Acórdão nº 0761/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Agosto de 2016

Magistrado ResponsávelFONSECA CARVALHO
Data da Resolução24 de Agosto de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I. Relatório 1. A Fazenda Pública vem interpor recurso da sentença do TAF do Porto que julgou totalmente procedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal, intentada por A………, S.A., identificada nos autos, contra o despacho da Chefe do Serviço de Finanças da Maia, de 18/01/2016, no âmbito do PEF nº. 1805201501522477, que indeferiu o pedido de suspensão da execução, por falta de idoneidade da garantia apresentada.

  1. Formulou as seguintes conclusões das suas alegações: A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou totalmente procedente a reclamação de atos do órgão de execução fiscal, interposta nos termos do disposto no art.º 276º do CPPT, do despacho, proferido pela Chefe do Serviço de Finanças da Maia, de 18-01-2016, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 1805201501522477 (adiante designado PEF), contra si instaurado, que indeferiu o pedido de suspensão da execução, por falta de idoneidade da garantia apresentada.

    1. Decidiu a Meritíssima Juíza a quo pela procedência da reclamação com fundamento na ilegalidade da utilização da metodologia do art. 15º do Código de Imposto de Selo (CIS) para aferir da idoneidade da garantia apresentada para suspensão da execução fiscal.

    2. Não pode a Fazenda Pública concordar com este entendimento, perfilhando a convicção que a sentença sob recurso incorre em erro de julgamento de direito, porquanto, é manifestamente apropriado recurso às regras fixadas no art. 15º do CIS para avaliar da idoneidade da garantia.

    3. A fiança como modo de garantia das obrigações tem subjacente, pela sua natureza intrínseca, um conjunto de fragilidades, comparativamente com o cômputo dos meios de garantia das obrigações que a lei põe à disposição. Conjunto de fragilidades que impõem à AT um especial dever de cuidado na análise, no caso concreto, da sua idoneidade para garantir o crédito tributário.

    4. Na ausência de norma específica que fixe o modo de avaliação da suficiência e idoneidade da fiança para garantir o crédito tributário, o princípio da unidade do sistema jurídico que se impõe à atividade interpretativa e integrativa do aplicador do Direito impõe que se procure na globalidade deste ordenamento jurídico normas que permitam atingir o fim visado - que é, tão só, a avaliação patrimonial da sociedade fiadora.

    5. É em obediência a esse princípio da unidade do sistema jurídico que, por exemplo, quando é indicado um imóvel como garantia num determinado processo de execução fiscal (sob a forma de hipoteca ou penhora), na avaliação da sua suficiência e idoneidade é utilizado o respetivo Valor Patrimonial Tributário (VPT) — com as regras específicas de determinação que constam no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) — apesar de não existir qualquer norma que especialmente o preveja.

    6. A avaliação da idoneidade de garantia prestada sob a forma de fiança afere-se pela suficiência do património do fiador. Sendo o fiador uma sociedade, a avaliação da idoneidade da fiança afere-se pela suficiência do património societário.

    7. É o valor do património transmitido gratuitamente o quantum da capacidade contributiva tributada em sede de IS, que corresponde ao valor do acréscimo patrimonial ocorrido na esfera dos beneficiários da transmissão gratuita. As regras dos arts. 13º a 31º do CIS determinam o valor de um património - o valor do acréscimo de património.

      I. As regras de determinação do valor tributável do IS, no caso de transmissões gratuitas, previstas nos arts. 13º a 21º do CIS, tratam exatamente da avaliação do património que é transmitido gratuitamente.

    8. Se o património for um imóvel, o seu valor é fixado por remissão para o Valor Patrimonial Tributário constante da matriz nos termos do CIMI (art. 13º CIS). Se o património for uma participação social, o seu valor resultará das regras do art. 15º do CIS.

    9. Uma participação social, representativa de uma fração do capital social da sociedade, representa uma fração do património da sociedade.

      L. No ato de constituição da sociedade o valor da participação social é uma fração do valor do Capital Social da sociedade, que corresponde, exatamente, à contribuição patrimonial, em dinheiro ou espécie, efetuada pelo sócio para a sociedade. Após o ato de constituição da sociedade o valor do património que essa participação social representa, em cada momento, é dado por essa fração no Capital Próprio da sociedade, em face das variações verificadas nesse património inicial em resultado da obtenção de lucros ou da acumulação de prejuízos.

    10. E o valor do Capital Próprio (património liquido) o valor do acréscimo patrimonial verificado na esfera do beneficiário de uma transmissão gratuita em IS e o valor de referência para aferir da suficiência de património da sociedade fiadora para garantir a dívida em execução fiscal.

    11. Da mesma forma que é o valor líquido do imóvel - após deduzir ao Valor Patrimonial Tributário os ónus e encargos a que se refere o art. 20º do CIS - o valor do acréscimo patrimonial tributado em sede de IS e o valor da dívida em execução fiscal que esse imóvel é idóneo a garantir.

    12. Mas, a avaliação do património representado por uma participação social de entidades com natureza comercial ou industrial não se basta por uma perspetiva estática - o que aconteceria caso apenas atendêssemos ao Capital Próprio de um determinado ano.

    13. Uma correta avaliação desse património não pode deixar de incorporar uma perspetiva dinâmica, acerca da capacidade dessa massa de bens e direitos em multiplicar-se, em gerar lucro. As oscilações do património de uma sociedade comercial são reveladas pela sucessão, ao longo dos anos, dos resultados contabilísticos atingidos.

    14. Daí a pertinência da consideração dos resultados obtidos pela sociedade nos dois últimos exercícios na fórmula do art. 15º do CIS, de modo a incorporar no valor final de avaliação as expectativas de aumento de património (no caso de lucros), ou de diminuição de património (no caso de prejuízos), que resultam desse histórico mais recente.

    15. Em face do que ficou dito, revela-se adequada a utilização da metodologia do art. 15º do CIS para avaliação da suficiência do património de uma sociedade fiadora, para, desse modo, em face dessa suficiência ou insuficiência, aferir da idoneidade da fiança prestada.

      Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, por verificação de erro de julgamento de direito.

  2. Não houve contra-alegações.

  3. O magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, de acordo com os seguintes fundamentos: 1. O presente recurso vem interposto da sentença do TAF do Porto de fls. 348 e seguintes, que julgou procedente a reclamação apresentada contra a decisão de indeferimento do pedido de suspensão da execução fiscal instaurada contra a recorrida, por falta de idoneidade da garantia oferecida, proferida pelo senhor chefe de finanças do Serviço da Maia.

    A Recorrente insurge-se contra o assim decidido por entender que a metodologia utilizada na apreciação da idoneidade da garantia é a adequada.

    Para tanto alega que “revela-se adequada a utilização da metodologia do art. 15º do CIS para avaliação da suficiência do património de uma sociedade fiadora, para, desse modo, em face dessa suficiência ou insuficiência, aferir da idoneidade da fiança prestada”.

    E termina pedindo a revogação da sentença.

  4. Na decisão recorrida foi dado como assente que no Serviço de Finanças da Maia foi instaurada execução fiscal, para cobrança da quantia de € 19.163,10 euros, relativa a imposto de selo do ano de 2013, em que figura como executada a aqui recorrida, a qual apresentou pedido de suspensão da execução, oferecendo como garantia a fiança prestada pela sociedade “B………, SGPS, S.A.”, que detém a totalidade do capital social da primeira.

    Na informação dos Serviços que serve de suporte à decisão de indeferimento do pedido da executada, proferida pelo senhor chefe de finanças em 16/11/2015, consta a seguinte conclusão: «a análise integrada recolhida dos indicadores de natureza quantitativa e qualitativa usados nesta avaliação do património autónomo da empresa/entidade garante, permitem concluir que esta não conseguirá libertar os meios financeiros líquidos suficientes, considerando a falta de capacidade de cumprimento de curto prazo revelada ou a existência de indícios claros de incumprimento, pelo que neste contexto não está em condições de se assumir como fiadora e que, com elevada probabilidade não tem capacidade de cumprir com as obrigações que a legislação fiscal estabelece para os garantes».

    Por sua vez o tribunal recorrido entendeu: «quando muito, a fórmula prevista no artigo 15º do CIS poderia, eventualmente, ser usada para aferir da idoneidade de uma garantia consubstanciada na entrega de um lote de ações ou em penhor de ações..., mas já não para avaliar a idoneidade de uma fiança, nem para apurar o património (líquido ou não) de uma sociedade».

    E nessa medida concluiu-se que “a AT errou ao considerar que a fórmula prevista no artigo 15º do C.I.S. permitia apurar o valor do património líquido da “B……….” e avaliar a idoneidade da fiança oferecida” e que o despacho reclamado padece de ilegalidade, o que constituía fundamento para a sua anulação.

  5. A questão que se coloca consiste em saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao dar como errada a metodologia empregue pela AT na avaliação que fez da idoneidade da fiadora para prestar a garantia no valor de € 26.187,44 euros, no âmbito do processo de execução fiscal nº 1805201501522477.

    Esta mesma questão já se tem colocado em diversos processos com contornos muito similares e que envolve a prestação de garantia por parte de sociedades de gestão de participações sociais que detêm a totalidade do capital da sociedade que é executada. E nessa medida vamos seguir de perto outros pareceres já emitidos noutros processos.

    Pese...

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