Acórdão nº 043/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Fevereiro de 2015
Magistrado Responsável | DULCE NETO |
Data da Resolução | 25 de Fevereiro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.
A…………, S.A., com os demais sinais dos autos, recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a reclamação que deduziu, ao abrigo do disposto nos artigos 276º e seguintes do CPPT, do acto praticado em 13/03/2014 pelo Senhor Director de Serviços da Unidade de Grandes Contribuintes, de indeferimento do pedido de levantamento da garantia bancária (por caducidade) que prestou com vista à suspensão da execução fiscal nº 3433201201079077 na pendência da reclamação graciosa que deduziu contra a liquidação de IRC e Juros Compensatórios donde emerge a dívida exequenda.
1.1.
Terminou a alegação de recurso com as seguintes conclusões: A. A Recorrente impugnou o indeferimento tácito da reclamação graciosa, como forma de acautelar seu direito à tutela jurisdicional efetiva.
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O interessado que não impugne o indeferimento tácito fica literalmente dependente da atuação da administração tributária, aguardando (indefinidamente) pelo momento em que esta se digne cumprir a sua obrigação de decidir, se decidir.
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Não se desconhece que a possibilidade de impugnar o indeferimento tácito é uma faculdade dos contribuintes e não uma obrigação sua; no entanto, isso significa apenas que a administração tributária continua obrigada a decidir, caso o interessado não impugne o indeferimento tácito, não que a lei atribua nova forma processual de reagir contra um protelar indefinido dessa decisão.
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Na verdade, deixando passar o prazo de impugnação do indeferimento tácito da reclamação graciosa, o contribuinte fica “nas mãos” da administração tributária, só se podendo, nas palavras deste Venerando STA, “queixar de si próprio”.
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Contudo, o Tribunal a quo entendeu também que, ao decidir impugnar o indeferimento tácito, a Recorrente abdicou do seu direito à declaração de caducidade da garantia, previsto no artigo 183º-A do CPPT, pois o prazo de impugnação do indeferimento tácito é sempre inferior ao prazo de um ano previsto naquela norma.
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A decisão recorrida parece correta e até mesmo inatacável, atendendo à sua fundamentação clara, lógica e linear.
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No entanto, ao considerar que o contribuinte tem de prescindir deste direito se quiser assegurar a tutela jurisdicional efetiva de um outro direito, e ainda por cima um direito, liberdade e garantia (a apreciação judicial do ato de liquidação de IRC), a decisão recorrida viola a lei e a Constituição.
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Dito de outra forma, não é válida uma interpretação segundo a qual a lei impõe o sacrifício de um direito como moeda de troca ao exercício de um outro direito fundamental.
I. Para além do exposto, a interpretação defendida na sentença recorrida premeia indevidamente a administração tributária: esta ou logra manter a garantia a seu favor por período de tempo indeterminado (porque o interessado impugnou o indeferimento tácito) ou, ao invés, passa a deter o poder não sindicável judicialmente de protelar indefinidamente a decisão, pondo em causa o direito à tutela efetiva (porque o interessado não impugnou o indeferimento tácito).
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A solução juridicamente válida para o caso sub iudice é a interpretação conforme à Constituição do artigo 183º-A do CPPT.
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Esta norma deve ser interpretada no sentido de que o prazo de um ano é reduzido, nos casos em que os contribuintes aguardam até ao limite do prazo de impugnação do indeferimento tácito e apresentam esta impugnação, para o termo deste prazo limite.
L. Pelo que caberia à administração tributária, por direta aplicação dos princípios constitucionais da legalidade, da justiça, da proporcionalidade e da boa-fé e por saber que havia frustrado as legítimas expectativas da Recorrente em obter uma decisão atempada daquela, fazer uma interpretação corretiva do disposto no artigo 183º-A do CPPT.
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Nesse sentido, perante o pedido de levantamento da garantia bancária apresentada pela Recorrente, seria da responsabilidade da administração tributária – em respeito pela coerência do sistema jurídico, pelo interesse público, atendendo aos fins a que presidiram à formulação constante no artigo 183º-A do CPPT, e sobretudo atendendo ao respeito pela tutela jurisdicional efetiva dos direitos, prevista nos artigos 20.º e 268.º da CRP – dar o devido provimento ao mesmo.
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Uma solução diversa viola as disposições constitucionais acima mencionadas e ainda o artigo 18º da CRP, já que configura uma restrição a um direito fundamental.
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Nestes termos, considera a Recorrente que a sentença recorrida e, bem assim, o despacho de indeferimento do pedido de levantamento da garantia bancária devem ser revogados, com as consequências associadas (leia-se, levantamento da garantia prestada e manutenção da suspensão do processo executivo).
1.2.
A Recorrida não apresentou contra-alegações.
1.3.
O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público emitiu douto e desenvolvido parecer no sentido de que fosse negado provimento ao recurso, com o seguinte discurso argumentativo: «A recorrente parte de uma asserção que não está demonstrada, nem se nos afigura correcta. Ou seja, que aquando da apresentação da impugnação judicial, o tribunal “a quo” entendeu que a recorrente “abdicou do seu direito à declaração de caducidade da garantia previsto no artigo 183º-A do CPPT”.
Desde logo porque da sentença recorrida não resulta, expressa ou implicitamente, o referido juízo que lhe é atribuído. Por outro lado a figura da “caducidade da garantia” não está construída como direito subjectivo, mas antes como sanção imposta à AT se não cumprir com o seu dever de celeridade. A prestação de garantia visa assegurar o pagamento da quantia exequenda e dessa forma proteger o credor (neste caso tributário); ou seja, a mesma é exigida em função da protecção do crédito tributário. O regime de caducidade da garantia tem subjacente o princípio da proporcionalidade e visa obter um equilíbrio entre o ónus imposto ao contribuinte ao suportar os encargos com a prestação de garantia a fim de beneficiar da suspensão da execução fiscal e o dever de celeridade que recai sobre a administração tributária de apreciar as reclamações que lhe sejam apresentadas. E nessa medida, caso a AT ultrapasse um prazo que se considera razoável para essa...
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