Acórdão nº 13-13.2TCFUN.L1--6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA MANUELA GOMES
Data da Resolução10 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: 1.

Á...

intentou, em Janeiro de 2013, acção declarativa contra M...

, com domicílio no Funchal, e "B... S.A.", com sede no Funchal, pedindo a condenação dos Réus a pagarem-lhe a quantia de € 974.895.87, a título de danos patrimoniais, acrescidos de juros de mora contados desde 27/06/2003, e ainda € 25.000,00, a título de danos morais.

Alegou ter estabelecido uma relação bancária com o Réu "B..., S.A.", tendo como interlocutor e agente de conta o Réu M..., sendo que este último efectuou movimentos na sua conta bancária, contra a sua vontade, e se apropriou de valores que lhe entregou para depósito na sua conta.

Mais invocou que esse comportamento do Réu M... lhe causou, quando o descobriu, sofrimento e angústia, devendo ser-lhe, por isso, atribuída a título de compensação, a quantia de € 25.000,00.

Citados os Réus, apenas o Réu "B..., S.A." apresentou contestação, impugnando o alegado pelo Autor e pugnando pela improcedência da acção.

Invocou que a relação estabelecida entre o Autor e o seu co-Réu M..., foi baseada em confiança familiar, referindo a existência de uma acção concertada entre os dois, com a intenção de ludibriar os serviços do Banco.

Invocou ainda que o Autor não apresentou prova cabal dos movimentos bancários que alega que o Réu M... efectuou, contra a sua vontade, nem dos danos morais que tal actuação lhe causou, pelo que entende que a acção deveria improceder.

Foi proferida sentença a julgar parcialmente procedente acção e, consequentemente, foram condenados, solidariamente, o Réu M... e o Réu "B...", a pagarem ao Autor a quantia de € 329.595,88, a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa civil legal supletiva, contados desde a data da citação e até integral pagamento; e condenados, também solidariamente, o Réu M... e o Réu "B...", a pagarem ao Autor a quantia de € 10.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa civil legal supletiva, contados desde a data da citação e até integral pagamento.

Absolveu os Réus dos restantes pedidos.

Inconformado, apelou o réu "B..." Alegou e, no final, formulou a seguinte síntese conclusiva: 1.No depoimento de R..., esta testemunha (arrolada pelo Autor, ora Apelado) reconhece expressamente o comportamento negligente e continuado de A... ao não verificar os extractos bancários do B..., S.A. que confessadamente recebia em casa.

2.O depoimento de C... (testemunha também arrolada pelo Autor) é claro quanto à relação essencialmente pessoal, familiar e de grande amizade entre o seu companheiro, A... e o Réu M....

3.O depoimento de I... (este também arrolado pelo Autor) é muito claro e muito objectivo quanto à antes invocada relação pessoal, familiar e de grande amizade que motivou a relação de confiança entre Á... e M... e ainda quanto ao comportamento negligente do Autor, ora Apelado, ao assinar documentos / impressos bancários em branco.

4.Também a testemunha J... disse expressamente que, tendo trabalhado com M... enquanto gerente, durante mais de dois anos, nunca viu o Senhor Á... na Agência, não se lembrando de o atender.

5.Dos depoimentos supra outra coisa não se pode concluir, quanto aos II. 2 Factos não provados, que a confiança existente entre o Autor e M... existia por conta da relação familiar e de amizade e de grande proximidade que entre ambos havia, sendo absolutamente acidental a relação bancária que entre os dois se estabeleceu e a qual só foi cimentada por causa dessa relação familiar e de amizade e de grande proximidade que comprovadamente ambos mantinham e cultivavam.

6.Disso é sintomático que, nos depoimentos mais inocentes, mais naturais de testemunhas C... e I..., a relação que é sempre referida é primeiramente a relação familiar e de amizade de A... e M....

7.Aos Factos Provados, deve ser aditado os pontos 52. e 53. dos Factos não Provados.

8.Aos Factos Provados deve ainda ser aditado o referido em 74. Dos Factos não provados pois, do depoimento de R..., resulta claramente que, recebendo o Autor, ora Apelado os extractos bancários em casa como recebia, então, se os tivesse analisado e não os tivesse dado/aceite como bons, teria verificado as alegadas irregularidades que nesta acção veio imputar.

9.Quanto aos II, 1 Factos Provados, não pode ser dado como provado - como o fez o Tribunal a quo - que foi na qualidade de gerente de conta do B..., S.A. que o Réu M... contactou inúmeras vezes o Autor (facto G.), como não pode também ser dado como provado que todos os movimentos e consequente relacionamento bancário entre o Autor e o B..., S.A. foi exclusivamente efectuado através de gestores de conta deste Banco quando o contacto de A... era feito em exclusivo com M... nunca tendo sido atendido ou se dirigido a qualquer outro colaborador desta mesma instituição bancária.

10.Não pode também ser dado como provado que o referido em J. dos Factos Provados tenha sucedido / ocorrido em consequência das relações bancárias estabelecidas.

11.O Tribunal a quo tenta escamotear aquela anormal relação existente entre Autor e primeiro Réu nomeadamente quando dá como liminarmente não provado o facto referido em 52. e dá como provado que foi em virtude das relações bancárias estabelecidas entre A... e M... que o primeiro assim agisse conforme indicado em 3., isto porque a confiança depositada pelo Autor no Réu M... foi fruto da relação familiar e de grande proximidade e não fruto da relação bancária que posteriormente se estabeleceu.

12.É que, conforme decorre dos documentos juntos nos autos (requerimento probatório do Banco B... de 06-12-2013) para prova do que é dito no artigo 29.° da contestação, a relação bancária de A... com o Banco B... inicia-se em 1993 e é este mesmo A... quem, no Auto de Inquirição de 14-10-2008, também junto aos autos nos termos do sobredito requerimento probatório, expressamente admite que conhece M... há mais de 30 anos, ou seja muito antes do indicado ano de 1993.

13.O B..., S.A. foi condenado ao pagamento dos acima já indicados €329.595,88 (trezentos e vinte e nove mil quinhentos e noventa e cinco euros e oitenta e oito cêntimos) a título de danos patrimoniais nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 500.° do Código Civil.

14.A responsabilidade objectiva deste Banco deve ser porém concretamente analisada à luz dos pressupostos de que depende a verificação da responsabilidade deste indicado artigo 500.° do Código Civil.

15.Cumpre por isso ponderar de forma consciente e objectiva não só ao facto da relação bancária estabelecida ter sido constituída depois e na medida da relação familiar, de amizade e de proximidade existente entre o Autor e o Réu M..., como também a conduta assumida e continuadamente negligente que o lesado Autor teve ao longo dos anos não só com a não verificação de extractos mas também com a consciente e livre assinatura de documentos em branco.

16.De facto, uma relação familiar, de amizade e de proximidade estabelece-se no exercício das funções confiadas por um banco a um seu funcionário bancário? 17.A confiança cega do Autor no deus M... ao ponto de não verificar durante anos os extractos bancários e assinar documentos em branco estabelece-se com aquele funcionário no exercício das funções que lhe foram confiadas pela sua entidade patronal banco? Ou antes em função da relação pessoal que, a montante e entre ambos, há muito se havia estabelecido? 18.A conduta negligente do lesado, facilitadora da própria lesão não deve ser objectivamente ponderada? É que a responsabilidade do comitente deve depender em absoluto de o facto ser praticado rigorosamente no exercício da função confiada ao comissário (RU, 110.°- 318).

19.Entende-se que o quadro supra de relação familiar, amizade, proximidade, quase crença que A... estabeleceu com o M... vai muito além, muito extravasa a relação bancária que a partir daí se tenha desenvolvido e no âmbito da qual as funções que o Tribunal a quo se limitou a ponderar foram levadas a cabo.

20.É que os factos em apreço foram praticados pelo Réu M... não porque ele era funcionário do B..., S.A. mas porque este mesmo Réu M... era, bem antes sequer de A... ser cliente do Banco B..., seu amigo, seu familiar há mais de 30 anos.

21.É que fora outro funcionário do Banco B... que não o seu ex-cunhado e o seu amigo próximo M... de há mais de 30 anos, A... teria então conferido os extractos bancários que recebia. O que não fez.

22.Os Tribunais e as decisões que proferem devem objectivamente a atender a todos os factos e a todas as circunstâncias que tornaram possíveis os danos. A Justiça é feita nessa exacta medida e nesse exacto compromisso. No caso, o Tribunal a quo comodamente limitou-se a dar por verificados os pressupostos do artigo 500.° do Código Civil relativamente aos quais a doutrina e a jurisprudência têm vindo a ser unanimes.

23.Ignorou que o Banco B..., aqui objectivamente responsabilizado é ele próprio também um lesado não só por conta do seu ex-funcionário mas também por conta da actuação grosseiramente negligente do Autor A....

24.E a mesma conduta e grau de culpabilidade do lesado assim como todas as demais circunstâncias do caso deve ser tida em conta na fixação dos danos não patrimoniais.

25.O Tribunal a quo uma vez mais ignorou toda a factualidade supra da relação familiar, de amizade, de grande proximidade, ignorou os documentos em branco que sucessivamente A... assinou, ignorou a não verificação dos extractos bancários que sempre em casa recebeu, não ponderou a culpabilidade deste lesado da qual necessariamente resulta no não arbitramento de qualquer montante a título de danos não patrimoniais.

26.Do mesmo modo o Tribunal a quo, relativamente ao montante dos danos patrimoniais, limita-se a aderir ao que antes havia sido decidido no processo crime a que alude a sentença proferida em cujos autos não foi o B...

De facto e recaindo sobre o Autor A... a prova do por si alegado em sede e Petição Inicial, este nenhuma prova...

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