Acórdão nº 0973/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelPEDRO DELGADO
Data da Resolução28 de Outubro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo O Ministério Público e a Fazenda Pública vêm interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que anulou a decisão administrativa condenatória interposta contra A………, melhor identificado nos autos, e ordenou a devolução dos autos à autoridade administrativa, para proceder à apensação dos processos de contra ordenação da qual resulte a aplicação de uma coima única O Ministério Público apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «1ª No processo de contra-ordenação tributária, por força do disposto no artº 3º b) e 81º do RGIT, remetidos os autos ao tribunal competente e apresentados ao juiz pelo MºPº, nos termos do artº 62º do RGCO, o juiz ou não aceita o recurso nos termos do artº 63º do RGCO, ou o decide, em conformidade com o artº 64º do RGCO.

  1. Nos termos do artº 25º do CPP - aplicável por força do ad 3.º b) do RGIT e 41º nº1 do RGCO - há conexão de processos quando o mesmo agente tiver cometido várias contra-ordenações e para todas elas organiza-se um só processo ou procede-se à apensação de todos no caso de terem sido instaurados vários - art.º 29.º 1 e 2 do CPP.

  2. A falta de apensação dos processos de contra-ordenação pela autoridade administrativa não integra qualquer das nulidades elencadas nos artigos 118º e 119º do CPP porque estas, com excepção do emprego da forma de processo especial fora dos casos previstos na lei, não são aplicáveis ao processo de contra-ordenação.

  3. Assim, face ao teor do artº 118º nº 1 e 2 do CPP, porque não está expressamente cominada a falta de apensação como nulidade, o acto é irregular.

  4. Uma vez que os autos comprovam a existência de uma situação de conexão subjectiva de processos, que estão todos na fase do julgamento, nada impede que se proceda agora à sua apensação, nos termos dos artigos 24º nº2 e 25º do CPP, àquele que respeitar à contra-ordenação determinante da competência por conexão nos termos do artº 29º nº2 do CPP proferindo-se depois o despacho previsto no artº 64º do RGCO.

  5. Esta parece ser a melhor solução a dar ao caso sendo certo que será ela a única que pode até beneficiar o recorrente. Pelo facto do Tribunal estar vinculado ao princípio da proibição da reformatio i pejus previsto no artº 72º-A do RGCO pelo que não poderá aplicar uma coima superior à aplicada pela autoridade administrativa.

  6. O mesmo pode não ocorrer se for mantida a anulação da decisão recorrida pois a autoridade administrativa, na determinação da medida da coima nos termos do artº7º da Lei 25/2006 de 30 de Junho, pode não voltar a aplicar uma coima de valor mínimo.

  7. Uma vez que no âmbito do RGIT vigora o regime do cúmulo material das penas, a pena única é a que resultar da soma de todas as coimas concretas.

  8. Uma vez que foi aplicada em cada processo uma coima, o tribunal mais não tem do que proceder à soma de todas elas para aplicar uma coima única, não havendo lugar à aplicação, no caso, do regime previsto nos artigos 77º e 78º do CP, para o cúmulo jurídico das penas.

  9. A decisão recorrida, ao anular a decisão que aplicou e ao determinar a remessa dos autos à autoridade administrativa para apensação dos processos e aplicação de uma coima única, violou por erro de interpretação o disposto nos artigos 63º e 64º do RGCO, 3ª b) e 81º do RGIT e, 24º nº2, 25º e 29º do CPP: 11ª O presente recurso é admissível nos termos do artº 73º nº 2 do RGCO, por tal se afigurar manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito e a promoção da uniformização das decisões judiciais e das autoridades administrativas.» Por sua vez a Fazenda Pública apresentou as suas alegações de recurso, com o seguinte quadro conclusivo: «A. Vem o presente recurso interposto da sentença que decidiu pela existência de uma questão prévia que obsta ao conhecimento mérito da causa e, em consequência, decidiu anular “a decisão administrativa de aplicação de coima” e ordenar “ a baixa dos presentes autos ao Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 3, para que seja organizado um só processo, ou seja efectuada a apensação dos vários processos de contra-ordenação, nos termos do consignado pelo art. 29.º do CPP, proferindo uma única decisão de aplicação de coima, atendendo ao que dispõe o art. 79º do CP, na situação de infracção continuada, ou aplicando o regime instituído no artigo 25.º do RGIT, o qual se circunscreve à questão de direito da anulação da decisão administrativa, apreciada pelo douto tribunal a quo.

B. Para assim decidir, considerou o Tribunal a quo, em síntese que, ”… ao Serviço de Finanças incumbia instaurar um só processo ou a apensação dos respectivos processos de contra-ordenação instaurados contra o aqui Recorrente, cabendo dessa decisão (única) recurso judicial, em ordem ao acesso à justiça) e ainda que, “concluindo o Serviço de Finanças pela inexistência de infracção continuada impunha-se então a aplicação de cúmulo material, nos termos do já aqui aventado artigo 25.º do RGIT, decisão abstratamente mais favorável ao Recorrido”, concluindo que a omissão destes procedimentos e operações determinam a anulação da decisão administrativa.

C. Quanto à legitimidade da Fazenda Pública para interpor o presente recurso, importa ter em conta que, com a proposta de Lei n.º496/2012, de 10 de Outubro de 2012, de aprovação do Orçamento do Estado para 2013, foi alterada a redacção do art. 83.º do RGIT, passando o representante da Fazenda Pública, por força do nº1 da referida norma, a ter legitimidade para interpor recurso da decisão proferida pelo tribunal, ampliando-se, deste modo, a sua possibilidade de intervenção no processo de contra-ordenação, que antes se limitava à produção de prova, nos termos do art. 81º, nº 2 do RGIT.

D. Deste modo, e tendo em conta a unidade do sistema jurídico e a aplicação subsidiária do RGCO neste âmbito, por força do art. 3º, alínea b) do RGIT, com a alteração legislativa ocorrida, a Fazenda Pública tem também legitimidade para recorrer nos recursos de processos de contra-ordenação tributária, ao abrigo do nº 2 do art. 73º do RGCO.

E. Quanto ao efeito do presente recurso, entende a Fazenda Pública que, no regime previsto nos artigos 83º e 84º, ambos do R.G.I.T., complementado pelo R.G.C.O., mormente os artigos 70º, 73º, 74º, 75º, 79º, 88º e 89º, de aplicação subsidiária, não é possível a execução das coimas e sanções acessórias antes do trânsito em julgado ou de se ter tornado definitiva a decisão administrativa que as aplicar, sendo esta a única interpretação que assegura a constitucionalidade material deste artº.84º, do R.G.I.T., nos casos em que o recurso é interposto de decisão condenatória, assim não sendo necessária a prestação de garantia para que o mesmo recurso goze de efeito suspensivo da decisão recorrida — conforme se doutrinou no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 15-11-2011, processo no 04847/11; e na esteira do entendimento dos Conselheiros Jorge Lopes de Sousa e Simas Santos em “Regime Geral das Infracções Tributárias anotado”, 4ª edição, 2010, em anotação ao art. 84º, página 582 e seguintes.

F. Neste sentido, não deverá ser considerada exequível a decisão judicial proferida nestes autos, que decidiu pela anulação da decisão administrativa e que determina que a Autoridade Administrativa proceda à apensação dos processos do(a) arguido(a)/recorrente, face à pendência do presente recurso, sob pena de se afectar o efeito útil do mesmo.

G. Quanto à anulação da decisão administrativa determinada pelo douto Tribunal a quo, entende a Fazenda Pública, salvo melhor opinião, que não pode proceder o argumento...

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