Acórdão nº 0150/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 31 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelARAGÃO SEIA
Data da Resolução31 de Março de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: Autoridade Tributária e Aduaneira, inconformada, recorre da sentença do TAF de Sintra, datada de 26.11.2015, que julgou procedente a presente providência cautelar, para suspensão de eficácia de acto autorizativo de acesso a informação bancária, que contra si havia sido intentada por A………...

Alegou, tendo concluído: I - Por sentença datada de 26 de Novembro de 2015, ora recorrida, veio o Tribunal a quo conceder a suspensão de eficácia do acto administrativo praticado pela Directora-Geral dos Impostos que autorizou o acesso à informação bancária do Requerente.

II - A recorrente não se conforma com essa decisão que, entende, resulta duma errada leitura da oposição apresentada e duma incorrecta interpretação do Direito.

III - A sentença recorrida imputa à oposição apresentada afirmações e leituras que não estão lá plasmadas nem consentidas (pelo contrário, existem afirmações expressas em sentido contrário), como por exemplo referir que foi defendido que a tutela cautelar só caberia em processos cujo recurso tem efeito suspensivo.

IV - E essa errada leitura da oposição, além de viciar a sentença, prejudicou o direito de contraditório da Requerida (ora recorrente), pois este direito só se realiza integralmente quando as peças apresentadas são ponderadas nos exactos termos em que foram redigidas.

V - O tribunal a quo julgou sem ter qualquer elemento concreto que graduasse a intromissão na vida privada do Requerente, apoiando-se apenas em elementos abstractos (conhecidos do legislador) e, ainda assim, alterando o efeito do recurso (meramente devolutivo por imposição legal, mas suspensivo, por sentença do tribunal).

VI - Essa decisão de promoção (de devolutivo para suspensivo) do efeito do recurso (que pelos fundamentos invocados se adivinha que será reiterada e sistemática, sempre que existir decisão de mérito de providências cautelares referentes à derrogação do sigilo bancário) configura uma violação do princípio da separação de poderes e do princípio da legalidade.

VII - A sustentar o seu entendimento, o tribunal cita um acórdão proferido num contexto legal distinto, além de não atender à douta jurisprudência que posteriormente existe sobre a matéria, em sentido diverso do decidido.

VIII - O tribunal entendeu tutelar um "direito" (não acesso à informação bancária detida pelo B………, referente ao contribuinte), que foi alcançado com violação de Lei (tipificada como crime).

IX - Sendo que tal “vantagem” ilegítima do requerente já tinha sido protegida pelo tribunal recorrido, entendendo que se aplicava o artigo 128º do CPTA ao caso sub judice, entendimento que se afigura inadequado e não nos parece acompanhado, nem pela doutrina, nem pela jurisprudência.

X - Quanto à ponderação de interesses, o tribunal privilegiou a privacidade da informação bancária (em abstracto e desconhecendo qualquer elemento concreto), em detrimento da tributação segundo a capacidade contributiva e a distribuição equitativa da carga fiscal, em completo afastamento quanto à jurisprudência pacífica do Tribunal Constitucional e da mais recente jurisprudência do STA.

XI - Pelo que concluímos que a sentença proferida fez uma deficiente interpretação da aplicação do Direito ao caso concreto, violando o disposto no nº 5 do artigo 63º-B da LGT.

Termos em que, concedendo-se provimento ao presente recurso, deve a sentença, ora recorrida, ser revogada, devendo ser julgado improcedente o pedido de suspensão de eficácia do acto administrativo que autorizou o acesso à informação bancária, assim se fazendo justiça.

Contra-alegou o recorrido, formulando as seguintes conclusões: I. Vem o presente recurso interposto pela administração tributária da Sentença proferida pelo Tribunal a quo, a qual decidiu «concluir pela concessão da providencia, no que toca a suspensão de eficácia do acto que autorizou o acesso a todas as contas e documentos bancários, por parte de funcionários da inspecção tributaria, de que seja titular o ora Requerente».

  1. A tal Sentença, porém, não podem ser assacados os vícios apontados pela Recorrente, já que a mesma materializa a correcta e devida aplicação do direito aos factos.

  2. Constitui objecto da providência requerida o despacho do Senhor Director-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, que autorizou que «funcionários da inspecção Tributária, devidamente credenciados, possam aceder directamente a todas as contas e documentos bancários existentes nas instituições bancárias, em sociedades financeiras ou instituições de crédito portuguesas», de que seja titular o aqui Requerente «relativamente aos anos de 2011, 2012 e 2013».

  3. Com vista ao decretamento da providência requerida, invocou o Recorrido a existência de lesão irreparável, consubstanciada no facto de que, através do acesso à informação e documentação bancária, a AT ficaria a conhecer ao detalhe a sua intimidade e vida privada, como por exemplo onde e quando faz as suas compras de mercearia, quanto gasta no supermercado, onde e quando vai ao cabeleireiro, e todas as demais despesas normais que o Recorrido efectua na sua vida, permitindo ficar a conhecer com minúcia muitos dos seus hábitos e preferências.

  4. Com vista a demonstrar o 'fumus boni iuris', apontou o Recorrido ao acto administrativo que autorizou o acesso a todas as contas e documentos bancários de que seja titular, por parte de funcionários da inspecção tributária, diversos vícios, designadamente que o despacho em causa é ilegal porque todos os actos de inspecção foram realizados fora do devido procedimento de inspecção tributária, porque assenta em elementos e provas acedidos a partir de terceiro ilegitimado, porque viola grosseiramente os princípios de adequação e da proporcionalidade, porque o Recorrido nunca foi pessoalmente e validamente notificado pela administração tributária para prestar quaisquer informações ou permitir o acesso às suas informações bancárias, bem porque o despacho em causa não se encontra minimamente fundamentado no que se refere aos factos que determinam a necessidade de acesso às informações bancárias do Recorrido relativas aos anos de 2011 e, em especial, de 2013.

  5. Posto isto, principia a Recorrente por invocar que a Sentença em crise incorreu em «erro de julgamento consubstanciado na errada interpretação das alegações da Requerida (aqui recorrente)».

  6. Não se identifica na Sentença recorrida que a mesma tenha feito uma incorrecta interpretação da oposição apresentada pela autoridade tributária, nem muito menos em que medida é que essa incorrecta interpretação afecta a validade, material e substancial, da Sentença proferida.

  7. Sem prescindir, afigura-se inequívoco que a posição da Recorrente, aliás manifestada nas suas alegações de recurso, é de que o direito à intimidade e à vida privada nunca poderiam prevalecer sobre o direito da administração tributária ao levantamento do sigilo bancário.

  8. Não é correcta a firmação de que «Ao decidir como decidiu, o tribunal a quo entendeu ponderar os interesses contrapostos de forma diferente da que foi feita pelo legislador, sem ter qualquer elemento adicional que lhe permitisse um juízo casuístico.».

  9. A Recorrente oblitera conscientemente que o processo cautelar visa assegurar a utilidade da sentença que vier a ser proferida no processo principal e caracteriza-se fundamentalmente pela sua provisoriedade e pela cognição sumária de facto e de direito.

  10. No caso concretamente em apreço, foi o presente procedimento cautelar interposto pelo Recorrido nos termos e ao abrigo do disposto no n.º 6 do artigo 147.º do CPPT, cabendo-lhe, assim, «invocar e provar o fundado receio de uma lesão irreparável [do requerente] a causar pela actuação da administração tributária», o que foi feito pelo Recorrido e reconhecido pela Sentença em crise.

  11. No caso, a Sentença ponderou, então, a aplicação...

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