Acórdão nº 0833/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GON
Data da Resolução14 de Maio de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. A Autoridade Tributária e Aduaneira não se conformando com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, que julgou procedente a acção administrativa especial em que A……………., S.A., com os demais sinais dos autos, impugnava o despacho do Ministro das Finanças, datado de 31/03/05, que lhe indeferiu o recurso hierárquico apresentado contra as correcções ao lucro tributável relativamente a IRC referente aos anos de 1995 e 1996, dele vem recorrer.

1.2. Termina as alegações formulando as conclusões seguintes:

  1. Vem o presente recurso interposto contra o douto acórdão de 11/10/2012 que julgou procedente a acção intentada por A……………., S.A. contra o despacho do Ministro das Finanças, de 31/03/05, proferido no âmbito do recurso hierárquico deduzido contra o despacho que sancionou as correcções ao lucro tributável propostas pela inspecção tributária relativamente a IRC referente aos anos de 1995 e 1996, tendo por fundamento a aplicação do regime dos preços de transferência consignado no art. 57º do CIRC.

  2. Aferir da legalidade da aplicação do art. 57º do CIRC implica analisar a verificação dos respectivos pressupostos e a adequação do método utilizado no cálculo do respectivo ajustamento.

  3. Uma vez que o douto acórdão recorrido concluiu pela adequação da taxa de juro remuneratória fixada pela AT, considerando que a AT fez uma escolha devidamente fundamentada e coerente com todo o raciocínio que a levou a concluir pela necessidade de correcção da matéria colectável, d) O presente recurso destina-se, apenas, a atacar o julgamento efectuado quanto aos pressupostos de aplicação do regime dos preços de transferência, por se entender que nesta sede o Tribunal “a quo” incorreu em erro na apreciação da matéria de facto e de direito e numa insuficiente fundamentação das razões de facto e de direito que sustentam as conclusões alcançadas.

  4. Desde logo, atento o dever de colaboração que incide sobre os contribuintes no esclarecimento da sua situação jurídico-tributária, reforçado pela obrigação da A. dispor de contabilidade organizada para efeitos de determinação e controlo do lucro tributável, cfr. art. 17º e 115º do CIRC, f) Cumpria ao contribuinte comprovar ou, no mínimo, demonstrar ser minimamente plausível que a entrega antecipada das avultadas importâncias transferidas para a B……………, ao longo dos anos de 1993, 1994, 1995 e 1996, constituíssem uma contrapartida pela aquisição de acções da B……………. concretizada em Dezembro de 1996, o que não aconteceu.

  5. O único documento que sustenta a matéria de facto fixada no probatório consiste num simples fax, de 31/12/1996, apreciado pelo Tribunal como um documento que “apenas consubstancia uma ordem dada a uma instituição bancária para que realize um operação de venda de acções, sem transferência de fundos”.

  6. Deste modo, a A……………… só alcança comprovar nos autos a realização da referida transacção de acções, mas não que tivessem sido acordados três anos antes pagamentos antecipados por conta dessa transacção.

  7. Em contradição com a apreciação que o Tribunal “a quo” fez constar do douto acórdão recorrido, que também nesta parte terá incorrido em erro, a AT não deixou de analisar as operações em causa consideradas na sua globalidade.

  8. Na verdade, ao caracterizar as entregas antecipadas como respeitando à concessão de empréstimos não remunerados, a AT considerou a posterior entrega das aludidas acções como constituindo a única contrapartida da concessão daqueles empréstimos que, por essa via, foram reembolsados quanto ao capital mutuado mas não foram remunerados mediante o pagamento de quaisquer juros.

  9. A conclusão quanto à natureza das entregas de numerário como respeitando a um empréstimo e não a uma transacção está devidamente explicitada pela AF, quer no relatório da inspecção, quer na informação que serviu de fundamento ao indeferimento do recurso hierárquico. O mesmo sucedendo quanto à natureza não remunerada dos empréstimos concedidos.

  10. De todo o modo, importa destacar que o pressuposto ora controvertido não respeita quer à existência de relações especiais entre as partes, quer ao método utilizado na quantificação do correspondente ajustamento, uma vez que ambos são dados como correctamente aferidos e demonstrados nos autos, mas antes ao pressuposto que se refere às condições acordadas para a operação, as quais relevam para efeitos da correcção prevista ao abrigo do art. 57º do CIRC quando sejam diferentes das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes.

  11. As condições praticadas pelas entidades envolvidas, e que constituem matéria de facto provada nos autos, demonstram cabalmente este pressuposto legal.

  12. Na verdade, ainda que se desse como válido o argumento de que os montantes em questão não revestem a natureza de empréstimos, uma vez que têm subjacentes transacções de acções em que aqueles montantes apenas configuram a natureza de pagamentos antecipados, ainda assim, e para efeitos do disposto no art. 57º do CIRC não deixariam os mesmos de ter a natureza de financiamento não remunerado, se se atender ao lapso de tempo que mediou entre as datas em que os pagamentos foram efectuados e a data da concretização da transacção.

  13. Mais, para este efeito importa ter presente o disposto no nº 4 do art. 36º da LGT, segundo o qual a AT não está vinculada à qualificação do negócio jurídico efectuado pela parte, sendo que aqueles intervalos de tempo que medeiam entre as entregas das aludidas importâncias e a transacção das acções consubstanciam uma perda de disponibilidade de um meio financeiro a favor de outra sociedade, o que, em condições normais de mercado praticadas entre pessoas independentes implicaria um remuneração, a título de juros.

  14. Ou seja, independentemente da qualificação jurídica apresentada pela A., estamos necessariamente perante uma operação de financiamento que, em condições normais de mercado, para efeitos de aplicação do art. 57º do CIRC e consequente ajustamento, implicaria uma remuneração.

  15. O Tribunal “a quo” incorre, ainda, num erro de julgamento em sede do direito, pois não obstante admitir que as entidades envolvidas, quer relativamente ao empréstimo faseado quer relativamente à transacção de acções, não seguiram a mesma postura que seria seguida por outra empresas relativamente às quais não existissem relações especiais (tal como se refere a folhas 8 do acórdão recorrido), ainda assim não retira desse facto as consequências que se impunham face ao disposto no art. 57º do CIRC, r) Uma vez que este normativo legal tem como finalidade proteger o erário público da erosão causada ao lucro tributável pela prática entre as empresas especialmente relacionadas de condições diferentes das que seriam normalmente praticadas entre entidades independentes, sem que o correspondente ajustamento tenha subjacente qualquer juízo de censura relativamente às opções de gestão efectuadas livremente pelas entidades relacionadas.

  16. Na verdade, quanto aos pressupostos de que depende a aplicação do regime dos preços de transferência, o acórdão recorrido não conclui pela inexistência de qualquer um deles, ou seja, (1) dá por comprovada a existência de relações especiais entre as partes envolvidas na operação, (2) não nega a existência de condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre entidades independentes entre si, (3) com o consequente apuramento de um lucro tributável diferente daquele que resultaria de uma operação em mercado livre.

  17. Para além de erróneas, afigura-se, ainda, que as conclusões em que assentou o julgamento do Tribunal “a quo” incorrem no vício de falta de fundamentação que tão-pouco permite compreender as razões, quer de facto quer de direito, que o levaram a julgar como julgou.

  18. O douto acórdão recorrido não justificou a razão por que ficou convencido que as acções foram transferidas como contrapartida daquelas transferências “antecipadas” de dinheiro, e que, por conseguinte, estaríamos perante uma compra e venda de acções com pagamentos antecipados.

  19. A nosso ver, não basta para sustentar esta convicção o juízo de que “a operação respeitante ao referido empréstimo faseado não pode ser vista isoladamente, desacompanhada da transferência da titularidade das acções, independentemente da existência de qualquer documento que titule tal operação de compra de acções faseada no tempo”.

  20. Tanto mais que, contrariamente ao expendido no acórdão recorrido, a AT, num integral respeito pelo princípio da tributação do lucro real, considerou para o efeito da tributação todas as operações efectuadas pelos sujeitos passivos, conjugadas entre si de uma forma coerente.

    Termina pedindo a procedência do recurso.

    1.3. A recorrida A………………., S.A. apresentou contra-alegações e requereu, subsidiariamente, a ampliação do objecto do recurso, finalizando com as conclusões seguintes:

    1. O presente recurso foi interposto pela RÉ contra o, aliás, Douto Acórdão proferido no processo de Acção Administrativa Especial n.º 5/05.5BCPRT, do Tribunal Central Administrativo Norte, que teve por objecto o despacho de indeferimento do recurso hierárquico proferido pelo Ministro de Estado e das Finanças, no dia 31 de Março de 2005, nos termos do qual, em síntese, se decidiu, o seguinte: “(..) em virtude das relações especiais que a recorrente tinha com a “B…………….., SA” concedeu-lhe financiamentos de elevados montantes, sem que relativamente aos mesmos tenha sido acordada qualquer remuneração, situação que, portanto, se afasta do que é normalmente suceder em relações de independência entre as partes.

      ”; B) O Douto Acórdão recorrido julgou procedente a Acção Administrativa Especial apresentada, com fundamento no facto de “(...) a decisão da AT de apuramento da matéria colectável com recurso a métodos indirectos não se encontra devidamente fundamentada, pois os argumentos apresentados não impossibilitavam a quantificação do lucro tributável exacta e directamente...

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