Acórdão nº 12386/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelCATARINA JARMELA
Data da Resolução17 de Setembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

* I - RELATÓRIOIsabel ………………………………..

intentou no TAF de Loulé processo cautelar contra a ……………………………………………, SA, no qual peticionou a suspensão da eficácia da deliberação do Conselho de Administração da entidade requerida, de 14.11.2014, nos termos da qual foi determinada a demolição da construção n.º B-10, do Núcleo Nascente da Península do Ancão, e a sua desocupação totalmente livre e desembaraçada de pessoas e bens até ao dia 5 de Janeiro de 2015, bem como a tomada de posse administrativa dessa edificação - para concretização da demolição -, entre as 10h e as 17h de 7.1.2015.

Por sentença de 27 de Abril de 2015 o referido tribunal julgou o pedido cautelar procedente, determinando a suspensão da eficácia da deliberação em causa.

Inconformada, a entidade requerida interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul, tendo na alegação apresentada formulado as seguintes conclusões: «

  1. A sentença recorrida (a pags. 16-17) identificou somente as 2 (duas) únicas causas de ilegalidade (vícios) suscitadas pelo Requerente, (i) por um lado, os vícios que imputa ao "plano estratégico'' elaborado pela entidade requerida (ii) por outro, a ausência de reconhecimento e pagamento contemporâneo, de uma indemnização nos termos do Código das Expropriações, B) Apreciando os vícios invocados - que identificou como sendo somente os 2 (dois) acima descritos -, a sentença recorrida considerou-os manifestamente improcedentes, tão claras e contundentes as razões aduzidas na sentença.

  2. Diante deste juízo - tão claro e contundente - seria de esperar que a sentença terminasse concluindo pela manifesta falta de fundamento da pretensão - atento o fumus malus iuris evidenciado por ela própria na análise dos vícios objecto de alegação.

  3. Acontece que, na parte final da p. 27 em diante, a pretexto do artigo 95°, n°2, do CPTA (inaplicável aos processo cautelares) a sentença veio suscitar oficiosamente - sem antes ter dado a possibilidade à Requerida de se pronunciar - outros novos vícios que não tinham sido alegados, nem estavam em discussão E) Foi somente com base em novos vícios (não alegados) que o Tribunal "a quo" acabou por preferir sentença por julgar verificado o requisito do fumus boni iuris.

  4. O Tribunal "a quo" suscitou e conheceu oficiosamente aqueles novos vícios (não alegados), mas sem antes ter ouvido a entidade Requerida, ora Recorrente, como era imposto e obrigatório por força do elementar princípio do contraditório, nos termos dos artigos 3°, n°3 do CPC e 95°, n°2 do CPTA.

  5. A sentença recorrida é, pois, uma verdadeira decisão-surpresa, com a qual a entidade Requerida não podia razoavelmente contar, nem se defender.

  6. O que configura a omissão de uma formalidade essencial que a lei prevê, na tramitação típica do processo - e também aplicável aos processos cautelares apesar do seu carácter urgente - em clara violação do princípio do contraditório, nos termos dos artigos 3°, n°3 do CPC ex vi artigo 1° do CPTA e artigo 95°, n°2 do mesmo Código.

  7. Em consequência, deve ser julgada procedente a invocada nulidade por violação do princípio do contraditório e, por consequência, anulada parcialmente a sentença ora recorrida - artigo 195°, n°2 do C.P.C.

  8. Por outro lado, a sentença também deve ser anulada e expurgada de toda a parte nula, isto é, de todo o discurso fundamentador e decisório relativo àqueles novos vícios (não alegados), na parte da p. 27 em diante, pelo simples motivo de que os mesmos não são cognoscíveis nesta sede cautelar.

  9. É que as enunciadas características da instumentalidade, da sumariedade, e da urgência são incompatíveis com o suscitar novos vícios (não alegados) ao abrigo do artigo 95°, n.º 2, do CPTA (só previsto e próprio das acções principais), L) Pelo que, a sentença recorrida, ao julgar verificado o fumus boni iuris, com base apenas em novos vícios (não alegados) - que a Mmª Juíza "a quo" suscitou oficiosamente - e somente após de uma excepcional diligência de prova não requerida por qualquer uma das partes -, invocando para o efeito os poderes de cognição dispostos no artigo 95°, n.º 2, do CPTA (não aplicável aos processos cautelares), excedeu manifestamente aquilo que lhe era lícito conhecer nesta sede cautelar, sendo parcialmente nula.

  10. Face ao exposto, temos que a sentença recorrida violou a característica da sumariedade da apreciação jurisdicional nesta espécie processual urgente, assim como violou o princípio do dispositivo, tendo conhecido de questões (novos vícios) de que não podia tomar conhecimento, em violação dos arts.95°, n.º 2, 112°, 113°, 114°, n°s 3, al.ª g) e 4, 120°, n°l, al.ª b) do CPTA e dos artigos 5°, 608°, 2 e 615°, n°l, alínea d) do C.P.C., aplicável ex vi art. 1° do CPTA.

  11. A Recorrente considera incorrectamente seleccionada e julgada a matéria de facto, por omissão de selecção e decisão sobre facto manifestamente relevante para boa decisão da causa, através de confissão especificamente aceite no artigo 3° da contestação, de que: «a Requerente reside na Rua …………………….., n° …… A -8000-256 Faro»., comprovativa de que a construção em apreço não é a primeira (e única) habitação da Requerente, para efeitos do artigo 37° do POOC, bem como os factos constantes dos artigos 28° e 42° da contestação.

  12. Os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida são: a prova por confissão judicial espontânea aceite no artigo 3° da contestação (arts. 356°, n°l do C. Civ e 46° do CPC), e os docs. n°sl e 2 da contestação.

  13. Por mera cautela de patrocínio, e sem prejuízo das nulidades acima apontadas, que importam que a sentença seja expurgada de toda a parte nula, isto é, de todo o discurso fundamentador e decisório relativo àqueles novos vícios (não alegados), a sentença recorrida faz uma errada interpretação e aplicação dos factos e do direito, ao questionar os poderes que a Recorrente invoca e em que fundamenta a sua actuação, tendo em conta os poderes legais conferidos à Recorrente pelo artigo 3°, n.°2, do DL n° 92/2008, que não oferecem dúvidas.

  14. Acresce o despacho ministerial de 21/09/2012, na parte expressamente sublinhada e destacada, que «compete à Polis RF a aprovação do PIR para as áreas a renaturalizar no âmbito do Polis Litoral Ria Formosa», cujo âmbito vem definido no artigo 2°, n°3 do DL n°92/2008; e ainda a cláusula 10ª, n°2 do Acordo entre o Estado português e os Municípios de Faro, Olhão, Tavira, Loulé e Vila Real de Santo António, relativo à ………………………………, de 02/05/2008.

  15. Dada a solução da sentença recorrida, deve ser aditado à matéria de facto que: o PIR também foi elaborado e aprovado pelo ministério responsável pela área do ambiente, através da Administração da Região Hidrográfica do Algarve, I.P., por despacho de 05/01/2012, que se junta e se dá aqui por integralmente reproduzido como doc. n°2 - cuja apresentação se tornou necessária apenas em virtude da decisão-surpresa proferida em 1° instância, nos termos do artigo 651°, n°l do C.P.C.

  16. Nos termos do artigo 1°, n°2 do Decreto-Lei n°208/2007, de 29 de Maio, as Administrações de Região Hidrográfica (ARH I.P.), prosseguem atribuições do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional (MAOTDR), sob superintendência e tutela do respectivo ministro.

  17. Por sua vez, nos termos do artigo 1°, n° l da Portaria n.° 393/2008, de 5 de Junho, as Administrações de Região Hidrográfica (ARH) sucederam no domínio dos recursos hídricos em todas as posições jurídicas tituladas pelas Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), criadas pelo Decreto-Lei n° 134/2007, de 27 de Abril, e também dotadas de competências para intervir nos procedimentos de gestão territorial relativos à adopção de medidas de política de solos que careçam de aprovação pelo Governo - como resulta do artigo 2°, alínea j), da Portaria n° 528/2007,de 30 de Abril.

  18. Pelo que, ainda que por hipótese subsistissem quaisquer dúvidas sobre a aprovação ministerial do PIR, as mesmas estariam sanadas pelo doc. n°2 junto, cuja apresentação se tornou necessária apenas em virtude da decisão-surpresa proferida em 1° instância, nos termos do artigo 651° do C.P.C.

  19. Acresce, como aliás reconhecido na sentença, que o indicado PIR é um mero projecto de execução de programação das medidas de renaturalização.

  20. Ora, as soluções adoptadas já tinham sido estabelecidas de formas vinculativa e sem qualquer margem de discricionariedade ao nível do artigo 37°, n°2, e 83°, n°l, alínea a), e n°2, alínea c) do Regulamento do POOC - onde se prevê pura e simplesmente "na área de domínio hídrico, demolição e remoção das edificações", vinculativos para entes públicos e particulares.

  21. Sempre seria aplicável o princípio do aproveitamento do acto administrativo, uma vez que a decisão foi proferida no âmbito de poderes vinculados, sem envolver qualquer margem de discricionariedade, podendo concluir-se, à luz das indicadas normas do POOC, que a decisão tomada era a única concretamente possível.

  22. Não é possível sequer descortinar quais os «trâmites procedimentais» do PIR questionados a que a sentença se refere, porque não foram alegados, nem concretizados, pelo que, nos termos em que foi suscitada a questão - torna-se inviável qualquer resposta - sendo manifestamente insuficiente para dar como verificado o requisito do fumus boni iuris baseado apenas nessa abstracção.

  23. Pelo que a sentença recorrida violou o artigo 120°, n°l, alínea b) do CPTA, ao considerar encontrar-se preenchido o requisito fumus boni iuris, somente com base nos indicados novos vícios, manifestamente improcedentes.

    A

  24. Como se pode verificar a pags. 16 a 26 da sentença, diante deste juízo – tão claro, simples e contundente - seria de esperar que a sentença terminasse concluindo pela manifesta falta de fundamento da pretensão - atento o fumus malus iuris evidenciado por ela própria na análise dos vícios objecto de alegação.

    BB) Consequentemente, tendo em conta o juízo tão claro, simples e contundente da sentença recorrida que, no seu discurso fundamentador...

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