Acórdão nº 030/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução10 de Setembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo I - RELATÓRIO O Ministério Público vem interpor recurso para o STA, ao abrigo do art. 150º do CPTA, do acórdão do TCAS que negou provimento ao recurso interposto da sentença proferida no TAC de Lisboa que julgou improcedente a ação de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa por si movida.

Para tanto conclui as suas alegações da seguinte forma: “1. O presente recurso de revista vem interposto, pelo autor, Ministério Público, do acórdão do TCAS que, negando provimento ao recurso por si interposto da sentença proferida no TAC de Lisboa, que considerou improcedente a acção, manteve a mesma e considerou como ... verificado o pressuposto de aquisição da nacionalidade, contido na alínea b), do nº1, do artº 9º, da LN e ainda no nº2 do art. 56º do RNP, da prática de crime punível, com pena máxima superior a três anos segundo a lei portuguesa.

  1. Considerou o douto acórdão em apreciação, que a aplicação destes dispositivos legais não é automática, “constituindo a condenação com trânsito em julgado, pela prática do referido crime, um mero indício da falta de idoneidade moral e civil para o estrangeiro aceder ao estatuto de nacional”. Assim, ...“torna-se necessário que o autor da oposição concretize as razões conducentes à verificação de não ser desejável a pretendida aquisição da nacionalidade.” 3. O aqui demandado foi condenado em 2008, pela prática, em 2003, de um crime de ofensa à integridade física agravado pelo resultado, p.p.p. artºs 143, 144º, al b) e 147º nº2, todos do C.Penal.

  2. Basta, para que seja negada a nacionalidade portuguesa ao demandado, o desvalor ético-jurídico inerente à prática de uma infracção punível com pena igual ou superior a três anos, não relevando, para o caso, o facto de o demandado “estar minimamente inserido na sociedade portuguesa por aqui residir, ter constituído família e ter trabalho certo”, como entendeu o douto acórdão em apreciação.

  3. Esta questão é comum a todos os casos em que o interessado na nacionalidade portuguesa tenha cometido um crime punível, em abstracto, com a referida pena, mas que o julgador considere que só por si não implica o indeferimento do pedido de aquisição da nacionalidade, ou que, em concreto, tivesse merecido pena inferir à aplicável em abstracto.

  4. A jurisprudência da jurisdição administrativa tem-se dividido quanto à aplicação deste requisito, ora considerando a pena aplicada em concreto (cfr. neste sentido, o Ac do STA in procº nº 76/12, de 5-2-13), bem como os acs do TCAS de 10-7-14 e de 10-1-13, in procºs 08604/12 e 08678/12, respectivamente), ora considerando que a referida pena deve ser considerada em abstracto (cfr neste sentido, o acórdão do STA de 20-3-2014, proferido no processo nº 01282/13 e acórdão do TCAS de 27-5-2010, proferido no processo nº 06065/10).

  5. Assim sendo, parece-nos, salvo melhor opinião, que haverá necessidade de fixar jurisprudência desse Alto Tribunal que decida a aplicação uniforme de um determinado critério aplicável a todas estas situações.

  6. O douto acórdão recorrido fez apelo ao circunstancialismo abonatório verificado na altura do pedido de aquisição da nacionalidade nomeadamente à pena de multa concretamente aplicada, portanto também às circunstâncias concretas endógenas e exógenas que rodearam a prática do crime e a sua condenação.

  7. Ambos os entendimentos fazem apelo a circunstâncias subjectivas que não vêm previstas nos citados normativos, o qual refere clara e textualmente que “não podem adquirir a nacionalidade portuguesa os estrangeiros que tiverem cometido um crime punível com pena de prisão igual ou superior a três anos”.

  8. Da letra da lei, não é possível extrair outra interpretação que não seja a recusa de atribuição da nacionalidade quando o interessado tenha praticado um crime que na lei portuguesa seja punível com pena de prisão igual ou superior a três anos.

  9. De contrário, o legislador, por certo, ter-se-ia exprimido noutros termos, prevendo a não atribuição da nacionalidade àqueles que tivessem sido efectivamente punidos com pena de prisão igual ou superior a três anos.

  10. Deste modo, a admissão deste recurso de revista é necessária nomeadamente para uma melhor aplicação do direito, por violação clara, pelo acórdão recorrido, da alínea c) do artº 9º da LN e nº2 do artº 56 do RNP e artº 92, nºs 2 e 3 do CPC.

  11. O entendimento no sentido de que o pressuposto contido nos referidos dispositivos legais não pode ser entendido ipsis verbis, devendo ser atendido só quando a pena efectivamente aplicada for igual ou superior a três anos e, mesmo neste caso, considerar necessário que o autor da oposição concretize as razões conducentes à verificação de não ser desejável a pretendida aquisição da nacionalidade, viola os dispositivos legais citados, bem como os nºs 2 e 3 do artº 99 do C.C. na medida em que o mesmo não tem na letra da lei o mínimo de correspondência verbal, presumindo-se que o legislador consagrou a solução mais adequada.

  12. Atribuir ao julgador o poder de decidir, em cada caso, se a condenação prevista na lei é ou não relevante, traria, quanto a nós, um factor de incerteza jurídica e de desigualdade não coadunável com a intenção do legislador que considerou que o factor indicador do merecimento, de ser naturalizado português, é clara e inequivocamente, apenas o não ter praticado nenhum crime punível com pena máxima igual ou superior a três anos.

  13. A conduta da Administração tem de entender-se, portanto, vinculada, o que significa que não podem ser introduzidos matizes ou gradações no tocante à verificação do requisito, pelo que o autor da acção de oposição não tem que concretizar as razões conducentes à verificação de não ser desejável a pretendida aquisição da nacionalidade.

  14. O requisito da não prática de crimes “puníveis”(e não “punidos”) com pena de prisão igual ou superior a três anos, foi considerado pelo legislador indicativo da personalidade adequada do interessado na aquisição da nacionalidade portuguesa, sendo, pelo contrário, a prática de algum desses crimes considerado como factor de indesejabilidade na medida em que faz pressupor uma personalidade susceptível de vir a causar problemas na sociedade portuguesa.

  15. A aquisição da nacionalidade portuguesa a estrangeiros não é um verdadeiro direito...

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