Acórdão nº 0595/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA BENEDITA URBANO
Data da Resolução10 de Setembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.

INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP, devidamente identificada nos autos, recorreu para este Supremo Tribunal do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), de 06.03.15 (fls 583 e ss), que confirmou a sentença do TAF do Porto, de 23.12.14 (fls 470 e ss), a qual julgou procedente a providência cautelar requerida pela A………., SA. Invoca para o efeito o n.º 1 do artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).

1.1.

O recorrente apresentou alegações, concluindo, no essencial, do seguinte modo (fls 614 e ss): “1ª. O presente recurso de revista justifica-se pelo facto de estarmos perante questões em que, nos termos do artigo 150.º/1 do CPTA, é necessário uma melhor interpretação de direito, para que se possa observar da forma mais correta possível os requisitos do fumus boni iuris e da ponderação de interesses.

  1. Para avaliar o requisito do fumus boni iuris é relevante que este Supremo Tribunal corrija o erro grosseiro cometido pelo Venerando Tribunal a quo que considerou que a Circular Informativa 068/CD/8.1.6. é um ato administrativo, já que a referida circular não limita a utilização do Oxigénio a 93% em meio hospitalar apenas aconselha que tal utilização só deve acontecer em situações de recurso.

  2. Ainda no âmbito da análise do requisito do fumus boni iuris, e na sequência do Acórdão recorrido, urge que este Supremo Tribunal se pronuncie quanto a esta questão: a entidade administrativa portuguesa com competências para o efeito tem que se vincular a uma posição técnica constante da farmacopeia portuguesa que venha a ser demonstrada errada? 4ª. Por fim, a admissão deste recurso justifica-se também para que este Supremo Tribunal se pronuncie relativamente à análise que o Venerando Tribunal a quo fez no âmbito do requisito da ponderação de interesses, nomeadamente para perceber qual o bem que tem mais peso nessa valoração: a defesa da saúde pública por efeito de preocupações levantadas pela análise técnica do INFARMED, ou as hipotéticas consequências comerciais para a ora Recorrida em função da Circular Informativa 068/CD/8.1.6..

  3. A Circular Informativa 068/CD/8.1.6. não é um ato administrativo, na medida em que é uma mera recomendação sem efeitos jurídicos proferida pelo INFARMED no âmbito das suas competências técnicas e funcionais.

  4. Aliás, refira-se que a referida circular informativa não preenche os requisitos do artigo 120.º do CPA para ser considerada um ato administrativo, na medida em que: i) não regula situações jurídicas, apenas formula um juízo técnico; ii) não produz qualquer efeito jurídico, não havendo qualquer sanção para o seu incumprimento; e iii) não se dirige a uma situação individual e concreta, mas sim a todas as situações em que é usado o Oxigénio a 93% em meio hospitalar.

  5. Desta forma, e nos termos do artigo 120.º/1/a) do CPTA, o Venerando Tribunal a quo deveria ter julgado totalmente improcedentes os pedidos cautelares efetuados pela ora Recorrida.

  6. Isto porque, não sendo a Circular Informativa 068/CD/8.1.6. um ato administrativo e tendo a ora Recorrida afirmado expressamente que a ação de que esta providência é instrumental tem como objeto a impugnação da referida circular, resulta evidente a manifesta improcedência da ação principal de que estes autos dependem.

  7. Ou seja, dada a inimpugnabilidade da Circular Informativa 068/CD/8.1.6. certamentre que a ação administrativa de esta providência depende será julgada improcedente.

  8. O que se acabou de referir é válido também para o caso hipotético de se considerar que a circular informativa ora em crise é um regulamento.

  9. O Venerando Tribunal a quo errou também ao considerar verificado o requisito do fumus boni iuris nos termos do artigo 120.º/1/c) do CPTA, na medida em que i) não ficou demonstrado que o INFARMED laborou em erro manifesto na elaboração da Circular Informativa 068/CD/8.1.6., e ii) a referida circular foi elaborada no âmbito de poderes discricionários conferidos pela lei ao INFARMED.

  10. De facto, o INFARMED não laborou em erro grosseiro – nem tal foi demonstrado pelo Tribunal a quo –, porquanto basta uma mera consulta dos documentos e do processo instrutor juntos aos autos para perceber qua há vários técnicos especializados que consideram haver dúvidas fundadas quanto à utilização do Oxigénio a 93% em meio hospitalar.

  11. Isto é, o INFARMED não anda sozinho no juízo técnico que elaborou e informou na circular informativa em causa nos presentes autos.

  12. Por outro lado, e tendo em consideração que a Circular Informativa 068/CD/8.1.6. é uma mera recomendação técnica que tem como base um juízo também ele técnico, é evidente que a referida circular foi emitida tendo por base poderes discricionários conferidos pelo legislador ao INFARMED.

  13. Desta forma, não tendo demonstrado que a referida circular foi elaborada tendo por base um erro grosseiro, o Tribunal a quo não podia avaliar do mérito da mesma.

  14. Desta forma também, o douto Tribunal a quo também errou ao considerar que a Circular Informativa 068/CD/8.1.6. violava o princípio da legalidade, nomeadamente porque não referiu qual a disposição legal que vincula o INFARMED a manter a mesma interpretação técnica da constante na farmacopeia europeia, mesmo provando que esta última não está correta.

  15. Nos termos do artigo 120.º/2 do CPTA, o douto Tribunal a quo deveria ter considerado que os interesses públicos em causa nos presentes autos são superiores aos interesses da Recorrida.

  16. Isto porque, os interesses que o INFARMED defende consubstanciam-se na defesa da saúde pública no seu global.

  17. Sendo que, consultando os autos – documentos e processo instrutor – resulta evidente a preocupação efetiva de diversos técnicos especializados relativamente à utilização de Oxigénio a 93% em meio hospitalar, pelo que, não se compreende como é que com esses dados o Venerando Tribunal a quo considerou que a preocupação do INFARMED na elaboração da Circular Informativa 068/CD/8.1.6. não era séria nem manifesta.

  18. Na verdade, qualquer dúvida quanto à segurança da Saúde pública é séria, manifesta e exige atuação das entidades competentes.

NESTES TERMOS, Deverá assim proceder-se à revogação do Acórdão recorrido, e em consequência julgar-se improcedente a presente a providência cautelar pois só assim decidindo, será feita JUSTIÇA!”.

1.2.

A recorrida contra-alegou (fls 670 e ss), e, quanto ao mérito da causa, concluiu, no essencial, assim: “I - A douta decisão recorrida deve manter-se pois aplicou correctamente as normas legais e os princípios jurídicos competentes.

II - Face ao disposto no art° 150° n.° 1 do C.P.T.A. não se mostram preenchidos os requisitos de admissibilidade de recurso da decisão proferida em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo, pelo que o mesmo não deve ser admitido.

III - A...

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