Acórdão nº 0724/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DO CÉU NEVES
Data da Resolução04 de Novembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO A recorrente A………………, S.A., inconformada com a decisão proferida, em 20 de Março de 2014, no TAF de Penafiel que julgou improcedente o recurso contencioso de anulação que intentou contra o Vereador do Ordenamento do Território, Urbanismo, Planeamento Urbanístico e Paisagem Urbana da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, através do qual peticionou a invalidade do despacho proferido em 14 de Novembro de 2012 que indeferiu o pedido de informação prévia sobre a viabilidade de construção de obra particular apresentado em 28 de Junho de 2002, deduziu o presente recurso.

Apresentou, para o efeito, as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: «A. A fls. 119 a 125 dos autos foi proferida (a primeira) sentença que considerou o recurso contencioso procedente, por preterição do direito de audiência prévia, previsto no artº 100º do Código de Procedimento Administrativo.

  1. A questão da anulabilidade do acto por violação do direito de audiência prévia ficou sedimentada, porque em momento algum dos autos se considerou que esse vício afinal não se verificava e que essa decisão deveria ser novamente objecto de pronúncia.

  2. Foi assim que se entendeu na segunda sentença proferida nestes autos, onde apenas se conheceram os restantes vícios, por aquele inicial já estar apreciado anteriormente.

  3. Assim, como é, não podia agora o Tribunal a quo conhecer novamente da questão da verificação ou não do vício de forma por violação do direito de audiência prévia.

  4. Tal questão já estava decidida e assente, pelo que não poderia ter sido alvo de conhecimento na sentença, sob pena de violação do caso julgado.

  5. Foi assim, violado o disposto no artº 619º e 621º do Código do Processo Civil.

  6. A sentença entendeu que apesar de ser inequívoco que houve violação desse princípio e do artº 100º do CPA, tal degradar-se-ía numa irregularidade não substancial incapaz de anular o acto, por aplicação do princípio do aproveitamento do acto.

  7. A retoma do procedimento administrativo pode conduzir, ao menos em teoria, a decisão diferente da impugnada e não é verdade que inexista qualquer utilidade no prosseguimento do procedimento administrativo, ainda que fosse o acto válido.

    I. A participação dos interessados neste procedimento administrativo assume particular pertinência, uma vez tratar-se de matéria técnica de difícil definição (veja-se por exemplo a questão da valia (ou não) histórica do edifício pré-existente) em que a requerente poderia fazer carrear para os autos matéria que poderia fazer alterar a decisão final.

  8. Por outro lado é sempre possível neste âmbito que o indeferimento do PIP tenha um conteúdo importante para o seu requerente, uma vez que “no caso de a informação ser desfavorável, dela deve constar a indicação dos termos em que a mesma, sempre que possível, pode ser revista por forma a serem cumpridas as prescrições urbanísticas aplicáveis” (artº 16º, nº 4 do RJUE).

  9. Assim, foi violado pela sentença recorrida o disposto no artº 100º do CPA e incorrectamente aplicado o princípio do aproveitamento do acto.

    Quanto ao erro sobre os pressupostos de facto L. A sentença refere que a alegação nas informações camarárias de que o edifício pré-existente era “emblemático pela sua história ou uma peça já gravada na memória colectiva (com) referências históricas” não fundamentou a decisão de indeferimento, pois, o único fundamento da decisão desfavorável foi a violação do artº 9º do Reg. do PDM.

  10. Afigura-se à recorrente que não existiam grandes dúvidas de que a Câmara Municipal entendia que, dada a suposta história do edifício, a intervenção proposta não respeitaria essa herança e que tal constituiria um dos fundamentos do indeferimento.

  11. A ser assim, é patente o erro nos pressupostos de facto, pois o edifício não está classificado nem tem uma herança histórica que mereça preservação.

  12. No entanto, se fica decidido e assente que essas considerações da entidade recorrida não servem para o indeferimento da pretensão da recorrente, trata-se de uma questão que, nesse aspecto até é favorável à recorrente.

    Violação do artº 9º do reg. do PDM de Vila Nova de Gaia e, artº 59º § 2 do RGEU P. A sentença considerou que o edifício numa área que envolve quatro arruamentos, entre os quais a Avª da República, o mesmo deverá respeitar os alinhamentos e cérceas dominantes desses arruamentos, não se afigurando como razoável que com tal se visasse que imóveis confrontantes com quatro arruamentos apenas tivessem que respeitar o alinhamento e cércea dominante de apenas um desses arruamentos e não dos restantes, pelo que a cércea dominante do arruamento da Avª da República onde se insere o edifício em questão não se mostra respeitada pelo projecto de edificação apresentado pelo recorrente.

  13. A frente do edifício e serventia da casa é para a Avª Sacadura Cabral, onde praticamente todas as casas são constituídas por dois andares, sendo essa a cércea dominante.

    O terreno apresenta um declive considerável, o que determina que da parte da frente apenas sejam visíveis dois pisos e da parte de trás se vejam três (factos o) e p) da matéria de facto provada).

  14. O edifício não se prolonga até ao arruamento da Avª da República. O edifício apenas se prolonga 8 metros para além do existente (que tem 32 metros), distando ainda 5 (cinco) metros dessa Avª da República. Por este arruamento não tem acesso de pessoas, mas apenas de veículos para garagem.

  15. O edifício não fica sequer à face da Avª da República, nem tem relação com ela. Todo o edifício se estrutura para a outra via.

  16. Esta parte traseira do edifício, que fica afastada da Avª da República, não deve ser abrangida pela regra da cércea dominante nesta.

  17. No caso vertente, a cércea a atender é aquela do arruamento que serve o edifício, ou seja a Avª Sacadura Cabral.

    V. E há também que fazer apelo ao disposto no artº 59º, nº 2 do Regulamento Geral da Edificação Urbana (RGEU) W. O terreno em que o edifício se insere tem quatro frentes: para a Avª Sacadura Cabral (a parte frontal), para a Rua da Assembleia, para a Avª da República e para a Rua Eça de Queirós (al. t) da matéria de facto provada) e a Avª Sacadura Cabral encontra-se a uma cota superior à da Avª da República, subindo a Rua da Assembleia e a Rua Eça de Queirós desta avenida para aquela, tratando-se portanto de ruas inclinadas.

    X. Face à Rua da Assembleia (e também face à Rua Eça de Queirós), a cércea pretendida é permitida (não existe ali qualquer cércea dominante).

  18. Tem plena aplicação o preceituado no §2 do artº 59º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) que dispõe que nos edifícios de gaveto formados por arruamentos de níveis diferentes a fachada do edifício sobre o arruamento mais baixo poderá elevar-se até à altura permitida para o outro arruamento, na extensão máxima de 15 metros.

  19. A altura do edifício ao nível da fachada, para as Ruas da Assembleia e da Eça de Queirós prolonga-se por cerca de 9 metros para cada lado.

    AA. Sendo que no alçado voltado para a Avª da República a altura é essa mesma existente nas outras duas ruas e apenas numa extensão de 9 metros.

    BB. Verifica-se assim que a altura desse alçado é admissível e legal.

    CC. A regra prevista do RGEU e a regra prevista no PDM são perfeitamente compagináveis e uma complementa a outra.

    DD. O artº 59º, § 2 do RGEU diz que nos edifícios de gaveto formados por arruamento de níveis diferentes, a fachada do edifico sobre o arruamento mais baixo poderá elevar-se até à altura permitida para o outro arruamento, na extensão máxima de 15 metros.

    EE. Porém, como é óbvio, não nos diz que a altura máxima definida para cada um dos arruamentos. Isso é o PDM que define.

    FF. Depois de definida a altura máxima para cada um dos arruamentos (que no PDM de Vila Nova de Gaia e para aquele local é definida pela cércea dominante, sendo que noutros PDM’s é definida por número de pisos fixo para cada local ou até em metros) é que entra a funcionar a regra prevista no artº 59º, § 2 do RGEU, para os edifícios de gaveto.

    GG. A regra do PDM, ao contrário do que diz a sentença sub judice não prevalece sobre a regra do artº 52º do RGEU, porque não tem que prevalecer, dado que têm campos de aplicação complementares.

    HH. Aliás, o PDM, dada a sua natureza regulamentar não poderia contrariar as normas da lei (no caso do RGEU), a não ser quando estas têm carácter supletivo e permitem expressamente que sejam afastadas por regulamentos municipais, o que não acontece no caso.

    II. Deste modo, a sentença recorrida ao considerar o acto recorrido válido, violou o disposto no artº 9º do Regulamento do PDM de Vila Nova de Gaia e artº 59º, § 2 do RGEU.

    Ilegal revogação do deferimento tácito formado nos termos do artº 111º, c) [por lapso, referiu-se al. b) no articulado inicial] do RJEU e artº 140º, 1, al. b) do CPA JJ. A sentença recorrida aceita que os prazos foram ultrapassados e que teria ocorrido deferimento tácito, nos termos do artº 111º do RJEU.

    KK. No entanto, considera que como esse acto silente violaria o previsto no PDM de Vila Nova de Gaia, ele seria nulo, pelo que poderia ser proferido livremente um acto expresso de sentido contrário.

    LL. Porém, como vimos acima, não havia qualquer violação do PDM, pelo que, o deferimento tácito era legal.

    MM. Sendo esse deferimento tácito um acto plenamente válido e constitutivo de direitos, como é, não podia, como veio a ser, através do despacho impugnado, revogado pelo recorrido (artº 140º, 1, b) do CPA).

    NN. Ao assim não considerar, a sentença violou o artº 140º, 1, b) do Código do Procedimento Administrativo» * O recorrido Vereador do Ordenamento do Território, Urbanismo, Planeamento Urbanístico e Paisagem Urbana da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, contra alegou no sentido da improcedência do recurso, formulando as seguintes conclusões: «1ª - De acordo com o disposto nos artigos 2º e 9º da Lei nº 13/02, de 19 de Fevereiro, a lei aplicável e que rege a tramitação dos...

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