Acórdão nº 448/15.6T8SCR.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 02 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução02 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Decisão em texto integral Assunto: Contrato de empreitada de consumo. Pedido indemnizatório com vista a eliminar/reparar, através de terceiro, os defeitos da obra. Danos morais. Excepção de caducidade.

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa (7ª Secção).

I – RELATÓRIO.

Intentou Gracinda ... ... ... ...

, viúva, residente à Estrada Ponta da Oliveira n.º42, 9125-035, ..., a presente acção declarativa comum contra ... – Construções, Lda., com sede ao Sítio dos Barreiros, Caixa 102, 9125, ....

Alegou essencialmente: A Ré executou trabalhos numa casa - de que é legítima proprietária, ainda que em regime de comunhão hereditária e na qual reside há mais de trinta anos - na sequência da intempérie que assolou a Região Autónoma da Madeira a 20 de Fevereiro de 2010.

A Ré realizou mal os trabalhos, enumerando a A. os defeitos existentes na casa, tendo-se a mesma recusado a reparar os referidos defeitos após ser interpelada para o efeito.

Por força deste comportamento da Ré, suspendeu os pagamentos e não tem possibilidades para reparar, a expensas próprias, a totalidades dos defeitos enumerados.

Por força dos mesmos tem-se sentido angustiada, abalada, com dificuldades em adormecer e sem apetite, deixando de convidar os amigos a casa por vergonha da mesma, tendo ainda o seu estado de saúde piorado por causa das fracas condições em que vive, nomeadamente a nível respiratório.

Conclui pedindo que a Ré seja condenada: a pagar-lhe a quantia de € 9.000,00 (nove mil euros) acrescidos de IVA à taxa legal em vigor, a título de indemnização correspondente ao valor monetário que a mesma terá de custear com as obras de eliminação dos defeitos, vícios e desconformidades existentes no prédio descrito na petição inicial, a realizar por terceiro a contratar para o efeito, em face do incumprimento definitivo imputado à Ré no cumprimento da sua obrigação de eliminação e/ou reparação dos mesmos; a pagar uma sanção pecuniária compulsória de €500,00 (quinhentos euros) diários, pelo não pagamento da aludida quantia, desde a data do trânsito em julgado da sentença, até efectivo e integral pagamento; a pagar a quantia de €15.000,00 (quinze mil euros) a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vincendos, calculados à taxa legal em vigor, desde a data de entrada da acção em juízo até efectivo e integral pagamento.

Citada para o efeito, veio a Ré deduzir contestação, alegando a caducidade do direito da Autora por as obras terem terminado em Dezembro de 2010 e só em Março de 2013, na sequência do pedido de pagamento realizado em Dezembro de 2012, a Autora invocou a existência de defeitos.

Sem prescindir, a Ré impugna o constante na petição inicial, defendendo que os trabalhos só não prosseguiram porque a Autora não tinha nem os materiais, nem o dinheiro para os comprar.

Em Junho de 2011 a Autora terá recebido os ditos materiais, mas não contactou a Ré para prosseguir com a obra.

As infiltrações de água descritas na petição inicial resultam do facto da Autora não ter procedido à colocação de telhado, sendo que a casa está há mais de cinco anos, sem tal cobertura.

Pese embora admita que, em 2011, procedeu a algumas reparações, defende a Ré que não pode ser responsabilizada pela inércia da Autora.

Quanto às condições de vida e aos problemas de saúde da Autora, impugna a Ré os respectivos factos, por desconhecimento.

Por requerimento - posteriormente admitido por respeito ao princípio do contraditório – veio a Autora responder à excepção de caducidade, remetendo para os factos e considerações de direito constantes na petição inicial, defendendo que considera não se verificar a dita caducidade porquanto os direito que pretende exercer por via da acção são distintos dos enunciados pela Ré.

No decurso da audiência de discussão e julgamento e entre sessões, veio a Autora requerer a ampliação do pedido (o que foi admitido), passando a peticionar €11.260,00 (onze mil duzentos e sessenta euros), acrescidos de IVA à taxa legal em vigor, a título de indemnização correspondente ao valor monetário que terá de custear com as obras de eliminação dos defeitos, vícios e desconformidades existentes no prédio.

Procedeu-se ao saneamento dos autos conforme fls. 137 a 141.

Realizou-se audiência de julgamento.

Foi proferida sentença que julgou a presente acção improcedente, por via da procedência da excepção de caducidade invocada pela Ré, absolvendo esta última do pedido (cfr. fls. 328 a 361).

A A. apresentou recurso desta decisão, o qual foi admitido como de apelação (cfr. fls. 407).

Juntas as competentes alegações, a fls. 369 a 402, formulou a A. apelante, as seguintes conclusões: I.

O Tribunal a quo, em sede de Fundamentação de Facto (Ponto IV) e de Fundamentação de Direito (Ponto V) da Sentença, apenas se pronunciou sobre as questões decidendas atinentes ao “contrato celebrado entre as partes” e à “caducidade do direito da Autora”.

II.

A Apelante não recorre do segmento da Sentença que qualificou – correta e assertivamente, atenta a matéria de facto dada como provada e as normas jurídicas elencadas e aplicadas - o contrato celebrado entre as partes como um contrato de empreitada de consumo, mas recorre do segmento da Sentença que julgou “a exceção de caducidade procedente”, com a consequente absolvição da Ré dos pedidos deduzidos pela Autora, mormente os formulados nos petitórios a) e c).

III.

A Apelante entende que o Tribunal a quo, nesse segmento, errou no sentido com que as normas jurídicas que constituem o fundamento jurídico da decisão recorrida foram interpretadas e aplicadas, inclusive em virtude de manifesto erro na determinação e aplicação das normas jurídicas.

IV.

Resulta do teor do petitório a) que a Apelante invocou e exerceu o direito à/de indemnização dos danos patrimoniais sofridos – pelo valor condenatório de € 11.260,00, acrescida de I.V.A. à taxa legal em vigor, após ampliação do pedido - contra a Ré em face do alegado e imputado incumprimento definitivo desta na obrigação de eliminação e/ou reparação dos defeitos, vícios e desconformidades existentes no Prédio, mediante a contratação de serviços de um terceiro para o efeito, bem como direito à/de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos.

V.

O exercício desses direitos foi o único que a Apelante, na qualidade de dona de obra consumidora, decidiu concretizar contra a Ré e não já, por exemplo, o direito a exigir dela a eliminação e/ou reparação dos defeitos, vícios e desconformidades em apreço, pois que, e bem, o Tribunal a quo considerou provado que “a Autora já não confia no trabalho, competência e profissionalismo da Ré, bem como das pessoas ao seu serviço” (Ponto 48).

VI.

Mais, o Tribunal a quo considerou provado que “a Ré deixou de executar qualquer trabalho no Prédio no início do mês de Dezembro de 2010” (Ponto 45) e “por missiva enviada à Ré a 6 de Março de 2013, que a recebeu, a Autora voltou a invocar a existência de defeitos na obra, tendo a Ré se deslocado ao Prédio, sem no entanto lá voltar” (Ponto 55), sem prejuízo do disposto no Ponto 54.

VII.

Conforme se lê no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 29 de Novembro de 2001, in Coletânea de Jurisprudência, Ano XXVI, Tomo 5, página 95, “o dono da obra, tendo-se verificado um incumprimento definitivo das obrigações de eliminação dos defeitos ou de reconstrução por parte do empreiteiro que se recusou a realizá-las, não correspondeu a uma interpelação admonitória para o fazer, falhou o seu cumprimento, ou deixou que a realização da sua prestação perdesse interesse, deve poder optar entre o direito à redução do preço ou à resolução do contrato, ou a efectuar a reparação ou reconstrução da obra pelos seus meios, ou com recurso a terceiros, sendo o empreiteiro responsável pelo custo desses trabalhos”.

VIII.

“Nos casos de incumprimento definitivo das obrigações de eliminação dos defeitos e de realização de nova construção ou de necessidade urgente de realização de obras de reparação, o dono da obra poderá optar pela efectivação destas prestações por si próprio, ou por terceiro, assistindo-lhe um direito de indemnização em dinheiro, correspondente ao custo das obras de reparação ou de reconstrução. Este direito é de exercício alternativo relativamente aos direitos de redução do preço e de resolução do contrato” (cfr. Cura Mariano in obra op. cite, página 130).

IX.

O Tribunal a quo julgou a procedência da exceção de caducidade dos direitos da Apelante por entender que, para o seu exercício tempestivo, haveria de ter denunciado à Ré a falta de conformidade do Prédio no prazo de um ano a contar da sua deteção (artigo 5.º, n.ºs 2 e 3 do DL 67/2003), e uma vez realizada essa denúncia, o exercício daqueles direitos haveria de ter sido concretizado no prazo de três anos, a contar daquela, incluindo a interposição de acção judicial tendente à efectivação do seu exercício, sob pena de caducidade (artigo 5.º-A, n.º 3 do DL 67/2003).

X.

Em suma, o Tribunal a quo considerou que “o prazo de três anos para a Autora interpor a presente ação terminou em Dezembro de 2014. Ao interpor a acção a 6 de Julho de 2015, a Autora ultrapassou este prazo”, de modo que “verificando-se que a Lei de Defesa do Consumidor, desde o início, previu um prazo de caducidade de exercício do direito, mais curto do que o prazo de prescrição previsto no artigo 309.º do CC e que o mesmo só foi alargado em prol da defesa do consumidor, entende-se que ainda que os mencionados prazos não se encontram previstos nesta mesma lei, será de aplicar o disposto no artigo 5.º-A do DL 67/2003, de 8 de Abril, aos pedidos de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens ou prestação de serviços defeituosos”.

XI.

Conforme se lê no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 6 de Dezembro de 2011, Processo n.º 447/09.7TBVIS.C1, “apesar do DL 67/2003 não incluir no seu regime o direito de indemnização, isso não impede a sua utilização pelo dono da obra consumidor”.

XII.

...

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