Acórdão nº 01497/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução28 de Outubro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 1276/10.0BELRS 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A……….., S.A.” (a seguir Recorrente) recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida no Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida na sequência do indeferimento do recurso hierárquico que instaurou após o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa da autoliquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) por ela efectuada com referência ao mês de Dezembro de 2004, pretendendo a anulação deste acto tributário, na parte respeitante ao imposto suportado com bens e serviços de utilização mista ou afectação promíscua (i.e.

, utilizados indistintamente nas diversas actividades prosseguidas pela Impugnante, sendo que apenas uma é sujeita a imposto), que alega não ter deduzido oportunamente e que considera estar ainda em prazo para fazer e mediante a utilização de um pro rata de 46%.

1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata e nos próprios autos e a Recorrente apresentou a motivação do recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.

): «A. DA NULIDADE DA SENTENÇA 1. A matéria de facto relevante para a decisão da causa, que se centra na questão da admissibilidade da aplicação do método da dedução directa do IVA por parte da Recorrente nos inputs que apresentam uma relação directa e imediata com as operações activas tributadas, por si realizadas, que conferem o direito à dedução, não foi levada à fundamentação da sentença ora recorrida, não constando, como deveria dos “factos provados”.

  1. Acresce que, a sentença a quo ao considerar como factualidade provada o facto de a Recorrente ter efectuado a dedução do IVA, com recurso ao método da afectação real, sendo esta matéria de facto errónea, permite a interpretação de que, em 2004, a Recorrente efectuou a dedução do imposto então incorrido em recursos de utilização mista, i.e.

    , aqueles que são utilizados, simultaneamente, em operações que conferem o direito à dedução do imposto incorrido e em operações que não conferem este mesmo direito, quando na realidade a Recorrente não efectuou qualquer dedução relativamente ao IVA desta tipologia de recursos.

  2. Pelo exposto, o Tribunal a quo por não ter considerado como provados os factos referidos supra, isto é i) que Recorrente efectuou a dedução do IVA incorrido na aquisição de recursos exclusivamente afectos a operações tributadas, com recurso ao método da dedução directa e não pelo método da afectação real e que ii) relativamente aos recursos de utilização mista (i.e.

    , utilizados, simultaneamente, na realização de operações que conferem o direito à dedução e operações que não conferem este mesmo direito) não foi, pela Recorrente, deduzido qualquer IVA, com referência ao ano 2004, o Tribunal a quo não cumpriu o disposto no n.º 2 do artigo 123.º do CPPT e nos n.ºs 2 e 3 dos artigos 659.º do CPC, pelo que a sentença enferma de nulidade, ao abrigo do n.º 1 do artigo 125.º do CPPT e da alínea b) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC.

    1. DO DIREITO a) Vícios da decisão de indeferimento do Recurso Hierárquico 4. A posição preconizada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, ao ir contra o seu próprio enquadramento notificado ao contribuinte (na decisão de deferimento do Recurso Hierárquico), consolidado e não revogado, comporta uma clara violação de diversas regras e princípios de direito administrativo e tributário, nomeadamente do princípio da tutela da confiança e do dever administrativo de proceder legalmente e de boa fé, do caso decidido ou resolvido e bem assim do acto constitutivo de direitos.

  3. Ora, estes vícios afectam de forma clara e inequívoca a relação jurídica tributária controvertida e objecto dos autos (i.e.

    , a (auto) liquidação de imposto em excesso pela Recorrente) e não representam apenas e só um vício do acto de indeferimento do Recurso Hierárquico do pedido de revisão oficiosa, pelo que a Recorrente entendeu que a Impugnação era o meio adequado.

  4. Não obstante, entendeu o Tribunal a quo que o meio processual utilizado pela Recorrente para discutir contenciosamente a decisão não foi o adequado, sustentando que deveria ter sido utilizada a Acção Administrativa Especial para reagir à decisão proferida em sede de Recurso Hierárquico, sem contudo lançar mão da convolação do meio de reacção utilizado pela Recorrente em Acção Administrativa Especial e, espantosamente, prosseguindo na apreciação dos restantes argumentos.

  5. Ora, ainda que o meio processual utilizado pela Recorrente não fosse idóneo ou seja inclusivamente impróprio (no caso vertente por ter sido deduzida impugnação judicial quando deveria ter sido apresentada acção administrativa especial), deveria ordenar-se oficiosamente a convolação (cfr.

    artigos 98.º, n.º 4, do CPPT e 97.º, n.º 3 da LGT), e não deveria de apreciar-se, na íntegra, as alegações deduzidas e o mérito.

    1. Do erro do Direito 8. A extensão do direito à dedução do IVA encontra-se estreitamente condicionada pelo universo de operações realizadas pelo sujeito passivo.

  6. No ano 2004, a Recorrente deduziu apenas o IVA dos recursos exclusivamente afectos a operações que conferem o direito à dedução recorrendo, ao método da dedução directa, previsto nos artigos 19.º e 20.º do Código do IVA e nos artigos 17.º e 19.º da Sexta Directiva.

  7. Assim, sempre que a Recorrente identificou uma ligação directa, integral e imediata entre as aquisições de bens e serviços (inputs) e as operações activas tributadas por si realizadas (outputs), que conferem o direito à dedução, a Recorrente procedeu à dedução da totalidade do imposto com recurso ao referido método da dedução directa.

  8. Reitere-se, pois, que a Recorrente apenas deduziu o IVA respeitante aos recursos exclusivamente conexos com operações tributadas (que conferem o direito à dedução).

  9. Doutro passo, relativamente ao IVA incorrido pela Recorrente na aquisição de bens e serviços por si utilizados de modo partilhado, em actividades que conferem o direito à dedução e naquelas que não conferem este mesmo direito (i.e.

    , recursos de utilização mista), não foi, pela Recorrente, deduzido qualquer imposto com referência ao ano 2004.

  10. Em verdade, e no decurso da acção inspectiva que lhe foi movida, apercebeu-se a Recorrente, após análise da sua metodologia de dedução do IVA incorrido que efectivamente, só estava a deduzir imposto incorrido em recursos afectos exclusivamente a operações tributadas, desconsiderando o imposto incorrido nos recursos de utilização mista, entregando sistematicamente ao Estado uma prestação tributária superior à efectivamente devida.

  11. Consequentemente, veio a Recorrente solicitar ulteriormente a recuperação do IVA incorrido nos recursos de utilização mista, dentro do prazo de quatro anos que lhe assiste (cfr.

    n.º 2 do artigo 91.º do Código do IVA, na redacção à data dos factos).

  12. Ora, relativamente aos inputs de natureza mista – recursos de utilização mista – o artigo 23.º do Código deste imposto estabelece, em consonância com o artigo 17.º da Sexta Directiva, a existência de duas metodologias para determinar o IVA dedutível: o pro rata e a afectação real.

  13. Em face do exposto e como resulta da aplicação da percentagem de dedução apurada pela Recorrente e pela Autoridade Tributária e Aduaneira, que corresponde a 46%, pretende a primeira que lhe seja reembolsado o crédito de IVA, no montante de € 1.380.354,92, o qual corresponde ao total do imposto incorrido com os recursos de utilização mista (€ 3.000.771,57) multiplicado pelo pro rata de 46%.

  14. Com efeito, a percentagem de dedução resulta de uma fracção cuja composição ou fórmula de cálculo se encontra pré-definida pelas normas tributárias, de forma imperativa e sem quaisquer concessões a uma margem de livre decisão administrativa.

  15. Concluindo-se, assim, que o método do pro rata é aquele que o sistema de IVA português, no artigo 23.º, n.º 1 do respectivo Código, escolheu como o método de dedução, por excelência, relativamente aos recursos de utilização mista, como a aplicação concreta deste método passa pela aplicação de uma fórmula de cálculo imperativamente definida pelo legislador, nacional e comunitário, quer quanto ao tipo de operações a considerar, quer quanto ao correspondente valor.

    1. DO PEDIDO Nestes termos e nos melhores de Direito aplicáveis que, V.ªs Exas., Juízes Conselheiros, doutamente suprirão, deve o presente Recurso, ser julgado procedente por provada, determinando-se, em consequência: a) A revogação da sentença recorrida; b) A anulação dos actos tributários de (auto)liquidação de IVA em excesso, no montante de € 1.380.354,92 [(Nas alegações de recurso, em nota de rodapé ao art. 150.º, a Recorrente salienta que o valor deveria ser ainda superior. Referindo-se ao montante cuja devolução pediu – € 1.380.354,92 – diz a Recorrente: «Montante resultante da aplicação do pró rata definitivo do ano de 2004, de 46%, ao valor do IVA incorrido nos recursos de utilização mista. Pressionada pelo terminus do prazo, que faria operar a caducidade, a Recorrente efectuou um levantamento preliminar dos recursos de utilização mista, no ano de 2004, o qual ascendeu a € 25.082.491,12, cifrando-se o respectivo IVA incorrido em € 3.000.771,75. Contudo, após uma análise com maior detalhe e rigor constatou-se que o IVA efectivamente incorrido e, por conseguinte, susceptível de dedução adicional, se afigura superior ao inicialmente peticionado, cifrando-se em € 1.530.750,84 – corresponde ao montante total do IVA incorrido com os recursos de utilização mista (€ 3.327.719,23) multiplicado pelo pro rata de 46%» )] e, bem assim, a restituição do imposto entregue em excesso pela Recorrente, no mesmo montante.

    Assim deliberando, farão V. Exas., como sempre, JUSTIÇA!».

    1.3 A Recorrida não contra alegou.

    1.4...

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