Acórdão nº 818/15.0T8AGH-A-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelPEDRO MARTINS
Data da Resolução14 de Setembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados.

Relatório: B-SA, requereu a execução dos avais prestados numa livrança por L e N.

As executadas deduziram oposição à execução, pedindo que a mesma fosse extinta, na medida em que o título dos autos é inexequível e inexigível (arts. 731 e 729-a-e do CPC), alegando para tanto, em síntese, que assinaram a livrança em branco e a exequente veio a preenchê-la sem antes a apresentar a pagamento e sem as interpelar para procederem ao pagamento do que fosse devido (que não sabem se é igual ao valor com que a livrança foi preenchida), em violação do que consta do pacto de preenchimento subscrito com a prestação do aval; não tendo havido interpelação das executadas, não há, relativamente a estas, incumprimento da obrigação de pagamento da quantia exequenda.

A exequente – que entretanto passou a ser o S-SA -, contestou, impugnando, alegando, em síntese, que a livrança em causa foi preenchida em obediência ao pacto de preenchimento firmado; antes de proceder àquele preenchimento, foram as executadas interpeladas para o pagamento da quantia em dívida; por não terem pago qualquer valor, o credor avançou para os meios judiciais, depois de ter procedido ao prévio preenchimento da livrança, nos termos sobreditos; a obrigação em causa é, pois, exequível. Conclui no sentido da improcedência dos embargos e do prosseguimento da execução.

Realizada a audiência final, foi depois proferida sentença, julgando os embargos improcedentes e determinando o prosseguimento da execução.

As executadas recorrem desta sentença, arguindo nulidades da mesma e erro de julgamento.

A exequente contra-alegou defendendo a improcedência do recurso.

* Questões a decidir: se a sentença é nula e qual o relevo de as executadas não terem sido – se não tiverem sido – interpeladas para o pagamento antes do preenchimento da livrança.

* Foram discriminados os seguintes factos provados (corrigiu-se o erro de alineação): A.

–A 11/08/2015, B intentou a acção contra as executadas, apresentando como título executivo a livrança de fls. 14, dos autos de execução.

B.

–Naquela livrança consta: contrato n.º 0000; como data de emissão: 18/07/2015; como quantia vencida: 87.761,97 €; como subscritor LN-Lda, Rua de , Angra do Heroísmo; no verso da referida letra, e depois da declaração “Bom para aval ao subscritor” constam as assinaturas das executadas.

C.

–Em 17/02/2009, B celebrou com a LN, o contrato de empréstimo n.º 00000.

D.

–B, a pedido e no interesse da LN, concedeu a esta um empréstimo no montante de 127.500€, pelo prazo de 15 anos.

E.

–Montante esse creditado na conta de depósitos à ordem titulada pela LN e integral e imediatamente utilizado pela mesma.

F.

–Aquando da celebração do contrato, a LN entregou a B uma livrança em branco devidamente subscrita por si e ainda avalizada pelas executadas, que serviria de garantia em caso de incumprimento do contrato.

G.

–As executadas assinaram a livrança dos autos (em garantia da dívida da LN para com a exequente) em branco, sem a aposição de qualquer valor ou data de vencimento.

H.

–Da cláusula 9ª, do referido contrato, as partes acordaram que: “1.-Em garantia do bom pagamento de todas e quaisquer obrigações e responsabilidades assumidas ou a assumir perante B e derivadas deste contrato, suas eventuais prorrogações, alterações, aditamentos e/ou substituições, até à sua completa liquidação, incluindo o pagamento do capital até ao valor limite do montante mutuado e os correspondentes juros compensatórios a taxa contratada e os devidos pela mora e demais encargos legais e contratuais e ainda de todas as despesas judiciais e extrajudiciais que B venha a fazer para a cobrança do seu crédito, foram ou serão constituídas a favor de B as garantias mencionadas na cláusula 1ª.

2.-É nesta data entregue a B uma livrança em branco emitida e subscrita pelos segundos outorgantes à ordem de B, autorizando desde já B, nos casos de incumprimento deste contrato, e/ou das suas eventuais prorrogações, alterações, aditamentos e/ou substituições, conforme aqui preceituado, a preencher pelo valor que lhe for devido, a fixar-lhe as datas de emissão e de vencimento, bem como a designar o local de pagamento, autorizando B a debitar o valor do imposto do selo, que se mostre devido, em quaisquer contas de depósitos à ordem de que nele sejam titulares.” I.

–A LN, que entretanto foi declarada insolvente, não procedeu ao pagamento das obrigações que se venceram a partir de 17/03/2015.

J.

–B remeteu à LN e às executadas cartas registadas com aviso de recepção, datadas de 03/02/2015, com o seguinte teor: “Assunto: responsabilidades vencidas e não liquidadas Montante do incumprimento: 12.137,99 €.

Nestes termos dispõem V. Exas, impreterivelmente, do prazo de 10 dias contados da recepção da presente carta, para efectuar o pagamento dos valores acima identificados, sob pena de, não o fazendo, serem accionados todos os mecanismos judiciais e cautelares de cobrança coerciva de dívida, com todas as consequências negativas que estas situações acarretam.” L.

–Aquelas cartas foram recebidas nas moradas fornecidas pelas executadas a 10/02/2015 e a 11/02/2015, por pessoa diversa das executadas.

M.

–Por meio de cartas registadas com aviso de recepção, datadas de 13/07/2015 e enviadas para as executadas, [o advogado da exequente escreveu o seguinte – corrigiu-se o teor do corpo desta alínea]: “Assunto: Livrança associada ao contrato de empréstimo n.º 00.00; Livrança associada ao contrato de empréstimo n.º 11.11.

Exmo(a). Senhor(a) Tendo em conta a ausência de liquidação integral das obrigações decorrentes dos contratos abaixo identificados, vimos pelo presente, informar, em representação da n/cliente B, que consideramos os mesmos resolvidos por incumprimento de V. Exa, com efeitos imediatos, sem necessidade de mais nenhuma comunicação e daí se retirando todas as legais consequências.

Assim, a 18/07/2015, encontra-se em dívida o montante de 100.480,46 € (…) ao qual deverão acrescer os respectivos juros de mora entretanto vencidos.

Esta quantia corresponde ao somatório de: 1– Livrança associada ao contrato n.º 0000, pelo montante de 87.761,97 €: Nos termos do artigo 23.2 do T.G.I.S. ao valor supra descrito acrescerá o montante de € 438,81 relativo ao imposto de selo sobre a livrança e respectivos juros.

Na falta de liquidação dos montantes em dívida, fixamos o dia 18/07/2015 como data de vencimento da livrança em branco avalizada por V. Exa, e dada em garantia para o bom cumprimento das obrigações assumidas, a ser preenchida pelo seguinte montante 87.761,97€.

[…] Na falta de pagamento ou alternativa aceitável e consistente, instauraremos de imediato a competente acção executiva para recuperação do montante em dívida.” N.

–Aquelas cartas foram recebidas, a 16/07/2015, pela executada L, a que lhe foi dirigida; e por pessoa diversa da executada N, a que lhe foi remetida para a morada por si fornecida.

* Das nulidades da sentença Na motivação da matéria de facto o tribunal recorrido disse o seguinte (a numeração foi agora colocada para facilitar a remissão): “A convicção do tribunal assentou […] 1.-No que se refere à remessa das cartas de interpelação/resolução do contrato relevámos o teor dos documentos de fls. 33/44.

2.-Conforme foi referido pelas testemunhas TM, gestora de clientes da LN [no B] e AF, gestor de negócios do B, como sempre, foi tentada a regularização extrajudicial do crédito.

3.-Inviabilizada esta, foram remetidas aquelas cartas para as moradas fornecidas pelas executadas.

4.-Assim, devem estas duas pessoas considerar-se devidamente notificadas do teor daquelas declarações.

5.-Efectivamente, a carta de 03/02/2015, dirigida à executada L, embora não tendo sido recebida por si, foi recebida por terceira pessoa que se comprometeu a proceder à sua entrega, por estar em condições de o fazer.

6.-A carta foi remetida e recebida no Rua de, em Angra do Heroísmo, onde aquela executada, L, em pessoa, veio a receber a carta de 13/07/2015, cfr. fls. 41.

7.-A carta dirigida de 03/02/2015, dirigida à executada N, embora não tendo sido recebida por si, foi recebida por terceira pessoa que se comprometeu a proceder à sua entrega, por estar em condições de o fazer.

8.-As executadas nunca alegaram que aquelas cartas não lhes foram entregues por aquela pessoa, que as recebeu e que ficou ciente da obrigação legal de proceder à sua entrega, conforme resulta do disposto no artigo 228/2 do CPC (a carta pode ser entregue, após assinatura do aviso de recepção, ao citando ou a qualquer pessoa que se encontre na sua residência ou local de trabalho e que declare encontrar-se em condições de a entregar prontamente ao citando).

9.-Dispõe o artigo 224 do CC (que vale de igual modo para os simples actos jurídicos, como é a interpelação, atento o disposto no art. 295 do CC), que: 1.-A declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele conhecida; as outras, logo que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada.

2.-É também considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida.

(…) 10.-As executadas não puseram em causa que a morada para a qual foram remetidas aquelas cartas lhes pertencem; de igual modo, não alegaram, como deviam, que a carta recepcionada por terceiro não lhes foi, por este, entregue, conforme estavam oneradas (art. 342/2 do CC).

11.-Assim, só nos resta concluir que as cartas remetidas pela exequente às executadas e, também, à devedora subscritora da livrança (cfr. a/r, de fls. 34, que, aliás, foi recebido e assinado pela executada L), foram devidamente recepcionadas, produzindo os seus efeitos legais.

12.-Por esta razão, o tribunal considerou provado que as executadas foram interpeladas ao pagamento das quantias devidas e, só após o não pagamento das mesmas, a exequente, beneficiário da livrança, procedeu ao seu preenchimento, com observância do acordado no...

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