Acórdão nº 0120/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 31 de Março de 2016

Data31 Março 2016
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO A……… e Outros [habilitados por decisão de fls. 1260 e segs] devidamente identificados nos autos, inconformados com a decisão proferida em 06 de Junho de 2013, no TAC de Coimbra que “julgou parcialmente procedente a excepção referente à ilegitimidade activa dos recorrentes no sentido de que estes apenas são parte legítima para a apreciação da legalidade das construções realizadas nos lotes confinantes aos seus, e procedente a excepção referente à irrecorribilidade do acto impugnado, rejeitando assim o recurso contencioso intentado pelos AA, interpuseram o presente recurso jurisdicional.

Apresentaram, para o efeito, as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: «1ª. Tem legitimidade activa quem retire da declaração de nulidade um benefício específico para a sua esfera jurídica, não contrário à lei, mesmo que a norma pretensamente violada não vise a protecção, em primeira ou sequer em segunda linha, de um bem jurídico próprio.

  1. Encontra-se nessa situação, o proprietário do prédio vizinho em relação à construção que ofende normas urbanísticas.

  2. Os recorrentes alegaram não só a sua qualidade de vizinhos com referência ao prédio sobre que incide a operação de loteamento (a poente relativamente a este e confinando com os lotes B1, B2, B3, B4 e B5, resultantes da operação recorrida), como identificaram os interesses que o acto recorrido lhes lesava: - Alteração da ocupação predominante do solo na sua específica área de residência, passando das moradias unifamiliares com dois pisos de altura (+ cave abaixo da cota de soleira) preexistentes, para blocos habitacionais que em geral correspondem a mais do dobro dos pisos das moradias e com uma ocupação nunca inferior, a cinco vezes a existente.

    - Violação da reserva da intimidade, - Violação do direito ao sossego, - Violação da expectativa de manutenção do valor dos seus imóveis, - Violação da expectativa de continuarem a residir em área com características, pelo menos semelhantes, às anteriormente existentes onde não existiam, como agora existem, vinte e cinco edifícios com altura entre cinco e sete pisos.

  3. A decisão recorrida ao restringir a legitimidade activa dos recorrentes aos lotes B1 a B5 viola de modo flagrante o disposto no nº 2, do art. 821º do Código Administrativo, devendo, pois e nesta parte, ser revogada.

  4. Do conjunto das deliberações 33/94 e 4623/96 da Câmara Municipal de Coimbra, com referência ao conteúdo da primeira (33/94), resulta: - A CCDR deveria pronunciar-se.

    - A deliberação final sobre o licenciamento ficou dependente da análise do projecto de execução do lago.

    - Estava em falta o sistema de manutenção da zona verde.

    - Faltavam os projectos de infraestruturas.

    - Não estavam definidos os prazos de conclusão das obras, nem a forma de prestação de caução.

    - Pelo menos uma parte do projecto de arruamentos estava por apresentar.

    - Só pela deliberação nº 4623/96, foi deferida a planta síntese e regulamento de loteamento.

    - O Alvará emitido faz referência a peças (todas elas) posteriores à deliberação nº 33/94.

  5. A deliberação nº 33/94 não tinha qualquer virtualidade de satisfazer as especificações do alvará exigidas nas als. e) a h) do nº 1, ou no nº 2 do art. 29º do DL 448/91. Pelo que, por indevida desconsideração, se têm tais normas como violadas na douta sentença recorrida.

  6. A deliberação nº 33/94 não continha o requisito da lesividade actual que deflui da interpretação conjugada das normas dos arts. 268º, 4 da CRP e 120º CPA, enquanto pressuposto para a sua recorribilidade. Pelo que, por indevida desconsideração, se têm tais normas como violadas na douta sentença recorrida.

  7. A deliberação nº 33/94 da Câmara Municipal de Coimbra constitui um mero acto interlocutório, preparatório, a meio de um procedimento tendente à regular aprovação de uma operação de loteamento de acordo com as regras estabelecidas no DL 448/91 e DR 63/91. Houve, pois, violação do disposto no art. 36º, 1, al. c) LPTA por indevida aplicação.

  8. Mesmo que a deliberação 33/94 possuísse a virtualidade de licenciar a operação de loteamento, sempre a deliberação nº 4623/96 (aqui recorrida) constituiria alteração dessa mesma deliberação nº 33/94.

  9. Ora, em tal quadro sempre se seguiria: I - O pedido de alteração de alvará de loteamento dá lugar a uma apreciação e reponderação ex-novo de todo o processo de loteamento, de modo que o acto que aprova as alterações ao loteamento não é um acto sobre acto, mas um acto sucessivo, que se autonomiza do anterior e visa uma nova definição da posição da administração face à pretensão do particular.

    II - Substituído acto que originariamente aprovou o loteamento por um outro que aprovou as alterações ao primeiro, este, nulo ou não, deixou de produzir efeitos na ordem jurídica (...).

  10. A deliberação nº 4623/96 (aqui recorrida) sempre constituiria alteração da deliberação 33/94 o que implicava: Ser recorrível autonomamente; Estar a mesma subordinada ao cumprimento das regras do PDM que passara a vigorar.

  11. Mesmo neste contexto sempre a decisão recorrida violara, por não aplicação o disposto no art. 36º, 2 do DL 448/91 e, como consequência, por indevida aplicação o disposto no art. 36º, 1, al. c) LPTA.

  12. Só a deliberação nº 4623/96 da Câmara Municipal de Coimbra foi lesiva de direitos e interesses legalmente protegidos dos recorrentes.

  13. Assim sendo, a douta decisão recorrida deixa os recorrentes na mesma situação do estudante de Coimbra, aquando dos julgamentos da praxe: Se interpõem recurso da deliberação que os prejudica (4623/96), erram na identificação do acto. Se tivessem interposto recurso da deliberação 33/94 ser-lhes-ia, por um lado impossível, por completa omissão e indefinição da mesma, declarar qual o direito ou interesse que a referida deliberação lhes viola, pelo que a sua pretensão soçobraria por falta de legitimidade activa, sendo que, tendo a deliberação efectivamente recorrida substituído a primeira (4623/96), sempre lhes faltaria o necessário interesse em agir.

  14. Em qualquer dos casos, a tutela jurisdicional efectiva constitucionalmente prometida no art. 20º CRP sempre ficaria por cumprir, pelo também esta norma foi violada na douta decisão recorrida.

  15. A questão da nulidade da deliberação nº 33/94, incidentalmente suscitada nos arts. 21º a 23º da PI e reiterada nos arts. 16º a 18º do articulado de resposta às excepções suscitadas pelo Ministério Público não foi pura e simplesmente abordada. O que corresponde a omissão de pronúncia nos termos da al. d) do nº 1, do art. 668º CPC (versão anterior à reforma de 2013 que aqui é aplicável) e que aqui se invoca.

  16. Quanto à matéria da caducidade da deliberação nº 33/94 invocada pelos recorrentes (cfr. arts. 17º a 20º da P.I.), a douta decisão recorrida, numa primeira linha, parece não conferir qualquer importância ao desfasamento temporal entre a deliberação nº 33/94 que, ainda na douta sentença recorrida, se decidiu licenciar a operação de loteamento (1994) e a emissão do correspondente alvará nº 397/97 (1997).

  17. Porém, ao encontro do que vem sendo decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo: 1 - A caducidade do alvará de loteamento opera pelo simples não exercício do correspondente direito, no prazo legalmente estabelecido, não constituindo, por isso, a notificação do acto declarativo dessa mesma caducidade requisito de eficácia deste acto.

    2 - Nenhuma disposição legal atribui à Administração a faculdade de alterar o regime legal de caducidade resultante do citado preceito legal, em relação ao qual não está prevista qualquer causa suspensiva ou interruptiva.

    3 - O licenciamento do loteamento cuja licença caducou não pode fazer-se por revalidação da licença caducada, mas sempre pela apresentação de um novo projecto de loteamento em relação ao qual sejam ouvidas, de novo, todas as entidades exteriores à Câmara que a lei exige para o licenciamento original, não podendo ser utilizados, sem confirmação, os pareceres que informam o processo da licença caduca.

    4- Tendo já ocorrido a caducidade (...), é patente que qualquer acto da Administração que, ulteriormente, pretendesse ter por objecto um alvará já caducado, necessariamente se traduziria na prática de acto insusceptível de produzir efeitos juridicamente relevantes, uma vez que se trataria, nessa hipótese, de acto cujo objecto seria impossível, por carecer de substracto pessoal, material e jurídico.

    5- II- A Câmara Municipal não pode prorrogar um prazo que caducou, nem fixar regras diferentes das estabelecidas na lei para a respectiva contagem, nem para fixação do momento em que se inicia o prazo de caducidade das licenças de urbanização, o qual é imposto por normas de interesse e ordem pública.

    III- As licenças de loteamento caducadas e os alvarás que as titulam não podem ser prorrogados, mas podem ser renovados por meio de um novo pedido de apreciação e um novo processo em que sejam observadas as regras, formalidades, exigências e consultas próprias do processo que é indicado pela lei como adequado, no momento em que o novo pedido é formulado.

  18. Assim, com referência à deliberação 33/94 foi violada na douta decisão recorrida a norma do art. 27º do DL 448/91.

  19. Se o Tribunal entendia que também a deliberação recorrida (4623/96) havia caducado ao tempo da emissão do alvará nº 397/97, então, salvo melhor opinião, haveria simplesmente de ser dada procedência ao recurso, por diverso fundamento do invocado pelos recorrentes, declarando, também, a caducidade da deliberação nº 4623/96 e de todas as demais e anteriores deliberações mencionadas no alvará».

    Terminam pedindo:

    1. Ser reconhecida...

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