Acórdão nº 01018/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução12 de Novembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA: A……………, L.da, intentou, no TAF de Mirandela, contra o Município do Mogadouro, acção administrativa especial de contencioso pré-contratual pedindo a anulação da decisão do Réu, de 25/03/14, que adjudicou a empreitada de obra pública denominada “Loteamento Industrial de Mogadouro – III Fase” à sociedade B…………., Lda.

Por sentença de 31/10/2014, a acção foi julgada procedente e anulados não só o acto de adjudicação como o contrato celebrado na sequência do mesmo.

C………., L.da, - uma das oponentes ao referido concurso - invocando o disposto no art.ºs 154.º e 155.º do CPTA, interpôs recurso de revisão dessa sentença alegando não ter sido citada para intervir como Contra Interessada.

Recurso a que o TAF não concedeu provimento.

A referida sociedade recorreu dessa decisão para o TCA Norte e este, por Acórdão de 5/06/2015, concedeu provimento ao recurso e declarou o processado nulo a partir da petição inicial.

É deste Acórdão que vem o presente recurso, interposto pela Autora – A…………… L.da - a coberto do disposto no art.º 150.º do CPTA.

Nele foram formuladas as seguintes conclusões: 1. O Acórdão recorrido deve ser revogado.

2. À luz do disposto no n.º 1 do art.º 150° do CPTA, afigura-se-nos, sem margem de subjectividade, que a questão controvertida nos presentes autos se reveste de uma importância fundamental, quer pela sua relevância jurídica, quer pela sua relevância social.

3. Devendo, desde logo, por esse facto, admitir-se o presente recurso de revista.

4. A questão central sub judice versa sobre a definição de contra - interessados na acção administrativa especial de impugnação de actos administrativos.

5. Sendo que, e como terá oportunidade de vislumbrar-se infra, estamos perante o facto evidente de que existe uma errada interpretação do art.° 57° do CPTA no Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), o recurso de revista revela-se, “in casu”, absolutamente fundamental para uma melhor aplicação do direito.

6. A decisão recorrida determina a revogação da decisão proferida em 1.ª Instância pelo TAF de Mirandela, deferindo o pedido de revisão formulado a fls., declarando a nulidade do processado a partir da petição inicial.

7. Esta decisão vem na sequência da interposição do recurso jurisdicional do acórdão proferido em 16.02.2015 pelo TAF de Mirandela, o qual indeferiu a reclamação para a conferência interposta pela recorrente do despacho de fls. de 20.01.2015, o qual havia indeferido o recurso de revisão interposto da sentença de 31.10.2014 8. Estamos perante decisões totalmente opostas, que põem em causa a apreciação de uma questão de grande relevância jurídica e ainda de maior relevância social que não pode deixar de ser apreciada por este Supremo Tribunal, pois só assim se aplicará o direito e se fará a devida justiça! 9. De acordo com o art.° 57° do CPTA são contra-interessados aqueles “…a quem o provimento do processo impugnatório possa directamente prejudicar ou que tenham legítimo interesse na manutenção do acto impugnado...”.

10. Efectivamente, o que está aqui em causa é a definição de contra-interessados na causa.

11. Há um lapso na definição de contra-interessados, tanto na 1.ª como na 2.ª instância.

12. Estamos claramente perante uma situação jurídica relevante, pelo que, apenas com a intervenção do STA serão definidas as coordenadas para decisões futuras.

13. O TCA Norte tem razão ao afirmar que o TAF de Mirandela errou na definição de contra-interessados.

14. Mas também este tribunal superior erra na sua definição de contra interessados.

15. O TAF de Mirandela errou na definição de contra-interessados por excesso de zelo, pois deveria apenas ter citado o verdadeiro contra-interessado, que era aquele que estava classificado em primeiro lugar.

16. Escreve o Prof. VIEIRA DE ANDRADE, in “Justiça Administrativa”, 2012, 12.ª Edição, pág. 253, que “Ao lado das partes principais - ao lado do autor (ad adjuvandum), bem como ao lado do réu (ad opponendum) - podem surgir, como partes acessórias, os assistentes, ou seja, as pessoas interessadas em que o litígio seja resolvido a favor de uma das partes, havendo ainda a considerar no processo administrativo a posição especial do Ministério Público. Em primeiro lugar, são de destacar os contra-interessados, designação que cabe aos que tenham interesse directo e pessoal em que não se dê provimento à acção (não é necessária a titularidade de uma posição jurídica própria), em regra, os particulares nos processos dirigidos contra a Administração (...)“ 17. O Ilustre Professor de Coimbra estabelece ainda uma pertinente distinção: entre contra-interessados e co-interessados.

18. Segundo o Autor, estes últimos são “(...) os terceiros que tenham interesse em que não se dê provimento ao pedido do autor (..

.)“, ob. cit., pág. 254.

19. Pegando na definição de contra-interessados acima transcrita, concluímos que apenas um dos concorrentes estaria na posição de contra-interessado, pois só a ele o provimento da acção poderia prejudicar (porque seria tolhida, como foi efectivamente, a adjudicação da obra).

20. Com efeito, só ele tinha interesse na manutenção do acto impugnado, pois só assim realizaria a obra.

21. Apenas este concorrente tem um interesse idêntico ao do réu. Todos os outros concorrentes têm um interesse idêntico ao da Autora, ou seja, a anulação do concurso, pelo que não são contra-interessados.

22. Mas sim co-interessados.

23. Não há assim preterição de qualquer formalismo legal.

24. A definição de contra-interessados é relevante para a identificação dos sujeitos processuais.

25. O contra-interessado é um litisconsorte necessário passivo. Há uma identidade de interesses entre o Réu e o contra-interessado. O contra-interessado não deduz nenhum pedido, defende a posição do réu, pois os seus interesses são iguais.

26. Portanto, numa situação de concurso público para adjudicação de uma empreitada de obras públicas, apenas o adjudicatário tem um interesse coincidente com o da entidade administrativa adjudicante.

27. Apenas este é, no rigor dos rigores, à luz do disposto no artigo 57º do CPTA, contra-interessado.

28. Assim, a recorrente C……………… não é contra-interessada no processo.

29. A recorrida não tem legitimidade para intervir no processo nessa qualidade, podendo fazê-lo, todavia, como interveniente processual recorrendo à figura do assistente.

30. O sumário do Acórdão recorrido diz o seguinte: “3. No procedimento pré-contratual em que apenas o candidato que apresentou a proposta graduada em primeiro lugar poderá tornar-se titular da relação jurídica contratual, os que ficaram com as respectivas propostas graduadas após a do impugnante - que não está em posição que lhe permita vir a celebrar o contrato e daí a legitimidade activa - não ficam pior se o acto for anulado pois em qualquer caso, sendo o acto anulado ou não, nunca veriam a sua proposta ocupar aquela posição. 4. Os candidatos que apresentaram propostas classificadas abaixo da proposta do impugnante não têm um interesse contraposto ao do impugnante nem têm interesse na manutenção do acto impugnado, pelo que não são contra-interessados para efeitos do disposto no artigo 57° do CPTA.

31. Repare-se que o próprio acórdão segue o entendimento por nós defendido.

32. Efectivamente os concorrentes classificados abaixo do impugnante não ficam prejudicados pela anulação do acto impugnado, nem têm interesse na manutenção do acto impugnado.

33. Mas na mesma situação estão os concorrentes classificados acima do impugnante, excepto o candidato cuja proposta foi graduada em primeiro lugar.

34. É aqui que o Tribunal erra no seu julgamento.

35. A verdade é que tanto o 2° como o 23° classificados não ficam prejudicados pela anulação do acto impugnado, nem têm interesse na manutenção do acto impugnado.

36. No douto Acórdão também se diz que sendo o acto anulado na totalidade, abre-se nova possibilidade de os classificados nos lugares cimeiros verem a sua proposta ocupar o primeiro lugar.

37. Assim, na verdade estes candidatos são co-interessados! 38. Defende ainda o douto Acórdão que o que está em causa no presente concurso é a ocupação do lugar primeiro.

39. Também aqui o Tribunal erra.

40. O que se discute no processo não é a classificação das propostas, mas sim a legalidade do concurso, uma vez que o mesmo previa critérios ilegais.

41. Ora, sendo anulado este concurso, nenhum dos concorrentes ocuparia o primeiro lugar.

42. A argumentação defendida pelo TCA Norte no seu acórdão não é uma argumentação sólida.

43. Este Tribunal cita um acórdão do TCA Norte, de 15.12.2005, no processo 01332/04.4BEPRT para defender que apenas os concorrentes classificados acima do impugnante são considerados contra-interessados. O que está em causa neste acórdão é um concurso de ingresso para a admissão de um estágio da carreira técnica superior com vista ao provimento como técnico superior de 2ª classe.

44. Este acórdão vem na sequência de um recurso de um despacho de absolvição da instância por ilegitimidade passiva.

45. Como sustenta este acórdão: “. . .

Ora, os classificados depois da recorrente, que o foi em 3° lugar para uma vaga de um lugar, e que não recorreram desse acto, aceitando portanto a classificação directamente apenas podem beneficiar do provimento do recurso, sendo que qualquer interesse indirecto, como o é o alegado pela entidade recorrida, não só não é aqui juridicamente tutelável, como, caso ocorra, pode sempre ser sindicado.”- sublinhado nosso.

46. O próprio acórdão admite que os classificados depois da recorrente, se não recorreram do acto administrativo foi porque aceitaram a sua classificação.

47. Ou seja, todos os concorrentes que não ficaram classificados em 1º lugar poderiam ter recorrido do acto de adjudicação. Não o fazendo, estão a aceitar a sua “derrota”.

48. Daqui também retiramos que todos os concorrentes classificados além do 1° lugar, têm o mesmo interesse da recorrida, pelo que não são contra-interessados.

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