Acórdão nº 0344/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução12 de Maio de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1.

    O MUNICÍPIO DE CANTANHEDE [MC] interpõe recurso de revista do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte [TCAN], em 20.11.2014, que negou provimento ao recurso de apelação que ele interpusera da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra [TAF/Coimbra] que o condenou a pagar à A………………., Lda.

    [A………..], a quantia de 70.093,68€, acrescida de juros vincendos sobre o valor do capital em dívida, à taxa legal a cada momento aplicável, desde a citação até integral pagamento.

    Conclui assim as suas alegações de revista: A) Nos presentes autos, foi a acção julgada procedente e negado provimento ao recurso, com o fundamento em que a condenação do ora recorrente se baseia em trabalhos efectuados e também que, por essa razão, não se pode invocar a excepção de não cumprimento do contrato e que, em todo o caso, essa excepção já não pode ser invocada porque o contrato de empreitada foi resolvido com fundamento naquelas quantias que não foram pagas; B) No caso concreto, a questão é a de saber se existindo fundamento para a invocação da excepção de não cumprimento do contrato, por não realização da empreitada, podia a empreiteira resolver o contrato de empreitada com fundamento na falta de pagamento de facturas; C) Nos termos do artigo 150º, nº1 do CPTA, «Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito»; D) Temos assim dois requisitos alternativos que fundamentam a interposição deste tipo de recurso: a) Questão que pela sua relevância jurídica ou social se revista de importância fundamental; b) Necessidade clara de admissão do recurso para melhor aplicação do direito; E) Dos fundamentos do presente recurso e constantes da decisão recorrida resulta, desde logo, que se está perante uma questão factual e jurídica controversa, de relevância fundamental e que justifica, necessariamente, uma melhor apreciação do direito; F) A necessidade de recurso concretiza-se, assim: «O recurso será claramente necessário quando sobre um instituto de aplicação frequente exista dúvida séria e instalada na jurisprudência atinente a aspectos essenciais das condições de exercício […] ou sobre o verdadeiro conteúdo de um direito [...]»; G) A enunciada questão juridicamente controversa levanta-se não só na presente acção, como em possíveis outras acções que venham a ser interpostas com o mesmo fundamento, estando-se, assim, perante uma questão cuja expansão e controvérsia se reveste de importância fundamental pela sua relevância jurídica sendo ainda, como já referido, claramente necessária a uma melhor aplicação do direito, face à interpretação da letra e do espírito do direito aplicável ao caso, motivo pelo qual se justifica, a nosso ver, e salvo melhor opinião, uma reapreciação excepcional por esse Venerando Tribunal, que fixe uma interpretação que assegure a melhor aplicação do direito a todos os casos semelhantes, conforme se irá explanar em seguida; H) Ora, entende o ora recorrente que estão preenchidos os requisitos da relevância jurídica ou social fundamental previstos no artigo 150º CPTA, razão pela qual interpõe o presente recurso; I) Considera o ora recorrente que é MATÉRIA DE RELEVÂNCIA JURÍDICA OU SOCIAL DE IMPORTÂNCIA FUNDAMENTAL que seja definido de forma clara e inequívoca se existindo fundamento para a invocação da excepção de não cumprimento do contrato, por não realização da empreitada, podia a empreiteira resolver o contrato de empreitada com fundamento na falta de pagamento de facturas vencidas e referentes à mesma empreitada, havendo o propósito firme de a não acabar, pelas razões por ele expressas no seu pedido de revisão dos preços, dado como provado no oficio remetido pela autora ao réu e dado como provado na alínea DD) dos factos assentes; J) Do contrato de empreitada resultam obrigações para ambas as partes e não cumprindo o empreiteiro a sua parte da empreitada, entende a ora recorrente que pode reter os pagamentos devidos à contraparte, se a mesma não cumprir as suas obrigações contratuais; K) Por isso, a questão colocada no recurso jurisdicional e decidida pelo Tribunal de 2ª Instância é que a ora requerente a de saber se «A ENTIDADE ADJUDICANTE NÃO PODE INVOCAR A EXCEPÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO DO CONTRATO COMO EXCEPÇÃO A UMA RESOLUÇÃO COM FUNDAMENTO NA FALTA DE PAGAMENTO DE FACTURAS VENCIDAS, em especial se ESSA EXCEPÇÃO JÁ NÃO PODE SER INVOCADA PORQUE O CONTRATO DE EMPREITADA FOI RESOLVIDO COM FUNDAMENTO NAQUELAS FACTURAS NÃO PAGAS»; L) Dado que esta questão não foi tratada ainda em qualquer decisão judicial que o ora recorrente conheça ou, pelo menos, tenha encontrado, razão pela qual interpõe este recurso, deve o presente recurso ser recebido como RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL; M) Estamos perante um caso que seria um excesso de pronúncia, pois o que está pedido não é que seja declarada a validade da resolução, mas apenas e tão só perante um pedido de condenação do réu a pagar as facturas e perante tal pedido coloca-se a questão de quem pode exigir esse pagamento, se a empresa de factoring, se o credor originário; N) A respeito da excepção de não cumprimento do contrato, desde logo não é necessário a dedução de reconvenção, pois que, estando em causa uma mera acção de condenação no pagamento de um crédito emergente de um contrato de empreitada, o réu para fazer valer a referida excepção de não cumprimento do contrato, não precisava de deduzir qualquer reconvenção; O) Porque, como se refere no artigo 274º, nº1 do CPC, o réu pode, ou seja, tem a faculdade de deduzir pedido reconvencional contra o autor, pelo que a reconvenção é facultativa e porque, como foi decidido pelo AC do STJ de 15.10.1980, in BMJ 300, página 364, «A excepção do não cumprimento do contrato [artigo 428º] constitui uma excepção dilatória de direito material, que, por isso, não deve ser deduzida através de reconvenção»; P) Refere-se que «não ficou demonstrado, nem foi sequer alegado que a autora tivesse incumprido ou cumprido defeituosamente os trabalhos objecto da facturação em dívida», pelo que a excepção de não cumprimento só pode colocar-se quando exista comportamento defeituoso da obrigação; Q) Não é esse o entendimento da jurisprudência, pois «a doutrina, tanto a contemporânea do Código de Seabra, como a actual, sustentam que também no caso de cumprimento defeituoso ou do não cumprimento parcial o contraente pode recusar a sua prestação, enquanto a outra não for rectificada ou completada: a excepção toma, nestes casos, a designação de exceptio non rite adimpleti contractus. Nesta hipótese, porém, há que ter muito em atenção o princípio básico da boa-fé no cumprimento das obrigações, hoje expresso o nº2 do artigo 761º do CC actual, e que já anteriormente era admitido entre nós» [AC do STJ de 09.12.1982, no BMJ, 322-321] e, nos presentes autos, estamos perante a primeira situação, ou seja, de incumprimento parcial; R) Verificada a possibilidade de aplicar ao presente caso a exceptio non adimpleti contractus, por se estar perante uma situação de incumprimento parcial, há que verificar os requisitos da aplicação do artigo 428º do CC, que são a prestação do réu é posterior à da autora e o a autora não cumpriu as obrigações principais emergentes do contrato; S) Quanto ao primeiro requisito, é evidente que a autora teria de cumprir as obrigações emergentes do contrato, dado como assente na alínea B) dos factos assentes, no prazo de 60 dias após a consignação, que ocorreu em 12.07.2009 [resposta ao quesito 1º], prazo esse que foi prorrogado até 11.11.2009 [alínea H) dos factos assentes] e a primeira factura emitida pela autora apenas se venceu em 06.11.2009 [alínea J) dos factos assentes], ou seja, a obrigação da autora vencia-se antes da obrigação do réu; T) Só o réu tinha legitimidade para invocar a referida excepção, porque «nos contratos bilaterais, havendo prazos diferentes nas prestações, a “exceptio” só pode ser oposta pelo que devia cumprir em segundo lugar» [AC da RC de 06.07.1982, in CJ, 1982, tomo 4, página 35] - ver, no mesmo sentido, José João Abrantes, «A excepção...

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