Acórdão nº 885/07.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelCATARINA ALMEIDA E SOUSA
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul 1 – RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA, inconformada com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade S..., LDA, contra o ato de liquidação adicional de IVA n.º ..., relativo ao período 2004/12, no valor de € 12.337,67, e respectivos juros compensatórios, no valor de € 868,03, vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.

Nas suas alegações expende, a final, o seguinte quadro conclusivo: “ I. A impugnante contabilizou o valor de 41.869.33, a título de quebras de existências, tendo-se verificado no decurso da acção inspectiva externa efectuada que para as mesmas não existia facturação que titulasse as respectivas vendas e que as mesmas também não se encontravam nas instalações daquela.

  1. Dispõe o art.º 80º do CIVA que se presumem transmitidos os bens adquiridos, importados ou produzidos que não se encontrem em qualquer dos locais em que o contribuinte exerce a sua actividade, pelo que, fundada na presunção da sua respectiva transmissão/venda, foi apurado IVA em falta, do ano de 2004, no montante de 12.337,68.

  2. A aplicação do disposto no art.º 80º do CIVA em sede de procedimento inspectivo justificou-se enquanto resultado da inventariação operada e da verificação da falta de bens face aos registos contabilísticos.

  3. Por tal facto, nos termos do art.º 80º do CIVA, presumiu-se a transmissão dos bens encontrados em falta, com a consequente liquidação do correspondente imposto.

  4. E tratando-se de uma presunção juris tantum, apenas ilidível perante prova em contrário, isto é, mediante prova de que os bens não foram efectivamente objecto de transmissão, a impugnante não logrou, ressalvado melhor entendimento, apresentar prova suficientemente demonstrativa de ter procedido à destruição, inutilização, obsolescência ou deterioração daquelas existências.

  5. Com efeito, a contabilidade da impugnante não permite demonstrar com efectividade qual o destino dado aos bens, posto que a organização contabilística por aquela implementada é reveladora de descontrolo na área das existências/inventários, como a própria reconhece quando se refere a situações como inventariação incorrecta dos bens; incorrecto envio de produtos ao cliente final (o que desencadeia uma alteração no produto em causa enquanto o produto não regressa), de bens com defeito de fabrico, de bens inutilizados por mau acondicionamento no transporte, bens que se tornam obsoletos, etc.

  6. E, neste conspecto, os depoimentos prestados neste estrito sentido afiguram-se concertados e comprometidos ab initio com aquela tese, não se revelando, portanto, idóneos para provar a tese exposta.

  7. Assim, não logrando carrear para os autos a prova contrária necessária e imprescindível para ilidir a presunção legal de que a Administração Fiscal beneficia, nos termos do art.º 80º do CIVA, sempre a questão decidenda deveria ter sido decidida contra a impugnante.

  8. A douta Sentença a quo fez errada interpretação do art.º 80º do CIVA, dos artigos 73º e 74º n.º 1 da Lei Geral Tributária e dos artigos 342º n.º 1, e 350º do Código Civil.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação totalmente improcedente, tudo com as legais e devidas consequências.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO, FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA” * Notificada das alegações de recurso, veio a Recorrida contra-alegar, terminando com as seguintes conclusões: “ A - O recurso quanto à matéria de facto deve ser rejeitado por total falta de especificação por parte da Recorrente, visto que não foi cumprido o ónus imposto pelo artigo 640.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 281.º do CPPT.

B - Insurge-se a FP quanto ao vício de violação de lei que foi imputado na sentença recorrida.

C - O Trihunal a quo concluiu não estarem reunidos os pressupostos de que depende a aplicação do artigo 80.º do Código do IVA, uma vez que os Serviços de Inspeção não lograram demonstrar que determinados bens não tinham sido encontrados em locais em que a recorrente exerce a sua atividade (nem tão pouco indicar quais os supostos bens em causa).

D - Conforme explicou o Tribunal a quo ''a Administração Tributária não provou a existência do facto conhecido de que teria que partir [inexistência dos bens em armazém] para aplicar aquela presunção".

E - A inspeção tributária não reuniu os pressupostos suficientes para aplicar a presunção legal, preferindo "assumir" que o valor registado em quebras dizia respeito a bens que não se encontravam em armazém.

F - E que, ainda que assim não se entendesse, sempre teria de se concluir que a impugnante havia ilidido a presunção do supra mencionado artigo, face à prova efetuada nos autos, mais concretamente da factualidade assente em F), G). H) e I) do probatório.

G - Caso este Venerando Tribunal venha a considerar procedentes os argumentos da Recorrente - o que apenas por cautela de patrocínio se equaciona, sem conceder -, requer-se a ampliação do âmbito do recurso, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 636.º do CPC.

H - Nesse caso, seria forçoso concluir que a impugnação seria procedente porque a liquidação padece do vício de falta de fundamentação.

Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exa. doutamente suprirá, deve ser negado provimento ao presente recurso.

” * O Exmo. Magistrado do Ministério Público (EMMP) junto deste Tribunal emitiu Parecer onde concluiu no sentido da improcedência do recurso.

* Colhidos os vistos, vem o processo submetido à Secção de Contencioso Tributário para julgamento do recurso.

* 2 - FUNDAMENTAÇÃO 2.1. De facto É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida: A - A Impugnante exerce a actividade de importação, exportação, fabrico e venda de equipamento de protecção individual (facto alegado no artigo 2º da petição inicial e não contestado pela Fazenda Pública); B - A Impugnante, no ano de 2004, mudou do sistema de inventário intermitente para o sistema de inventário permanente (cfr. depoimento da testemunha M...); C - Em finais de 2003/início de 2004, no âmbito da reestruturação da Impugnante, esta adquiriu e implementou um novo sistema informático (PHC) (cfr. depoimento das testemunhas de C..., G..., e D...); D - Com a implementação do sistema informático referido em C), cada produto passou a ser especificado e referenciado por subcategorias (cfr. depoimento das testemunhas C... e G...); E - Do sistema informático referido em C) consta o registo do preço de custo e de venda de cada tipo de produto (cfr. depoimento das testemunhas C..., G... e D...); F - No ano de 2004, tendo por base suporte documental com, designadamente, a identificação do produto e seu valor, foram registadas na contabilidade da Impugnante quebras no valor de € 198.894,39 e sobras no valor de € 156.525,06, tendo a diferença entre estes dois valores (€ 41.869,33) sido contabilizada como custo extraordinário desse ano...

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