Acórdão nº 0611/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelARAG
Data da Resolução15 de Junho de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A FAZENDA PÚBLICA, inconformada, interpôs recurso da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa (TTL) datada de 14 de Março de 2016, que julgou procedente a reclamação deduzida por A………….., LDA, contra o acto de constituição de penhor legal nº 20150000005456463, praticado no âmbito do processo de execução fiscal nº 3107201501159186.

Alegou, tendo concluído como se segue: I - O presente recurso visa reagir contra a sentença que decidiu que o ato de penhor sindicado nos autos incorre em violação de lei por violação dos princípios da igualdade e de direito a uma tutela jurisdicional efetiva mormente por entender que não se encontravam esgotados todos os prazos contenciosos (em incumprimento do princípio pro actione).

II - Com efeito, na decisão recorrida o Tribunal a quo considera que quanto ao conhecimento do mérito da reclamação, o mesmo se encontra vertido na apreciação da ilegalidade do ato de penhor constituído no âmbito da reclamação. Entende-o por duas ordens de razões que confluem na declaração de ilegalidade do mesmo: quer seja por qualificar esse ato como um ato sujeito a fundamentação nos termos do art.° 195.° do CPPT sujeitando assim o mesmo às formalidades dos atos administrativos quer por supostamente ter ocorrido em data em que não decorrera ainda o prazo para que se produzissem os efeitos e função da citação (art.° 189.° do CPPT).

III - A este propósito conclui o tribunal a quo: “Aliás, in casu, como decorre da matéria de facto assente, a reclamante manifestou a intenção de prestar garantia no PEF em causa, o que acentua ainda mais a exigência de a AT explanar a necessidade subjacente à constituição de penhor, o que, como já referimos, não foi minimamente explanado.

Como referido no já citado Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24.10.2012 (processo: 01042/12): “[E]mbora a lei tributária permita à Administração fiscal, por sua iniciativa e independentemente de consentimento do respetivo titular, a constituição de penhor ou hipoteca legal para garantia (especial) dos créditos tributários (...), e o n.° 1 do artigo 195.° do CPPT pareça permitir a constituição de penhor sempre que o interesse e a eficácia da cobrança o torne recomendável, a Lei Geral Tributária - que logica e naturalmente prevalece sobre o disposto no CPPT, (...)-, exige que a constituição de tais garantias se revelem necessárias à cobrança efectiva da divida-, necessidade essa que não se tem por verificada nos casos em que o próprio executado, voluntariamente, se oferece para prestar garantia e não se lhe dá, antes da constituição do penhor, oportunidade de o fazer”..

Entende por outro lado a decisão recorrida que: “Refira-se que o nosso ordenamento jurídico prevê a possibilidade de a AT recorrer a medidas cautelares precisamente para fazer face a situações em que mesmo o estando ainda em curso o mencionado prazo, há razões fundadas para se concluir pela existência de risco de depauperamento do património do executado (cfr. art.214.°, do CPPT).

Não obstante, essas medidas cautelares têm pressupostos e tramitação própria, devendo desde logo, ser requeridas junto do tribunal tributário competente. Uma situação como a dos autos por transformar o penhor num ato de efeito equivalente às medidas cautelares legalmente previstas, mas sem as exigências a estas subjacentes, o que não pode ser admitido.” IV - Com o devido respeito, não pode a douta sentença recorrida manter-se na ordem jurídica por erro de julgamento ou, de direito, de a mesma ser revogada pelos motivos já acima elencados. Refere a propósito o Ilustre Conselheiro Jorge Lopes de Sousa na sua obra, CPPT comentado e anotado: “No art.° 51.º da LGT prevê-se a possibilidade de a administração tributária, nos termos da lei, tomar providências cautelares para garantia dos créditos tributários em caso de fundado receio de frustração da sua cobrança ou de destruição ou extravio de documentos ou outros elementos necessários ao apuramento da situação tributária dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários.

A competência para a adoção de medidas cautelares que se prevê neste art. 51º é atribuída à própria administração tributária, sem necessidade de recorrer aos tribunais.

Nesse sentido refere o nº 3 do artº 51º da LGT que “As providências cautelares consistem na apreensão de bens, direitos ou documentos ou na retenção, até à satisfação dos créditos tributários de prestações tributárias a que o contribuinte tenha direito” Ou seja, contrariamente ao entendimento da decisão recorrida, existem providências cautelares que podem ser adotadas pela administração tributária, não se limitando as mesmas àquelas que são da competência dos tribunais como será o caso do arresto e arrolamento.

Como reafirma ainda nesse sentido na mesma obra o ilustre Conselheiro Jorge Lopes de Sousa “Porém, deverá admitir-se outra providência genericamente referida no n.° 3 do artº 51º da LGT, que é a retenção, até à satisfação dos créditos tributários, de prestações tributárias a que o contribuinte tenha direito.” V - Ou seja, como é pacífico, a compensação não se confunde com o penhor sendo tal entendimento defendido pelo STA, discriminando a propósito esse douto Tribunal que na compensação estamos perante uma forma de extinção da obrigação diversa do cumprimento por pagamento e, no penhor perante a constituição de um direito real de garantia da qual o OEF (órgão de execução fiscal) lança mão para garantir a cobrança da dívida nos termos do artº 50º n.° 2 da LGT e art.° 195º n.° 1 do CPPT.

VI - Ora apesar de o OEF ter procedido ao depósito do penhor à ordem do processo, a verdade é que apenas em 16 de Outubro de 2015, no mesmo processo de execução nº 3107201501159186 se procedeu à emissão de DUC e pagamento nesse processo, data em que o credor já podia exigir o cumprimento imediato da obrigação, por via do termo do prazo de oposição à execução, tendo até aí tido uma função meramente garantística.

VII - Até porque, há muito se esgotara o prazo de pagamento voluntário, momento a partir do qual a dívida tributária se toma exigível - precisamente por decurso do prazo voluntário de pagamento da dívida em causa (cfr. artigo 84º e 89º, n.° 1, do CPPT).

VIII - Mas a defesa da recorrida não deixou de ser viabilizada no decurso dos subsequentes trâmites processuais que, salvo melhor entendimento, seguiram o regime da penhora de créditos previsto no artigo 226° do CPPT que, face à alínea a) do n.° 1 do artigo 165º do CPPT, no regime da execução fiscal, se concretiza com a efetiva citação da/o executada/o.

IX - Argumentando por maioria de razão, diga-se ainda que “A maiori ad minus”, entendeu o Tribunal Constitucional no acórdão nº 386/2005 que o n.° 1 deste artº 89º [do CPPT] não é materialmente inconstitucional, à face dos princípios da igualdade e do acesso aos tribunais (art.°s 13.° e 20.°, n.° 1 da CRP), quando interpretado com o sentido de permitir a compensação logo que a dívida se torna exigível, findo o prazo de pagamento voluntário de 30 dias (aplicável, nos termos do art.° 85.°, nº 2, do CPPT, quando não for fixado prazo especial), mesmo antes de estar findo o prazo para o exercício do direito de impugnação, que é de 90 dias, nos termos do nº 1 do artº 102º deste Código, embora desta interpretação resulte que o contribuinte que vise obstar à compensação tenha de impugnar o ato de liquidação dentro daquele prazo de 30 dias, sob pena de perder o direito de ver suspensa a execução, pois a dívida, operada a compensação, fica cobrada» X - Ora, nos termos da citação recebida pela oponente, foi a mesma alertada para o facto de que decorrido o prazo de trinta dias (para pagamento voluntário da dívida exequenda e acrescido, requerimento da dação em pagamento, ou dedução de oposição) sem que a dívida exequenda se mostrasse paga, ou fosse prestada garantia idónea que suspendesse a execução, nos termos do art.° 169º e 199º do CPP.T., o processo executivo prosseguiria com a penhora de bens ou, direitos existentes no seu património, no valor suficiente para a cobrança da dívida conforme o montante indicado.

XI - Como daí se pode concluir, estando em causa, no sistema fiscal, nomeadamente a avaliação em matéria de garantias, deverá também considerar-se que esta matéria se encontra abrangida pelo art.° 103º da CRP por estar em apreço os elementos essenciais do imposto. Nesta medida, a norma tributária abrangida na reserva de lei da Assembleia da República constante do artº 103º da CRP, normativo dedicado ao sistema fiscal, não pode sofrer uma interpretação analógica, o que teria como efeito o alargamento dos pressupostos meios, ou a da oportunidade das garantias relativas à inexigibilidade, com vista aos fins.

Não será pois de aplicar ao caso, através da analogia, as garantias que abrem a via da discussão da legalidade.

XII - Ora, de acordo com o disposto no n.° 1 do art.° 195º do CPPT (cfr. igualmente a al. b) do nº 2 do artº 50º da LGT), a AT pode constituir hipoteca legal ou penhor quando «o interesse da eficácia da cobrança o torne recomendável». Tal interesse é justificado ope legis. Subjudice, importa no entanto sublinhar que foi constituído penhor.

No âmbito de tal quadro legal prevê o artigo 215°, do CPPT (Código de Procedimento e de Processo Tributário), em sentido contrário à decisão recorrida o facto de que, findo o prazo posterior à citação e não tendo o executado efetuado o pagamento, se procede de imediato à penhora.

Ora, havendo limitações, tais são relativas à penhora de certos bens (arts. 822.°, 823.° e 824.° do CPC), sendo que são esses tais limiares que não podem ser afetados pela vontade da executada ou da do órgão da execução fiscal. Disso é paradigma o limite imposto quanto à extensão da penhora que deve limitar-se ao necessário para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido nos termos definidos pelo art.° 217.° do...

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