Acórdão nº 193/06.3TBHRT.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 04 de Dezembro de 2014
Magistrado Responsável | TERESA PRAZERES PAIS |
Data da Resolução | 04 de Dezembro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa M… e marido G… intentaram a presente acção declarativa de condenação contra D….e mulher S…. alegando , em síntese , que são proprietários de um prédio urbano onde construíram a sua habitação, prédio esse que identificam, o qual adquiriram por doação dos pais da autora mulher e provém de destaque de um prédio.
Os réus, por seu lado, são proprietários de um prédio, que identificam, e que fica para além do prédio dos autores e mesmo além daquele de onde foi destacada o dos autores .
Mais alegaram que o réu marido explora o prédio dos pais , de onde foi destacado o dos autores, onde tem vacas a pastar sendo que, para transportar bens e/ou equipamentos, passa pelo prédio dos autores sem que tenha autorização para tanto e sem que exista qualquer servidão.
Alegaram ainda que existe uma canada de servidão para o prédio que os réus exploram e para o seu próprio prédio, a qual descrevem e que apenas permitia a passagem de pessoas a pé e animais, pelo que os réus passaram a utilizar o espaço em frente à casa dos autores que, entretanto, asfaltaram tal espaço .
Alegaram ainda que pretendem construir um muro dentro do seu próprio prédio , na zona onde existe a canada de servidão que referiram , alargando-a de forma que permite a passagem de veículos, ao que os réus se têm oposto alegando que tal faixa de terreno não é propriedade dos autores .
Concluem pedindo que se declare que são proprietários do prédio que identificaram e que os réus sejam condenados a reconhecer tal propriedade, em toda a sua extensão, e a absterem-se de praticar quaisquer actos que violem o invocado direito de propriedade .
Regularmente citados os réus apresentaram a sua contestação na qual impugnaram os factos alegados na petição inicial, nomeadamente que mesmo antes de ter sido efectuado o destaque do prédio hoje dos autores , e mesmo antes do pai da autora mulher ter adquirido o prédio, já existia uma servidão, que o réu marido já então utilizava , a qual permitia a passagem de tractores, carrinhas e equipamentos .
Mais alegou que logo após o pai da autora mulher ter adquirido o prédio , a canada de servidão foi por ele alargada para as dimensões que tem actualmente .
Deduziram também pedido reconvencional onde alegam serem proprietários de um prédio urbano, que identificam, ao qual se acede, desde data anterior a 1937, através de canada existente no prédio que foi do pai da autora mulher e de onde foi posteriormente desanexado o prédio hoje dos autores.
Tal servidão desde, pelo menos, 1984 , que tem a largura que hoje apresenta e foi utilizada para acesso ao prédio dos réus .
Alegaram ainda que os autores , em 2006 , iniciaram trabalhos de demolição do muro que delimitava o seu prédio da servidão e pretendiam reconstruir o muro junto à berma contrária da servidão, o que não é possível em virtude das características do terreno no local , para além de que impossibilitaria os réus de acederem ao seu prédio com a viatura ou equipamentos.
Concluem pela improcedência da acção e pedem que sejam declarados proprietários do prédio que identificam, que os autores sejam condenados a reconhecer tal propriedade , que se declare a existência da servidão predial que identificam, que os autores sejam condenados a reconhecer a existência de tal servidão e o respectivo direito de passagem dos réus e a absterem-se da prática de qualquer acto que impeça a passagem na servidão.
Os autores responderam ao pedido reconvencional impugnando toda a factualidade alegada na reconvenção e concluem pela improcedência desta e pela procedência da acção.
******************** A final foi proferida esta decisão: Face a tudo o que ficou exposto , na parcial procedência da acção e na improcedência da reconvenção, decide-se : 1 - declarar os autores …. proprietários do prédio urbano descrito sob o artigo 495 , sito na …, freguesia da … , concelho da Horta; 2 - condenar os réus …a reconhecerem tal direito de propriedade e ainda a absterem-se de praticar actos violadores de tal direito de propriedade ; 3 - absolver os réus do pedido contra eles formulado pelos autores de reconhecimento do direito de propriedade sobre o prédio supra identificado relativamente à área e extensão referidas na descrição predial ; 4 - absolver os autores … da instância relativamente aos pedidos formulados pelos réus … ******************** É esta decisão que os RR impugnam, formulando estas conclusões: Pré-existência da servidão por confissão das partes: 1. Na petição inicial e na réplica os Autores, ora recorridos, reconhecem a existência de uma servidão de passagem na extrema sul do seu prédio, com cerca de 80 em de largura, para passagem para o prédio dos recorrentes (com atafona e ruínas), situação que se verificava pelo menos desde agosto de 1984.
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Estando provado (por confissão das partes) que inicialmente a servidão tinha 80 em e que, posteriormente (defendemos sempre em data anterior a 1985) "Daniel … e os filhos procederam ao alargamento da servidão para que ficasse com a largura que tem atualmente" (facto 15 da sentença), e sendo o recorrente marido e a recorrente mulher filhos de Daniel…, deveria a sentença apenas declarar a pré-existência da servidão, com a largura que tem atualmente.
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Ao não se pronunciar sobre esta questão a sentença é nula, nos termos da alínea d), do nº 1, do artigo 615° do CPC.
Impugnação da matéria de facto (artigo 640° CPC): 4. Pela prova produzida em sede de audiência de julgamento (declarações da testemunha D…) e pelos documentos (escritura e registo da aquisição do prédio em 1984), o facto 15 da matéria provada na sentença deverá ser alterado, por força do n° 1 do artigo 662° do CPC, de modo a ter a seguinte redação: "Em data anterior a 1985, Daniel… e os filhos procederam ao alargamento da servidão de forma a que a mesma ficasse com a largura que tem atualmente" 5. As declarações desta testemunha (gravadas desde o nº 0760 a fim do lado A e desde o n" 0010 a fim do lado B da cassete nº 2), pai da recorrida mulher e do recorrente marido, são claras no sentido de que a servidão passou a ter a largura que tem atualmente desde 1985. Daniel …diz que "Comprei o terreno há 30 anos e quando comprei alarguei aquilo tudo e já entrava trator e tudo" e isto "Foi no ano a seguir logo. Eu alarguei aquilo e ficou em terra". Constituição da servidão por usucapião: 6. Caso a sentença desse como provado que o alargamento da servidão ocorreu em 1985, a solução de direito seria distinta, sendo que também deveria ser mesmo que se mantenham todos os factos dados como provados.
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De forma que entendemos errada, a sentença considerou que o lapso de tempo necessário para a constituição da servidão por usucapião apenas iniciou a sua contagem a partir do destaque (22-05-1998) até Março de 2006, não se atingindo assim os 15 anos necessários para a verificação deste requisito.
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A sentença deveria ter considerado a posse anterior ao destaque, pois desde pelo menos 1985, que o acesso ao prédio dos recorrentes e dos seus antecessores faz-se pela servidão existente no prédio de Daniel Arruda e Maria Palmira, com a largura que tem atualmente, passando a fazer-se, a partir do destaque (1998), pelo prédio destes (prédio "mãe") e pelo prédio dos recorridos (prédio destacado).
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Verificando-se que o prédio serviente, com o destaque, foi dividido em dois prédios, "cada porção fica sujeita à parte da servidão que lhe cabia" (artigo 1546°, do CC, primeira parte).
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Assim, somadas as posses, anteriores e posteriores ao destaque, está verificado o lapso de tempo necessário para a constituição da servidão por usucapião, pois a servidão, "com a largura que tem atualmente" (facto provado 15 da sentença) existe desde 1985 (data em que Daniel Arruda e os filhos alargaram a servidão que antes "tinha cerca de 80 em de largura") (facto provado 13 da sentença).
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Ao decidir como decidiu o Tribunal "a quo" violou, para além do referido artigo 1546° do CC, o disposto no artigo 413° do CPC, com a consequente nulidade da sentença, nos termos da alínea d), do n" 1, do artigo 615° do Cf'C.
Constituição da servidão por destinação do pai de família: 12. Nos autos e na sentença recorrida foram dados como provados, e bem, a verificação de todos os pressupostos para a constituição da servidão por destinação do pai de família. Assim sendo, o Tribunal "a quo" deveria apenas declarar a sua existência "ope legis". Na verdade "sempre que se verifiquem os...
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