Acórdão nº 232/17.2YRLSB-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelSEARA PAIX
Data da Resolução05 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: AAA –, com sede na Rua (…), , representada pelo Presidente da Direcção Nacional (…), tendo sido notificada no dia 12 de Dezembro de 2016, do acórdão proferido no âmbito da arbitragem necessária para definição de serviços mínimos, vem do mesmo interpor RECURSO de APELAÇÃO, cujas alegações termina com as seguintes CONCLUSÕES: 1.–A decisão de que o AAA recorre é o douto Acórdão proferido pelo Colégio Arbitral no pretérito dia 12 de Dezembro de 2016 no âmbito do processo de Arbitragem Obrigatória de Serviços Mínimos nº 4/2016/DRCT-ASM, que correu termos na DGAEP; 2.–Este processo de Arbitragem Obrigatória de Serviços Mínimos nº 4/2016/DRCT-ASM foi desencadeado na sequência do pré-aviso de greve nacional decretada pelo AAA para os períodos compreendidos entre as 00H00 do dia 15 de Dezembro e as 24H00 do dia 18 de Dezembro de 2016 e entre as 00H00 do dia 22 de Dezembro e as 24H00 do dia 25 de Dezembro de 2016; 3.–Neste Acórdão proferido em 12 de Dezembro de 2016 pelo Colégio Arbitral, e com o qual o AAA não se conforma, foram fixados os seguintes serviços mínimos e os seguintes meios para os assegurar: 1)-Quanto aos serviços mínimos: a)-Assegurar, durante o fim-de-semana, uma visita de familiares directos ou das pessoas indicadas pelo recluso aquando da sua admissão, caso essas mesmas pessoas não tenham feito a visita durante os dias úteis da semana; b)-Assegurar o trabalho dos reclusos ao trabalho exterior nos termos habituais; c)-Assegurar o acesso dos reclusos ao trabalho no interior do estabelecimento durante o período de greve, nos casos de absoluta impossibilidade de o mesmo se realizar noutros períodos; d)-Assegurar a presença dos reclusos na frequência de acções de formação profissional, quer no interior quer no exterior do estabelecimento, nos casos de absoluta impossibilidade de tais acções se realizarem noutros períodos; 2)-Quanto aos meios: a)-Nos dias não úteis, deve ser assegurado o efectivo habitualmente escalado para o fim-de-semana; b)-Nos dias úteis, deve ser escalado em número de efectivos igual ao habitualmente escalado para os dias não úteis, acrescido de 20%.

  1. –Pese embora neste Acórdão proferido pelo Colégio Arbitral se tenha vindo sustentar que a decisão proferida quanto aos serviços mínimos e quanto aos meios para os assegurar se mostra em consonância com o que decorre da Constituição da República Portuguesa, com o que decorre da Lei e com o que decorre de decisões arbitrais e judiciais anteriormente proferidas acerca desta matéria, tal entendimento não pode de forma alguma ser aceite pelo AAA, pela manifesta ilegalidade e inconstitucionalidade de que se reveste a interpretação e a aplicação das normas que neste Acórdão foi feita, o que aqui se não pode desde já deixar de invocar; 5.–Impõe-se, no entanto, começar por referir que, naquele que é o muito modesto entendimento por parte do AAA, o Acórdão proferido pelo Colégio Arbitral, em 12 de Dezembro de 2016, e de que se recorre, padece do vício de falta de fundamentação, sendo nulo; 6.–Se analisado o Acórdão proferido pelo Colégio Arbitral é possível verificar que as referências sobre a questão dos serviços mínimos a serem prestados e quanto aos meios de os prestar são sempre feitas de forma geral e abstracta, tudo por referência aos preceitos legais aplicáveis e a anteriores decisões proferidas acerca da matéria, sendo impossível descortinar quais as concretas razões que motivaram e fundamentaram esta decisão em relação ao pré-aviso de greve nacional que esteve decretada pelo AAA para os períodos compreendidos entre as 00H00 do dia 15 de Dezembro e as 24H00 do dia 18 de Dezembro de 2016 e entre as 00H00 do dia 22 de Dezembro e as 24H00 do dia 25 de Dezembro de 2016; 7.–O AAA não pode aceitar de forma alguma a fixação dos serviços mínimos nos moldes em que estes têm sido decididos por parte do Colégio Arbitral, nomeadamente não pode aceitar a fixação de serviços mínimos que não estão expressamente previstos na letra da Lei, assim como não pode aceitar ainda a fixação de serviços mínimos que não estejam tipificados na Lei e que não sejam pacificamente considerados de “necessidade social impreterível” à luz do que decorre dos preceitos constitucionais vigentes nesta matéria, como foi o que sucedeu com o sentido da decisão proferida em 12 de Dezembro de 2016 pelo Colégio Arbitral e de que se recorre; 8.–Com efeito, naquela que foi a decisão proferida em 12 de Dezembro de 2016 o Colégio Arbitral foi do entendimento de que a realização do trabalho no interior ou no exterior dos Estabelecimentos Prisionais por parte dos reclusos constitui uma “necessidade social impreterível”, assim como considerou que a educação, a formação frequentada por reclusos e até mesmo as visitas aos reclusos também constituem uma “necessidade social impreterível” para efeitos dos serviços mínimos a serem observados no período de greve, circunstancialismo com o que o AAA não concorda e no qual não pode conceder de forma alguma; 9.–Face à amplitude e à indeterminação de que se reveste a decisão proferida pelo Colégio Arbitral quanto à fixação dos serviços mínimos no âmbito deste processo de Arbitragem Obrigatória de Serviços Mínimos nº 4/2016/DRCT-ASM, a verdade é que, com esta decisão, na prática, os trabalhadores do Corpo da Guarda Prisional em greve acabariam por vir a ter que assegurar e por ter que realizar todas aquelas que são as normais tarefas do seu dia-a-dia, ou seja, teriam que realizar as normais tarefas como se não estivessem em período de greve; 10.–Doutro passo, da conjugação do que decorre dos artigos 57º da Constituição da República Portuguesa com o que se estabelece no artigo 15.º do DL nº 3/2014, de 03 de Janeiro, resulta inequívoco que os serviços mínimos a serem assegurados pelos trabalhadores do Corpo da Guarda Prisional com vista à satisfação de “necessidades sociais impreteríveis” devem ser os serviços necessários ao assegurar da alimentação, da higiene, da assistência médica e medicamentosa dos reclusos; 11.–Percorrido quer o texto como o espírito do que se estabelece nestes preceitos, quer no artigo 57º da CRP como no artigo 15º do DL nº 3/2014, de 03 de Janeiro, resulta inequívoco que o legislador não pretendeu que as visitas, o trabalho, a educação e a formação de reclusos fossem susceptíveis de ser considerados de “necessidades sociais impreteríveis” para efeitos de qualquer restrição ao exercício do direito à greve constitucionalmente consagrado; 12.–Ainda que seja pacífico que o exercício do direito à greve constitucionalmente consagrado seja susceptível de sofrer restrições, tais restrições não podem deixar de estar previstas na lei e não podem deixar de se limitar ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, pois que tal é o que decorre de forma inequívoca do que se estabelece nos nºs 1, 2 e 3 do artigo 18º da Constituição da República Portuguesa; 13.–A fixação de serviços mínimos a serem observados no decurso do exercício do direito à greve não pode, por conseguinte, deixar de ser feita por referência às “necessidades sociais impreteríveis” que se encontram previstas quer no texto como no espírito das normas legais que as contemplam, sob pena do direito à greve constitucionalmente consagrado ficar completamente esvaziado de conteúdo em termos práticos; 14.–Ora, no caso concreto dos trabalhadores do Corpo da Guarda Prisional não sobrestam dúvidas de que no artigo 15º do DL nº 3/2014, de 03 de Janeiro, o legislador ordinário apenas veio contemplar que os serviços mínimos a serem observados com vista à satisfação das “necessidades sociais impreteríveis” seriam apenas os serviços necessários ao assegurar da alimentação, da higiene, da assistência médica e medicamentosa dos reclusos; 15.–Consentâneo com este entendimento foi, por exemplo, o que foi decidido no Acórdão proferido no processo nº 18/2015/DRCT-ASM, de 27.07.2015, no qual é possível verificar que o Colégio Arbitral entendeu, e muito bem quanto ao AAA, que o trabalho por parte da população reclusa quer no interior como no exterior dos estabelecimentos prisionais não integraria o conceito de “necessidade social impreterível”, muito menos integraria tal conceito o prejuízo eventualmente sofrido por entidades contratantes porque este inere a uma qualquer empresa numa situação de greve, tendo o Colégio Arbitral decidido pela não fixação de quaisquer serviços mínimos em relação ao assegurar do trabalho da população reclusa; 16.–Na senda do que antecede, aquela que foi a interpretação e a aplicação do que se estabelece neste artigo 57º da Constituição da República Portuguesa e neste artigo 15º do DL nº 3/2014, de 03 de Janeiro, em conjugação entre si, e que veio a ser feita pelo Colégio Arbitral na decisão que proferiu em 12 de Dezembro de 2016 quanto aos serviços mínimos a serem fixados por referência à satisfação de “necessidades sociais impreteríveis” viola de forma inequívoca o que decorre princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade subjacentes à razão de ser que motivou o legislador constitucional ao admitir a possibilidade de poderem vir a ser contempladas restrições em relação ao exercício do direito à greve constitucionalmente consagrado, pois que tais restrições não podem deixar de ser feitas nos termos que se encontram previstos no artigo 18º da Constituição da República Portuguesa; 17.–Consequentemente, aquela que foi a interpretação e a aplicação das normas legais citadas por parte do Colégio Arbitral na decisão que proferiu em 12 de Dezembro de 2016 quanto aos serviços mínimos a serem fixados por referência à satisfação de “necessidades sociais impreteríveis” viola ainda de forma inequívoca o disposto no artigo 18º da Constituição da República Portuguesa; 18.–É que o sentido, o alcance e a amplitude da interpretação e da aplicação de preceitos legais e constitucionais que vieram a ser vertidos neste...

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