Acórdão nº 01204/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Março de 2016
Magistrado Responsável | ASCENSÃO LOPES |
Data da Resolução | 02 de Março de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
1-Relatório: A…………… SA, vem recorrer para este STA da sentença proferida no TAF do Porto que negou provimento à sua impugnação da liquidação adicional de IRC referente ao ano de 2000.
A recorrente apresentou alegações com as seguintes conclusões a fls.143 dos autos: «i. O princípio de especialização dos exercícios vale assim para os casos em que os custos são contabilizados num exercício mas em que a despesa efectiva só é suportada noutro e para os casos em que o ganho ainda que contabilizado num exercício, só é, de facto, recebido noutro.
ii. No caso dos autos, entendeu o Tribunal a quo validar a correcção em causa nos autos, relativa a um donativo decidido e pago no exercício de 2000 — quando, tendo em conta que o cheque correspondente ao donativo não aceite, no montante de Esc. 3.000.000$00, foi emitido em 31.12.2000, é manifesto que o donativo que conduziu ao recibo nº 3/2001 era mais do que previsível e conhecido na esfera do doador à data de 31.12.2000 - era uma realidade já consumada.
iii. Como é Jurisprudência deste Supremo Tribunal: - «O princípio da especialização dos exercícios, porque se destina a tributar a riqueza gerada em cada exercício independentemente do seu efectivo recebimento, impõe que se contabilize como custo do exercício em que foi tomada a decisão da atribuição de uma gratificação aos membros dos órgãos sociais de uma empresa, ainda que a mesma não seja distribuída até ao termo deste.»- (Ac. Do STA, de 09.02.2000, dado no proc. nº 22.208).
- «(...) o princípio de especialização de exercícios, porque se destina a tributar a riqueza gerada em cada exercício, impõe que os respectivos proveitos e custos sejam contabilizados à medida que sejam obtidos e suportados, e não à medida que o respectivo recebimento ou pagamento ocorrem.”- (Ac. do STA, de 25.01.2006, dado no Proc. n.º 0830/05, destaque nosso, e, no mesmo sentido, Ac. do STA, de 02.04.2008, dado no Proc. nº 807/07-30, Ap. DR de 29 de Setembro de 2008, p. 358, Ac. do STA, de 19.11.2008, dado proc. nº 0325/08., e Ac. do STA de 09.05.2012, dado no proc. nº. 0269/12.) iv. Estando em causa nos autos, na perspectiva da AF, um mero erro de contabilização de um custo, constata-se que o mesmo não lesa os interesses patrimoniais da Fazenda, nada resultando dos autos no sentido de que, através do mesmo, se pretendeu operar a transferências de resultados, - pelo que o princípio da justiça deverá prevalecer sobre o princípio da especialização dos exercícios (Ac. STA, de 05.02.2003, dado no Proc. n.º 1648/02, e Ac. do STA, de 13.10.96, dado no proc. n.º 20.404.) v. Mais: do erro de contabilização não resultou, nem resultaria, qualquer prejuízo para o Estado, uma vez que, se os custos não são imputáveis a determinado exercício (2000), sempre seriam a outro (2001), e, aí, sempre atenuariam a carga tributaria, na mesma medida do agravamento da carga tributaria que imprimem no exercício em que foram anulados (2000) - sob pena de injustificado enriquecimento da Fazenda, materializado no agravamento da carga tributaria no exercício ao qual são retirados os custos fiscais, por serem imputáveis a outros exercícios; mas não desagravamento da carga tributaria nos exercícios a que são imputáveis, o que é de todo injusto, ilegítimo e injustificado.
vi. Como refere a nossa Doutrina, “Há nesta situação dois deveres a ponderar, ambos com cobertura legal: um é o de repor a verdade sobre a determinação da matéria colectável dos exercícios referidos, dando execução ao princípio da especialização, reposição essa que a administração fiscal deve efectuar mesmo que não lhe traga vantagem; outro é o de evitar que a actividade administrativa se traduza na criação de uma situação de injustiça. (...) Entre esses dois valores, designadamente nos casos em que a administração fiscal não teve qualquer prejuízo com o erro praticado pelo contribuinte, deve optar-se por não efectuar a correcção, limitando aquele dever de correcção por força do princípio da justiça.» - (Leite de Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge de Sousa, Lei Geral Tributária, comentada e anotada, vislis, 1999, págs. 167 e ss, destaque nosso.) vii. A actuação da AF ocorreu mesmo ao arrepio de orientações administrativas que a vinculam - designadamente do Ofício-Circular n° 14/93, de 23/11, da Direcção de Serviços de IRC, de onde resulta que “aos Serviços de Fiscalização no âmbito de análise interna ou externa o controlo da matéria colectável, determinada com base em declaração do contribuinte, devem os mesmos, sem prejuízo da penalidade ao caso aplicável, fazer as correcções adequadas ao resultado líquido do exercício a que os custos ou proveitos digam respeito, quando, nos termos do art 18.º do CIRC, não sejam consideradas componentes negativas ou positivas do lucro tributável do exercício da sua contabilização.
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Exceptuam-se deste procedimento as provisões, reintegrações e amortizações quando não contabilizadas como custos ou perdas do exercício a que respeitam.” viii. Nos termos da lei, o enquadramento dos donativos é efectuado em função das finalidades prosseguidas pela donatária e não em função da finalidade dos donativos concretamente atribuídos como decidido pelo Tribunal a quo - motivo pelo qual, para o efeito, é irrelevante o teor dos recibos emitidos pela donatária quanto ao destino concreto que esta lhes declarou dar.
ix. De resto, compulsada a lei, também do disposto no artigo 3º do Estatuto do Mecenato, resulta que o enfoque legal reside nas actividades e acções desenvolvidas pelas entidades beneficiárias: e não na finalidade específica dos donativos concretamente atribuídos.
x. Aliás, como parece óbvio, o doador não conhece, nem tem de conhecer, o destino que é dado aos bens ou quantias doados - dentro do largo espectro de atribuições prosseguidas pelo donatário - sendo certo que, dos estatutos da Fundação B………., resulta claramente que esta prossegue finalidades suficientemente variadas e eclécticas, que tornam inviável catalogá-la numa única e específica categoria de mecenato.
xi. Assim, ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, não se vislumbra qualquer impedimento legal à consideração dos donativos em questão como “mecenato social”, no artigo 2 nº 1 b) do Estatuto do Mecenato.
xii. Ao assim não decidir, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 2.º e 3.º do Estatuto do Mecenato - a impor a revogação da decisão recorrida.
Nestes termos e nos melhores de direito, deve conceder-se provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, o que se faz por obediência à Lei e por imperativo de J U S T I Ç A!» Não foram apresentadas contra alegações.
O Ministério Público emitiu parecer a fls. 156 dos autos, com o seguinte conteúdo: «Vem interposto recurso da douta sentença de 15.01.2013, proferida no Proc. n.º 566/05.9BEPRT do TAF do Porto que, negando provimento à impugnação deduzida pela firma “A……….., SA”, manteve o acto de liquidação adicional do IRC, referente ao exercício de 2000.
Nas conclusões da sua Alegação a recorrente sustenta que a sentença padece de erro de julgamento, por errada interpretação e aplicação do disposto nos arts. 2.º e 3.º do Estatuto de Mecenato, censurando ainda o julgado relativamente à não aceitação da contabilização de um donativo, no valor de 3.000.000$00, como custo do exercício de 2000.
No que respeita ao enquadramento dos donativos não se me afigura que assista razão à recorrente.
O Estatuto do Mecenato, aprovado pelo DL n.º 74/99, de 16 de Março, atribui para efeitos fiscais distinto relevo aos donativos de mecenato social e àqueles que são enquadráveis na figura do mecenato cultural, ambiental, científico ou tecnológico, desportivo e educacional.
Ora, se é certo, como resulta da lei, que o enquadramento legal dos donativos é efectuado em função da natureza jurídica da donatária e das finalidades por ela prosseguidas, também se tem por certo que se impõe a ponderação sobre a concreta finalidade dos donativos atribuídos quando, como é o caso, a donatária prossiga...
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