas e outros divertimentos públicos, com as excepções ali referidas.

Em teoria, a situação em análise apenas poderia ser integrada nas provas e manifestações desportivas.

Vejamos.

Os green fees são quantias pagas pelos jogadores por uma volta ao campo de golfe.

Na redacção imediatamente anterior à introduzida pela LOE para 2011 à verba 2.15 da Lista I do CIVA estava, também, sujeita a taxa reduzida a prática de actividades físicas e desportivas.

Sucede que com tal alteração, no que agora interessa, apenas estão sujeitas a taxa reduzida as provas e manifestações desportivas e já não a prática e actividades desportivas.

Ora, prática desportiva e prova desportiva ou manifestação desportiva são realidades diferentes.

Na verdade, o que distingue a prática desportiva da prova desportiva ou manifestação desportiva é o carácter de competição e a existência de uma entidade terceira que julgue, aprecie ou classifique os competidores e ateste a cumprimento das regras com árbitros, juízes e outros.

Provas desportivas serão, pois, os campeonatos, torneios ou taças ou outros eventos desportivos com idêntica natureza.

Ora, no caso dos autos, em função da factualidade apurada, a ilação que se retira é que os green fees são devidos não pela participação...

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