Acórdão nº 0344/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GON
Data da Resolução21 de Outubro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. A Fazenda Pública recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, julgou procedente a impugnação judicial que A…………, Lda., com os demais sinais dos autos, deduziu contra a liquidação de sisa no montante de € 3.000,00 e de juros compensatórios no montante de € 1.328,71.

1.2. Termina as alegações formulando as conclusões seguintes: A. Incide o presente recurso sobre a sentença de 26-04-2013, que julga procedente, por provada, a impugnação que versa sobre liquidação adicional de sisa (e correspondentes juros compensatórios), no montante total de € 4.328,71.

  1. A questão a decidir seria “a de saber se ocorreu caducidade do direito à liquidação e se, por força da declaração espontânea da impugnante para a correcção da liquidação de SISA se gerou uma obrigação natural que devia cumprir”.

  2. Tendo concluído, em função dos pontos B, C e D do probatório, que “a celebração da escritura de compra e venda, que é ato translativo da propriedade do bem vendido, ocorreu em 4 de Agosto de 1999 e a impugnante apresentou-se para retificar o conhecimento de SISA pelo qual liquidou a SISA inicial em 06 de Novembro de 2007, portanto já depois de decorridos os oito anos após a transmissão do bem, encontrando-se, no momento em que ocorreu a liquidação, caducado o prazo para o efeito, mesmo considerando o prazo a que alude o artigo 92º do CIMSISD, invocado pela Fazenda Pública”.

  3. Não pode a Fazenda Pública conformar-se com tal decisão, na medida em que não é devidamente relevada factualidade determinante para a dita, constante da alínea C do probatório: “Com data de 06 de Novembro de 2007, o gerente da impugnante apresentou termo de declaração para efeitos de liquidação de SISA, pela qual declarou que pretende retificar o conhecimento de SISA com o nº 70, emitido em 4 de Agosto de 1999 e referente à aquisição pelo preço de € 74.891,81 em vez de €44.891,81 que foi este o valor indicado na compra que fez …” (o sublinhado é nosso).

  4. A rectificação é um acto administrativo secundário que visa emendar os erros de cálculo ou os erros materiais contidos no acto administrativo anterior, cuja função é meramente correctiva; podendo ser feita a todo o tempo e a pedido dos interessados (no caso, a aqui impugnante), tendo efeitos retroactivos.

  5. A Administração, quando detecta um erro de cálculo ou um erro material (no caso vertente, por auto-denúncia do próprio visado) tem o dever jurídico de o rectificar (o que fez, recalculando o valor de SISA devido, conforme decorre do documento 1 anexo à PI), pois não faria sentido permitir-lhe contemporizar com o erro.

  6. Numa atitude consentânea com as próprias declarações reduzidas a termo, procedeu o declarante (sócio gerente da impugnante) ao pagamento, na mesma data, da SISA liquidada pelo diferencial declarado.

  7. Ou seja, apresentou-se a impugnante (na pessoa do respectivo sócio-gerente) a realizar, espontaneamente, uma prestação, sendo, como defende Galvão Telles, in Obrigações, 3ª edição, p. 41, o seu acto irretractável.

    I. E, ao apresentar-se voluntariamente para regularizar a sua situação tributária, acabou a aqui impugnante por praticar acto de ordem moral ou social que corresponde a um dever de justiça, ainda que o seu cumprimento já não pudesse ser judicialmente exigível - como negar-lho? J. Estamos, assim, perante uma obrigação natural, nos moldes definidos no art. 402º do Código Civil, com fundamento “num mero dever de ordem moral ou social, cujo cumprimento não é judicialmente exigível, mas corresponde a um dever de justiça”.

  8. Configurando, nesta medida, a impugnação aqui controvertida venire contra factum proprium.

    L. A previsibilidade é um elemento constitutivo do Estado de Direito, fundamental para as relações sociais e jurídicas. Estando associada à boa-fé objetiva, a proteção da confiança legítima vincula declarações e comportamentos se esses meios são aptos a gerar expectativas.

  9. Não obstante, a boa-fé objetiva e a confiança legítima criam deveres anexos, cujo incumprimento implica na ilegitimidade das declarações e dos comportamentos contraditórios, causando o dever de se manter ou restaurar a situação original ou de se reparar os prejuízos causados pela incoerência.

  10. Os valores fundamentais da previsibilidade, estabilidade, clareza, transparência...

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