Acórdão nº 1329/11.8TVLSB.L1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA ADELAIDE DOMINGOS
Data da Resolução18 de Novembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa I – RELATÓRIO Na sequência do decretamento do procedimento cautelar não especificado, os ali requerentes, NG e NC vieram instaurar ação declarativa condenatória, sob a forma de processo ordinário, contra os ali requeridos RP e Editora CC, pedindo a condenação dos réus, nos seguintes termos:

  1. A retirarem do mercado todos os exemplares do livro “P...”; b) A pagarem a quantia de €50,00, a título de sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso na retirada dos exemplares do livro “P...

    ” do mercado; c) A entregarem à autora NZ os suportes de imagem e reproduções utilizados na edição e reprodução do livro “P...

    ”, relacionados com a sua obra e a obra de JV; d) A entregarem ao autor NC os suportes de imagem e reproduções utilizados na edição e reprodução do livro “P...

    ”, relacionados com a sua obra; e) A nunca mais utilizarem qualquer das imagens constantes nos referidos suportes, sem a prévia e escrita autorização dos autores, no que respeita às respetivas obras; f) A pagarem ao autor NC a importância de €2.000,00, acrescida de juros à taxa legal em vigor, desde o dia 14/05/2004, acrescida de IVA; g) A pagarem ao autor NC a importância de €3.000,00, acrescida de juros à taxa legal em vigor, desde o dia da citação da Providência Cautelar, acrescida de IVA; h) A pagarem à autora NZ, a importância de €43.000,00, acrescida de juros à taxa legal em vigor, desde o dia da citação da Providência Cautelar, acrescida de IVA; i) A pagarem aos autores, a título de honorários para a sua mandatária, a importância de €10.000,00, acrescida de juros à taxa legal em vigor, desde o dia da citação da presente ação, acrescida de IVA.

    Peticionaram ainda a publicidade da sentença nos termos do artigo 211º-A do Código de Direitos de Autor e Direitos Conexos (CDADC).

    Para fundamentarem a sua pretensão, alegaram, em síntese, o seguinte: A autora, reputada escultora, realizou uma exposição intitulada “NZ a mulher e o sagrado”, tendo sido elaborado um catálogo de apoio à mesma, onde estão inseridas algumas reproduções fotográficas das obras expostas e das constantes do vídeo que integrava a exposição e, ainda, uma fotografia da escultora.

    Um dos textos que integra o catálogo foi escrito, expressamente para este efeito, pelo réu RP.

    A autora também é herdeira universal do escultor JV e, nessa qualidade, doou à Câmara Municipal de ...um conjunto de esculturas e um conjunto de desenhos da autoria do mesmo.

    O autor NC, fotógrafo de renome, realizou uma exposição intitulada “NC viagem ao sul”, tendo sido elaborado um catálogo de apoio à mesma, onde estão inseridas reproduções das obras expostas feitas pelo próprio, bem como um texto escrito, também expressamente para este efeito, pelo réu RP.

    Em Novembro de 2010, os autores tomaram conhecimento da edição do livro “P...” da autoria do réu RP e editado pela ré CC, o qual se encontrava à venda pelo preço de €29,50.

    Nesse livro, os réus, sem autorização dos autores, utilizaram a reprodução de obras dos autores expostas nas referidas exposições.

    Assim, do autor NC utilizaram a reprodução de seis fotografias, e da autora NZ, utilizaram 46 reproduções das obras expostas na mencionada exposição.

    Utilizaram, ainda, no mesmo livro “pensar-te”, e sem autorização da autora, reproduções de 18 esculturas e de 2 desenhos do escultor JV e, ainda, 1 fotografia de uma sala em cuja parede se encontram diversas reproduções de obras do referido escultor inseridas no livro comemorativo dos 10 anos do Museu JV.

    O réu RP utilizou, ainda, sem autorização do autor NC, duas imagens de obras do autor, que publicou no “LMD”, versão portuguesa.

    O réu RP deu às ditas reproduções um contexto diferente da que tinham originalmente, adulterando-as, atentando contra a genuinidade e integridade das obras, tendo como finalidade a comercialização do livro "P..." em benefício exclusivo do autor do livro e da editora, com prejuízos dos direitos dos autores, nos moldes em que se consubstanciam os pedidos formulados.

    Contestaram os réus.

    O réu RP defendeu, no que ora releva, que foi autorizado pela edilidade donatária a usar o material referente às obras de JV.

    O livro “P...” é uma obra de análise e divulgação artística no campo específico da arte contemporânea, sem natureza comercial.

    Foi autorizado o uso dos suportes digitais das reproduções das obras efetuadas no “LMD”.

    Os autores autorizaram a utilização das reproduções das suas obras.

    Não houve qualquer adulteração da obra dos autores.

    Os autores não sofreram qualquer dano, antes tiveram benefício com a atuação do réu.

    Concluiu pela improcedência da ação.

    Por sua vez, a ré CC alegou, no que ora releva, que os catálogos não foram apenas elaborados para as exposições dos autores em referência nos autos, mas também para servir de estudo e divulgação da obra dos mesmos.

    O livro “P...” destina-se à promoção, divulgação, análise e ensino da Arte Contemporânea.

    Todos os intervenientes na preparação e edição do livro aceitaram participar no processo sem qualquer contrapartida monetária.

    O autor NC teve conhecimento da publicação das imagens das suas obras no “LMD”.

    A autora NZ doou ao Município de B… o espólio constituído pelas obras do escultor JV, pelo que os direitos de autor das obras em causa pertencem ao Município.

    Os réus não violaram os direitos de autor, tendo o réu na elaboração do livro seguido os mesmos procedimentos que seguiu na elaboração dos catálogos, na edição do “LMD” e na elaboração do livro “... ... B…”.

    Em todas as situações existiu consentimento tácito.

    Os autores atuam em manifesto abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.

    No mais, impugnou os danos invocados pelos autores e concluiu improcedência da ação.

    Foi apresentada réplica.

    Após ter sido elaborado despacho saneador e fixada a matéria de facto, procedeu-se a julgamento.

    Foi proferida sentença, em 29/01/2014, que julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, decidiu do seguinte modo: “1- condeno os RR.: a) a retirarem do mercado todos os exemplares do livro P..., no prazo de 10 dias; b) no pagamento da quantia de €50,00, a título de sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso na retirada dos exemplares do livro P... do mercado; c) a entregarem à A. NZ os suportes de imagem e reproduções utilizados na edição e reprodução do livro P..., relacionados com a sua obra e a obra de JV; d) a entregarem ao A. NC os suportes de imagem e reproduções utilizados na edição e reprodução do livro P..., relacionados com a sua obra; e) a pagarem ao A. NC a quantia de €2.800, acrescida de juros à taxa de 4% ao ano, a contar da citação para a presente acção; f) a pagarem à A. NZ a quantia de €5.000, acrescida de juros à taxa de 4% ao ano, a contar da citação para a presente acção e 2- absolvo os mesmos do mais que era peticionado.

    Nos termos do disposto no artigo 211º-A do CDADC, determino a publicidade da presente sentença, publicidade essa a ter lugar através da publicação por extracto num dos três jornais mais lidos a nível nacional.” Inconformados, apelaram os dois réus, apresentando as conclusões infra transcritas, pedindo a revogação da sentença e a sua absolvição do peticionado.

    Contra-alegaram os autores, pugnando pela confirmação do julgado.

    O recurso foia admitido conforme despacho de fls. 593.

    Conclusões da apelação (do apelante RP): 1.ª O ora recorrente não procedeu à utilização de obras, nos termos em que o consigna o artigo 40º, alínea a) do CDA, pois apenas está adquirido que usou imagens dessas obras como forma citação ilustrativa de afirmações que produziu em textos de opinião e crítica artística de sua autoria, pelo que a sentença enferma de erro de Direito por violação do artigo citado ao assumir que se está perante uma “utilização de obra”, pelo que a sentença enferma de erro de Direito por violação do citado artigo 40º do CDA quando o interpreta e aplica no caso como se de uma utilização de obra se tratasse; 2.ª Ora (i) dada a relação pretérita entre os Autores e o Réu, no que se refere à produção de catálogos relativos a exposições de obras destes, complementadas então com textos de apresentação crítica do ora recorrente em que não se colocou a questão da autorização escrita para o efeito do uso nessas obras das imagens respectivas das obras expostas (ii) dada a natureza do livro “...”, de promoção da cultura e divulgação da arte contemporânea (iii) e visto, enfim, o facto de as imagens desse livro serem as desses catálogos bem como os textos respectivos do ora recorrente (iv) é de concluir que existia uma autorização tácita para que as imagens em causa pudessem ser usadas pelo ora recorrente (artigo 217º do CCv, nomeadamente o n.º 2) sem necessidade de uma autorização formal nesse sentido (v) e, a haver sanção pela omissão da forma escrita para a autorização em causa, nos termos do artigo 41º, n.º 2 do CDA, ela não será a nulidade prevista no artigo 220º do CCv, mas, pois que o CDA prevê expressamente no seu artigo 211º outra sanção, no caso a responsabilidade civil, a existir (vi) recaindo os Autores na actuação em má-fé, por se tentarem prevalecer agora de uma “autorização escrita” que nunca exigiram quando tiraram benefício do trabalho do ora recorrente com o uso das mesmas imagens em catálogos atinentes às exposições que efectuaram, pelo que a sentença enferma de erro de Direito por violação dos artigos 217º, 220º e 334º do CCv e 220º do CDA.

    1. O uso pelo ora recorrente no livro “P…” da reprodução de imagens de obras dos Autores visou, instrumentalmente, citar quanto era necessário para o objectivo de exemplificar e legitimar as suas asserções de análise crítica relativamente àquelas obras, valorizando-as de modo a permitir fins públicos de divulgação cultural e de promoção dos citados, tudo dentro dos limites consentidos pelo artigo 75º, n.º 2, alínea g) do CDA, interpretado nos termos do artigo 9º do CCv, ou, caso estejamos ante lacuna de previsão...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT