Acórdão nº 07098/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 13 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelBARBARA TAVARES TELES
Data da Resolução13 de Julho de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO E…, S.A., inconformada com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a impugnação judicial intentada contra a liquidação de IVA de 1998 e liquidação de juros compensatórios relativa a Julho de 1998 e Dezembro de 1998, no valor total de €13.573,75, veio dela interpor o presente recurso jurisdicional: A Recorrente termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: A. “Conclusões: 1. Nos presentes autos, discutiu-se a legalidade da aplicação da presunção de venda contida no artigo 80.º [atual artigo 86.º] do Código do IVA, às Existências, bens de Economato e Imobilizado que não se encontravam no local de exercício da atividade da ora Recorrente no final do exercício de 1998.

  1. Sem prejuízo da sua concordância, em termos gerais, com o elenco dos factos dados como provados pelo Meritíssimo Juiz a quo, entende a Recorrente que deverão ser ainda dados como provados os seguintes factos, essenciais à boa decisão de causa: i. Que o volume de vendas alcançado pela Recorrente no exercício de 1998 foi de € 2.110.703,11 (Esc. 423.157.980); ii. Que a percentagem de quebras de Existências do exercício de 1998 foi de 0,62% do volume de vendas iii. Que tal rácio é inferior à média nacional registada em 1,4%.

  2. Quanto ao âmbito de aplicação do artigo 80.º [atual artigo 86.º] do Código do IVA, conclui-se face aos elementos literal e teleológico da norma que o mesmo só abrange os bens que possam ser transmitidos na atividade normal da empresa.

  3. Por outro lado, tal presunção só pode ser aplicada quando existam indícios claros de venda, o que não sucede no caso vertente.

  4. Isto porque, em matéria tributária, vigora o princípio geral de presunção de boa-fé, presumindo-se verdadeiras as declarações apresentadas pelos mesmos (cf. art. 59.º, n.º 2, e art. 75.º, ambos da LGT).

  5. Neste sentido, a presunção de venda contida no artigo 80.º [atual artigo 86.º] do Código do IVA deve também ser mediada pelo confronto com os princípios da legalidade, da justiça e da proporcionalidade (cf. art. 55.º da LGT).

  6. Assim, a aplicação desta presunção não pode ser automática, devendo sempre ter correspondência com a realidade material.

  7. Por fim, também quanto à forma de elisão da presunção contida no artigo 80.º [atual artigo 86.º] do Código do IVA, resulta claro que a legislação fiscal não restringe tal efeito a um elenco pré-determinado de documentos, como se infere da Douta Sentença recorrida.

  8. Face ao exposto, haverá que concluir que toda a prova apresentada pela Recorrente é legítima e deverá ser devidamente valorada.

  9. Sendo por isso ilegal o entendimento subjacente à Douta Sentença sob recurso, de acordo com o qual a presunção contida no artigo 80.º [atual artigo 86.º] do Código do IVA só poderia ter sido ilidida através de participações de furtos e autos de abate.

  10. No caso vertente, a Administração Tributária limitou-se a uma aplicação automática, cega e injusta da presunção prevista no artigo 80.º do Código do IVA, sem atender às circunstâncias do caso concreto e apesar de não existirem quaisquer indícios de vendas paralelas dos bens em questão 12. De facto, os valores registados na contabilidade da Recorrente como quebras da rubrica de Existências têm por base exclusivamente pequenos furtos, erros de codificação de mercadorias e produtos danificados, conforme se demonstrou através da prova testemunhal produzida.

  11. Sendo facto notório, suportado no artigo publicado no Jornal de Notícias junto aos autos em 14.08.2003, que a área de atividade da Reclamante regista uma média de quebra de Existência por furtos de 1,4% do volume de vendas.

  12. Quebras que, no caso vertente, têm valor correspondente a 0,62% do volume de vendas da Recorrente no exercício de 1998.

  13. Por outro lado, quanto à exigência de autos para participação dos furtos como prova (única) da ocorrência dos mesmos, conclui-se que a mesma não tem correspondência com o teor literal da norma.

  14. Sendo contrário ao princípio da justiça e da proporcionalidade (art. 55.º da LGT) exigir uma prova que acarretaria custos administrativos mais elevados do que os (potenciais) ganhos com a recuperação – impossível – dos bens furtados.

  15. Também os valores registados na contabilidade da Recorrente como quebras do Economato não tiveram subjacente qualquer transmissão onerosa desses bens, devendo-se essencialmente a uma deficiente contabilização das “saídas” ou “consumos” desses bens ao longo do exercício (cf. prova testemunhal produzida).

  16. No entanto, a presunção legal contida no artigo 80.º [atual artigo 86.º] do CIVA nunca teria aplicação a bens de Economato, que não se destinam ao exercício da atividade da Recorrente.

  17. Contudo, ainda se tal norma tivesse aplicação aos bens de Economato – o que apenas por acutela se admite – a presunção de venda deveria ser considerada ilidida em virtude da prova testemunhal produzida nos autos.

  18. Por fim, também quanto ao “abate de imobilizado”, conclui-se que não tem aplicação a presunção contida no artigo 80.º [atual artigo 86.º] do CIVA, cujo âmbito de aplicação, ao abrigo do Ofício n.º 35.264. de 24.10.1986 dos SAIVA, se destina expressamente a Existências.

  19. E, mesmo que a identificada citada presunção fosse aplicável ao Imobilizado – o que não se aceita – a mesma seria sempre uma presunção ilidível, que não pode ser aplicada automaticamente sem qualquer conexão com a realidade.

  20. Ora, nos presentes autos, foi produzida prova testemunhal bastante de que o Imobilizado em causa foi destruído e não alienado, sendo indefensável, face a teor literal da presunção aplicada pela Administração Tributária, o entendimento de que a mesma só poderia ter sido ilidida mediante a elaboração de autos de abate.

  21. Por todo o exposto, deve ser revogada a Douta Sentença recorrida, por manifesto erro de julgamento, consubstanciado na errónea interpretação e aplicação do disposto no artigo 80.º [atual artigo 86.º] do Código do IVA, errada valoração da prova produzida e, bem assim, por violação dos princípios da justiça, da legalidade da proporcionalidade previstos no artigo 55.º da LGT.

    TERMOS EM QUE, Nos melhores de direito e com o sempre mui Douto suprimento de V. Exas., deve o presente Recurso ser considerado procedente e a Douta Sentença recorrida revogada, com todas as necessárias consequências legais.

    Pois só assim se fará a necessária JUSTIÇA.” *A Recorrida não apresentou contra-alegações.

    *Neste Tribunal, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer, defendendo que o recurso não merece provimento devendo, em consequência, a sentença recorrida ser mantida.

    * Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.

    *Objecto do recurso - Questão a apreciar e decidir: Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pela Recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

    As questões suscitadas pela Recorrente consistem em apreciar se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de facto e de direito quando decidiu pela improcedência da impugnação por entender que, ao caso em concreto, se aplica a presunção legal do artigo 80º do CIVA.

    *II.FUNDAMENTAÇÃO II. 1. Da Matéria de Facto A sentença recorrida deu como assente a seguinte matéria de facto: “A) - A Administração Fiscal procedeu a inspecção à actividade da Impugnante e elaborou o relatório de inspecção tributária que constitui fls. 9 e segs. do processo administrativo apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido e donde resulta com interesse para a decisão: «(…) II - OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA A. MOTIVO, ÂMBITO E INCIDÊNCIA TEMPORAL Nos termos do art° 46° do RCPIT, foi emitida a Ordem de Serviço n° … com o código PNAIT …, para o procedimento externo de verificação do pedido de reembolso de IVA do sujeito passivo E…, S.A., NIPC … e CAE 52.444: Comércio a Retalho de Outros Artigos para o Lar.

    O reembolso de IVA, no montante de Esc.5.391.637, foi pedido no período 9902 e resulta de créditos de imposto reportados de períodos anteriores.

    O sujeito passivo exercia a actividade de comércio a retalho de artigos para o lar nas lojas P… do centro comercial … e no …, tendo deixado de explorar aqueles espaços comerciais em Setembro de 1998. O sujeito passivo não procedeu no entanto à cessação da actividade B. ENQUADRAMENTO FISCAL Em termos de IRC o sujeito passivo é residente, exercendo a título principal uma actividade de natureza comercial, encontrando-se enquadrado no regime geral de tributação.

    Em sede de IVA o sujeito passivo encontra-se enquadrado no regime normal de tributação com periodicidade mensal.

    III - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL 1. DONATIVOS E QUEBRAS DE EXISTÊNCIAS 1.1 Donativos Em 3 1/10/1997 o sujeito passivo considerou como um custo extraordinário, na conta 691, donativos de mercadoria no valor de Esc.625.829, não tendo procedido à liquidação do correspondente IVA.

    Nos termos da alínea f) do n.°3 do art° 3° do Código do IVA a transmissão gratuita é considerada uma transmissão de bens e como tal encontra-se sujeita a IVA. Tendo em consideração que os bens comercializados pelo sujeito passivo...

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