Acórdão nº 554/06.8TBNLS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Outubro de 2014
Magistrado Responsável | MARIA DOMINGAS SIM |
Data da Resolução | 07 de Outubro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
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Relatório A..., B... e C... instauraram contra a “Companhia de Seguros L..., S.A”, acção declarativa de condenação, a seguir a forma ordinária do processo comum, pedindo a final a condenação da ré no pagamento: a) a todos os AA da quantia global de €61.150,00; b) à A. A... da quantia de € 95.200,00; c) a cada um dos AA. B... e C.... da quantia de € 12.500,00.
Em fundamento alegaram, em síntese útil, que são, respectivamente, o cônjuge sobrevivo e os filhos de D..., falecido em consequência de acidente de viação ocorrido no dia 12/11/2003, na EN n.º 234, no concelho de Nelas, no qual foi interveniente quando tripulava o seu ciclomotor com motor com a matrícula 1-MGL-19-49, tendo sido embatido na parte traseira pelo veículo pesado de mercadorias com a matrícula NA0850BB, que circulava na sua retaguarda. O embate deveu-se a conduta culposa deste condutor que, pretendendo ultrapassar o ciclomotor, não adequou a velocidade a que circulava à manobra que intentava realizar, assim abalroando aquele veículo e provocando a queda do D....
A morte do cônjuge e pai dos autores foi causadora de danos de natureza patrimonial e não patrimonial que por esta via pretendem ver ressarcidos, sendo responsável a demandada seguradora, para a qual se encontrava transferida a responsabilidade civil emergente dos acidentes de viação em que o veículo pesado fosse interveniente, mediante contrato de seguro em vigor à data do acidente.
* Citada a Ré, apresentou contestação, na qual, defendendo-se por excepção, arguiu a sua ilegitimidade para a causa, uma vez que o veículo pesado se encontrava segurado na companhia de seguros “ L..., Compañia de Seguros e Reaseguros SA”, com sede em Barcelona, Espanha, sendo assim parte legítima o Gabinete Português da Carta Verde.
Em sede de impugnação alegou ter-se o falecido despistado sem a intervenção de terceiros, mais reputando em todo o caso de excessivos os valores peticionados.
Concluiu pela sua absolvição da instância, por ilegitimidade passiva, ou, caso assim se não entenda, pela sua absolvição do pedido.
Replicaram os AA., mantendo o alegado na petição inicial, tendo no entanto deduzido incidente de intervenção principal do Gabinete Português da Carta Verde, o qual foi admitido.
Regularmente citado, apresentou o GPCV contestação na qual impugnou igualmente os factos alegados pelos autores na petição inicial.
Requereu ainda a sua intervenção o Instituto da Segurança Social, IP (Centro Nacional de Pensões) que, com fundamento na versão do acidente apresentada pelos AA., pediu o reembolso do montante já pago à autora A... a título de subsídio por morte e pensão de sobrevivência, no valor de € 9.782,75, acrescido das pensões que se vencerem e sejam pagas na pendência da acção, até ao limite da indemnização a conceder, bem como nos juros de mora contados desde a citação até integral pagamento.
Também este pedido foi contestado, tendo a ré invocado mais uma vez a sua ilegitimidade passiva e impugnado os factos alegados no que concerne à dinâmica do acidente.
* Dispensada a realização da audiência preliminar, prosseguiram os autos com selecção dos factos assentes e organização da base instrutória.
Teve lugar audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo que da acta consta, tendo o Tribunal respondido a final à matéria de facto controvertida sem reclamação das partes.
Foi por fim proferida sentença que decretou: “1. Absolver do pedido a Ré Companhia de Seguros L..., SA.
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Condenar o Réu “Gabinete Português da Carta Verde” a pagar: a) Aos Autores A..., B..., e C..., as seguintes quantias: - € 4.000,00 (quatro mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos pela vítima, por sucessão, a que acrescem juros, à taxa legal, desde a presente decisão até integral pagamento; - € 40.000,00 (quarenta mil euros), a título de danos não patrimoniais da vítima, pelo dano morte, a que acrescem juros, à taxa legal, desde a presente decisão até integral pagamento; - € 100,00 (cem euros), a título de danos patrimoniais, a que acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
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– Aos AA., individualmente: € 15.000,00 (quinze mil euros) à A. A..., por danos não patrimoniais próprios, a que acrescem juros, à taxa legal, desde a presente decisão até integral pagamento - € 12.500,00 (doze mil e quinhentos euros) a cada um dos Autores B... e C..., num total de € 25.000,00, por danos não patrimoniais próprios, a que acrescem juros, à taxa legal, desde a presente decisão até integral pagamento; c) - À Autora A...: - € 40.000,00 (quarenta mil euros), a título de danos patrimoniais (lucro cessante), a que acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a presente data até integral pagamento.
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Condenar o Gabinete Português da Carta Verde a pagar ao Instituto da Segurança Social, IP (CNP), a quantia de € 9.782,75 (nove mil, setecentos e oitenta e dois euros, e setenta e cinco cêntimos), acrescida de juros contados desde a citação até integral pagamento, e ainda das pensões que se vencerem e forem pagas na pendência da acção, até ao limite da indemnização a conceder, acrescida de juros a partir da interpelação para o respectivo pagamento”.
Irresignado com o decidido, apelou o condenado GPCV e, tendo apresentado competentes alegações, rematou-as com as seguintes necessárias conclusões: “1.ª No que concerne à apreciação da dinâmica do acidente, o Tribunal a quo fundou a sua convicção essencialmente nas declarações prestadas pela testemunha E..., tendo desconsiderado as declarações prestadas pela testemunha F..., prestadas em audiência de julgamento; 2.ª Porém, ambos os depoimentos são absolutamente coincidentes no que diz respeito à causa da queda isolada da motorizada tripulada pelo inditoso D..., e designadamente no que concerne ao embate do pesado no ciclomotor, ocorrência que nenhum confirma; 3.ª Para além da ausência de qualquer elemento de prova testemunhal que sustente a conclusão obtida pelo Tribunal “a quo” no que concerne ao embate entre tais veículos, temos ainda que nenhum outro elemento de prova objectivo sustenta tal conclusão; 4.ª Dos autos resulta ainda que a infeliz vítima mortal deste trágico acidente, conduzia a motorizada com uma taxa de álcool no sangue de 1,46 gr/litro, taxa esta que sempre determinaria deterioração marcada psicomotora e da fala, que condiciona de forma marcada a condução de veículos motorizados; 5.ª Deste modo, da prova produzida resulta, inequivocamente, a verificação de uma situação de queda inicial do ciclomotor, cenário com o qual o condutor do veículo pesado se deparou; 6.ª Assim, o Meritíssimo Juiz a quo julgou incorrectamente os pontos os pontos 15, 17 a 19 e 22, dos factos provado e, outrossim, os itens 39 e 42 da base instrutória.
7.ª Tendo por base o depoimento das testemunhas E... e F..., prestados na sessão de audiência de discussão e julgamento impunha-se decisão diversa sobre os supra aludidos pontos da matéria de facto controvertida; 8.ª Circunstância que implica a obtenção da conclusão de que a culpa na produção do acidente se ficou a dever, exclusivamente, ao falecido D...; 9.ª O Meritíssimo Juiz a quo julgou, também, incorrectamente os pontos 39º e 42º dos factos provados, que deveriam ser dados como provados, com base dos mesmos depoimentos testemunhais; 10.ª O Meritíssimo Juiz a quo julgou, ainda, incorrectamente o ponto 25. dos factos provados; 11.ª Na verdade, tendo em consideração o depoimento da testemunha E..., impunha-se decisão diversa quanto a esta matéria, concretamente quanto à verificação da morte instantânea por parte do inditoso; 12.ª Não sendo, por isso, devida qualquer indemnização pelo sofrimento da vítima, que não se apurou; 13.ª Por fim, Tribunal a quo errou na determinação do montante dos danos decorrentes dos lucros cessantes da Autora, ora Recorrida, que nunca serão superiores à quantia de €22.500,00.
14.ª A douta sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação do preceituado nos artigos 483º, 496º, 562.º e 566º do CC do Código Civil”.
Com tais fundamentos conclui dever ser proferida decisão que, revogando a sentença impugnada, absolva o recorrente do pedido ou, no limite, reduza os montantes indemnizatórios em conformidade com o requerido.
* Contra alegaram os AA, pugnando pela manutenção do decidido.
* Indiscutido que pelo teor das conclusões se delimita e define o objecto do recurso, são as seguintes as questões submetidas à apreciação deste Tribunal: i. da modificação da decisão da matéria de facto – erro de julgamento no que concerne aos factos assentes sob os n.ºs 15., 17., 18., 19., 21., 22. e 25. da sentença e ainda quanto aos vertidos nos art.ºs 39.º e 42.º; ii. da errada interpretação e aplicação dos art.ºs 483.º, 496.º, 562.º e 566.º. todos do CC, no que concerne ao arbitramento dos montantes indemnizatórios destinados a compensar o dano não patrimonial sofrido pela própria vítima e dano patrimonial decorrente da perda de rendimento.
* i. da modificação da matéria de facto Pretende o apelante ter ocorrido erro de julgamento no que concerne aos factos vertidos nos n.ºs 15., 17., 18., 19., 21., 22. e 25. da sentença, que, em seu entender, deveriam ter sido dados, todos eles, como não provados, ao invés do perguntado em 39.º e 42.º da base instrutória, aos quais, defende, deveriam ter sido dadas respostas positivas.
Argumenta, em sustento do invocado erro de julgamento, que razão não haveria para desconsiderar o depoimento prestado pelo condutor do pesado, a testemunha F..., em tudo coincidente àquele que antes prestara no decurso do inquérito que correu termos nos serviços do MP junto da comarca de Nelas e que findou com despacho de arquivamento. Acresce que a testemunha E..., determinante no processo formativo da convicção do Tribunal, não confirmou em parte alguma do seu depoimento ter visto o pesado embater no motociclo tripulado pela vítima mortal, cuja queda se deu sem intervenção de terceiro, ao que não terá sido seguramente alheia a apurada...
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