Acórdão nº 01107/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelASCENS
Data da Resolução07 de Janeiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

1-Relatório: C………………., SA veio deduzir impugnação judicial contra o acto de autoliquidação de IVA referente a Janeiro de 2012 na parte em que incide sobre as taxas de ocupação do subsolo pagas às autarquias locais e repercutidas nos consumidores finais de gás natural no valor de 15.260,91 Euros.

A decisão recorrida julgou procedente a impugnação.

A Fazenda Pública veio recorrer para este STA apresentando alegações com as seguintes conclusões: «

  1. Vem o presente recurso da sentença que julgou procedente por provada a presente impugnação.

  2. Está patente na decisão que: “Em face de todo o exposto, não pode ser acolhida a tese propugnada pela AT na informação vinculativa que serviu de base ao indeferimento da reclamação graciosa da autoliquidação do IVA.

    Não está em causa a aplicação extensiva do n°2 do artigo 2° do CIVA à impugnante, mas antes a circunstância de, em virtude da exclusão das TOS do âmbito de incidência do imposto operado por esta disposição, o débito das mesmas TOS aos clientes estar igualmente excluído de tributação.

    O tratamento uniforme entre todas as operações e agentes económicos constitui um imperativo legal por força do princípio da neutralidade do IVA que está na essência desse imposto.

    Por outro lado, não está em discussão a aplicabilidade da al. c) do nº6 do artigo 16º do CIVA para excluir as TOS da base de incidência do imposto.

    De resto, a repercussão do valor das TOS é uma operação meramente financeira que nem sequer constitui uma actividade económica na acepção do artigo 9°, n°1 da Directiva do IVA, daí que não caiba no âmbito de incidência do imposto.”.

  3. Contudo, a Fazenda Pública não pode conformar-se com tal decisão.

  4. A impugnante é concessionária do serviço público de distribuição de gás natural e dos seus gases de substituição na Zona Centro Interior, ao abrigo do contrato de concessão, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n°98/2008, Diário da República n°119 I.ª série, de 23-06-2008; E) Na cláusula 7 n°s 2 e 3 do referido contrato estabelece-se que: “Assiste à Concessionária o direito de repercutir sobre os utilizadores das suas infra-estruturas, quer se trate de entidades comercializadoras de gás ou de consumidores finais, o valor integral de quaisquer taxas, (...) incluindo as taxas de ocupação do subsolo cobradas pelas autarquias locais.”; F) É Jurisprudência assente que é de qualificar como taxa, por ter natureza sinalagmática, o tributo liquidado por um município como contrapartida pela utilização do subsolo com tubos e condutas de gás; G) O cumprimento das obrigações declarativa e de pagamento foi de encontro à informação vinculativa da DSIVA solicitada pela própria impugnante, que mereceu despacho de 03-08-2011; H) Os contratos de concessão entre o Estado e os concessionários não são tributados em sede de IVA por força do n°2 do art.° 2° do CIVA, uma vez que são operações praticadas no âmbito dos poderes de autoridade do Estado; I) A repercussão da TOS ao cliente final não é por si só uma actividade económica, contudo, sempre terá de integrar o valor tributável sujeito a IVA, por imperativo legal; J) Quer dos art.°s 73° e 78° da Directiva 2006/112 de 28 de Novembro de 2006, quer do art.° 16°, n°s 1 e 5 alínea a) do CIVA se retira que o valor tributável das transmissões de bens e das prestações de serviços sujeitas a imposto é o valor da contraprestação obtida ou a obter do adquirente, do destinatário ou de um terceiro, incluindo os impostos, direitos, taxas e outras imposições, com excepção do próprio imposto sobre o valor acrescentado; K) Atente-se ao Ofício-Circulado 30127 da DSIVA, de 13-05-2011, concernente às taxas de recursos hídricos que preconiza que: “A repercussão, sobre o utilizador final, do encargo económico que a taxa representa, nos termos do artigo 5.° do Decreto-Lei n°97/2008, de 11 de Junho, incluído na factura emitida pelas entidades exploradoras/distribuidoras dos recursos hídricos, constitui, ainda que discriminado, parte do valor tributável da operação, nos termos da alínea a) do n.°5 do artigo 16° do Código do IVA. Sobre esta incide IVA à taxa reduzida (6% no Continente e 4% nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira), por inclusão na verba 1.7 da Lista 1 anexa ao CIVA, sem prejuízo da aplicação de taxa diferente a outros bens ou serviços que possam ser discriminados na factura, devendo ser observadas as regras de facturação previstas no Código do IVA, designadamente, no seu artigo 36.º.”; L) Deve também chamar-se à colação o Acórdão do STA de 21-09-2011, processo n°766/09, relativo ao Imposto sobre veículos (antigo IA), que remete para o Acórdão do TJUE de 28.07.2011, proferido no Processo n° C-106/10 cuja posição é a de que: “Um imposto como o imposto sobre veículos em causa no processo principal, cujo facto gerador está directamente ligado à entrega de um veículo abrangido pelo âmbito de aplicação deste imposto e que é pago pelo fornecedor desse veículo, integra-se no conceito de «impostos, direitos aduaneiros, taxas e demais encargos», na acepção do artigo 78.º, primeiro parágrafo, alínea a), da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, e deve, em aplicação desta disposição, ser incluído no valor tributável em imposto sobre o valor acrescentado da entrega do referido veículo”; M) É pois inquestionável que também a taxa de ocupação de subsolo repercutida aos clientes faz parte da contraprestação obtida pelos serviços prestados e o seu facto gerador está directamente ligado à prestação dos serviços (pois sem o seu pagamento ao Estado a concessionária estaria inabilitada a fornecê-los), pelo que terá de ser englobada no valor tributável e como tal ser sobre ela aplicada a taxa de IVA correspondente; N) A sentença recorrida assenta maioritariamente a sua fundamentação no princípio da neutralidade fiscal, contudo, o presente recurso contrapõe o princípio da legalidade, visto que a TOS não consubstancia uma operação económica da concessionária para o cliente final, no entanto, esta será englobada, por força de lei (art.° 16°, n°5 alínea a) do CIVA), no valor tributável sujeito à taxa de IVA; O) Padece, assim, a sentença recorrida de erro de julgamento, pois não se procedeu a uma análise exaustiva dos factos e da sua subsunção ao direito, sendo que teria de redundar na aplicação da norma vinda de referir; P) Estabelece o art.° 5.º, n°3 do CPC (anterior art. 664° do CPC) que o Juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, consistindo no princípio da oficiosidade do conhecimento do direito, “jus novit curia”, sendo esta matéria sempre indisponível; Q) Após a entrada em vigor do ETAF e CPTA, passou-se de um contencioso de mera anulação, fortemente limitador dos poderes de decisão do juiz e destinado à mera defesa da legalidade, para um contencioso de plena jurisdição, que proporciona uma tutela jurisdicional mais efectiva, aumentando-se os poderes de cognição do juiz; R) Deve constar da sentença: a identificação das partes e do objecto em litígio, a fixação das questões a solucionar, a fundamentação, discriminando os factos provados e a aplicação do direito, culminando com a decisão, à luz do art.° 607° do CPC; S) Salvo o devido respeito, entendemos que a sentença recorrida peca na aplicação do direito, visto que se impunha a alusão ao art.° 16°, n°5 alínea a) do CIVA e como tal a improcedência da presente impugnação.

    Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se, em consequência, a substituição da douta sentença recorrida, por outra em que, após a análise do seu mérito, se julgue improcedente, por não provada, a presente impugnação, com as legais consequências.» A recorrida apresentou contra alegações de recurso com as seguintes conclusões: 1. Bem andou o Mmo. Juiz a quo ao decidir que não há lugar à incidência de IVA sobre as TOS refaturadas ou redebitadas pela Recorrida aos seus clientes ao abrigo do contrato de concessão com o Estado Português e nos termos regulamentados pela EPSE.

    1. Contrariamente ao que alega a AT, não se aplica o disposto no artigo 78.°, al. a) da Diretiva do IVA e no artigo 16.º, nº 5, al. a) do CIVA para incluir as TOS redebitadas aos clientes no valor tributável de IVA.

    2. Com efeito, inexiste uma relação direta - “um nexo direto e necessário entre o serviço prestado e contravalor recebido” - entre o recebimento das TOS dos clientes e uma prestação que lhes seja dirigida pela Recorrida, havendo apenas, e no limite, um nexo incidental e indireto.

    3. Se as TOS não forem pagas às autarquias locais, a consequência é apenas a constituição de uma dívida, sem qualquer efeito legal sobre o contrato de concessão com o Estado Português ou sobre a licença de comercialização de gás natural de último recurso concedida pela DGEG - Direção-Geral de Energia e...

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