Acórdão nº 0939/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução18 de Novembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

A FAZENDA PÚBLICA e o MINISTÉRIO PÚBLICO recorrem para o Supremo Tribunal Administrativo da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que, no âmbito de recurso judicial apresentado pelo arguido A………… da decisão que lhe aplicou uma coima por falta de pagamento de taxa de portagem em infra-estruturas rodoviárias, anulou essa decisão de aplicação de coima e determinou a remessa dos autos à autoridade administrativa para que procedesse à apensação de todos os processos de contra-ordenação instaurados contra o arguido e realizasse o cúmulo material das coimas aplicadas.

1.1.

O Ministério Público rematou as suas alegações de recurso com o seguinte quadro conclusivo: 1. No processo de contra-ordenação tributária, por força do disposto no art. 3º b) e 81º do RGIT remetidos os autos ao tribunal competente e apresentados ao juiz pelo MºPº, nos termos do art. 62º do RGCO, o juiz ou não aceita o recurso nos termos do art. 63º do RGCO, ou o decide, em conformidade com o art. 64º do RGCO.

  1. Nos termos do art. 25º do CPP – aplicável por força do art. 3º b) do RGIT e 41º nº 1 do RGCO – há conexão de processos quando o mesmo agente tiver cometido várias contra-ordenações e para todas elas organiza-se um só processo ou procede-se à apensação de todos no caso de terem sido instaurados vários - art. 29º 1 e 2 do CPP.

  2. A falta de apensação dos processos de contra-ordenação pela autoridade administrativa não integra qualquer das nulidades elencadas nos artigos 118º e 119º do CPP porque estas, com excepção do emprego da forma de processo especial fora dos casos previstos na lei, não são aplicáveis ao processo de contra-ordenação.

  3. Assim, face ao teor do art. 118º nº 1 e 2 do CPP, porque não está expressamente cominada a falta de apensação como nulidade, o acto é irregular.

  4. Uma vez que os autos comprovam a existência de uma situação de conexão subjectiva de processos, que estão todos na fase do julgamento, nada impede que se proceda agora à sua apensação, nos termos dos artigos 24º nº 2 e 25º do CPP, àquele que respeitar à contra-ordenação determinante da competência por conexão nos termos do art. 29º nº 2 do CPP proferindo-se depois o despacho previsto no art. 64º do RGCO.

  5. Esta parece ser a melhor solução a dar ao caso sendo certo que será ela a única que pode até beneficiar o recorrente. Pelo facto do Tribunal estar vinculado ao princípio da proibição da reformatio in pejus previsto no art. 72º-A do RGCO pelo que não poderá aplicar uma coima superior à aplicada pela autoridade administrativa.

  6. O mesmo pode não ocorrer se for mantida a anulação da decisão recorrida pois a autoridade administrativa, na determinação da medida da coima nos termos do art. 7º da Lei 25/2006 de 30 de Junho, pode não voltar a aplicar uma coima de valor superior.

  7. Uma vez que no âmbito do RGIT vigora o regime do cúmulo material das penas, a pena única é a que resultar da soma de todas as coimas concretas.

  8. Uma vez que foi aplicada em cada processo uma coima, o tribunal mais não tem do que proceder à soma de todas elas para aplicar uma coima única, não havendo lugar à aplicação, no caso, do regime previsto nos artigos 77º e 78º do CP, para o cúmulo jurídico das penas.

  9. A decisão recorrida, ao anular a decisão que aplicou e ao determinar a remessa dos autos à autoridade administrativa para apensação dos processos e aplicação de uma coima única, violou por erro de interpretação o disposto nos artigos 63º e 64º do RGCO, 3ª b) e 81º do RGIT e, 24º nº 2, 25º e 29º do CPP.

  10. O presente recurso é admissível nos termos do art. 73º nº 2 do RGCO, por tal se afigurar manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito e a promoção da uniformização das decisões judiciais e das autoridades administrativas.

    1.2.

    Por seu turno, a Fazenda Pública rematou as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: A. Vem o presente recurso interposto da sentença que decidiu pela existência de uma questão prévia que obsta ao conhecimento mérito da causa e, em consequência, decidiu anular “a decisão de aplicação de coima, por violação do disposto no art. 25º do RGIT e 29º do CPP” e ordenar “a remessa destes autos à Autoridade Administrativa, para que proceda à apensação dos processos e realização do cúmulo material das coimas concretamente aplicadas”, o qual se circunscreve à questão de direito da anulação da decisão administrativa, apreciada pelo douto Tribunal a quo.

    B. Para assim decidir considerou o Tribunal a quo,em síntese que, “impunha-se, por conseguinte, à entidade administrativa proceder à apensação dos processos, organizando um único processo para efeitos de aplicação de uma coima única, nos termos do disposto no art. 25º do RGIT”,concluindo que a omissão destes procedimentos e operações determinam a anulação da decisão administrativa.

    C. Quanto à legitimidade da Fazenda Pública para interpor o presente recurso, importa ter em conta que, com a proposta de Lei nº 496/2012, de 10 de Outubro de 2012, de aprovação do Orçamento do Estado para 2013, foi alterada a redacção do art. 83º do RGIT, passando o representante da Fazenda Pública, por força do nº 1 da referida norma, a ter legitimidade para interpor recurso da decisão proferida pelo tribunal, ampliando-se, deste modo, a sua possibilidade de intervenção no processo de contra-ordenação, que antes se limitava à produção de prova, nos termos do art. 81º, nº 2 do RGIT.

    D. Deste modo, e tendo em conta a unidade do sistema jurídico e a aplicação subsidiária do RGCO neste âmbito, por força do art. 3º, alínea b), do RGIT, com a alteração legislativa ocorrida, a Fazenda Pública tem também legitimidade para recorrer nos recursos de processos de contraordenação tributária, ao abrigo do nº 2 do art. 73º do RGCO.

    E. Quanto ao efeito do presente recurso, entende a Fazenda Pública que, no regime previsto nos artigos 83º e 84º, ambos do R.G.I.T., complementado pelo R.G.C.O., mormente os artigos 70º, 73º, 74º, 75º, 79º, 88º e 89º, de aplicação subsidiária, não é possível a execução das coimas e sanções acessórias antes do trânsito em julgado ou de se ter tornado definitiva a decisão administrativa que as aplicar, sendo esta a única interpretação que assegura a constitucionalidade material deste art. 84º do R.G.I.T., nos casos em que o recurso é interposto de decisão condenatória, assim não sendo necessária a prestação de garantia para que o mesmo recurso goze de efeito suspensivo da decisão recorrida — conforme se doutrinou no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 15-11-2011, processo nº 04847/11; e na esteira do entendimento dos Conselheiros Jorge Lopes de Sousa e Simas Santos em “Regime Geral das Infracções Tributárias anotado”, 4ª edição, 2010, em anotação ao art. 84º, página 582 e seguintes.

    F. Neste sentido, não deverá ser considerada exequível a decisão judicial proferida nestes autos, que decidiu pela anulação da decisão administrativa e que determina que a Autoridade Administrativa proceda à apensação dos...

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