Acórdão nº 0691/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Outubro de 2015

Data21 Outubro 2015
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

1-Relatório: A ora recorrida deduziu oposição à execução fiscal nº 7270/2012 e apensos instaurada para cobrança da quantia de 119.835,95 Euros liquidada pelo Município de Almada a título de taxa de ocupação da via pública (T.O.V.P.) referente ao ano de 2005.

Por sentença do TAF de Almada de 22/09/2014 foi julgada procedente a oposição e determinada a extinção da execução fiscal.

Desta decisão recorreu o Município de Almada para o TCA- Sul que por acórdão de 23/04/2015 se julgou incompetente em razão da hierarquia e indicou como competente este STA por apenas estar em causa matéria de direito.

O Município recorrente apresentou alegações com as seguintes conclusões: «A taxa de ocupação do Domínio público não foi substituída pela TMDP, ambas as taxas são devidas e compatíveis, porque assentam em prestações distintas, sendo diferentes os fatores geradores de uma e de outra; -II. A TMDP não substituiu a taxa de ocupação do domínio público prevista no Regulamento Municipal de Taxas e Licenças do Município de Almada; III. As TOVP, respeitantes a ocupação do espaço público com as obras necessárias para a implantação das redes (abertura de valas, caixas de visita e colocação de cabos) não se encontram englobadas na taxa de direitos de passagem prevista no artigo 106° da Lei das Comunicações eletrónicas IV. Os sujeitos passivos nas duas taxas são bem distintos, sendo que na TMDP, o sujeito passivo é o cliente final, na TOVP o sujeito passivo é a empresa prestadora de serviços.

V. A cobrança da TOVP não coincide com a cobrança da TMDP, porquanto esta última ocorre apenas quando se mostra concluída a intervenção na via pública e o serviço em condições de ser prestado; VI. Os Municípios têm património e finanças próprios, sendo que o regime da autonomia financeira das autarquias locais assenta, designadamente nos poderes de elaborar, aprovar e alterar planos de atividades e orçamentos, de dispor de receitas próprias, que por lei se lhe encontrem destinadas e constituem receitas dos municípios entre outras o produto da cobrança de taxas; VII. A pretensa impossibilidade de cobrança da taxa de Ocupação do Domínio Publico pelos Municípios, por via da aplicação da Lei 5/2004, de 10 de fevereiro, viola a Lei das Autarquias Locais, assim como a Lei das Finanças Locais; VIII. A ocupação do solo municipal para a implantação de infraestruturas, durante um determinado período de tempo, implica o pagamento de Taxas por essa ocupação, até porque essa intervenção impossibilita a utilização desse espaço para outros fins e satisfaz a necessidade individual das operadoras de obter lucro (neste sentido o AC. Do TCA Sul de 29/06/2010); IX. A tese defendida na douta sentença recorrida, faz com que as operadoras fiquem isentas de todo e qualquer encargo adveniente da ocupação do espaço público, uma vez que a TMDP é suportada pelo cliente final; X. De todo modo a admitir-se que a Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro, veio afastar qualquer outra taxa, que não a TMDP em contrapartida da concessão dos direitos previstos no artigo 24° da LCE. Este regime só seria aplicável após a entrada em vigor do DL n.º 123/2009, de 21 de Maio, alterado pelo DL n.º 258/2009, de 25 de Setembro, e nunca antes.

XI. Pelo que sempre as taxas cobradas no caso vertente teriam que ser consideradas legais.

XII. A douta sentença recorrida, faz assim uma errada interpretação e aplicação das disposições contidas na Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro, violando em consequência a Lei das autarquias locais, assim como a Lei das Finanças Locais.

Nestes termos e nos melhores de direito que V. Exas doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado com a consequente revogação da douta sentença recorrida.» Foram apresentadas contra-alegações com as seguintes conclusões.

1. O presente recurso foi interposto pelo MUNICÍPIO DE ALMADA da Sentença proferida no âmbito do processo de Oposição à Execução n.º 864/12.5BEALM do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada em que a RECORRIDA deduziu oposição ao processo de execução fiscal n.º 7270/2012 e Apensos, instaurados pelo Município de Almada para cobrança coerciva de dívidas respeitantes a Taxas de Ocupação da Via Pública, referentes ao ano de 2005, no valor global de € 119.835,95, alegando assim, a inexigibilidade da dívida exequenda.

2. Estando em causa, apenas, a discussão de matéria de direito, a competência em razão da hierarquia, para o conhecimento do presente recurso é conferido ao Supremo Tribunal Administrativo.

3. A douta Sentença recorrida considerou totalmente procedente a oposição à execução deduzida pela ora RECORRIDA, com fundamento no facto de existir entre a Taxa Municipal de Direitos de Passagem (TMDP) e a Taxa de Ocupação do Espaço Público uma sobreposição de normas de incidência que visam a tributação da mesma realidade e com idêntica finalidade, estando assim verificado o fundamento previsto no artigo 204.°, n.º 1, alínea a) do CPPT, uma vez que a impossibilidade de subsistência das taxas previstas no Regulamento de Ocupação do Espaço Público do Município de Almada, com as taxas previstas na Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro, gera a ilegalidade em abstracto das mesmas.

4. Sustenta, a RECORRENTE não existir qualquer dupla tributação, dado entender que a TMDP e a Taxa Municipal de Ocupação do Espaço Público têm naturezas diferentes, e incidem, por sua vez, em situações diversas (cf. página 8 das alegações de recurso da Recorrente).

5. Neste contexto, perfilha ainda a RECORRENTE, nas suas alegações de recurso, o entendimento segundo qual a TMDP é uma taxa que tem por fundamento legal a Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro, que estabelece o regime jurídico aplicável às redes e serviços de comunicações, enquanto a Taxa de Ocupação do Espaço Público tem por fundamento o Regulamento e Tabela das Taxas, Licenças e outras Receitas Municipais, que por sua vez se legitima na Lei das Finanças Locais.

6. Sucede, porém, que o âmbito de aplicação subjectivo da Lei das Finanças Locais é mais amplo do que da Lei das Comunicações Electrónicas, pois, enquanto esta apenas se aplica às empresas autorizadas a oferecer redes públicas de comunicações, a Lei das Finanças Locais é aplicável a um conjunto mais amplo de empresas.

7. As taxas de Ocupação da Via Pública são ilegais (em abstracto) por violação do direito comunitário e do regime jurídico aprovado pela Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro - Lei das Comunicações Electrónicas, uma vez que para além da Taxa Municipal de Direitos de Passagem (TMDP) mais nenhuma taxa municipal pode ser liquidada às empresas autorizadas a oferecer redes públicas de comunicações pelo direito de instalação dos seus recursos e equipamentos no domínio público e privado municipal.

8. A dívida em cobrança coerciva é, consequentemente, inexigível, uma vez que a partir da entrada em vigor da Lei das Comunicações Electrónicas que aprovou a Taxa Municipal de Direitos de Passagem - não se consente aos Municípios taxar, às empresas que oferecem redes e serviços de comunicações electrónicas acessíveis ao público, as utilidades decorrentes da ocupação e utilização do domínio público municipal com a implementação e funcionamento de estruturas necessárias às respectivas redes de comunicações, através de tributos ou encargos de outra espécie ou natureza (como é o caso da RECORRIDA).

9. Ora, a ilegalidade abstracta da liquidação é precisamente o primeiro dos fundamentos de oposição à execução fiscal. Dispõe o artigo 204.°, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que constitui fundamento de Oposição Judicial, a Inexistência do imposto, taxa ou contribuição nas leis em vigor à data dos factos a que respeita a obrigação ou, se for o caso, não estar autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respectiva liquidação”.

10. Prevê-se, assim, como fundamento de oposição a ilegalidade abstracta do próprio tributo, ou seja na ilegalidade abstracta a ilegalidade reside directamente na própria lei cuja aplicação é feita, como se verifica no caso vertente.

11. Com efeito, cabem neste conceito de ilegalidade abstracta todos os casos de actos qua aplicam normas que violam regras de hierarquia superior, designadamente, as de direito comunitário ou internacional vigente em Portugal ou mesmo normas legislativas de direito ordinário quando é feita aplicação de normas regulamentares.

12. A regulamentação das redes e serviços de comunicações electrónicas, incluindo os serviços de distribuição de televisão por cabo, e, bem assim, a regulamentação dos denominados direitos de passagem”, encontra-se enquadrada, entre mais, na directiva autorização - a Directiva n.º 2002/20/CE e, na directiva-quadro a Directiva n.º 2002/21/CE, que visam garantir às empresas e cidadãos europeus o acesso a uma infra-estrutura de comunicações de grande qualidade, com uma vasta gama de serviços, a baixo custo, mediante a harmonização e simplificação da legislação que regula o acesso ao mercado de serviços e redes de comunicações electrónicas (cf. Considerando 3 e 4 da Directiva 2002/21/CE e Considerando 1 e artigo 1.º da Directiva 2002/20/CE).

13. De acordo com o disposto no artigo 11.º da directiva-quadro, os direitos de passagem” correspondem aos direitos atribuídos às empresas autorizadas a oferecer redes públicas de comunicações de instalação de recursos em, sobre ou sob propriedade pública ou privada, sendo conferido aos Estados- Membros a possibilidade de imporem taxas sobre estes “direitos de passagem” às empresas autorizadas a oferecer redes públicas de comunicações que procedam à instalação de tais recursos (e não aos clientes destas ou a quaisquer outras entidades).

14. Ora, estas taxas, previstas especificamente no artigo 13.º da directiva autorização são as únicas que podem ser cobradas em contrapartida dos referidos direitos de instalação, conforme, aliás, se depreende do objectivo expresso no Considerando (3) da directiva autorização, de criação “de um quadro...

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