Acórdão nº 0144/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelANA PAULA LOBO
Data da Resolução13 de Julho de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional Decisão recorrida - Tribunal Tributário de Lisboa de 30 de Janeiro de 2013 Julgou a presente impugnação IMPROCEDENTE, e por conseguinte, absolveu a Fazenda Pública do pedido.

Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A……………… - Participações, SGPS, S.A., impugnante, identificada nos autos, veio interpor o presente recurso da sentença supra mencionada, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª) A liquidação impugnada resultou da aplicação, pela Administração Tributária, do disposto no nº 3 do artº 31º do EBF — hoje, nº 3 do artº 32º; 2ª) A regra referente às mais-valias obtidas pelas SGPS é a da sua não tributação (nº 2, do artº 31º do EBF), o que quer dizer que o legislador considerou que essas mais-valias não representam capacidade contributiva adequada quando obtidas por SGPS; 3ª) O n° 3 do art° 31º do EBF “sanciona” as SGPS que obtenham mais-valias se as participações alienadas tiverem sido adquiridas a entidades com as quais elas têm relações especiais, se tais participações não se tiverem mantido na sua titularidade pelo menos durante três anos; 4ª) Não obstante as participações aqui em causa, terem sido adquiridas e alienadas a preço de mercado, o facto de entre a data de aquisição e a data de alienação mediarem menos de três anos, levou a Administração Tributária a considerar como tributáveis as mais-valias obtidas pela recorrente na alienação de tais participações, por aplicação do referido n° 3 do art° 31° do EBF; 5ª) Esta norma é similar à estabelecida na alínea a) do n° 3 do art° 23° do CIRC, onde não se aceitam como custos fiscais as menos-valias resultantes da alienação de participações sociais se estas tiverem sido adquiridas a entidades com as quais se tem relações especiais e se tais participações não tiverem sido mantidas na titularidade da alienante antes de decorridos três anos; 6ª) Tais normas, como o assinala a doutrina, têm a natureza e o conteúdo de normas anti-abuso específicas, em que o legislador criou presunções legais inilidíveis, face às quais, um certo comportamento corresponde, necessária e inelutavelmente, a uma certa consequência jurídica; 7ª) Assim, nos termos do referido nº 3 do art° 31º do EBF, se forem alienadas participações sociais antes de decorridos três anos sobre a data da aquisição e esta tiver sido feita a entidade com a qual se tem relações especiais, a consequência jurídica inelutável é a perda da isenção estabelecida no nº 2 do artº 31º do EBF; 8ª) O Tribunal Constitucional tem julgado incompatíveis com a Constituição presunções inilidíveis, pelo que a liquidação impugnada é ilegal por ter sido emitida com base em norma inconstitucional — precisamente, o nº 3 do artº 31º do EBF, que consagra essa presunção inilidível; 9ª) Também a jurisprudência comunitária tem considerado incompatível com o direito comunitário a existência de presunções de fraude ou evasão fiscal, proibindo a existência de critérios pré-determinados; 10ª) De acordo com tal jurisprudência comunitária, esse combate à elisão fiscal tem que ser feito caso a caso, analisando o caso concreto e as suas circunstâncias, também concretas; 11ª) Como tem assinalado a doutrina, a existência de cláusulas anti-abuso específicas, criando presunções inilidíveis, só são constitucionalmente admissíveis se forem inevitáveis, adequadas e proporcionais; 12ª) O que está em causa na previsão do nº 3 do art° 31º do EBF é a existência de relações especiais e o necessário, e legítimo, “combate” à possível manipulação de preços estabelecidos entre tais entidades; 13ª) Ora, o meio mais adequado, e portanto, mais proporcional, para se atingir esse objectivo, é o previsto no art° 63º do CIRC, onde são dados poderes à Administração Tributária para analisar a concreta operação e corrigir, se para tanto houver fundamento, os preços estabelecidos pelas partes; 14ª) Ora, não aplicar esse método quando estão em causa mais-valias obtidas pelas SGPS, ou menos-valias, no caso do artº 23 nº 3, a), do CIRC, mas antes impedir a aplicação dos regimes regra de não tributação ou de não aceitação dos custos, não é adequado nem proporcional; 15ª) Estando em causa, na previsão do nº 3 do artº 31º do EBF, a existência de relações especiais e o “combate” a comportamentos ilisíveis, outro meio adequado é o da aplicação da cláusula geral anti-abuso estabelecida no nº 2 do artº 38º da LGT; 16ª) Na aplicação de tal cláusula geral, onde estão, ou podem estar, em causa actos ou negócios artificiosos, o legislador rodeou a sua aplicação dos maiores cuidados; 17ª) Assim, a Administração Tributária tem que analisar criteriosamente a concreta operação, fazer a prova da artificialidade da operação, podendo o contribuinte apresentar contra-prova; 18ª) Não aplicar ao caso das mais-valias das SGPS este método, não é adequado, nem proporcionado, porque na aplicação do art° 31º, n° 3, do EBF, não há qualquer análise de caso concreto, nem se admite a contra-prova por parte do contribuinte; 19ª) Há, além disso, como também o assinala a doutrina, uma total incoerência, e, portanto, uma falta de justeza, no sistema, já que em situações em que a fuga ao Fisco é consabidamente maior, como em pagamentos feitos a off-shores, o art° 65°, n° 1 do CIRC, admite que o contribuinte faça prova de que tais pagamentos correspondem a efectivas operações e que não têm, nem um carácter anormal, nem um montante exagerado; 20ª) Ao invés, em situações em que o que está em causa é apenas a questão do preço de transacção ser o preço de mercado, o n° 3 do art° 31º do EBF, sem admitir qualquer prova em contrário, “castiga” a operação com a perda do benefício fiscal; 21ª) Também como tem dito a doutrina, a criação de uma presunção inilidível, como aquela que está estabelecida no n° 3 do art° 31° do EBF, viola o princípio constitucional da capacidade contributiva; 22ª) É que se o legislador considerou as mais-valias não especulativas obtidas pelas SGPS como não tributadas, é porque entendeu que tais mais-valias não representam, para aquele tipo de sociedades, capacidade contributiva; 23ª) Ora, ao estabelecer no n° 3 do artº 31º do EBF, que em razão da existência de relações especiais, essas mais-valias são tributadas, sem admissão de prova da regularidade das transacções, viola-se essa inexistência de capacidade contributiva; 24ª) O artº 31º, nº 3, do EBF viola, também, o direito à prova, sendo que, como o também assinala a doutrina, o ónus da prova não é apenas processual — com ele permite-se obter um resultado justo.

  1. ) Há, além disso, uma clara violação do princípio da igualdade, desde logo, como se viu, por a lei tratar de forma mais penalizante situações de mero controle dos preços de transacção do que situações em que há artifícios ou pagamentos a off-shores.

  2. ) A impugnada liquidação, fundamentada em tal norma (nº 3 do artº 31º do EBF) é, pois, ilegal, não se podendo manter a douta sentença recorrida.

Requereu a revogação da sentença recorrida, julgando-se procedente a impugnação.

Foi emitido parecer pelo Magistrado do Ministério Público no sentido da confirmação da sentença recorrida.

Mostram-se provados, por documento, os seguintes factos com relevo para a decisão do presente recurso:

  1. A Impugnante exerce a actividade de gestão de participações sociais noutras sociedades como forma indirecta de exercício de actividades económicas (cfr. relatório da inspecção tributária, a fls. 41/42 do Processo Administrativo).

  2. A Impugnante foi objecto de uma acção de inspecção em sede de IRC, no âmbito da qual foram efectuadas correcções à matéria colectável, de natureza meramente aritmética, resultante de imposição legal, aos exercícios de 2007 e 2009, nos montantes de 35.981.881,53€ e de 29.792.997,91€, respectivamente (cfr. relatório de inspecção, a fls. 40 do Processo Administrativo).

  3. As correcções mencionadas na alínea anterior foram efectuadas com o seguinte fundamento, que aqui se transcreve na parte com interesse para a decisão: “III-DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL III.1 Introdução No exercício de 2007, a sociedade A…………. apurou um resultado líquido do exercício de € 53.373.047,60, conforme respectiva Demonstração de Resultados e Balancete Analítico após apuramento de resultados.

    O resultado contabilístico constitui o lucro real que, de acordo com os princípios enumerados na Constituição da República portuguesa e no Código do IRC, é determinante para o apuramento do lucro tributável, sendo apenas de efectuar as correcções extracontabilísticas de acordo com as normas fiscais.

    Deste modo, o Sujeito Passivo procedeu a vários acréscimos e deduções ao resultado líquido do exercício no quadro 07 da declaração de rendimentos, modelo 22, para apurar o resultado para efeitos fiscais que, neste caso, se traduziu num prejuízo para efeitos fiscais no montante de € 21.150.014,12, conforme respectivo campo 239 do Q 07, Anexo 3.

    Verificou-se que os acréscimos e deduções efectuados estão de acordo com as normas fiscais em vigor à data.

    Pela análise dos registos contabilísticos...

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