Acórdão nº 92/14.5TVLSB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS SIM
Data da Resolução03 de Novembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório A...

    instaurou contra B..., Limitada, acção declarativa de condenação, a seguir a forma ordinária do processo comum, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe: “a) € 901.395,00, a título de multas pelo atraso no início da execução da obra.

    1. € 100.000,00, a título de cláusula penal pelo incumprimento definitivo do contrato, em consequência da resolução do contrato por culpa imputável à ré.

    2. juros de mora sobre as quantias referidas, à taxa legal, desde a data da exigibilidade de tais montantes até efectivo e integral pagamento”.

    Em fundamento alegou, em síntese, ter celebrado com a ré contrato de empreitada, nos termos do qual esta se obrigou a construir um prédio de rés-do-chão, 1.º e 2.º andar, sito em ...

    Nos termos do acordo celebrado, a obra teria o seu início no dia 16 de Abril de 2012, tendo sido estipulado que a mora no cumprimento da obrigação de iniciar os trabalhos faria incorrer a ré numa multa diária no valor de €1.485,00, correspondente a 3% o do valor total da empreitada.

    Ajustaram ainda as partes - cláusula 8.ª do contrato - uma penalidade no valor de €100.000,00 em caso de incumprimento definitivo do contrato por banda da ré, montante em cuja fixação foi tida em devida conta a situação difícil em que o autor ficaria colocado perante os seus clientes no caso do contrato não vir a ser cumprido.

    Mais alegou que a ré nunca deu início aos trabalhos, apesar de para tal ter sido insistentemente interpelada, vindo o demandante a interpelá-la numa derradeira ocasião por carta datada de 9 de Agosto de 2013, para que desse início à obra no prazo de 30 dias, sob pena de resolução do contrato. Em reunião que teve lugar no dia 27 de Novembro de 2013 a ré comunicou à autora que não iria cumprir o contrato, por não ter capacidade para o efeito, reconhecendo-se ainda devedora das penalidades emergentes do acordo celebrado que, todavia, logo declarou que não iria pagar por não dispor de meios financeiros para tanto.

    Na sequência do assim declarado, a autora resolveu o contrato por carta datada de 13/12/2013, interpelando ainda a ré para proceder ao pagamento dos montantes de €100.000,00 e €901.395,00 correspondentes às penalidades fixadas, quantias que reclamou no âmbito desta acção, acrescidas dos juros de mora contados desde a data da interpelação, tudo nos termos dos art.ºs 798.º e seguintes, 810.º e seguintes, e 559.º, todos do CC, disposições legais que expressamente invocou.

    Regularmente citada, a ré não apresentou contestação.

    Por despacho proferido nos autos, foram os factos articulados na petição inicial tidos por assentes.

    Notificadas as partes nos termos e para os efeitos do art.º 567º, n.º 2 do CPC, pronunciou-se a autora no sentido de dever a ré ser condenada no pedido, após o que foi proferida douta sentença que, na parcial procedência da acção, condenou a ré no pagamento do montante de 100.000,00 € (cem mil euros), a título de cláusula penal indemnizatória, acrescido de juros de mora, à taxa legal comercial, desde 17.12.2013 até integral pagamento, e ainda na quantia de 178.200,00 € (cento e setenta e oito mil e duzentos euros) a título de cláusula penal compulsória, acrescida de juros de mora, à taxa legal comercial, desde a data da decisão até integral pagamento.

    Inconformado com o decaimento parcial, apelou o autor e, tendo invocado as razões da sua discordância nas alegações que apresentou, condensou-as nas seguintes necessárias conclusões: ...

    Tendo indicado como normas violadas os artigos 812.º, n.º 1 e 334.º, n.º 1 do CC, conclui pela procedência do recurso e consequente revogação da sentença apelada na parte impugnada.

    Não foram apresentadas contra alegações.

    * Assente que pelo teor das conclusões se fixa e delimita o objecto do recurso, a única questão sujeita à apreciação deste Tribunal consiste em indagar do acerto da decisão apelada quando, fazendo apelo ao instituto do abuso de direito, procedeu à redução do montante que resultaria da aplicação da cláusula penal moratória ajustada pelas partes.

  2. Fundamentação De facto ...

    De direito Não está em causa nos autos a caracterização do contrato celebrado entre autor e ré como contrato de empreitada, dado que por ele se obrigou a demandada a edificar um prédio de rés-do-chão e 1.º andar em ..., mediante o pagamento pelo primeiro, na qualidade de dono da obra, de um preço, pelas partes fixado em €495.000,00, acrescido de IVA.

    Aceitam ainda autor e ré que do contrato celebrado, cuja validade e eficácia não vem questionada, resulta a sua recíproca vinculação ao clausulado. Conforme assinala o Mm.º juiz “a quo”, o contrato constitui para as partes lei imperativa, ficando ambas obrigadas ao seu cumprimento pontual (no sentido de cumprimento integral ou “ponto por ponto”), conforme resulta do disposto no art.º 406.º, n.º 1 do CC (diploma ao qual pertencerão as demais disposições legais que vierem a ser citadas sem menção da sua origem).

    Revela ainda o acervo factual apurado que, a despeito do convencionado, a ré, que se obrigara a dar início aos trabalhos no prazo máximo de 30 dias a contar da outorga deste contrato, que as partes reduziram a escrito e dataram de 15 de Março de 2012, e a concluí-los no prazo de 16 meses, nunca chegou a iniciar a obra. E face a este incumprimento da ré, veio o autor a resolver o contrato, o que fez mediante carta registada datada de 13/12/2013, conforme os factos provados igualmente evidenciam, resolução cuja licitude aqui não se discute.

    Resolvido o contrato, reclamou o ora apelante da ré sociedade o montante de €100.000,00 fixado a título de cláusula penal, correctamente qualificada pelo Mm.º juiz “a quo” de liquidação prévia do dano por força da resolução do contrato, pressupondo portanto o incumprimento definitivo por banda da empreiteira, e €901.395,00, estes a título “de multas pelo atraso no início da execução da obra”.

    Não vindo questionado o direito do autor a haver para si a aludida quantia de €100.000,00, nem tendo sido posto em causa o acerto da decisão recorrida quando considera cumuláveis a cláusula penal indemnizatória que prevê para a resolução do contrato e a cláusula penal moratória, insurge-se o apelante contra o que apelida de redução oficiosa indirecta do montante liquidado por aplicação desta última, actividade que ao Tribunal estaria vedada por força da disposição contida no art.º 812.º.

    Vejamos, pois, da razão que lhe assiste (ou não).

    O pedido formulado assenta, pois, no transcrito parágrafo 6º da cláusula 7.ª, por cujos termos não se iniciando os trabalhos na data prevista, a empreiteira focava obrigada a pagar ao dono da obra uma multa diária de 3%o (três por mil) do valor da empreitada, sem prejuízo da faculdade igualmente conferida ao dono da obra de declarar resolvido o contrato a partir do 30.º dia da mora.

    ...

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