Acórdão nº 1586/11.0TVLSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelCRISTINA COELHO
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO A A intentou contra o R, acção de condenação com processo ordinário, pedindo que: 1º- se declare o direito de retenção que assiste à A. sobre vários imóveis que identifica; 2º- se condene o R. a pagar à A. a quantia de € 4.056.808,33, acrescida de juros vincendos, à taxa de 8%, sobre € 3.990.350,00 a contar de 30 de Junho de 2011 e até integral pagamento; 3º- se condene o R. a pagar o IVA à taxa legal, que for devida na data do pagamento das obras; 4º- se condene o R. a pagar à A. a quantia mensal de € 700,00 até à entrega dos imóveis, acrescida de juros vincendos, à taxa de 8%, desde a citação, e até integral pagamento; 5º- se condene o R. a pagar à A. juros vincendos, à taxa de 8%, sobre € 154.300,00 desde a citação e até integral pagamento; 6º- se condene o R. em juros compulsórios.

A fundamentar o peticionado, alegou, em síntese: A Sociedade ... Lda na qualidade de proprietária dos lotes nºs 1, 2, 6, 8, 9, 13, 25, 27 e 29 do loteamento do prédio denominado Quinta ... , iniciou neles a construção dos edifícios previstos para a referida urbanização.

Os referidos 9 lotes foram integrados no património do R., a favor de quem se mostram registados.

Após a transmissão da propriedade, a Sociedade ... Lda ficou na posse dos mencionados lotes e continuou as obras, na qualidade de empreiteira, ficando o R. obrigado a proceder ao pagamento dos trabalhos.

No âmbito da empreitada, a Sociedade ... Lda construiu 98% dos projectos dos lotes 6, 8 e 9, cerca de 95% do projecto do lote 13, cerca de 70% do projecto do lote 25, cerca de 60% dos projectos dos lotes 1 e 2, cerca de 30% do projecto do lote 27 e cerca de 5% do projecto do lote 29, tendo despendido quantias num total de € 3.654.300.

O R. nunca pagou qualquer quantia à Sociedade ... Lda , razão pela qual, em Maio de 2008, esta suspendeu os trabalhos, e passou a exercer o seu direito de retenção sobre os lotes e edifícios, despendendo, a partir de então, com a guarda do estaleiro e dos prédios e com a conservação e limpeza destes a quantia mensal de € 700,00.

A Sociedade ... Lda executou, ainda, para o R. a empreitada de alteração de uma moradia em (...), no que despendeu € 237.850,00.

Concluídas as obras de remodelação em Maio de 2007, a Sociedade ... Lda reteve o imóvel por falta de pagamento das despesas, notificando, a 15.10.2007, o R (à data gerido pela (...) ) para pagar a dívida referente a esta obra, o que aquele não fez, estando, desde então, em mora.

A 22.02.2011, o R. (já gerido pela (...) ) foi notificado pela Sociedade ... Lda para pagar € 3.500.000,00, relativos a parte da dívida referente à construção dos edifícios.

Por contrato de 7.5.2011 a Sociedade ... Lda cedeu à A. os seus créditos vencidos e vincendos sobre o Réu, bem como os direitos a eles relativos.

A A. notificou o R. da cessão a 12.7.2011.

Regularmente citado, o R.

contestou, por excepção, invocando, à cautela, a prescrição do alegado direito da A., e por impugnação, e termina propugnando pela improcedência da acção, com a sua absolvição dos pedidos.

A A.

replicou, ampliando a causa de pedir e o pedido, e esclarecendo que o contrato de cessão de créditos ocorreu em 5.09.2008, e não na data indicada na PI, respondeu à matéria das excepções invocadas propugnando pela sua improcedência, e requereu a suspensão da instância por pendência de processo “prejudicial”.

O R.

treplicou, propugnando pelo indeferimento do pedido de ampliação do pedido e causa de pedir, por se mostrar processualmente inadmissível, ou, quando assim não se considere, pela sua improcedência.

Foi proferido despacho a indeferir a requerida suspensão da instância [1],e a convidar a A. a apresentar PI corrigida, ao que esta aderiu.

O R. apresentou nova contestação, na qual termina pedindo que se julgue a acção improcedente, por não se mostrar devidamente aperfeiçoada a PI; ou quando assim não se considere, deve a acção ser julgada não provada e as excepções por si invocadas julgadas procedentes, absolvendo-o da instância; ou quando assim não se considere, deve a acção ser julgada improcedente e o R. absolvido do pedido.

Foi proferido despacho que admitiu a ampliação do pedido, dispensou a audiência preliminar, julgou improcedente a excepção de prescrição invocada,julgou totalmente improcedente o pedido ampliado, seleccionou matéria assente e elaborou BI, as quais sofreram reclamação, totalmente indeferida.

Procedeu-se a audiência de julgamento, vindo, oportunamente, a ser proferida sentença, que julgou a acção totalmente improcedente por não provada e, em consequência, absolveu o R. de tudo o peticionado.

Inconformada com a decisão, dela apelou a A.

, formulando no final das suas alegações as seguintes conclusões, que se reproduzem: 1ª - As questões centrais da lide são as seguintes: a. Se foram concluídos contratos de empreitada entre o R e a Sociedade ... Lda , referentes aos lotes de Camarate e à Casa de (...); b. Se a Sociedade ... Lda realizou as obras pelos valores indicados nos autos; c. Se a Sociedade ... Lda cedeu à ora apelante o crédito sobre o R; d. Se a A tem direito de retenção dos imóveis de Camarate e Casa de (...).

  1. - A douta sentença apelada não considerou provado que a Sociedade ... Lda fosse credora do R com base num contrato de empreitada, pelo que a ora apelante também o não seria, não obstante a cessão do crédito. Para a douta sentença, aquela falta de prova implicou ainda a improcedência do reconhecimento do direito de retenção alegado pela ora recorrente. Por fim, o Tribunal julgou não provado que a Sociedade ... Lda tivesse despendido com o guarda da obra de Camarate a quantia mensal de 700 €.

  2. - Não obstante a decisão proferida sobre a primeira questão, afirma-se na douta sentença recorrida não haver dúvida de que a Sociedade ... Lda continuou as obras depois da integração dos lotes de Camarate no património do R, acrescentando, porém, que não se provou que a Sociedade ... Lda continuou os trabalhos porque a isso se obrigou perante o R mediante o recebimento de um preço.

  3. - É uma afirmação extraordinária porque supõe que a Sociedade ... Lda fez trabalhos de valor superior a 3,5 milhões de euros nos lotes depois de transmitidos para o R, por sua mera recreação e sem a esperança de ser paga! 5ª – Então a Sociedade ... Lda negociou durante 1,5 anos com o Banco ..., S.A. e o R a forma de recebimento dos 3,5 milhões de euros e este, afinal de contas, nenhum acordo fora celebrado de que emergisse o dever de o R pagar as obras? Com todo o respeito devido, isto não é credível nem razoável.

  4. - Tanto mais que, em audiência, se provou a existência do contrato pois a testemunha Dr. CC, que era, e é, promotor da (...), que foi inicialmente gestora do Fundo R, assistiu ao encontro onde foi combinada a finalização das obras de Camarate e de (...) (fls. 14 e 15, 23 e 24, 27 a 30 e 37 a 40 da transcrição).

  5. - Na douta sentença afirma-se que não se alcança da petição o fato jurídico que determinou que a Sociedade ... Lda ficasse na qualidade de empreiteira.

  6. – Mas não é assim: foi alegado o acordo entre a Sociedade ... Lda e o R para execução das partes das obras em falta, que o R devia pagar. A testemunha não só confirmou esse acordo, estabelecido em reunião entre as partes, como indicou o seu conteúdo. A Sociedade ... Lda tinha de terminar as construções [naturalmente de acordo com os projectos] e recebia um preço a fixar de acordo com o preço unitário da construção que não podia exceder 600 a 700 €/m2.

  7. - Este acordo, nos termos do art. 1207º do Código Civil classifica-se como contrato de empreitada.

  8. - Pretende o M.º Juiz que não havia empreitada porque não estava definido o objecto dos dois contratos, dado que não se especificavam os trabalhos realizados e a realizar em Camarate e em (...).

  9. - Esquece a douta sentença que o acordo era para terminar as obras, o que obviamente obrigava a cumprir a parte dos projectos não realizada.

  10. – De resto, e sem conceder, quando não se tivesse definido, como se definiu, o objecto da obrigação da Sociedade ... Lda , os contratos seriam nulos por falta de objecto e essa nulidade arrastava o dever de restituir tudo o que tivesse sido prestado pelas partes, pelo que, em face da inseparabilidade das obras feitas nos lotes do R e na casa de (...) a Sociedade ... Lda teria direito à restituição do respectivo valor (art. 289º, nº 1, do Código Civil). O R deveria o valor das obras e a acção procederia com o fundamento revelado nos autos, uma vez que os fatos provados permitiriam que o Tribunal conhecesse e aplicasse o Direito, fazendo JUSTIÇA! 13ª - Quanto ao argumento que o M.º Juiz parece querer retirar da falta de fixação de um preço, esquece, muito estranhamente, o que se dispõe nos arts. 1211º e 883º do Código Civil.

  11. - A existência de relação contratual que obrigava a Sociedade ... Lda a efectuar as obras e o R a pagá-las resulta também confirmada pelo depoimento da testemunha RS, que durante 1,5 anos acompanhou as negociações entre o Banco ..., S.A., a Sociedade ... Lda e o R para conseguir o financiamento necessário ao pagamento dos trabalhos (cf. fls. 66 e 67).

  12. – Tais negociações só podem explicar-se pela existência do dever jurídico de pagar as obras e este pela celebração do contrato de empreitada.

    16º - De tudo se conclui que a douta sentença não analisou convenientemente a p. i., e ajuizou mal a prova, para declarar a absurda inexistência de acordo entre as partes visando a conclusão das obras de Camarate e de (...).

  13. - Em suma, o entendimento do Tribunal não considerou devidamente a p. i., contraria a prova produzida, não aplica a lei e nem ao menos desonera o R. do dever de pagar o custo das obras! 18ª - Nem pode deixar de afirmar-se ser em extremo chocante que o Tribunal recorrido...

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