Acórdão nº 925/16.1BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 25 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelJORGE CORT
Data da Resolução25 de Maio de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. Relatório A Fazenda Pública interpõe o presente recurso jurisdicional contra a sentença proferida a fls. 248/264, que julgou procedente a reclamação judicial deduzida por “I... Limpezas e Serviços, Unipessoal, Lda.” contra o despacho do Chefe de Divisão da Direcção de Finanças de Lisboa, de 26.04.2016, que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia por si formulado.

Nas alegações de recurso, a recorrente formula as conclusões seguintes: 1) Pela sentença proferida nos autos à margem referenciados, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra julgou procedente a reclamação do ato do órgão de execução fiscal deduzida por I... Limpezas e Serviços Unipessoal, Lda, declarando, "que o despacho impugnado fez incorrecta aplicação da lei, e deve por isso ser anulado".

2) E, ao contrário do entendimento vertido na douta Sentença recorrida, consideramos que para ser deferido o pedido de dispensa de prestação de garantia é necessário que se verifiquem três requisitos: que a prestação da garantia causa prejuízo irreparável ao executado ou que seja manifesta a sua falta de meios económicos; que haja uma situação de inexistência de bens ou da sua insuficiência para pagamento da dívida exequenda e do acrescido; e, que essa inexistência ou insuficiência não seja imputável ao executado.

3) Ou seja, destes, são requisitos alternativos para que o interessado possa ser dispensado da prestação de garantia, a ocorrência de prejuízo irreparável causado pela prestação da garantia ou a manifesta falta de meios económicos para a prestar, desde que, em qualquer dos dois casos, a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado.

4) No que diz respeito ao requisito da manifesta falta de meios económicos entende-se desde já que o mesmo não se mostra preenchido uma vez que a Reclamante nada provou, isto é, com a reclamação não juntou qualquer tipo de prova, ficando-se apenas por um conjunto de considerações e alegações sem junção de qualquer tipo de prova documental que comprovem as mesmas.

5) Contudo, entendeu a douta sentença que a "Reclamante produziu prova bastante para firmar no tribunal a convicção de que, atento o montante da garantia a prestar, não dispõe dos necessários meios." 6) E que, "revela-se incompleta a informação que suporta o despacho impugnado, na medida em que não detalha nem pondera os encargos que a reclamante deve suportar no seu funcionamento, bastando-se com a enumeração de elementos do activo, ainda assim, de forma incorrecta, como se retira do facto de ter incluído no activo fixo tangível um bem de que a Reclamante não é proprietária." 7) Ora, com o devido respeito, não podemos concordar com tal conclusão, para tal veja-se a Informação da Administração Tributaria quanto ao pedido inicial, ao referir que os bens da executada, no seu conjunto, são nitidamente superiores ao valor a garantir nos autos e que a Reclamante não demonstrou, por um lado, que os seus bens se mostrem insuficientes para assegurar o crédito exequendo, e por outro lado, se os mesmos fossem onerados, esta oneração não impossibilitaria a executada de exercer a sua actividade.

8) Assim, bastava o não preenchimento deste requisito alternativo da Reclamante não carrear para os autos qualquer elemento de prova sobre a ocorrência de prejuízo irreparável causado pela prestação da garantia ou sobre a falta de meios económicos para a prestar e, como refere o Jorge Lopes de Sousa, "no que concerne ao prejuízo, irreparável o interessado deverá indicar em que é que ele se concretiza e indicar as razões que levam a crer que existe uma séria probabilidade de ele poder vira ocorrer se não for dispensado da prestação da garantia." 9) Aliás, conforme decorre das normas de âmbito geral relativas à distribuição do ónus da prova vertidas no artigo 342.º do Código Civil (CC) e no artigo 74.º da LGT, incumbe ao executado a prova dos factos constitutivos do direito à dispensa de garantia que invoca.

10) É certo que haverá circunstâncias em que poderá ser feito um juízo de inexigibilidade sobre o carácter documental da prova, nos casos concretos em que tal exigência seja considerada de tal forma onerosa que possa configurar um constrangimento ilegítimo do direito constitucionalmente garantido de acesso ao Direito.

11) Assim sendo, relativamente às regras aplicáveis em matéria do ónus da prova, teremos que seguir as regras gerais estabelecidas, quer no Código Civil, quer, em particular, na Lei Geral Tributária, ou seja, nos termos do artigo 342.º e 344.º, n.º 2 do CC, "Aquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado. A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita. Em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como constitutivos do direito." 12) De igual modo, no que concerne ao procedimento tributário, o artigo 74.º, n.º l da LGT, refere que, "O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque." 13) In casu, é sobre o reclamante, aquele que pretende a dispensa de prestação da garantia, que impende o ónus de provar que se verificam os pressupostos constitutivos do direito à referida dispensa.

14) Neste sentido, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), de 19 de Dezembro de 2012, processo n.º 01320/12, ao concluir que, "I - É sobre o executado que pretende a dispensa de garantia, invocando explícita ou implicitamente o respectivo direito, que recai o ónus de provar que se verificam as condições de que tal dispensa depende, pois trata-se de factos constitutivos do direito que pretende ver reconhecido." 15) Ou seja, de acordo com as alegações da Reclamante, a mesma nunca demonstrou a falta de meios económicos, revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento de dívida exequenda e acrescido e que, ao não ser concedida a dispensa de garantia e a eventual penhora de bens, saldos bancários e créditos dos clientes, "criar-lhe-ão uma "asfixia" financeira tal que a impediria de continuar a implementar o plano de recuperação judicialmente homologado." 16) Neste seguimento, não poderemos concordar com a douta sentença, ao concluir que "o montante de Euros €52.383,57 que integra a conta "Clientes", corresponde a uma mera contacorrente do valor a receber dos clientes, não estando disponível na totalidade e a todo o momento por forma a ser entregue à AT. De todo o modo, e passando ao restante requisito legal, da ocorrência de prejuízo irreparável causado pela prestação da garantia, a ora Reclamante alegou e provou que, ao ficar privada deste montante de Euros 52.383,57 ou da utilização das suas carrinhas e máquinas de limpeza, deixaria de poder cumprir o plano de pagamento em prestações acordado com a AT, o PER e as demais despesas que deve suportar para poder funcionar, entrando, de imediato, em situação de insolvência." 17) Ou seja, considerando os fundamentos invocados, a Reclamante não fez prova da sua notória dificuldade financeira, não permitindo aferir da sua falta de liquidez financeira e que a mesma reflectiria numa situação de prejuízo fiscal.

18) Além disso, no que se refere ao pedido de dispensa de prestação de garantia, será sempre necessário provar, não só que haja uma situação de inexistência de bens ou da sua insuficiência para pagamento da dívida exequenda e do acrescido, mas, também, que essa inexistência ou insuficiência não seja imputável ao executado e que a prestação da garantia causa prejuízo irreparável ao executado ou que seja manifesta a sua falta de meios económicos.

19) A reclamante tenta convencer de forma conclusiva da insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, mas ao mesmo tempo refere que "a prossecução de qualquer penhora que incida sobre os seus bens móveis e/ou os créditos do seus clientes automaticamente conduziria ao seu incumprimento generalizado deixando de poder laborar e consequentemente causando-lhe um prejuízo irreparável deixando de cumprir as suas obrigações, actuais e as assumidas no seu P.E.R." 20) Neste sentido a douta sentença ao concluir que "ao ficar privada deste montante de Euros 52.383,57 ou da utilização das suas carrinhas e máquinas de limpeza, deixaria de poder cumprir o plano de pagamento em prestações acordado com a AT, o PER e as demais despesas que deve suportar para poder funcionar, entrando, de imediato, em situação de insolvência." 21) Ora ao pressupor a existência de bens no seu activo, não se consegue aferir de que forma inequívoca é que a prestação de garantia, através da penhora de alguns bens, até cumprimento integral, poderia causar prejuízo irreparável à executada.

22) A verdade é que a executada, ora Reclamante, falhou no seu ónus de fundamentação e comprovação dos pressupostos do direito a que se arrogou e, continua a falhar, mesmo em sede de reclamação.

23) Ao contrário, pela confrontação entre o teor do requerimento apresentado pela executada e o teor da informação e do despacho que recaíram sobre o mesmo, fica patente que a decisão reclamada em nada merece repreensão, mostrando-se devidamente fundamentada, de facto e de direito, e permitindo perfeitamente apreender a razão que levou a administração a proferir aquela decisão.

24) Ora, e como bem refere o Serviço de Finanças, a Reclamante não provou que a prestação de garantia consubstancie ou implique prejuízo irreparável, nem que a insuficiência de bens não tenha derivado de culpa sua. Sendo certo que não é feita qualquer alegação válida de prejuízo irreparável adveniente da prestação da garantia.

25) Isto porque só devem ser considerados irreparáveis os prejuízos ou danos cuja extensão não possa ser avaliada pecuniariamente, sendo certo que os mesmos terão de ser consequência directa do acto de que se reclama, impendendo sobre a Reclamante o ónus de especificar e concretizar os citados prejuízos e de alegar...

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