Acórdão nº 18209/12.2T2SNT.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelANA GR
Data da Resolução27 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam do Tribunal da Relação de Lisboa: I – RELATÓRIO: 1 - E., Lda intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra N., Lda, pedindo que, por incumprimento imputável à R., seja declarado resolvido o contrato-promessa de compra e venda que com esta celebrou, com a consequente condenação a pagar-lhe a quantia de € 40.000,00 (correspondente ao dobro do sinal passado) acrescida de juros moratórios desde a citação.

Para fundamentar os pedidos formulados alegou, em síntese, que celebrou com a R. um contrato promessa, em que o A. prometeu comprar e a R. prometeu vender o terreno designado por “lote 11” sob condição de obtenção de licença de construção. Porém, o pedido formulado pela R. de autorização de construção foi indeferido. uma situação de incumprimento do dever de providenciar junto da CM Sintra para que fosse concedida a licença de construção ao lote prometido vender. E que assim, e não tendo marcado a escritura de compra e venda prometido, ter-se-ia colocado em situação de incumprimento definitivo. Perdeu, assim, interesse no negócio.

2 - A Ré contestou, negando o incumprimento definitivo ou que este lhe seja imputável.

E, em reconvenção, com base no incumprimento do contrato por parte da A., que não pagou a quantia de reforço de sinal no prazo de 90 dias após a assinatura de tal contrato e ter declarado que não pretendia cumprir o prometido, pede que lhe seja reconhecido o direito de fazer seu o sinal recebido, no montante de € 20.000,00.

Subsidiariamente, para o caso de improceder o pedido reconvencional principal, peticiona a condenação da Autora a pagar a quantia de € 20.000,00 a título de reforço do sinal até ao prazo de 15 dias após trânsito da sentença e seja fixado judicialmente o prazo de 30 dias após o trânsito para a outorga do contrato prometido, sob pena de incumprimento definitivo do contrato promessa.

3 - Houve réplica, em que a A. impugna a factualidade conducente ao pedido reconvencional e invoca a má-fé contratual e a nulidade do contrato promessa, por inexistência da certificação da licença de construção, e bem assim por inexistir o reconhecimento presencial das assinaturas dos outorgantes. A propósito da má-fé contratual, funda a sua perda definitiva de interesse na impossibilidade de obtenção de licença de construção pela R. e na grande desvalorização do imóvel desde a data da celebração do contrato promessa.

A R. respondeu na réplica, onde pugna pelo abuso de direito, sob a forma de venire contra factum proprium, por banda da Autora ao invocar a nulidade do contrato promessa.

4 - No despacho saneador foi admitido o pedido reconvencional e, dispensada a audiência preliminar, foram fixadas a matéria assente e a base instrutória.

Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento e foi proferida sentença pela qual se decidiu: “ (…) o Tribunal julga a presente ação totalmente procedente, por provada e o pedido reconvencional improcedente, por não provado, e em consequência condena o R. a pagar à A. a quantia de €40.000, equivalente ao sinal entregue em dobro, acrescida de juros desde a citação até integral pagamento.

(…)” 5 - Inconformado, veio a R. interpor o presente recurso da apelação, pedindo a revogação da sentença recorrida e substituída por outra que condene a A. no pedido reconvencional, tendo, nas suas alegações oportunamente apresentadas, formulado as seguintes conclusões: “…” 8 - A A. apresentou a sua resposta às alegações de recurso da R., pugnando pela improcedência do mesmo.

Colhidos os vistos legais, e tudo visto, cumpre apreciar e decidir.

* II – AS QUESTÕES DO RECURSO: O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, tendo por base as disposições conjugadas dos arts 608º nº 2, 635º nº 4 e 639º nº 1 todos do NCPC, aplicável in casu por a decisão sob censura ter sido proferida depois de 01/09/2013 (art 7º nº 1 da Lei nº 41/2013 de 26-06).

Esclarecendo-se que a sentença transitou em julgado no que concerne à improcedência da nulidade do contrato promessa, por inexistência da certificação da licença de construção e do reconhecimento presencial das assinaturas dos outorgantes, pelo que o objecto do recurso restringe-se ao segmento decisório que condenou a R. no pedido formulado pela A. e julgou o pedido reconvencional improcedente.

Se bem se compreende o teor da alegação da recorrente, um tanto prolixa e caótica, à semelhança das conclusões que a encerram, afigura-se-nos que as questões que nos importa aqui apreciar e decidir serão as seguintes: 1-da nulidade da sentença; 2-do erro na decisão de facto; 3-com ou sem alteração da matéria de facto, apreciar se foi correcta, ou não, a subsunção jurídica aduzida na sentença.

* III – NULIDADE DA SENTENÇA : No caso em apreciação, invoca a apelante que a sentença padece da nulidade prevista na aludida alínea d) do nº1 do art 615º do NCPC, porquanto o Tribunal a quo declarou provados factos - os consignados sob as alíneas i) e j) - que não foram alegados por qualquer das partes, sendo que relativamente ao constante da alínea j) altera significativamente a causa de pedir invocada pela A..

Ora, a invocação de tais fundamentos, em sede de nulidade de sentença, salvo o devido respeito, afigura-se inconsistente.

A divergência da apelante na situação em apreço, reside na apreciação da matéria de facto, mas o art 615º do CPC, não se aplica ao julgamento da matéria de facto, reportando-se exclusivamente às causas de nulidade da sentença.

A apreciação da correcta ou incorrecta interpretação das provas, sua análise e fundamentação, não fazem parte das taxativas causas de nulidade da sentença, pois, ainda que possa haver um erro de julgamento, não será o mesmo apreciado no âmbito desta nulidade.

No caso vertente, a recorrente confunde manifestamente nulidade da sentença por excesso de pronúncia com hipotéticos "erros de julgamento" relativos à fixação/assentamento dos factos materiais da causa, só sindicáveis em sede de mérito, que não em sede de mera forma.

A incorrecção do julgamento da matéria de facto é insusceptível de ser considerada como vício formal da sentença, constituindo antes erro de julgamento a ser arguido em sede de impugnação da decisão de facto (como a recorrente efectivamente arguiu).

Assim, só em sede de apreciação da matéria de facto se aferirão estes aspectos, não padecendo a sentença da nulidade da alínea b) do nº1 do art 615º do CPC.

Improcede, por conseguinte, a invocada nulidade.

* IV – DA MATÉRIA DE FACTO : Salienta a recorrida que a R. não reclamou da matéria levada à base instrutória, pelo que ficou prejudicado o direito da apelante de, decorrido o prazo de 15 dias que tinha para o efeito, vir pedir a reapreciação de tal matéria, pois a mesma transitou em julgado, nos termos e efeitos do art 617º do CPC.

Mas a matéria assente e a base instrutória, com ou sem reclamação, não formam caso julgado impeditivo da sua ulterior modificação, pois estando esta decisão final sobre a matéria de facto viciada, e não havendo recurso autónomo dela, pode ela ser impugnada no recurso interposto da decisão final, nos termos gerais.

Não é, pois, por a R. não ter reclamado elaboração da base instrutória, nem da decisão sobre a matéria, que o impede de agora, no seu recurso, de questionar a resposta dada ao pontos da base instrutória e à sua redacção.

E, no caso em apreciação, infere-se da alegação de recurso que a recorrente discorda da matéria de facto que o Tribunal a quo deu como provada, maxime, do enunciado nas alíneas f), g), i), j) e m), defendendo ainda que o art 10º da base instrutória deveria ter merecido resposta positiva, invocando essencialmente, para sustentar a consequente alteração da decisão de facto, o teor de vários depoimentos e o conteúdo de alguns documentos.

Por se encontrarem minimamente preenchidos os pressupostos da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, previstos no art 640º do NCPC 2013, passa-se a apreciar tal impugnação.

Assim, procedeu-se à audição integral de todos os depoimentos (testemunhais e depoimentos de parte) e à análise dos documentos juntos aos autos, não só porque essa uma das discordâncias do recurso, como porque é esse o nosso dever para que daí possa resultar uma apreciação e decisão em conformidade com o direito enquadrável à situação dos autos.

A ausência de referência (na decisão que julgou a matéria de facto) à numeração dos correspondentes factos controvertidos, constantes da base instrutória afecta significativamente a compreensão pelos destinatários do que foi dado, ou não, como provado e torna mais onerosa a tarefa de análise e controlo da decisão.

Cremos, por isso, que a metodologia seguida pela Mmª Juíza a quo não é a mais adequada.

É a seguinte a formulação destes artigos da base instrutória e as respectivas respostas: -ponto 2 - Na data referida em A) o referido requerimento encontrava-se na fase do saneamento liminar? Resposta: Provado [alínea f) dos factos provados] [Este ponto está interligado com alínea A) dos factos assentes -“No âmbito da sua atividade a autora celebrou com a ré, em 6 de Junho de 2008, o acordo, denominado “contrato promessa de compra e venda”, cuja cópia se encontra junta a fls. 9 a 11 e que se tem aqui por integralmente reproduzido”] -ponto 3 – Posteriormente à assinatura do contrato referido em A) a ré deu conhecimento à autora que o requerimento referido em 1) foi inferido? Resposta: Provado que em data posterior à assinatura do contrato promessa o A. tomou conhecimento que o requerimento referido em e) tinha sido indeferido [alínea g) dos factos provados]...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT