Acórdão nº 0504/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelARAG
Data da Resolução28 de Outubro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A…………….., Lda, inconformada, recorreu da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu (TAF de Viseu) datada de 6 de Junho de 2014, que julgou totalmente improcedente a impugnação que deduzira contra o indeferimento do pedido de revisão oficiosa da autoliquidação de taxa de promoção relativa ao período mensal de Maio de 2002 no montante de € 12.948,38.

Alegou, tendo concluído como se segue: A.

O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou improcedente a impugnação judicial do acto tributário relativo à taxa de promoção alegadamente devida ao Instituto da Vinha e do Vinho.

B.

Ao contrário do que foi defendido nos autos pelo IVV e acolhido pelo Tribunal a quo na sentença ora posta em crise, o processo de investigação à taxa de promoção que foi iniciado pela Comissão (processo C43/2004) não é «totalmente irrelevante para os presentes autos e para a fundamentação da pretensão da Impugnante» - cf. página 21 da sentença proferida nos autos -, sendo que neste entendimento radica o erro de julgamento que ocorreu em 1ª instância.

C.

Independentemente da eventual compatibilidade com o mercado comunitário da totalidade ou da parte do auxílio em questão relacionada com os vinhos produzidos em Portugal ou independentemente dos aspectos da mesma taxa que estão em investigação pela Comissão por suscitarem dúvidas quanto à respectiva compatibilidade com o mercado comum, verifica-se, no caso da taxa em causa dos autos, uma ilegalidade manifesta, decorrente da falta de notificação da medida à Comissão, ao arrepio do disposto no n.° 3 do artigo 88º do TCE (actual n.° 3 do artigo 108º do TFUE) e consequente proibição de execução de semelhante medida prevista no mesmo artigo.

D.

Essa ilegalidade encontra-se plenamente provada nos autos – cf. alíneas F), G) e H) dos factos provados e teor da decisão da Comissão Europeia de iniciar o procedimento contraditório C43/2004, junto aos autos pela A…………… -, pelo que o Tribunal a quo não podia ter decidido no sentido em que decidiu na sentença ora posta em crise.

E.

É inegável que estamos perante um auxílio de Estado porquanto as campanhas de promoção e de publicidade do vinho que beneficiam um determinado conjunto de empresas, são financiadas com receitas da taxa de promoção, sendo consequentemente possível identificar os três elementos que caracterizam um auxílio de Estado: (i) a vantagem económica (a vantagem económica para os operadores do sector vitivinícola decorre do facto de não terem de suportar o encargo com a organização da promoção dos seus produtos); (ii) para um determinado grupo de destinatários (a vantagem económica é atribuída a um determinado conjunto de empresas ou sector de actividade, in casu, o sector do vinho e dos produtos vinícolas); (iii) financiada através de recursos estatais (as receitas utilizadas provêm da cobrança da taxa de promoção que, como é claro, é um recurso estatal).

F.

A própria Comissão reconhece nas decisões proferidas sobre este assunto, que estamos perante um auxílio de Estado (cf. parágrafos 57, 102 ou 131 da decisão junta pela A………… com a petição Inicial e parágrafos 84, 113 ou 131 da Decisão de 20.07.2010, junta como documento n° 3 com a contestação do IVV).

G.

A taxa de promoção, sendo una, consubstancia — conforme está demonstrado nos autos e vem até afirmado pela própria Comissão Europeia (cf. parágrafos 56 a 58, entre outros, da Decisão da Comissão e, por exemplo, parágrafo 113 da Decisão de 20.07.2010) —, a fonte de financiamento desses auxílios de Estado.

H.

Ainda que esta taxa de promoção financie também outras medidas ou prestações que não revistam a natureza de auxílios, o que é facto é que ela constitui a única fonte de financiamento dos auxílios à promoção e à publicidade e à formação e, como tal, faz parte integrante dessa medida - cf., por exemplo, parágrafo 112 da Decisão de 20.07.2010.

I.

A implementação de uma medida parafiscal — in casu, a taxa de promoção — que consubstancia a única fonte de financiamento de um auxílio de Estado não notificado, com o qual tem uma relação de afectação obrigatória ou legal, de tal modo que o produto da taxa influencia directamente o montante do auxílio concedido, tem de ser notificada à Comissão, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 88º do TCE (actual artigo 108.º do TFUE) — cf. jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia e pág. 48 do Parecer jurídico junto aos autos.

J.

Foi dada execução pelo Estado Português à taxa de promoção do vinho cobrada pelo IVV e às medidas financiadas pelo produto dessa imposição parafiscal, desde 1995, sem autorização prévia da Comissão - cf. parágrafos 1 e 3 da aludida Decisão da Comissão.

K.

A Comissão Europeia inscreveu as medidas de auxílio e o respectivo modo de financiamento em causa nos presentes autos no conjunto de auxílios não notificados — conforme melhor decorre do parágrafo 3 da decisão junta pela A………….., que ora se transcreve: «(3) Resultando das informações prestadas ter sido dada execução ao dispositivo em causa, desde 1995, sem autorização prévia da Comissão, foi o mesmo inscrito no registo dos auxílios não notificados».) L.

A proibição de execução ou efeito suspensivo previsto no nº 3 do actual artigo 108º TFUE foi, inclusivamente, recordada pela Comissão a Portugal no parágrafo 147 da Decisão da Comissão.

M.

A taxa de promoção, não tendo sido notificada previamente à Comissão e sendo mantida em execução, é necessariamente inválida até à prolação e trânsito final da decisão da Comissão sobre a respectiva compatibilidade com o mercado comum e mantém-se inválida, relativamente ao período em questão nos autos, por mais regular e compatível com o mercado comum que tenha sido considerado o auxílio investigado (cf., por exemplo, Ac. De 21.11.1991, FNCE, proc. C-354/90).

N.

«[U]ma decisão da Comissão que declare um auxílio não notificado compatível com o mercado comum não tem por consequência regularizar, a posteriori, os actos de execução que são inválidos por terem sido adoptados em violação da proibição contida nessa disposição , porquanto «qualquer outra interpretação conduziria a favorecer a inobservância, pelo Estado-Membro em causa, dessa disposição e privá-la-ia do seu efeito útil.» — cf. Acórdão de 05.10.2006, TRANSALPINE ÖLLEITUNG IN ÖSTERREICH GMBH, processo C-368/04, n.° 41; cf., ainda, Acórdão de 21.10.2006, processo C-261/01 e 262/02.

O.

A taxa de promoção não podia, por isso, ser cobrada. E tendo-o sido — como o foi (cf. parágrafo 132 da Decisão de 20.07.2010: «Portugal deu execução ilegalmente ao financiamento das campanhas de promoção genérica do vinho, financiadas por meio de uma taxa cobrada sobre os produtos nacionais e sobre os produtos importados dos outros Estados-Membros, em violação do artigo 108°, n.° 3, do TFUE») — impõe-se agora aos órgãos jurisdicionais nacionais que declarem a anulação dos actos de liquidação da taxa de promoção relativos ao período em questão, uma vez que o estabelecimento daqueles auxílios e daquela taxa de promoção, sem prévia pronúncia da Comissão Europeia, é contrário ao Direito Comunitário - o que, em concreto, se requereu nos presentes autos relativamente ao acto de liquidação da taxa de promoção e veio a ser, com erro de julgamento, indeferido em primeira instância.

P.

Não se diga em sentido contrário que este auxílio de Estado respeitou, porventura, os limites dos auxílios de minimis e que, como tal, não carecia de ser previamente notificado ao abrigo do disposto no actual artigo 108º, n.° 4, do TFUE.

Q.

Na decisão final proferida no âmbito do procedimento de investigação que vimos referindo, relativa ao período em causa nos autos, a Comissão não veio a enquadrar a medida nos chamados “auxílios de minimis” — cf. decisão de 20.07.2010, doc. 3 da contestação do IVV.

R.

A medida de apoio estatal a que se referem os presentes autos não pode ter enquadramento nos auxílios de minimis: • A obrigatoriedade de notificação à Comissão do auxílio em causa deve ser analisada em função dos elementos de facto e de direito existentes à data em que esse auxílio foi adoptado, sob pena de se violarem os princípios da segurança jurídica e protecção da confiança dos cidadãos, princípios estruturantes do Estado de Direito democrático (cf. artigo 2° da Constituição da República) — cf. Acórdão de 10 de Setembro de 2009 do Tribunal Geral da União Europeia, Processo T-75/2003 • Aquando da sua introdução no ordenamento interno, o auxílio em causa não foi configurado, nem classificado, pelo Estado Português como um auxílio de minimis, nem foram cumpridas pelo Estado Português as obrigações inerentes à atribuição ou introdução de um auxílio dessa natureza, como deveria nos termos do disposto nos artigos e do Regulamento (CE) 994/98, de 7 de Maio de 1998, não se tendo estabelecido, sequer, na legislação atinente com esta medida, qualquer limite ao montante de auxílio a atribuir; • O elementar princípio da segurança jurídica que vigora e subjaz tanto ao ordenamento jurídico interno, como ao ordenamento comunitário, impede igualmente que não se saiba, à partida, se o auxilio é ou não compatível com Direito Comunitário, conclusão a que se chegará, antes da respectiva entrada em vigor, pela Decisão a proferir pela Comissão (em virtude da notificação a que alude o artigo 108° do TFUE e que, por isso, deverá ser prévia) ou pela configuração antecedente da medida como um auxílio de minimis, o que não sucedeu no caso dos autos; •A consideração de que o auxílio em questão terá eventualmente respeitado os limiares de minimis só relevará para efeitos de considerar semelhante auxílio compatível com o mercado comum, já não relevando para efeitos de sanar, a posteriori, a irregularidade cometida com a falta de notificação de um auxílio estatal — cf. jurisprudência do TJUE.

• Face ao disposto no nº 4 do artigo 2º do Regulamento (CE)...

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