Acórdão nº 2203/14.1TTLSB.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelSEARA PAIX
Data da Resolução20 de Abril de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: O Ministério Público, na sequência de participação feita pela ACT, instaurou contra AA, acção especial de reconhecimento de existência de contrato de trabalho, pedindo que se declare a existência de um contrato de trabalho entre o trabalhador BB e a Ré.

Houve contestação da Ré e resposta do MP.

O Mº Juiz proferiu despacho saneador no qual julgou inconstitucional as normas constantes dos art. 26/1i), 186ºK a 186º do CPT, por violação dos princípios do Estado de Direito Democrático, na sua vertente do princípio da segurança jurídica e do princípio da confiança, da liberdade de escolha do género de profissão e da igualdade. Julgou verificada a excepção dilatória inominada consistente na “inconstitucionalidade da acção de reconhecimento de existência de contrato de trabalho” e, consequentemente, absolveu a Ré da instância.

Foi interposto recurso obrigatório pelo Ministério Público para o Tribunal Constitucional que, por acórdão nº 219/2015, de 8 de Abril de 2015, decidiu: a)Não julgar inconstitucional as normas constantes dos art. 26 nº 1 al. i) e 186º-K a 186º-R do Código de processo do Trabalho; e, em consequência, b)Conceder provimento ao recurso, determinando-se a reforma da decisão recorrida de acordo com o juízo de não constitucionalidade.

Volvidos os autos à 1ª Instância, foi proferido novo despacho saneador no qual o Mº Juiz decidiu julgar improcedente a excepção dilatória de erro na forma do processo arguida pela Ré, bem como a excepção dilatória de falta de interesse processual (falta de interesse em agir do M.P.).

Foi designada data para realização da audiência de julgamento.

O Interveniente/Trabalhador foi notificado nos termos do art.186ºL/4 do C.P.Trabalho, e no início da presente diligência o trabalhador desistiu do direito que lhe assiste à qualificação desse contrato como sendo contrato de trabalho.

O Mº Juiz proferiu, então, a seguinte decisão: “Face ao exposto e nos termos dos arts. 277º/d), 283º, 284º, 285º, 289º, a contrario, e 290º do C.P.Civil de 2013, aplicáveis ex vi do art. 1º/2a) do C.P.Trabalho, e art. 52º deste mesmo C.P.Trabalho, decide-se julgar válida e relevante a desistência do pedido formulada pelo trabalhador BB, declarando-se a extinção da presente instância e absolvendo-se a Ré AA do pedido.

Sem custas, por o Ministério Público estar isento delas.” O Ministério Público, não se conformando com esta decisão que julgou válida a desistência do pedido por parte do trabalhador BB, e, em consequência, declarou a extinção da instância absolvendo a Ré AA, do pedido, veio dela interpor o presente recurso, formulando, nas suas alegações, as seguintes CONCLUSÕES: (…) Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência o despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que determine a normal tramitação dos autos.

Não houve contra-alegação.

Remetidos os autos a este Tribunal da Relação, foram colhidos os vistos legais.

Cumpre apreciar e decidir.

A questão que emerge das conclusões do recurso consiste em saber se a desistência do pedido formulada pelo trabalhador BB, é válida.

Fundamentação de facto.

Os factos relevantes são os seguintes: Na presente acção especial de reconhecimento de existência de contrato de trabalho, que o Ministério Público instaurou contra AA, foi formulado o pedido que se declare a existência de um contrato de trabalho entre o trabalhador BB e a Ré.

Foi designada data para realização da audiência de julgamento.

O Trabalhador BB foi notificado, nos termos do art.186ºL/4 do C.P.Trabalho, e na tentativa de conciliação a que se procedeu, antes da realização da audiência de julgamento, o trabalhador declarou que “o contrato objecto da presente acção sempre foi um contrato de docência e não um contrato de trabalho. Já estava aposentado quando celebrou o contrato objecto dos presentes autos. Não tem qualquer interesse que a acção prossiga”. Mais declarou que “o contrato de docência mantem-se em vigor no momento actual com a Ré nos termos em que sempre foi executado, desempenhando o trabalhador outras funções, na área da formação, noutras entidades”. Declarou ainda que “está consciente que sendo um contrato de docência o mesmo pode terminar a qualquer altura por iniciativa da Ré o que confirma que assim foi contratado”.

O Mº Juiz perguntou ao Trabalhador se com essas declarações pretendia ou não desistir do seu direito à qualificação jurídica do contrato objecto desta acção como sendo contrato de trabalho, e pelo mesmo foi dito que “pretende desistir desse direito”.

O Mº Juiz proferiu, então, a seguinte decisão: “Face ao exposto e nos termos dos arts. 277º/d), 283º, 284º, 285º, 289º, a contrario, e 290º do C.P.Civil de 2013, aplicáveis ex vi do art. 1º/2a) do C.P.Trabalho, e art. 52º deste mesmo C.P.Trabalho, decide-se julgar válida e relevante a desistência do pedido formulada pelo trabalhador BB, declarando-se a extinção da presente instância e absolvendo-se a Ré AA do pedido.” Fundamentação de direito: A questão a apreciar neste recurso, como se disse, consiste em saber se a desistência do pedido formulada pelo trabalhador, é válida.

Esta questão tem sido apreciada nos Tribunais da Relação em termos divergentes.

Entendem uns ([1]) que a Lei nº 63/2013 de 26.08 introduziu no ordenamento jurídico a acção especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, como mecanismo de combate à utilização indevida do contrato de prestação de serviços em relações de trabalho subordinado, e de luta contra a precariedade das relações laborais, tem subjacente o interesse público prosseguido através da intervenção do Ministério Público, na defesa da legalidade democrática e promoção do interesse social. E na prossecução desse interesse visado pela Lei 63/2013, não está tanto em causa o interesse de um concreto trabalhador, mas sim o propósito de que as relações de trabalho subordinado sejam reconhecidas e executadas como tal pelas partes. Entendem estes que nesta acção o trabalhador não é parte e, logo, não tem legitimidade para exercer os direitos processuais inerentes a quem têm essa qualidade processual, nomeadamente o de desistir do pedido ou de qualificar a relação jurídica como de prestação de serviços através de acordo, na tentativa de conciliação a que se refere o art.º 186-0, do CPT.

Outros ([2]), porém, entendem que apesar do escopo da referida acção ser o combate à utilização indevida do contrato de prestação de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT