Acórdão nº 1143/06.2TBCLD.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 02 de Outubro de 2014
Magistrado Responsável | ONDINA CARMO ALVES |
Data da Resolução | 02 de Outubro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA RELATÓRIO LUÍSA -----------, residente em ---------, e MANUELA -----, residente em --------, intentaram contra LUÍS ------------ e LURDES --------, residentes em -------------, acção declarativa sob a forma de processo comum ordinário, através da qual pedem a condenação dos réus à demolição da construção que efectuaram, em parte, no imóvel das autoras, descrito sob o nº 02915/…, da freguesia de -----, concelho de -----, que correspondia ao seu logradouro, e à sua reposição no estado anterior a tal obra, ou se não se julgar assim, pedem a condenação no pagamento de indemnização dos danos causados e do ilícito enriquecimento com a usurpação, calculada por valor global não inferior a € 247.356,66, pela depreciação da parte restante, e ao lucro proporcionalmente obtido com a construção efectuada, acrescido de juros moratórios à taxa legal em vigor, desde a data da citação.
Fundamentaram as autoras, no essencial, esta sua pretensão da seguinte forma: 1. As autoras são as únicas herdeiras de seus pais, A.Alves ---- e Gertrudes --------.
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A mãe das autoras faleceu no dia --/---/---, no estado de viúva.
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A herança deixada pelos pais das autoras integra um prédio urbano sito na Rua -----, freguesia de -----, concelho de ---, descrito sob o nº 02915/-----, daquela freguesia e concelho.
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O prédio é composto por uma casa de habitação e, no exterior desta, em construção autónoma e separada, existe, há mais de 90 anos, uma «casa de forno», de cozer pão, e confinando com a parte traseira da dita «casa de forno» existia, até 2004, um logradouro com a área de 85 m2 de área, em forma retangular, que confrontava, a norte e a poente, com a estrada, e onde atualmente se encontra instalada parte de uma nova construção.
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As autoras, seus pais e avós, sempre usaram e possuíram, desde há mais de 90 anos, de modo exclusivo, de forma pública e sem oposição de quem quer que fosse, o imóvel em causa, integrado pelo referido logradouro, usado para arrumos diversos.
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O logradouro em causa confrontava, a norte, com o caminho que é a atual estrada, e a sul, com um outro terreno em forma de declive, e que lhe ficava superior, terreno este que, pelo menos até meados dos anos 50, era um baldio.
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O dito terreno rústico, situado a sul do logradouro, encontra-se inscrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 00974/----, da freguesia de ------, concelho de ------, ali constando como tendo a área de 143 m2, e está registado em nome dos réus desde 7 de fevereiro de 2001.
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Tal imóvel teve como primeiro titular, António -----, tendo sido por este arrematado, como terreno baldio que era então, por escritura de 23 de dezembro de 1957, encontrando-se descrito no referido título como tendo aquela a área e «sem qualquer utilidade comum».
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Nessa escritura, o referido prédio aparece identificado como «confrontando a Norte com A.Alves ----, o pai dos ora AA.», ou seja, com o prédio urbano sito na Rua -----, freguesia de ----, concelho de ----, descrito sob o nº 02915/-----, daquela freguesia e concelho.
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Tal significa que já em 1957 o acima referido logradouro era tido como parte integrante do imóvel que agora é das autoras.
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Sucede que, no ano de 2004, os réus construíram no terreno de que são donos, uma moradia, a qual, no entanto, ocupa 83,90 m2 do supra referido logradouro pertença das autoras, o que fizeram deliberada e dolosamente, bem sabendo que o mesmo era pertença das autoras.
Citados, os réus apresentaram contestação, na qual alegaram, em síntese: 1. É completamente falso que na traseira da “casa do forno” tenha existido, até 2004, um logradouro ou qualquer outro espaço pertencente ao prédio das autoras.
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O prédio das autoras, cujo limite era a traseira do muro da “casa do forno”, em linha reta e no seguimento de tal muro até à Rua do Talefe, sempre confrontou, e confronta, a sul, com o prédio dos réus.
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Nunca, a sul da traseira do muro da “casa do forno”, existiu qualquer logradouro ou espaço pertencente ao prédio das autoras.
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Todo o terreno que aí existia antes da construção efetuada pelos réus, sempre pertenceu aos seus antepassados, e pertence-lhes presentemente a eles.
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A construção erigida pelos réus no seu prédio valorizou o prédio das autoras.
Deduziram ainda os réus, reconvenção, na qual pediram a condenação das autoras/reconvindas a reconhecer os reconvintes como donos e legítimos possuidores do prédio descrito no artigo 21 da contestação e que tal prédio confina com a traseira da “casa do forno” das reconvindas e linha recta no seguimento deste até à Rua do Talefe, por o terem adquirido por usucapião e ainda que a construção da moradia dos reconvintes foi efectuada totalmente no prédio atrás referido.
Mais pediram os réus que, se assim se não entender, deveria ser julgado procedente por provado o pedido reconvencional deduzido pelos reconvintes contra as reconvindas e José ------ e ordenada a transferência para os reconvintes da faixa de terreno que vier a verificar-se ter sido ocupada pelos reconvintes com a construção efectuada, por acessão industrial imobiliária, declarando os reconvintes como únicos donos e legítimos possuidores da área de terreno que eventualmente venha a ser declarada ocupada pelos reconvintes com tal construção, devendo em consequência de tal, os reconvintes ser condenados a pagar às reconvindas e José -------- o valor que vier a ser fixado por este Tribunal, a título de indemnização às reconvindas, e ao chamado.
Além disso, consideraram os réus que as autoras litigam de má fé, pelo que pediram a sua condenação em multa e indemnização a liquidar em execução de sentença.
Na contestação, os réus deduziram ainda o incidente de intervenção principal provocada de José -------, casado com a 2ª autora no regime da comunhão geral de bens, «a fim de acautelar o efeito útil da presente ação», sendo «necessária a sua intervenção para o caso de procedência do pedido reconvencional dado o pedido afetar o direito do ora chamado».
Em réplica, as autoras deduziram oposição ao chamamento de José --------- e pugnaram pela improcedência da reconvenção, com a sua consequente absolvição dos pedidos reconvencionais bom como da sua condenação em multa e indemnização por litigância de má-fé.
Também na réplica as autoras procedem à ampliação do pedido, o que fazeram nos seguintes termos: «Deve admitir-se a ampliação dos pedidos das AA., no sentido de lhes ser reconhecido o direito de propriedade, adquirido por sucessão em posse e usucapião de seus pais e avós, sobre o terreno correspondente a pelo menos cerca de 83,90 m2, o qual constituía, a parte por debaixo do imóvel 00974 da freguesia de -----, confrontando a sul com esta e a norte e poente com a estrada principal, e esteve, há mais de 90 anos, consecutiva e ininterruptamente, até 2004, como logradouro do imóvel nº 02915, das ora AA.».
Ainda no mesmo articulado, as autoras pediram a condenação dos réus, como litigantes de má, «em multa, e na indemnização desde já liquidada de € 5.000,00 e no demais que até final se liquidar».
Os réus apresentaram articulado de tréplica, no qual defenderam o indeferimento da ampliação do pedido formulada pelas autoras e pela sua absolvição do pedido de condenação em multa e indemnização por litigância de má fé.
Pediram ainda os réus a rectificação do primeiro pedido subsidiário de forma a que «a seguir à Rua da ----, onde consta, por o terem adquirido por usucapião, passe a constar: “Por o terem adquirido por escritura de compra e venda e ainda por usucapião por si e seus antepassados”.
Foi admitido o incidente de intervenção principal provocada de José --------, o qual, citado, não deduziu contestação. Foi igualmente admitida a rectificação ao primeiro pedido subsidiário, pretendida pelos réus.
Proferido o despacho saneador, elaborada a condensação com a fixação dos Factos Assentes e a organização da Base Instrutória, foi levada a efeito a audiência de discussão e julgamento, após o que o Tribunal a quo proferiu decisão, constando o Dispositivo da Sentença, o seguinte: Por todo o exposto, nesta ação intentada por Luísa ------ e Manuela ------, contra Luís ------ e Lurdes -------, e em que é interveniente principal, José -----, casado com a 2ª autora no regime da comunhão geral de bens, na qual os réus deduziram reconvenção contra as autoras e contra o chamado: 5.1 – Quanto à ação: 5.1.1 – declaro adquirido, por usucapião, o direito de propriedade das autoras sobre a faixa de terreno identificada em 14. e 22. da fundamentação de facto; 5.1.2 – condeno os réus: 5.1.2.1 – a demolirem a parte da moradia referida em 12., 13., 15. e 24. Da fundamentação de facto, que incorporaram na faixa de terreno identificada em 5.1.1; 5.1.2.2 – a reporem a faixa de terreno identificada em 5.1.1, no estado em que a mesma se encontrava antes de nela terem iniciado as obras de incorporação de parte da moradia referida em 5.1.2.; 5.2 – Quanto à reconvenção: 5.2.1 – reconheço os réus como proprietários do prédio identificado em 6. Da fundamentação de facto, ou seja, o terreno rústico descrito na Conservatória do Registo Predial, sob o nº 00974/------, da freguesia de ------, Concelho de -----, com a área de 143 m2 que se encontra registado em nome dos réus, desde 7 de fevereiro de 2001, por o terem adquirido por usucapião, prédio esse que confina a norte com a faixa de terreno das autoras identificada em 14. e 22. da fundamentação de facto e com «o espaço existente mencionado em 22. A), que fica em linha reta no seguimento do muro da traseira da “casa do forno” até à rua do Talefe»; 5.2.2 – absolvo as autoras e o interveniente principal de tudo o mais que contra eles é pedido pelos réus em sede reconvencional.
5.3 – Quanto à litigância de má fé: Considero não haver lugar à condenação de qualquer das partes por litigância de má fé.
Inconformados com o assim decidido, os réus/ reconvintes interpuseram recurso de apelação, relativamente à sentença prolatada.
São as...
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