Acórdão nº 107/10.6TBCSC.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução21 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam do Tribunal da Relação de Lisboa: I- RELATÓRIO 1.

Os AA instauraram contra a R.

e ainda o Município de C[1] a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum ordinário[2] pedindo: (i) que o tribunal decrete que é válido e está em vigor o contrato nº 9001777371 celebrado com o A, que abastece um determinado prédio, que identifica e que foi ilegal e injustificada a suspensão do serviço promovida pela R, respeitante a tal contrato; (ii) a condenação da R no pagamento das seguintes quantias: € 6 360,00 como compensação pela quantia despendida pela A. com o aluguer de um gerador durante todo o período que durou a suspensão do serviço; € 23 137,48 a título de compensação pelas quantias despendidas pela A. com o consumo de combustível efectuado pelo gerador colocado no prédio durante o período de suspensão de fornecimento de energia eléctrica; € 2 400,00 a título de despesas bancárias e juros respeitantes ao financiamento indicado no art.º 55º da p.i., valores a que deverão acrescer juros vincendos desde a citação da R e até integral pagamento.

Alegam, em resumo, que a R suspendeu, sem qualquer comunicação aos AA e ilegalmente, o fornecimento de energia eléctrica ao prédio identificado, estando em vigor e válido contrato de fornecimento celebrado pelo A., o que impediu a A de ter acesso à energia eléctrica que lhe era fornecida, com vista ao desenvolvimento da sua actividade naquele prédio, que tinha arrendado ao A.

Mais alegam que a R., não obstante na posse de informação sobre a existência de um procedimento cautelar e a consequente suspensão do acto administrativo invocado pelo Município de C para proceder à demolição de construções não licenciadas existentes no imóvel e que esteve na origem da solicitação do Município à R para proceder ao corte de energia, nunca cuidou de restabelecer voluntariamente o serviço e não respondeu às reclamações efectuadas.

Finalmente alegam que tiveram prejuízos durante todo o tempo (234 dias) em que durou a suspensão do fornecimento de energia, tendo a A despendido avultadas quantias na locação de um aparelho gerador e no consumo médio diário, por esse aparelho, de 100 litros de gasóleo e, mesmo assim, a A viu-se forçada a laborar de forma deficiente, a que acresce ter-se visto obrigada, por virtude destes factos, a recorrer ao crédito bancário, por forma a poder pagar vencimentos e honrar os seus compromissos. Concluem que foi ilegal a suspensão do serviço de fornecimento de energia eléctrica operada pela R, a pedido do Município de C e que a R é responsável pelos prejuízos sofridos pela A.

Contestou a R. pedindo a procedência das excepções invocadas, entre elas a sua ilegitimidade e a improcedência dos pedidos formulados.

Estriba a sua defesa alegando a inexistência de relação contratual entre a A e a R. e que o abastecimento de energia eléctrica foi suspenso por solicitação e determinação do Município de C, por imperativo de segurança e de interesse público, dado este pretender proceder à demolição de um conjunto de construções não licenciadas, impugnando ainda os alegados prejuízos. Na resposta à contestação os AA pugnaram pela improcedência das excepções invocadas e deduziram incidente de intervenção provocada da interveniente supra identificada.

Na sequência de ter sido admitido este incidente e citada a interveniente, veio esta aos autos declarar que fazia seu o articulado apresentado pela R.

Foi elaborado o despacho saneador, aí se concluindo pela competência do tribunal e julgada improcedente a excepção de ilegitimidade arguida pela R, assim como se concluiu pela verificação dos restantes pressupostos processuais, inexistência de nulidades, outras excepções dilatórias ou peremptórias, bem como questões prévias de conhecimento oficioso.

Procedeu-se à selecção dos factos assentes e à elaboração da base instrutória, sem reclamação.

  1. Prosseguindo o processo os seus regulares termos, veio a final a ser proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu as RR dos pedidos formulados.

  2. É desta decisão que, inconformados, os AA vêm apelar, pretendendo a revogação da decisão recorrida e a condenação das RR a pagar-lhes os montantes peticionados, terminando as alegações com as seguintes conclusões: I. Quanto à matéria constante dos pontos 1 a 35 da matéria considerada como provada pelo tribunal a quo nenhum reparo merece a decisão ora em crise; II. Contudo não se conformam os AA que o tribunal a quo tenha considerado não provados os factos 3 a 5 da matéria de facto não provada; III. Como resultará demonstrado, mal andou o tribunal a quo ao decidir neste sentido; IV. Deveria o tribunal recorrido ter considerado provado que: - em resultado do referido em 33º. 34º e 35º, a A., por falta de liquidez, viu-se forçada e obrigada a recorrer a crédito bancário no montante de € 22 500,00 (art.º 29º da b. i.); - por forma a poder pagar os vencimentos dos seus 17 funcionários (art.º 30º da b.i.); - o financiamento referido em 29º obrigou a um pagamento de juros e despesas bancárias que ascendem ao montante de € 2 400,00 (art.º 31º da b.i.).

V. Na verdade, conforme consta dos documentos juntos como docs 276 e segs e dos depoimentos prestados em sede audiência de discussão e julgamento mal andou o tribunal a quo ao dar tais factos como não provados; VI. A testemunha AF esclareceu que é funcionária da A desde 2008, ter conhecimento da existência do litígio entre a sua entidade patronal e a R, esclarecendo que ela própria contactou a R para que fossem esclarecidas as razões que levaram à suspensão do fornecimento de energia eléctrica, ao mesmo tempo que, adiante, esclareceu que a sua entidade patronal se viu obrigada a recorrer ao crédito bancário por forma a fazer face aos pagamentos que tinha a fazer aos seus credores, sobretudo por força do acréscimo de custos inerentes à sua actividade em resultado do corte ocorrido no fornecimento de energia eléctrica; VII. Estes elementos, conjugados com os demais já referidos que fazem prova directa dos factos alegados, deveriam ter levado o tribunal a dar como provados os factos respeitantes aos pontos 3, 4 e 5 da matéria considerada como não provada; VIII. Considerando a factualidade atrás descrita e a demais matéria assente bem se vê Venerandos Senhores Desembargadores que deveria ser outra a decisão proferida pelo tribunal a quo; IX. Provaram os AA que contrataram com as RR a prestação de serviços de fornecimento de energia eléctrica – cfr. ponto 1 da matéria de facto assente; X. Provaram os AA que as RR, nomeadamente a R R-Distribuição, S.A. procedeu ao corte do abastecimento da energia eléctrica sem aviso prévio – cfr. ponto 4 e 6 da matéria de facto assente; que o serviço apenas foi reposto após a determinação proferida pelo tribunal a quo no âmbito do procedimento cautelar apenso aos presentes autos - cfr. ponto 5 da matéria de facto assente; que as RR tiveram conhecimento do procedimento cautelar e da suspensão do acto administrativo em causa após o corte da energia eléctrica - cfr. ponto 18 da matéria de facto assente; XI. Provaram ainda os AA ter contactado inúmeras vezes os serviços da RR, sem que no entanto o serviço de fornecimento de energia eléctrica fosse reposto, o que apenas aconteceu por ordem do tribunal e passados largos meses - cfr. pontos 22 a 28 da matéria de facto assente; XII. É ilegal e errónea a interpretação que o tribunal a quo faz do regulamento de relações comerciais do sector eléctrico (doravante RRCSE); XIII. Se é certo que os AA se conformam com o entendimento respeitante à legitimidade da ordem emanada da autoridade administrativa no entanto a verdade é que ficam esquecidas duas questões que resultam dos autos e da lei a aplicar e que o tribunal a quo ignorou; XIV. Conforme resulta do art.º 47º do RRCSE a interrupção, mesmo quando determinada por razões de interesse público, deverá ser precedida de aviso aos interessados; XV. Dos autos resulta provado, cfr. ponto 6 da matéria de facto assente, que as RR procederam ao corte do fornecimento de energia eléctrica sem qualquer aviso, o que poderiam ter feito, não havendo razão legal ou factual para tal comportamento já que as RR foram avisadas que teriam de comparecer para o aludido corte em 4 de Fevereiro de 2009 e ainda assim não avisaram os AA que iriam proceder à remoção do ramal; XVI. No que respeita ao disposto no art.º 47º do RRCSE diga-se que as RR tomaram conhecimento da intervenção em causa, atempadamente, e podendo ter cumprido a lei não o fizeram; XVII. Acresce Venerandos Senhores Desembargadores que as RR tomaram conhecimento da suspensão de eficácia do acto após o corte, cfr. ponto 18 da matéria de facto assente, e ainda assim não procederam à religação.

XVIII. Ainda que se admitisse que a ordem era legítima e que as RR não poderiam actuar de outra maneira e mesmo considerando a falta de aviso em que incorreram, violando o disposto no art.º 47º do RRCSE, a verdade é que as RR mantiveram o incumprimento do contrato, mesmo após terem conhecimento da suspensão de eficácia do acto administrativo. XIX. Acresce que as RR foram diversas vezes contactadas pelos AA, inclusive pelo seu mandatário, e não procederam à religação do serviço, cfr. pontos 22 a 28 da matéria de facto assente, tendo sido este o comportamento que provocou os prejuízos...

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