Acórdão nº 0784/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelANA PAULA LOBO
Data da Resolução18 de Maio de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso para uniformização de jurisprudênciaDecisão recorrida – decisão proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa e Fiscal no proc. n.º 831/2014-T em 20 de Maio de 2015.

Acórdão fundamento – acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no processo n.º 01582/13, de 04 de Dezembro de 2013, disponível em www.dgsi.pt 1.

A………….

, notificada da decisão proferida no processo nº 831/2014-T em 20 de Maio de 2015, veio deduzir recurso por oposição de acórdãos invocando oposição com o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no processo n.º 01582/13 em 04 de Dezembro de 2013, pelos fundamentos que se mostram sintetizados nas seguintes conclusões: DOS PRESSUPOSTOS DO RECURSO POR OPOSIÇÃO DE DECISÕES JURISDICIONAIS PREVISTO NO ARTIGO 25.º, N.° 2, DO R.JAT A. Nos termos do artigo 25.°, n.° 2, do RJAT, a decisão recorrida e o acórdão fundamento estão em oposição quanto à mesma questão fundamental de direito: se à alienação de acções por pessoa singular, detidas há mais de doze meses, realizada no ano de 2010, em data anterior a 27 de Julho de 2010, é aplicável o regime tributário das mais-valias mobiliárias introduzido pela Lei n.° 15/2010, de 26 de Julho; B. Com efeito, encontram-se preenchidos os seguintes pressupostos: (i) trânsito em julgado do acórdão fundamento; (ii) prolação das decisões em processos distintos; (iii) identidade de situações fácticas; (iv) existência de um quadro legislativo substancialmente idêntico; (v) necessidade de decisões opostas expressas, e (vi) dissonância da decisão recorrida com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo; C. Segundo pôde a Recorrente apurar junto desse Douto Tribunal ad-quem, o acórdão fundamento, não tendo sido objecto de interposição de recurso jurisdicional, transitou em julgado no mês de Dezembro de 2013. Nestes termos, conclui-se pelo preenchimento do pressuposto (1): trânsito em julgado do acórdão fundamento; D. A decisão recorrida e o acórdão fundamento foram proferidos no âmbito de processos judiciais distintos. A decisão recorrida foi proferida por tribunal arbitral constituído sob a égide do Centro de Arbitragem Administrativa, no âmbito do processo n.° 831/2014-T. Diversamente, o acórdão fundamento foi proferido pela Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito do processo n° 01582/13. Nestes termos, conclui-se pelo preenchimento do pressuposto (ii): prolação da decisão recorrida e do acórdão fundamento em processos distintos; E. O cenário jurídico-normativo subjacente à decisão recorrida e ao acórdão fundamento é substancialmente idêntico — em ambos, o sujeito passivo reagiu contenciosamente de liquidação adicional de IRS, relativa ao ano de 2010, resultante da aplicação pelos serviços da Administração Tributária do regime tributário das mais-valias mobiliárias introduzido pela Lei n.° 15/2010, de 26 de Julho, aos ganhos obtidos nesse mesmo ano, provenientes da alienação de acções, detidas há mais de doze meses, realizada em data anterior a 27 de Julho de 2010. Nestes termos, conclui-se pelo preenchimento do pressuposto (iii): identidade das situações fácticas; F. Quer a decisão recorrida quer o acórdão fundamento discutem a aplicação do regime tributário das mais-valias mobiliárias introduzido pela Lei n.° 15/2010, de 26 de Julho, divergindo relativamente à sua aplicação no caso concreto. Nestes termos, conclui-se pelo preenchimento do pressuposto (iv): existência de um quadro legislativo substancialmente idêntico; G. As decisões jurisdicionais em presença são diametralmente opostas, determinando a ocorrência do relevante facto tributário por referência a preceitos legais distintos (artigos 43.º, n.º 1, 72.º, n.° 4, e 143.º do CIRS vs. artigo 10.º, n.º 3 do CIRS), aplicando, por via disso, regimes tributários igualmente distintos (artigo 1.º da Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho, o qual revogou o artigo 10.º, n.º 2, do CIRS vs.. artigo 10.º, n.° 2, do CIRS, na redacção anterior à Lei n.° 15/2010, de 26 de Julho). Nestes termos, conclui-se pelo preenchimento do pressuposto iv): necessidade de decisões opostas expressas; H. Desconhece a Recorrente existir jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo consonante com o sentido decisório perfilhado pelo Douto Tribunal a quo no âmbito da decisão recorrida. Nestes termos, conclui-se pelo preenchimento do pressuposto (vi): dissonância da decisão recorrida com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo; I. Em face do exposto, entende a Recorrente ter cabalmente demonstrado existir oposição entre a decisão recorrida e o acórdão fundamento, quanto à mesma questão fundamental de direito, encontrando-se plenamente preenchidos os pressupostos conducentes à admissão do presente recurso jurisdicional; J. Em consequência, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que julgue verificada a referida oposição entre as decisões jurisdicionais em apreço, com os inerentes efeitos legais.

DA INFRACÇÃO IMPUTADA À DECISÃO RECORRIDA K. O âmago dos presentes autos prende-se com a aplicação concorrencial de dois regimes de tributação das mais-valias mobiliárias distintos: o regime resultante do Decreto-Lei n.° 228/2002, de 31 de Outubro vs. o regime decorrente da Lei n.° 15/2010, de 26 de Julho; L. Em concreto, importa determinar o regime aplicável: se a delimitação negativa da incidência de IRS sobre as mais- valias mobiliárias resultantes da alienação de acções detidas pelo respectivo titular durante mais de 12 meses, nos termos do artigo 10.º, n.° 2, alínea a), do CIRS, na redacção do Decreto-Lei n.° 228/2002, de 31 de Outubro; se a norma geral de incidência consagrada no artigo 10.º, n.° 1, alínea b), do CIRS, na redacção da Lei n.° 15/2010, de 26 de Julho, tributando as referidas mais-valias à taxa especial de 20% sobre o respectivo saldo anual positivo, sendo o respectivo englobamento meramente facultativo, nos termos dos artigos 22.º, n.º 3, e 72.º, n.° 4, do CIRS; M. Determinando o artigo 10.º, n.º 3, do CIRS, que «os ganhos consideram-se obtidos no momento da prática dos actos previstos no n.° 1 [do mesmo preceito legal] [nomeadamente, no momento da alienação das participações sociais]», o relevante facto tributário ocorreu a 15 de Janeiro de 2010, aquando da venda das acções; N. Tal facto tributário tem carácter instantâneo, esgotando-se na realização da mais-valia mobiliária; O. Não assiste pois razão ao Douto Tribunal a quo quando extraí da aplicação conjugada dos artigos 43.º, n.º 1, 72.º, n.° 4, e 143º do CIRS, ter o facto tributário relevante ocorrido a 31 de Dezembro de 2010. Estas normas concorrem para a determinação da matéria colectável em sede de IRS mas já não para o apuramento do facto tributário propriamente dito; P. Tendo o facto tributário ocorrido a 15 de Janeiro de 2010, por força do artigo 12.°, n.° 1, da LGT, e na medida em que a Lei n.° 15/2010, de 26 de Julho, não previu qualquer disposição especial quanto à sua aplicação no tempo, é aplicável o artigo 10.º, n° 2, alínea a), do CIRS, na redacção do Decreto-Lei n.° 228/2002, de 31 de Outubro, pelo que os ganhos obtidos pela Recorrente encontram-se necessariamente excluídos de tributação em sede de IRS; Q. A adopção de entendimento distinto, consonante com a posição perfilhada pelo Douto Tribunal a quo no âmbito da decisão recorrida, bule necessária e inadmissivelmente com o princípio da proibição da retroactividade em matéria tributária previsto nos artigos 103°, n.° 3, da CRP, e 12.°, n.° 1, da LGT; R. Por tudo quanto ficou exposto, entende a Recorrente padecer o sentido decisório perfilhado pelo Douto Tribunal a quo na decisão recorrida de erro sobre os pressupostos de direito, assente na preterição do regime ínsito no artigo 10.º, n.º2, alínea a), e 3, do CIRS, na redacção do Decreto-Lei n.° 228/2002, de 31 de Outubro, e, consequentemente, na violação do princípio da proibição da retroactividade em matéria tributária previsto nos artigos 103.°, n.° 3, da CRP, e 12.°, n.° 1, da LGT; S. Não obstante, a aplicação da Lei n.° 15/2010, de 26 de Julho, no âmbito dos presentes autos, encerra igualmente uma violação do artigo 1.º do Protocolo Adicional à Convenção Europeia dos Direitos do Homem; T. O artigo 1° do Protocolo Adicional à Convenção Europeia dos Direitos do Homem consagra um direito subjectivo a favor dos particulares: o direito à não ingerência ilegal do Estado na sua propriedade privada, tutelando o património de um particular afectado por uma liquidação de imposto ilegal; U. No presente caso, é manifesta a ingerência da tributação em causa no direito de propriedade da Recorrente, tal como é inequívoco o seu carácter excessivo decorrente da aplicação retroactiva da Lei n.° 15/2010, de 26 de Julho, à alienação das acções em apreço, ocorrida quando a existência de tal lei se não perspectivava minimamente sequer — não existindo qualquer anúncio público que a prenunciasse —, não podendo pois a mesma ser considerada como revestindo a qualidade de lei necessária à compatibilidade da tributação por ela determinada com a protecção da propriedade privada consagrada no artigo 1° do Protocolo Adicional à Convenção Europeia dos Direitos do Homem; V. Tudo ponderado, resulta inequívoco que a aplicação retroactiva da Lei n.° 15/2010, de 26 de Julho, às mais-valias realizadas pela Recorrente com a alienação das acções acima referidas, atenta a manifesta desproporcionalidade entre o interesse público nessa aplicação e a necessidade de salvaguardar os direitos individuais da Recorrente e, bem assim, a falta de capacidade ordenadora inerente à eficácia retroactiva daquela lei, se revela contrária ao artigo 1.º do -Protocolo Adicional à Convenção Europeia dos Direitos do Homem; W. Por outro lado, no cenário desse Douto Tribunal ad quem entender estar-se perante um facto tributário complexo de formação sucessiva — hipótese que se admite, embora sem conceder, por mera cautela de patrocínio —, por força do regime ínsito...

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