Acórdão nº 08954/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelLURDES TOSCANO
Data da Resolução29 de Junho de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul l – RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA, vem recorrer da sentença de fls. 367 a 382 proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por B… e N… do indeferimento da reclamação graciosa que apresentaram contra o acto de liquidação adicional de IRS e respectivos juros compensatórios, do ano de 2006, no valor global de €11.317,11, e na qual foi desconsiderado a pretensão de reinvestimento declarada no anexo G, relativamente ao valor de realização do imóvel inscrito na matriz sob o artigo 3269.

Nas suas alegações de recurso formula as seguintes conclusões: «Deve ser dado provimento ao presente recurso porquanto, como se mostra dos autos: 1 - A, aliás, douta sentença recorrida ofendeu o preceito do artigo 77 da LGT e 66 CIRS ao decidir anular a liquidação com fundamento na falta de fundamentação.

2 - A verdade é que, a densidade gradativa do conteúdo da fundamentação terá de ter em conta a natureza estritamente vinculada do acto tributário, o seu carácter massivo e a circunstância de a sua base factual ter sido declarada pelos contribuintes, no lugar da averiguação e apreciação das circunstâncias pela AT, devendo considerar-se suficientemente fundamentado com a indicação na "demonstração de liquidação" dos valores considerados, respectiva taxa e operações efectuadas.

3 - Elementos suficientes para que uma pessoa normal, perante a situação concreta, fique em condições de o conhecer e controlar, na construção segregada pela doutrina e jurisprudência.

4- Na hipótese de assim se não entender, adquirido nos autos que os impugnantes ficaram cientes das razões de facto e de direito da decisão da AT por via de resposta ao requerimento formulado nos termos do artigo 37 CPPT, facto discernido claramente pelos meios de reacção posteriormente apresentados, em perfeita correspondência com o resultado a que chegou o procedimento correcto do tribunal a quo seria declarar a irrelevância do vício de forma.

5 - Tendo aqui todo o cabimento a posição adoptada pela jurisprudência: as normas devem ser apreciadas segundo a função que lhes é atribuída, de modo que se esse fim é conseguido por outra via, a formalidade não deve ser tratada como substancial; e, por isso, admitir como subentendido, que em atenção a essa circunstância -não existem motivos para anular o acto.

Assim, de harmonia com o exposto, e, principalmente, pelo que será suprido pelo Douto Tribunal, deve ser revogada a sentença acorrida, com as legais consequências, come é de JUSTIÇA.

»* Os Recorridos contra-alegaram, apresentando as seguintes conclusões: «A. Aos Impugnantes nunca foram dados a conhecer prévia ou concomitantemente à emissão da liquidação impugnada os respectivos fundamentos de facto e de Direito; B. Efectivamente, apesar de terem utilizado o mecanismo previsto no artigo 37° do CPPT, os Impugnantes não foram devidamente esclarecidos na resposta obtida relativamente aos fundamentos de facto e de direito da liquidação impugnada, contrariamente ao que a Fazenda Pública parece querer afirmar nas respectivas alegações de recurso; C. Apenas no primeiro projecto de despacho de decisão de reclamação graciosa, e portanto em Dezembro de 2010, a AT dá a conhecer pela primeira vez as razões que alegadamente motivaram a liquidação de IRS impugnada, por remissão para os fundamentos constantes de acto decisório proferido em outro processo de reclamação graciosa nº …, que levaram a AT a concluir que o Impugnante Marido nunca tivera a sua habitação própria e permanente no Imóvel Primitivo alienado no ano de 2006; D. Os Impugnantes nunca poderiam razoavelmente contar com tal motivação dado que a mesma não tem qualquer aderência à realidade dos factos; E. A AT sempre se furtou, todavia, a apreciar devidamente o vício de falta de fundamentação alegado pelos Impugnantes na respectiva reclamação graciosa, a analisar a prova documental comprovativa da habitação própria e permanente do Impugnante Marido e a explicar porque razão, por um lado, não aceitou o cumprimento dos pressupostos previstos para o reinvestimento declarado pelo Impugnante Marido e, por outro, aceitou um reinvestimento parcial do mesmo no valor de € 9.202,54; F. O vício de falta de fundamentação formal não se poderá degradar em formalidade não essencial verificando-se que os Impugnantes nunca puderam compreender verdadeiramente as razões de facto e de direito motivadoras da liquidação de IRS e exercer convenientemente o seu direito de defesa; G. Termos em que a liquidação de IRS impugnada efectivamente padece do vício de falta de fundamentação formal, nos termos do artigo 77° da LGT, o qual determina a sua anulação, como entendido na sentença objecto de recurso, que se deverá desta forma manter; H. No caso de proceder a argumentação alegada pela Fazenda Pública, o que por mera cautela de patrocínio se concede, a liquidação de IRS impugnada deverá ainda assim ser anulada dado que padece também do vício de falta de fundamentação material; I. A jurisprudência do STA defende que apenas será de atender à fundamentação contextual e contemporânea, ou seja, aquela que se integra no próprio acto e à face da qual se procede à apreciação contenciosa da respectiva legalidade, sendo irrelevantes os elementos que, com esses objectivos, sejam invocados a posteriori; J. No caso em apreço, a AT furtou-se a analisar a matéria de facto em causa no processo de reclamação graciosa e motivou a respectiva decisão de indeferimento com base num fundamento totalmente novo e nunca antes alegado anteriormente ao segundo projecto de despacho de decisão de que os Impugnantes apenas tomaram conhecimento em Fevereiro de 2011, o que constitui invariavelmente uma alteração de fundamentos ilegal; K. Termos em que, ainda que proceda a argumentação alegada pela Fazenda Pública, a liquidação de IRS impugnada deverá ainda assim ser anulada dado que padece do vício de falta de fundamentação material, nos termos do artigo 77° da LGT, o que desde já se requer a título subsidiário, nos termos do artigo 636° do CPC, ex vi do artigo 2°, alínea e), do CPPT, por via de ampliação do objecto do presente recurso, verificando-se que tal argumentação - não analisada pelo tribunal recorrido por procedência do vício de falta de fundamentação formal - se enquadra ainda no âmbito do pedido de anulação da liquidação por vício de falta de fundamentação formulado pelos Impugnantes no ponto III.1 da respectiva petição de impugnação judicial.

Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exa. doutamente suprirá, e em face da motivação e das conclusões atrás enunciadas, se requer que as presentes contra-alegações sejam considerados e que o recurso interposto seja julgado improcedente por não provado, mantendo-se em todo o caso a anulação da liquidação de IRS impugnada e dos respectivos juros compensatórios.

»* O Ministério Público, junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso (cfr. fls.426/428 dos autos).

* Colhidos os Vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

* II - FUNDAMENTAÇÃO II.1.

De Facto A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: «

  1. Por escritura pública celebrada em 27.01.2005, os Impugnantes, no estado civil de divorciados, compraram, em comum e em partes iguais, pelo preço € 85.000,00, o prédio misto sito em C…, na freguesia e concelho de …, inscrito na matriz urbana sob o artigo provisório 6455 - cfr. doc. 2 junto com a P.I.

  2. Por despacho de 06.10.2004 do Presidente da Câmara Municipal de …, foi emitido parecer favorável sobre o "Pedido de Informação Prévia" efectuado em 16.08.2004 "sobre a viabilidade de construção de uma moradia unifamiliar e piscina em local diferente e por substituição de outra existente" no prédio identificado em A), com os condicionamentos constantes de fls. 52/53, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, designadamente, de demolição da casa existente e respectiva baixa no Serviço de Finanças e Registo Predial - cfr. doc. 3 junto com a P.I.

  3. Em 21.06.2005 foi emitido pela Câmara Municipal de …, em nome do Impugnante marido, o...

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