Acórdão nº 0388/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelANA PAULA LOBO
Data da Resolução18 de Maio de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso JurisdicionalDecisão recorrida – Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé .

12 de Janeiro de 2015Declarou a incompetência material do Tribunal.

Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A………………, Autora, no processo nº 2/15.2BELLE, Acção para Reconhecimento de um Direito ou Interesse Legítimo em Matéria Tributária que deduziu contra o Ministério das Finanças e da Administração Pública, o Ministério da Saúde e o Ministério da Presidência e dos Assuntos Parlamentares, pedindo a declaração de ilegalidade e recusa de aplicação do regime previsto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 59.º-A do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 109/2014, de 10 de Julho, e o reconhecimento de que o regime de regalias e isenções fiscais previstas na Lei n.º 151/99, de 14 de Setembro, em especial a isenção concretizada no artigo 10.º do Código do IRC, não pode ser aplicável à actividade comercial, desenvolvida fora do fim estatutário das entidades do sector social da economia titulares dos alvarás, das farmácias sociais, veio interpôr o presente recurso da sentença supra mencionada, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões: 1. Em 12 de Janeiro de 2015, foi proferida a sentença recorrida, nos termos da qual se considerou o Tribunal a quo materialmente incompetente para decidir a pretensão da Recorrente, de acordo com a motivação que, para maior facilidade, resumidamente se passa a citar: “(…) os tribunais de primeira instância apenas podem proceder à fiscalização sucessiva concreta da constitucionalidade de normas legislativas quando, para permitir a decisão do litígio submetido a julgamento, se pronunciam no caso concreto, sob a conformidade, ou desconformidade, da norma aplicável à Constituição – cfr. os artigos 204.º e 280.º, n.º 1, da Constituição da República.

Estando expressamente «excluída da jurisdição administrativa e fiscal, a apreciação de litígios que tenham por objecto a impugnação de actos praticados no exercício da função política e legislativa» - artigo 4.º, n.º 2, alínea a) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais. (…)”.

  1. Entende a Recorrente que a Sentença recorrida labora em erro de julgamento quanto ao objecto da acção e, consequentemente, nula por omissão de pronúncia quanto aos pedidos concretamente formulados na petição inicial de reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária.

  2. A Sentença recorrida é, ainda, nula por omissão de pronúncia por não ter conhecido do segundo pedido formulado pela Recorrente, sendo que o não conhecimento do primeiro dos pedidos não prejudicava o conhecimento do pedido subsequente, por não se tratar de pedidos dependentes.

  3. No que concerne ao objecto da acção, desconsiderou o douto Tribunal a quo que a presente acção visa garantir aos administrados um meio processual excepcional que lhes permitam, em todas as situações, ter acesso aos tribunais para assegurar os direitos ou interesses legítimos em matéria tributária.

  4. Assim, o objectivo da presente acção é garantir uma tutela judicial dos direitos ou interesses legítimos.

  5. No caso em análise, e como resulta da argumentação exaustivamente apresentada, é inequívoco que o único meio processual disponível à tutela do direito da Recorrente ao princípio constitucional da capacidade contributiva, materializado na igualdade dos contribuintes, isto é, que o pagamento de impostos implique um sacrifício igual para cada um dos contribuintes, é precisamente a acção para reconhecimento de um direito.

  6. Assim, e sendo o presente Recurso norteado pela natureza da acção intentada pela Recorrente, e as suas especificidades, concluir-se-á que a Recorrente não pretende uma fiscalização, sucessiva e abstracta, da constitucionalidade das normas constantes dos n.º s 2 e 3 do artigo 59.º-A do Decreto-Lei nº 307/2007, de 31 de Agosto (na redacção introduzida pelo Decreto-Lei nº 109/2014, de 10 de Julho), mas apenas, o reconhecimento de que, no caso concreto, o conjunto de benefícios fiscais reconhecidos às denominadas Farmácias Sociais, lesa, de modo evidente, o direito constitucional supra exposto.

  7. Como referido supra, a consequência imediata do erro na apreciação dos fundamentos da presente acção, foi o não conhecimento dos pedidos de desaplicação das seguintes normas: i. A recusa da aplicação do regime previsto nos nºs 2 e 3 do artigo 59º-A do Decreto-Lei nº 307/2007, de 31 de Agosto, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei nº 109/2014, de 10 de Julho; (ii) e a recusa de aplicação do regime de regalias e isenções fiscais previstas na Lei nº 151/99, de 14 de Setembro, em especial a isenção concretizada no artigo 10º do Código de IRC.

    ii. Sendo que, caso o Tribunal a quo tivesse apreciado os pedidos formulados pela Recorrente nos moldes melhor expostos supra, em total respeito pelos limites definidos no artigo 4.º, n.º 2 do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (adiante ETAF), certamente que os presentes autos teriam protegido o direito da Recorrente à tutela judicial efectiva.

  8. Ora, o conhecimento destes pedidos de recusa de aplicação não implicam uma análise constitucional que extravase o âmbito dos poderes do Tribunal a quo.

  9. Nessa medida, com vista a garantir a tutela jurisdicional efectiva dos direitos e interesses dos cidadãos, a que alude o artigo 268.º, n.º 4 da CRP, deverá ser conhecida nos termos melhor formulados supra a nulidade da decisão recorrida, por omissão de pronúncia sobre os referidos dois pedidos de recusa de aplicação de normas, suscitadas pela Recorrente.

  10. Impõe-se, portanto, do ponto de vista da Recorrente, que, em cumprimento daquele comando constitucional, seja declarada a nulidade da sentença proferida, promovendo a emanação de outra decisão que contemple a apreciação de todos os pedidos deduzidos pela Recorrente, nomeadamente os pedidos referentes à recusa de aplicação de normas.

  11. Mais entende a Recorrente que o Tribunal a quo omitiu o dever de convite ao aperfeiçoamento do pedido, previsto no artigo 590.º do CPC aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT.

  12. Na verdade, e em linha do entendimento sufragado pelo Supremo Tribunal Administrativo, sempre se invoca que o despacho de indeferimento liminar, dada a sua natureza “radical”, na medida em que coarcta à partida toda e qualquer expectativa de o autor ver a sua pretensão apreciada e julgada, encontrando a sua justificação em motivos de economia processual, deve ser cautelosamente decretado.

  13. Neste sentido, entre muitos outros, os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 15. - Acórdão de 9 de Outubro de 2002, proferido no processo com o n.º 26482; 16. - Acórdão de 4 de Março de 2009, proferido no processo com o n.º 786/07; 17. - Acórdão de 24 de Fevereiro de 2011, proferido no processo com o n.º 765/10.

  14. Impõe-se, assim, a declaração de nulidade da sentença proferida, promovendo a emanação de outra decisão que contemple a apreciação de todos os fundamentos de suscitados pela Recorrente.

  15. Assim, uma vez mais, é possível concluir que, se o Mmº. Juiz a quo tivesse considerado as circunstâncias excepcionais em que a presente acção foi apresentada, certamente teria notificado a Recorrente para vir esclarecer os pedidos por si formulados, evitando-se desse modo, a negação imediata da tutela judicial efectiva que se procurou alcançar.

  16. No que respeita aos erros de direito que entende a Recorrente existir na Sentença recorrida, sublinhe-se o seguinte: 21. Na acção intentada pela Recorrente, estavam em causa, precisamente, pedidos que devem ser reconduzidos a pedidos de fiscalização sucessiva concreta pelo que deveria o Tribunal a quo ter conhecido dos mesmos.

  17. Com efeito, os pedidos foram formulados por referência a direito ou interesse legítimo da própria Autora, ora Recorrente, e não por referência a uma situação abstracta e geral.

  18. Por outras palavras, os pedidos formulados na petição inicial não consubstanciam pedidos correspondentes a pedidos de fiscalização abstracta, com força obrigatória geral, de constitucionalidade, mas antes com efeitos limitados à esfera jurídica da ora Recorrente, através do reconhecimento do seu direito ou interesse legítimo em matéria tributária, ainda que a causa de pedir seja a existência de normas inconstitucionais e de disposições legais violadoras do Direito da União Europeia. Desde logo, contrariamente e pelo prisma defendido pelo Tribunal a quo, não se verifica uma qualquer violação do artigo 204.º, 280.º, n.º 1 e 281.º, todos da CRP, ou do artigo 4.º, n.º 2, alínea a) do ETAF.

  19. Ora, a sentença recorrida padece de erros de direito ao ter levado a cabo uma interpretação do artigo 145.º do CPPT violadora do princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva (artigo 20.º e artigo 268.º, n.º 4, ambos da CRP), assim como do artigo 204.º da Lei Fundamental.

  20. O que a ora Recorrente procurou, através da sua acção de reconhecimento de direito ou interesse legítimo em matéria tributária, correspondente a um meio de plena jurisdição, foi o reconhecimento da sua situação jurídica individualizada.

  21. O...

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