Acórdão nº 61079/12.5YIPRT.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 03 de Fevereiro de 2015
Magistrado Responsável | MARIA DA CONCEI |
Data da Resolução | 03 de Fevereiro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa.
I- Relatório: A A veio propor, em 9.4.2012, contra a R providência de injunção que, em face da oposição deduzida, veio a seguir a forma de processo declarativa. Pede a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia global de € 15.197,62, incluindo a taxa de justiça suportada no montante de € 153,00, sendo € 14.804,50 respeitante ao valor não pago por esta à A. na sequência do fornecimento de bens e serviços na área da construção civil entre 23.12.2010 e 9.4.2012, e € 240,12 a título de juros vencidos.
Na oposição apresentada, veio a Ré invocar, em síntese, o cumprimento defeituoso do contrato por parte da A.. Afirma que tendo sido acordado o fornecimento e aplicação por esta de um pavimento com propriedades técnicas específicas, anti-estático condutivo, nas suas instalações, a A. não cumpriu os prazos estabelecidos e executou os trabalhos de forma deficiente, não tendo procedido, como lhe competia, à eliminação dos defeitos que ela própria reconheceu existirem, pelo que não está a Ré obrigada a pagar o preço em falta até que o pavimento seja substituído (ver arts. 145º e 146º da oposição), ocorrendo a excepção do não cumprimento. Pede a improcedência da causa e deduz, por seu turno, pedido reconvencional contra a A..
Por despacho de fls. 52/53 foi julgada inadmissível a reconvenção, atenta a forma de processo, indeferindo-se a mesma.
A A. respondeu à matéria da excepção arguida no início da audiência de julgamento, impugnando, no essencial, os factos para tanto alegados e concluindo pela improcedência da excepção.
Depois de juntos documentos e de inquiridas as testemunhas oferecidas, veio o Tribunal a determinar a reabertura da audiência para produção de mais prova, ordenando a realização de perícia por um único perito.
Realizada a perícia e prestados os esclarecimentos solicitados, por escrito e em audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, em 24.4.2014, que decidiu nos seguintes termos: “(...) julga-se procedente por provada a presente ação e, em consequência, condena-se a ré a pagar à autora a quantia de € 14.804,50 acrescida de juros vencidos no valor de € 240,12; e ainda os juros vincendos, até pagamento.
Custas pela ré, (art. 527º do CPC).
(...).” Inconformada, interpôs recurso a Ré, culminando as alegações por si apresentadas com as seguintes conclusões que se transcrevem:
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A A. peticionava a condenação da R. no pagamento de facturas oriundas do fornecimento e colocação de um pavimento nas suas instalações, no valor de €:14.804,50, ao que a R. deduziu Oposição, na qual invocou o não cumprimento atempado e total da empreitada, bem como, defeitos na realização da mesma, pois após a conclusão das obras verificou-se que em certas zonas do pavimento colocado, haviam bolhas, e que o mesmo se estava a descolar, e que por tal, considerando a especificidade da actividade técnica da R., esta encontrava-se assim comprometida.
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Tais defeitos, que foram declarados como provados, Em diversas zonas do pavimento aplicado na área de produção da requerida – “PCBA”, o mesmo está a levantar, a desprender-se do chão sobre o qual foi colocado, apresentando bolhas, defeitos estes, que, após terem sido detetados pela R. foram comunicados à A.. C) A causa provável das referidas anomalias ou bolhas é a falta de resistência mecânica da massa de regularização sob o efeito de cargas intensas, equipamento mais empilhador, associadas a movimentos de arrastamento na colocação dos equipamentos. D) Também foi considerado e valorado pelo Tribunal à Quo que, a testemunha JS, que procedeu à aplicação do pavimento, a mando da autora, disse ter utilizado todos os materiais recomendados pela marca, tendo aplicado ainda um aditivo (primário) na zona de entrada ou garagem, por se tratar de zona sujeita a passagem de veículos; que a testemunha JM, diretor de produção da ré, disse que das duas áreas em que a autora aplicou o pavimento, apenas surgiram bolhas ou anomalias naquela onde a ré tem situada a sua área de produção e respetivos equipamentos, sendo que atribuiu o aparecimento das bolhas à não aplicação de um selante, e ainda concluiu o senhor perito que a causa dos empolamentos se deveu a “falta de resistência mecânica da massa de regularização sob o efeito dessas cargas intensas associadas a movimentos de arrastamento na colocação dos equipamentos.
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Porquanto existiu um manifesto erro de julgamento e de enquadramento legal da factualidade dada como provada, por parte do Tribunal à Quo.
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A própria A. antes de realizar os trabalhos que foram objecto da empreitada, fez deslocar ao local os seus técnicos, que tiveram a oportunidade de verificar qual a actividade que iria ser desenvolvida no local, pelo que teve ao seu alcance todos os dados necessários para que aplicasse um pavimento com a necessária resistência para o efeito.
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No pavilhão da entrada do estabelecimento da R., o pavimento está perfeito, e suporta todo o tipo de cargas e trabalhos constantes com o empilhador, pelo simples facto – matéria considerada provada e analisada pelo Tribunal à Quo – em virtude do facto de naquela zona, ter sido aplicado pela testemunha João Silva, a mando da própria A., um aditivo (primário) na zona de entrada ou garagem.
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Aditivo esse que não foi aplicado na zona onde se revelaram as supra referidas anomalias.
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E, como a A. não aplicou tal primário na restante zona, é óbvio que não procedeu com o cuidado e a perícia com que deveria, causando a ocorrência de tais defeitos.
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Fácil é de concluir que a A. deveria ter ordenado a aplicação desse tal primário em todas as zonas das instalações, e não apenas na entrada.
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Provado o cumprimento defeituoso, é sobre o devedor que recai a prova de que o mesmo não procede de culpa sua. Culpa esta que a A., diga-se em abono da verdade, nem sequer procurou afastar.
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Quando a prestação for defeituosamente cumprida, o devedor, cuja culpa se presume, responde pelo prejuízo causado ao credor, nomeadamente pela eliminação dos defeitos (artigos 799º, 1, e 1221º a 1223º do Código Civil).
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Assim, a existência desses defeitos, por força da excepção de não cumprimento do contrato, invocada pela R., obsta ao pagamento da prestação em falta até à sua eliminação, nos termos do disposto no artº 428º do C. Civil.
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Procedendo assim, a excepção de não cumprimento contratual invocada pela R..
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A empreiteira, ora A. não está vinculada apenas à obrigação de realizar uma obra, de obter certo resultado, porquanto, ela encontra-se ainda vinculada a executar uma obra isenta de vícios e conforme com o convencionado, quer dizer, sem defeitos (artºs 1218 nº 1 e 1219 nº 1 do Código Civil).
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Obra defeituosa é, portanto, aquela que tiver um vício ou se mostrar desconforme com aquilo que foi acordado. O vício corresponde a imperfeições relativamente à qualidade normal das prestações daquele tipo; a desconformidade representa uma discordância com respeito ao fim acordado, e que estão supra descritas, e foram consideradas como provadas.
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Caberia à A., por conhecer a actividade industrial da R., aplicar um pavimento, que, à semelhança do aplicado na divisão da entrada, não cedesse com a circulação de máquinas, pois até a visitou antes da aplicação do pavimento, bem sabendo assim com o que contava, não podendo desconhecer a actividade desenvolvida e a desenvolver pela R..
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E, ainda que assim se não entendesse, o que só por mera hipótese académica se admitiria, existindo sequer uma dúvida quanto à perfeição, ou não, dos trabalhos realizados pela A., a solução apenas poderia, e deveria ser, a que obriga o artº. 414º do C.P.C., resolvendo-se contra quem o facto aproveita, e, sendo neste caso o devedor da obrigação de realização do resultado da empreitada, a A., a solução apenas poderá ser resolvida contra a...
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