Acórdão nº 9/13.4TBCLB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Abril de 2015

Data14 Abril 2015
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2ª Secção): I – RELATÓRIO C (…) intentou a presente ação declarativa de condenação sob a forma de processo sumário contra A (…), S.A.

, para efetivação da responsabilidade civil por dano emergente de acidente de viação, pedindo a condenação da ré no pagamento ao autor dos danos materiais com a reparação do veículo, no montante de 5.279,40 €, e utilização de veículo de substituição no valor de 483,30 €, bem como em montante não inferior a 1.500,00 € pelos danos morais sofridos pelo autor, alegando, para tal e em síntese, que no dia 18 de janeiro de 2010, o veículo do autor circulava na faixa direita da A25, quando embateu num javali que se encontrava na faixa de rodagem, o qual já tinha sido atropelado pelo veículo ligeiro de mercadorias que seguia à sua frente na faixa de rodagem, acidente que ficou a dever-se, única e exclusivamente, à omissão por parte da Ré, Concessionária da A25, do seu dever de vigilância, manutenção e conservação.

A Ré contesta alegando, em síntese, que a explicação mais plausível para a presença do animal na via, prende-se com o facto de o mesmo ter ingressado na autoestrada através de um dos nós ou ramos daquela, concretamente pelo nó de Celorico, cujo eixo se situa muito perto do local do acidente, concluindo com a afirmação de que procedeu com toda a diligência e cuidado que lhe era exigível, não lhe podendo, por isso, ser assacada qualquer culpa na produção do acidente em causa, pelo que deve a mesma ser absolvida do pedido.

Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença, a julgar a ação parcialmente procedente, condenando a Ré, A (…)– Auto-Estradas (....), S.A., no pagamento ao autor da quantia total de 5.489,40 €.

Não se conformando com a mesma, a ré dela interpôs recurso de apelação, concluindo a respetiva motivação, com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: (…) O autor apresenta contra-alegações no sentido da manutenção do decidido.

Cumpridos que foram os vistos legais, cumpre decidir do objeto do recurso.

II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., artigos 635º, e 639º, do Novo Código de Processo[1] –, as questões a decidir são unicamente as seguintes: 1. Nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

2. Impugnação da decisão sobre a matéria de facto.

3. Se a Ré logrou elidir a presunção de incumprimento dos deveres de segurança.

III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO 1. Nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

Defende a apelante que, sendo a sentença omissa quanto à matéria de facto por si alegada no art. 34º da sua contestação, não tendo considerado tais factos como “provados” ou como “não provados”, enferma da nulidade prevista no artigo 615º, nº1, al. d), do CPC.

A circunstância de o juiz não selecionar determinados factos alegados por uma das partes, para o efeito de os dar como provados ou não provados, por os considerar irrelevantes, por conterem expressões conclusivas, ou, até, porque deles não se apercebeu, não integra qualquer nulidade da sentença, nulidade que só se verificará num dos casos taxativamente previstos no artigo 615º do CPC.

Haverá, uma vez mais, que explicitar o sentido da nulidade prevista na al. d) do artigo 615º, que ocorre quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.

“Devendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e todas as exceções invocadas ou as que oficiosamente lhe cabe conhecer, o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da sentença, que as partes hajam invocado[2]”.

Assim delimitado o âmbito da invocada nulidade, consistente na omissão de pronúncia, ter-se-á de concluir que a alegada circunstância de o facto de o juiz a quo não ter tido em consideração a matéria em causa – dando-a como provada, ou como não provada – (desconhecendo-se se, por o mesmo ter entendido tratar-se de matéria irrelevante, se por a achar conclusiva ou por integrar matéria de direito), não integrará a invocada nulidade.

Decidir se determinado facto é, ou não, relevante para algumas das soluções possíveis de direito, fará parte da apreciação de mérito da causa, contendendo com discordâncias de fundo relativamente à apreciação de direito efetuada pelo juiz a quo.

De qualquer modo, atentar-se-á em que o reconhecimento da nulidade com base em tal fundamento importaria, tão-somente, que este tribunal conhecesse da “questão” cuja apreciação foi omitida pelo juiz a quo, em conformidade com o disposto no nº1 do artigo 665º do CPC.

A circunstância de o tribunal a quo não ter considerado determinados factos, dando-os como “provados” ou como “não provados”, levará, nesta sede, não à nulidade da decisão ao abrigo do disposto na al. d), do nº1 do artigo 615º do CPC, mas sim, caso se venha a considerar tais factos como relevantes, que este tribunal deles conheça, ou à nulidade do julgamento para ampliação da matéria de facto, caso o processo não contenha os elementos necessários para a apreciação de tal matéria.

Não se verifica, assim, a invocada nulidade.

2. Impugnação da decisão sobre a matéria de facto.

Os tribunais da Relação, sendo tribunais de segunda instância, têm atualmente competência para conhecer tanto de questões de direito, como de questões de facto.

Segundo o nº1 do artigo 662º do NCPC, a decisão proferida sobre a matéria de pode ser alterada pela Relação, “se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.

Insurge-se a Ré/apelante contra a decisão tomada pelo tribunal a quo relativamente ao facto constante do número 16 dos factos “provados”, com o seguinte teor: “16. A vedação da A25, nas circunstâncias de tempo e lugar descritas em 1), e nas imediações do local encontrava-se sem falhas, ruturas ou abertas.” Segundo a Apelante, o depoimento da testemunha (…) impunha que o tribunal fosse bem mais longe do que foi, concretizando a extensão da vedação da A25 que se encontrava em boas condições de segurança e conservação, dando-se a seguinte resposta à matéria por si alegada nos arts. 23 e 24 da sua contestação: “A vedação da A25 encontrava-se, na data do sinistro, e numa extensão de cerca de 12 km, correspondente a toda a extensão do sub-lanço onde eclodiu o acidente, em ambos os sentidos de marcha daquela A25, em boas condições de segurança e conservação, ou seja, sem falhas, ruturas e/ou aberturas”.

Antes de mais, haverá que salientar que, encontrando-se em causa a matéria alegada nos arts. 23º e 24º da contestação da Ré/Apelante Ascendi, o juiz a quo deu inteiramente como provada a matéria neles contante[3].

O juiz a quo fundamentou pelo seguinte modo por si dada a tal ponto da matéria de facto: “Relativamente ao facto constante do ponto 16) resultou o mesmo do depoimento da testemunha (…) que vistoriou a vedação no próprio dia do acidente, após a ocorrência do mesmo, não tendo encontrado quaisquer anomalias na vedação, o que foi depois confirmado dois ou três dias depois, pelo funcionário da ré, (…) o qual se deslocou ao local, já de dia, e chegou à mesma conclusão.” Vejamos, então, se da conjugação dos dois referidos depoimentos se pode extrair uma resposta mais precisa do que a dada como provada pelo tribunal a quo, indo além do alegado pela própria parte.

A testemunha (…) auxiliar de conservação, afirmou que, não se tendo deslocado ao local do acidente quanto o mesmo ocorreu, foi chamado dois ou três dias depois para fiscalizar a vedação e que fizeram a pé todo o percurso de 12 km, partindo do meio do troço que vai de Celorico a Fornos, num sentido e noutro e não viram anomalia nenhuma, estava tudo bem. Contudo, tal verificação ocorreu, não no dia do acidente, mas 2 ou 3 dias depois; por outro lado, tal verificação ocorreu, não a partir do local do acidente (o que permitiria uma maior atenção ao espaço envolvente), mas do meio do troço. Ora, quanto ao observado no próprio dia do acidente, a testemunha (…)oficial de serviços de vigilância da Ré, afirmou que juntamento com o agente da BT, fizeram uma inspeção às vedações na altura, mais ou menos 500 m a partir do sítio onde estava o animal, 500m para a frente e 500 m para trás, caminhando a pé junto à vedação e as vedações estavam boas. Quanto ao agente da GNR que elaborou a participação dos acidentes, (…), afirmou não se lembrar se verificaram as vedações. Por fim, estranha-se, neste caso, a ausência de junção aos autos do auto de ocorrência a elaborar pela concessionária, do qual ficam normalmente a constar os procedimentos e inspeções então efetuados, auto que é dado a assinar igualmente aos intervenientes no acidente.

Concluindo, entendemos que a prova produzida nos autos não nos permitira ir mais além do que foi o juiz a quo, não nos merecendo a resposta por aquele dada ao ponto 16, qualquer censura.

Pretende o Apelante ver ainda aditada a matéria constante do art. 34º da sua contestação, com fundamento em que a mesma se mostra provada...

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