Acórdão nº 047/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Setembro de 2015

Data09 Setembro 2015
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 194/14.8BELLE 1. RELATÓRIO 1.1 A Fazenda Pública (adiante Recorrente) interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que, julgando procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade denominada “A…………, Lda.” (adiante Impugnante ou Recorrida) na sequência do indeferimento da reclamação graciosa, anulou a liquidação de Imposto de Selo (IS) que lhe foi efectuada com referência ao ano de 2012 e a dois prédios em regime de propriedade vertical, com fundamento em vício de violação de lei, porquanto, contrariamente ao que entendeu a Administração tributária (AT), para efeitos da incidência daquele imposto, o valor patrimonial tributário (VPT) a considerar não é o resultante do somatório do VPT de todas as divisões ou andares susceptíveis de utilização independente, mas o VPT atribuído a cada um desses andares ou divisões.

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «a) A questão decidenda é a interpretação da verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS) aditada pelo art. 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29/10; b) Com a alteração introduzida pela citada Lei, o IS passou a incidir também sobre a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo VPT constante da matriz, nos termos do CMI, seja igual ou superior a € 1 000 000,00 (vide verba n.º 28 da TGIS); c) No CIS não há qualquer definição sobre os conceitos de prédio urbano, pelo que terá que se aplicar o disposto no CIMI, para aferir da eventual sujeição a IS (Cfr. art. 67.º n.º 2 do CIS redacção dada pela Lei n.º 55-A/2012); d) O art. 2.º n.º 1 do CIMI define o conceito de prédio; e) O art. 2.º n.º 4 do CIMI ressalva as fracções autónomas de prédios constituídos em regime de propriedade horizontal, as quais considera, excepcionalmente, como prédios; f) Ao contrário, sendo um prédio constituído em propriedade total com partes ou divisões susceptíveis de utilização independente, é o prédio no seu todo, e já não cada uma daquelas partes, que integra o conceito de “prédio”, para efeitos de IMI e de IS, por remissão do artigo 1.º, n.º 6 do CIS; g) É precisamente o que acontece no caso objecto da sentença recorrida, pelo que, o que deve relevar, para efeitos de tributação de IS (verba 28 da TGIS e artigo 1.º do CIS), é o somatório do valor patrimonial tributário de todas as divisões ou andares susceptíveis de utilização independente; h) Excedendo o referido somatório, o montante de € 1.000.000,00 como sucede no caso concreto, estavam reunidos os pressupostos definidos na norma de incidência; i) E, a tal não obsta o facto de cada andar/divisão constar separadamente na inscrição matricial, e com os respectivos valores patrimoniais tributários, pois tal discriminação apenas releva, para efeitos fiscais, face ao conceito de matrizes prediais constante do artigo 12.º do CIMI e na matéria regulada neste Código para a organização das matrizes; j) A imposição de organizar desta forma as matrizes deve-se à necessidade de relevar a autonomia que, dentro do mesmo prédio, cabe a cada uma das suas partes, as quais podem ser funcional e economicamente independentes; k) Esta autonomização apenas se justifica porque no mesmo prédio pode ocorrer a utilização para comércio ou habitação, com ou sem arrendamento, o que é determinante nas regras da avaliação fiscal no âmbito do CIMI, face aos diferentes coeficientes de afectação previstos no art. 41.º desse código; l) A douta sentença padece de erro de julgamento de direito, quando decidiu considerar, para efeitos de tributação da verba 28 da TGIS, como “prédio”, cada um dos andares/divisões susceptíveis de utilização independente de um prédio em propriedade total; m) Pois, o que releva é antes o somatório dos valores patrimoniais de tais andares/divisões, atento o disposto nos artigos 1.º, n.º 1 e n.º 6 do CIS e artigo 2.º do CIMI; n) Assim, os prédios inscritos na matriz predial urbana da freguesia de ……… sob os artigos 5151-A a V e 5152-A a V, composto cada um por 21 unidades susceptíveis de utilização independente, é subsumível à verba n.º 28 da TGIS, em virtude do seu valor patrimonial tributário total exceder o valor de € 1.000.000,00, previsto naquele normativo legal.

Pelo exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente revogada a douta sentença recorrida, mantendo-se as liquidações impugnadas […]».

1.3 A Impugnante não contra alegou o recurso.

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto, que enunciou as questões a dirimir como sendo as de saber «se integra o conceito de prédio com afectação habitacional previsto na verba 28 da Tabela Geral de imposto de Selo (IS) tal como foi aditado pelo art. 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29/12, o prédio constituído em propriedade global, ou cada um dos seus andares divisões susceptíveis de utilização independente, tal como consta da matriz» e «se, assim, é legal fazer incidir imposto de selo relativo a 2012, tomando por referência o somatório dos valores patrimoniais de tais andares ou fracções», emitiu parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação (() As notas que no original estavam em rodapé serão transcritas no texto, entre parêntesis rectos.

): «[A] sujeição a imposto do selo dos prédios com afectação habitacional resultou do aditamento da verba 28 da T.G.I.S., e da alteração do artigo 1.º do CIS, efectuada pelo artigo 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, que tipificou nomeadamente o seguinte: - “Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000,00 – sobre o valor patrimonial tributário para efeito de IMI: (...) 28-1 – Por prédio com afectação habitacional – 1% (...) No artigo 67.º, n.º 2 do Código do I.S., dispôs-se que “às matérias não reguladas no presente código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se subsidiariamente o CIMI”.

Sendo assim claramente de recorrer ao C.I.M.I. para a integração do conceito de prédio que não consta desse código, verifica-se que neste se encontra definido prédio como “toda a fracção de território abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotadas de autonomia económica em relação ao terreno em que se encontram implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial” (artigo 2.º n.º 1).

Ora, este “dá-nos um conceito fiscal de prédio alargado que se afasta, portanto, do conceito civil”1 [1 Nuno Sá Gomes, Tributação do Património, Almedina, 2005, p. 124-127], previsto no art 204.º n.º 2 do C. Civil e que coincide com o de coisas imóveis, tal como previsto neste dispositivo nos seus n.ºs 1 e 3.

No dito conceito se enquadram as unidades de alojamento constituídas no regime de empreendimento turístico que, aliás, com as fracções autónomas constituídas em propriedade horizontal têm similitude2 [2 Fernanda Paula Oliveira, Maria José C. Neves, Dulce Lopes e Fernanda Maçãs, Urbanização e Edificação Comentado, Almedina, 2011, p. 70 referem tal similitude com reflexo no registo predial em que é efectuada em ambas as situações uma inscrição em dependência, a qual no que respeita ao empreendimento turístico é para além da genérica, distinta para cada unidade de alojamento ou apartamento e ainda quanto às fracções temporais do direito de habitação periódica, a qual é subordinada à descrição da unidade de alojamento (cfr. art. 81.º do Código do Registo Predial)], e relativamente às quais foi expressamente previsto que para efeitos do CIMI, “cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio” (art. 2.º n.º 7).

Aliás, tendo as ditas unidades de alojamento sido descritas nas matrizes autonomamente, e com a indicação do respectivo valor, de acordo com o artigo 12.º, n.º 3 do C.I.M.I.: “cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial a qual discrimina igualmente o respectivo valor patrimonial tributário”, é o mesmo que importa considerar para efeitos de I.S.

Também o Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) já se pronunciou sobre as questões controvertidas, nomeadamente, em sentença proferida a 20-10-13, no processo 50/2013, cujo texto se encontra acessível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/index.php?listPage=21, tendo entendido existir então inscrição na matriz de vários prédios em propriedade vertical, não é possível liquidar o I.S. pelo somatório do V.P.T. das “partes, andares ou divisões”, como não é possível liquidar o respectivo I.M.I. dessa forma.

Não se pode deixar de concordar com este entendimento que faz prevalecer a verdade material sobre a realidade jurídico-formal, de acordo como o artigo 11.º, n.º 3, da L.G.T.

Acresce que a indagação efectuada sobre a ratio legis subjacente à regra da verba 28 da T.G.I.S., introduzida pela Lei n.º 55-A/2012, em obediência ao disposto no artigo 9.º do Código Civil, apenas permite concluir assentar a mesma em princípios da equidade social e da justiça fiscal, chamando a contribuir de uma forma mais intensa os titulares de propriedades de elevado valor destinadas a habitação, e fazer-se incidir a nova taxa...

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