Acórdão nº 01262/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1. O MINISTÉRIO PÚBLICO [MP] interpõe recurso de revista do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul [TCA], datado de 14.05.2015, que negou provimento ao seu recurso da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa [TAC/L], datada de 27.06.2014, que julgara improcedente a sua oposição à aquisição de nacionalidade por parte da moldava A……………..

    Terminou as suas alegações com as conclusões seguintes: 1- O presente recurso de revista vem interposto, pelo autor, Ministério Público, do acórdão do TCA que, negando provimento ao recurso por si interposto da sentença proferida pelo TAC, que considerou improcedente a acção, manteve a mesma e considerou como não verificado o pressuposto de aquisição da nacionalidade, contido na alínea b), do nº1, do artigo 9º da LN, e ainda no nº2 do artigo 56º do RNP, da prática de crime punível com pena de prisão superior a três anos, segundo a lei portuguesa; 2- Considerou o douto acórdão em apreciação, que a aplicação destes dispositivos legais não é automática, pelo que estando «demonstrada a integração da ré na comunidade portuguesa é lícito concluir que não existem factos que evidenciem a sua indesejabilidade enquanto indivíduo inserido na comunidade portuguesa»; 3- A aqui demandada foi condenada em 15.07.2004, pela prática, entre os anos de 2000 e 2002, de um crime de associação criminosa, na pena de 2 anos de prisão, e de um crime de roubo, ambos de natureza transnacional, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, ou seja, em cúmulo jurídico, na pena única de 3 anos e 6 meses de prisão, decisão transitada em julgado em 24.08.2004; 4- Ora, basta, para que seja negada a nacionalidade portuguesa à demandada, o notório desvalor ético-jurídico inerente à prática de várias infracções puníveis, cada uma delas, com pena de prisão igual ou superior a 3 anos, não relevando, para o caso, o facto de a demandada estar, alegadamente, minimamente inserida na sociedade portuguesa por aqui residir, ter constituído família e ter trabalho, como entendeu o douto acórdão em apreciação; 5- Esta questão é comum a todos os casos em que o interessado na nacionalidade portuguesa tenha cometido um crime punível, em abstracto, com a referida pena, mas que o julgador considere que só por si não implica o indeferimento do pedido de aquisição da nacionalidade, ou que em, concreto, tivesse merecido pena inferior à aplicável em abstracto; 6- A jurisprudência da jurisdição administrativa tem-se dividido quanto à aplicação deste requisito, ora considerando a pena aplicada em concreto [ver neste sentido, o AC STA, processo nº76/12, de 05.02.2013, bem como os AC’s do TCAS de 10.07.2014 e de 10.01.2013, processos nºs 08604/12 e 08678/12, respectivamente], ora considerando que a referida pena deve ser considerada em abstracto [ver neste sentido, o AC do STA de 20.03.2014, processo nº01282/13, e AC TCAS de 27.05.2010, processo nº06065/10]; 7- Assim sendo, parece-nos, salvo melhor opinião, que haverá necessidade de definir jurisprudência desse Alto Tribunal que decida a aplicação de um determinado critério aplicável a todas estas situações; 8- O douto acórdão recorrido fez apelo ao circunstancialismo abonatório verificado na altura do pedido de aquisição da nacionalidade, nomeadamente ao cumprimento da pena de prisão em que a demandada foi condenada, portanto também às circunstâncias concretas endógenas e exógenas que rodearam a prática do crime e a sua condenação; 9- Ambos os entendimentos fazem apelo a circunstâncias subjectivas que não vêm previstas nos citados normativos, o qual refere clara e textualmente que «não podem adquirir a nacionalidade portuguesa os estrangeiros que tiverem cometido um crime punível com pena de prisão igual ou superior a três anos»; 10- Da letra da lei, não é possível extrair outra interpretação que não seja a recusa de atribuição da nacionalidade quando o interessado tenha praticado um crime que seja punível na lei portuguesa com pena de prisão igual ou superior a três anos; 11- De contrário, o legislador, por certo, ter-se-ia exprimido noutros termos, prevendo a não atribuição da nacionalidade àqueles que tivessem sido efectivamente punidos com pena de prisão igual ou superior a três anos; 12- Deste modo, a admissão deste recurso de revista é necessária nomeadamente para uma melhor aplicação do direito, por violação clara, pelo acórdão recorrido do disposto na alínea b), do artigo 9º da LN, e no nº2, b), do artigo 56º do RNP; 13- O entendimento no sentido de que o pressuposto contido nos referidos dispositivos legais não pode ser entendido «ipsis verbis», devendo ser atendido só quando a pena efectivamente aplicada for igual ou superior a 3 anos e, mesmo neste caso, considerar necessário que o autor da oposição concretize as razões conducentes à verificação de não ser desejável a pretendida aquisição da nacionalidade, viola os dispositivos legais citados, bem como o disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 9º do Código Civil, na justa medida em que o mesmo não tem na letra da lei o mínimo de correspondência verbal, presumindo-se, assim, que o legislador consagrou a solução mais adequada; 14- Atribuir ao julgador o poder de decidir, em cada caso, se a condenação prevista na lei é ou não relevante, traria, quanto a nós, um factor de incerteza jurídica e de desigualdade não coadunável com a intenção do legislador que considerou que o factor indicador do merecimento de aquisição da nacionalidade portuguesa é, clara e inequivocamente, apenas o não ter praticado nenhum crime punível com pena máxima igual ou superior a 3 anos; 15- A conduta da Administração tem de entender-se, portanto, vinculada, o que significa que não podem ser introduzidos matizes ou gradações no tocante à verificação do requisito, pelo que o autor da acção de oposição não tem que concretizar as razões conducentes à verificação de não ser desejável a pretendida aquisição da nacionalidade; 16- O requisito da não prática de crimes «puníveis» [e não «punidos»] com pena de prisão igual ou superior a 3 anos, foi considerado pelo legislador indicativo da personalidade adequada do interessado na aquisição da nacionalidade portuguesa, sendo, pelo contrário, a prática de algum desses crimes considerado como factor de reconhecida indesejabilidade na medida em que faz pressupor uma personalidade susceptível de vir a causar problemas na sociedade portuguesa; 17- A aquisição da nacionalidade portuguesa a estrangeiros não é um verdadeiro direito mas uma legítima expectativa de atribuição, mas apenas se se verificarem os pressupostos contidos na lei; 18- Mas ainda que fosse um direito, não seria direito absoluto, sofrendo as restrições previstas na lei de cada país, aplicáveis apenas a estrangeiros como permite a última parte do nº2 do artigo 15º da CRP; 19- O direito de mudar de nacionalidade, previsto na segunda parte do nº2 do artigo 15º da Declaração dos Direitos do Homem, é apenas uma declaração de princípios, que será legislado em concreto e regulamentado pelos Estados soberanos, como aconteceu com o Português – ver nº4 do artigo 8º da CRP; 20- Não existe qualquer norma internacional ou constitucional que obrigue o Estado a conceder a nacionalidade a todos os estrangeiros, ou a aplicar a estas normas que atribuem direitos exclusivamente a cidadãos nacionais; 21- Os casos em que não se mostra adequada essa atribuição, em função das opções políticas e dos valores morais e sociais espelhados em lei interna, não podem ser considerados...

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