Acórdão nº 89359/10.7YIPRT.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Setembro de 2015

Data08 Setembro 2015
ÓrgãoCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I-Relatório: 1. “S., Unipessoal, Lda instaurou procedimento de injunção, transmutada em ação declarativa com forma ordinária, contra R.

pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de EUR 164.112,60, acrescida de EUR 2.131,66, a título de juros de mora, já vencidos.

Para tanto, alegou, em síntese, que: Dedica-se à consultoria na área das tecnologias de informação e comunicação, à venda e locação de programas e serviços de informática e de telecomunicações, sistemas de computadores, incluindo hardware e software.

Em 22/08/2008, celebrou com a requerida um contrato de prestação de serviços na área da informática, designadamente serviços de implementação e manutenção de software e hardware, helpdesk e formação.

Nesse âmbito, a autora prestou à ré diversos serviços, no montante de EUR 164.112,60 e que a ré, apesar de instada, não pagou.

  1. A ré deduziu oposição e reconvenção, alegando, em suma, que: Na petição inicial, a autora não identifica a concreta relação contratual que fundamenta a sua pretensão, pelo que a petição inicial é inepta, por falta de causa de pedir.

    A ré foi vítima de diversos ilícitos criminais praticados por um seu ex-diretor, os quais se encontram em averiguação no DIAP, sendo que a relação contratual estabelecida com a ora autora é uma das situações em averiguação naquele processo-crime. Por se configurar a existência de causa prejudicial, deve ser suspensa a instância até ser proferida decisão com trânsito em julgado no processo que corre no foro criminal.

    A ré dedica-se à gestão de resíduos de equipamentos elétricos e eletrónicos, tendo implantado uma rede de centros de receção para a receção, separação e armazenagem de resíduos. Para tal estabeleceu parcerias com operadores de gestão e resíduos e parceiros operacionais que asseguram a prestação dos serviços necessários.

    A ré celebrou um contrato com a empresa I., Lda visando a criação de um sistema informático denominado “SIGRes3e”, especialmente desenvolvido para a ré, de acordo com as suas necessidades específicas.

    Posteriormente, por influência do seu então diretor financeiro, a ré celebrou um contrato com a empresa C., atualmente denominada S., Unipessoal, Lda, ou seja, a ora autora. Este contrato visava aperfeiçoar, desenvolver e melhorar o sistema existente, ou seja, o “SIGRes3e”, cabendo ainda à autora disponibilizar serviços de helpdesk e de formação. Esses serviços foram prestados pela A, sociedade controlada pelo então diretor financeiro da ré.

    A ré delegou no seu diretor financeiro a coordenação e acompanhamento da execução deste contrato. Este, porém, como a ré veio posteriormente a apurar, não defendeu os interesses da ré, tendo aceitado que a ré ficasse na total dependência técnica da autora e autorizado o pagamento de faturas de Janeiro de 2008 a Outubro de 2009, no valor total de EUR 2.216.884,00, sem estar comprovado que os respectivos serviços tenham sido prestados, e sem que a autorização de pagamento contivesse assinatura de um membro do Concelho de administração da ré ou por valores superiores aos do mercado.

    Por outro lado, entre 2007 e 2009, por serviços de consultoria, projetos de desenvolvimento aplicacional e de formação, a ré pagou EUR 1.207,929,00, sendo que este valor representa uma diferença de EUR 374.584,00 face aos preços de mercado.

    Além disso, apenas por efeito da atuação ilícita do ex-diretor da ré, ficou clausulado que a titularidade dos direitos sobre o software (que a requerente desenvolveu) lhe pertence.

    Sendo assim, pelo licenciamento do sistema SIGMA, a ré pagou indevidamente à autora EUR 597.358,00. Ainda que se entenda que o custo do licenciamento do SIGMA deveria ser suportado pela ré, ainda assim, a autora cobrou esse serviço em duplicado, o que representa um prejuízo para a ré de EUR 192.500,00.

    Nesta conformidade, a ré invoca a nulidade do contrato por ser contrário à ordem pública e aos bons costumes (art. 280º, nº2, do CC). Ou, se assim não for entendido, a sua anulabilidade, por se tratar de negócio usurário (art. 282º, nº1, do CC). Afirma ainda que o negócio é anulável, por ter sido celebrado com base em erro na formação da vontade (art. 251º, do CC).

    Conclui, pedindo que: a) Seja declarada a ineptidão da petição inicial e a ré absolvida da instância; b) Caso assim não se entenda, seja ordenada a suspensão da instância até ao trânsito em julgado do acórdão a proferir no processo-crime, instaurado contra o ex-diretor da ré; c) Seja declarado nulo o contrato celebrado com a autora; d) Subsidiariamente, seja anulado o dito contrato; e) Seja, em consequência, determinada a restituição de todas as prestações efetuadas e reconhecida a titularidade da ré sobre o software de base e ainda de todas as aplicações operacionais correspondentes ao atual sistema informático; f) Se assim não se entender, e se considerar o contrato válido, seja a autora condenada a reconhecer a titularidade da ré sobre o software de base e ainda de todas as aplicações operacionais correspondentes ao atual sistema informático; g) Em reconvenção, seja a autora condenada: - A pagar à ré, a título de compensação, a quantia de EUR 971.942,00, correspondente à diferença entre o montante que a autora deve restituir à ré e o valor dos serviços ao preço de mercado prestados pela autora à ré, até 31/12/2009, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a apresentação da oposição e vincendos até integral pagamento; - A pagar à ré a quantia que se vier a liquidar posteriormente, correspondente à compensação entre as quantias a restituir pelas partes, relativas aos serviços faturados pela autora e os que sejam indevidamente pagos pela ré, após 31/12/2009; - A reconhecer o direito de acesso da ré ao código-fonte do software de base e de todo o software aplicacional.

  2. A autora replicou e ampliou o pedido. Neste âmbito, alegou que desde a instauração do requerimento de injunção até à data da apresentação da réplica se venceram (outras) faturas no valor global de EUR 253.152,00 que a ré, mais uma vez, não pagou. Concluiu, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe (também) esta quantia, acrescida dos respectivos juros de mora, já vencidos e vincendos.

    Pediu, ainda, a condenação da ré com litigante de má fé.

  3. A ré treplicou.

  4. Foi proferido despacho que indeferiu a suspensão da instância – cf. fls. 738.

  5. Na audiência preliminar, foi admitida a reconvenção, bem como a ampliação do pedido e julgada improcedente a ineptidão do requerimento de injunção. Foi selecionada a matéria assente e organizada a base instrutória.

  6. Foi produzida prova pericial - cf. fls. 1105 e ss e 1132-1133 e 1202 e ss..

  7. Realizado o julgamento, foi proferida sentença que: a)- Julgando a ação procedente, condenou a ré “a pagar à autora a quantia de EUR 415.428,00, acrescida de juros de mora sobre o valor de cada uma das faturas – a primeira deduzida da nota de crédito – discriminadas nos pontos 1º e 2º dos factos provados, contados 60 dias após a data de emissão de cada uma delas, às taxas supletivas legais que resultam da aplicação da Portaria 597/2005, de 19/07, até integral pagamento”; b)- Julgando a reconvenção improcedente, absolveu a autora do pedido reconvencional; c)- Julgou inverificados os pressupostos da litigância de má-fé.

  8. Inconformada, apelou a ré, e, nas suas alegações, concluindo, disse: (…) 10.

    Nas contra-alegações, pugna-se pela improcedência do recurso e, consequentemente, pela manutenção da sentença recorrida.

  9. Cumpre apreciar e decidir se deve, ou não, ser alterada a decisão de facto; se o contrato deve, ou não, ser declarado nulo ou anulado e se, em consequência, deve ser ordenada a restituição das prestações peticionadas nas conclusões das alegações.

  10. É a seguinte a factualidade dada como provada: 1º- A Requerente emitiu à Requerida as seguintes faturas que as recebeu: - Fatura n.º 38/2009, emitida a 30.09.2009, com vencimento em 29.11.2009, no valor de € 39.954,00; - Fatura n.º 42/2009, emitida a 31.10.2009, com vencimento em 29.12.2009, no valor de €41.108,40; - Fatura n.º 46/2009, emitida a 2.12.2009, com vencimento em 30.01.2010, no valor de €41.607,60; - Fatura n.º 2010000002, emitida em 8.01.2010, com vencimento em 9.03.2010, no valor de € 41.442,00.

    (Alínea AA) dos Factos Assentes).

    2º- A Requerente emitiu e enviou à Ré as faturas, que as recebeu: - Fatura n.º 2010000007, de 01/02/2010, no valor de € 46.832,40; - Fatura n.º 2010000014, de 04/03/2010, no valor de € 49.225,20; - Fatura n.º 2010000017, de 05/04/2010, no valor de € 50.419,20; - Fatura n.º 2010000021, de 03/05/2010, no valor de € 52.675,20; - Fatura n.º 2010000024, de 01/06/2010, no valor de € 54.000,00 (BB).

    3º- A requerente emitiu e enviou à requerida a nota de crédito n.º 2 de 30/09/09, no valor de 1836,00€. (CC).

    4º- A Requerida não pagou as faturas referidas em AA) e BB). (DD).

    5º- Com data de 22/08/2008, entre a requerida e a requerente, então denominada C., foi celebrado um contrato, do qual constam, entre outras, as seguintes cláusulas: “Cláusula 1.ª (Objeto): 1. Pelo presente contrato, adiante designado como Contrato, a primeira Contratante adjudica à Segunda Contratante a prestação de serviços na área de informática, designadamente serviços de desenvolvimento, implementação e manutenção de software e hardware, helpdesk e formação, nos termos definidos nos Anexos ao Contrato que dele fazem parte na data da celebração ou venham a ser aditados, sendo as condições específicas de tais serviços objeto de aditamento ao Contrato, sob a forma de Anexo.

  11. Os termos e condições da prestação dos serviços objeto do presente Contrato, bem como as obrigações, responsabilidades e exclusões, são especificamente reguladas nos respectivos Anexos, sem prejuízo da legislação vigente aplicável.

  12. As Partes Contratantes reconhecem e delegam no Departamento Financeiro da Primeira Contratante a coordenação, acompanhamento e controlo da prestação de serviços da Segunda Contratante, efetuada ao...

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