Acórdão nº 602/13.5PBCTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução08 de Julho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 5ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Coimbra I – RELATÓRIO 1. No âmbito do Processo Comum (Singular) nº 602/13.5PBCTB, da Comarca de Castelo Branco – Castelo Branco – Instância Local – Secção Criminal – J1, foram submetidos a julgamento os arguidos A... e B... (devidamente identificados nos autos), na sequência da acusação pública que lhes imputava a prática, em co-autoria material, de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelos artigos 2º nº 5 al. n) e 86.º, nº 1, alínea a) da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro (Regime Jurídico das Armas e Munições).

  1. Realizada a audiência de discussão e julgamento, por sentença proferida em 11.02.2015, veio a acusação a ser julgada improcedente e, em consequência, ambos os arguidos absolvidos do imputado crime.

  2. Inconformado com o, assim, decidido, recorreu o Ministério Público, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões (transcrição): “1. Por sentença proferida nos presentes autos e de agora se recorre, os arguidos A... e B... foram absolvidos da prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos artigos 2°, n.° 5, alínea n) e 86°, n.° 1, alínea a), ambos da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro (que aprovou o Regime Jurídico das Armas e Suas Munições).

  3. O Tribunal a quo deu como provados todos os factos constantes da acusação pública, com excepção daquele em que se afirmava que o arguido A... atirou a garrafa contra a parede da discoteca.

  4. Porém, considerou o Meritíssimo Juiz a quo que os factos supra referidos não integram a prática do crime de detenção de arma proibida punidos pelas disposições legais supra mencionadas.

  5. Para tanto, entendeu o Meritíssimo Juiz a quo que a garrafa com gasolina no interior e um pavio a arder não configura qualquer engenho de fabrico artesanal não autorizado.

  6. Quanto à definição de “engenho explosivo ou incendiário improvisado” prevê o artigo 2.°, n.º 5, alínea n) que serão “todos aqueles que utilizem substâncias ou produtos explosivos ou incendiários de fabrico artesanal não autorizado.

  7. Não obstante ser referida na fundamentação da sentença, a tese defendida no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 06/03/2013, relativamente à utilização de garrafas de gás em certo tipo de assaltos a multibancos, entendemos nós que as situações descritas no aludido Acórdão e nos presentes autos não são comparáveis.

  8. O engenho fabricado pelos arguidos nos autos tem como finalidade única e exclusiva a utilização como meio de agressão.

  9. Acresce que o engenho foi construído de forma artesanal, ilicitamente, devendo ser visto como um todo e não apenas olhando às suas componentes individuais.

  10. Por tal facto, a não integração dos seus componentes nos produtos previstos no anexo 1 do Decreto-Lei n.º 376/84, de 30 de Novembro não tem a virtualidade de afastar a ilicitude do engenho em si mesmo.

  11. Ao não ter assim entendido, a sentença recorrida violou, por erro de interpretação, o disposto no artigo 2.°, n.º 5, alínea n) e 86°, alínea a), ambos da Lei 5/2006 de 23 de Fevereiro.

  12. Em consequência, deverá a sentença absolutória recorrida ser alterada e substituída por uma outra que condene os arguidos pela prática, como co-autores materiais, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p, pelo artigo 86°, alínea a), por referência ao artigo 2.°, n.° 5, alínea n), ambos da Lei 5/2006 de 23 de Fevereiro.

  13. Dos autos constam todos os elementos necessários à escolha e determinação da medida concreta da pena.

    * Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado e, em consequência, revogar-se a sentença absolutória recorrida, substituindo-se por outra que condene os arguidos pela prática, como coautores materiais, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p, pelo artigo 86°, alínea a), por referência ao artigo 2.°, n.° 5, alínea n), ambos da Lei 5/2006 de 23 de Fevereiro, com o que Vossas Excelências farão a costumada JUSTIÇA!” 3. O recurso foi admitido por despacho de fls. 143.

  14. O arguido B... , a fls. 148 a 152, respondeu ao recurso concluindo do seguinte modo (transcrição): “1. O arguido B... concorda integralmente com a Sentença recorrida.

    1. O recurso interposto pelo Digníssimo Magistrado do Ministério Público, limita-se à impugnação da Sentença sobre a matéria de direito.

    2. A questão que se coloca no recurso é saber se uma garrafa de plástico contendo no seu interior gasolina e, introduzido no gargalo da garrafa um pano a arder, se tal engenho se enquadra na noção (legal) de arma, constante no artigo 5° n°2 alínea n) da lei n° 5/2006, de 23-2.

    3. Para que a garrafa de plástico com gasolina, e com um pano se enquadrasse no tipo/definição legal, i.e., engenho explosivo ou incendiário improvisado, teria que utilizar substância ou produto explosivo ou incendiário de fabrico artesanal não autorizado.

    4. Para a Lei, na interpretação efetuada pelo Tribunal recorrido, com a qual se concorda, o que caracteriza o engenho explosivo ou incendiário é a natureza do produto utilizado, ou seja, tem que ser um produto explosivo ou incendiário de fabrico artesanal não autorizado.

    5. E não, na interpretação do Recorrente que este engenho seja enquadrado como arma pelo engenho em si ou pela sua única aptidão de como o engenho pode de ser utilizado (uso) ou sequer a mera detenção.

    6. Os produtos utilizados (garrafa de plástico, gasolina, pano) não têm natureza artesanal não autorizada, independentemente de como os componentes desse engenho foram ligados entre si ou o seu uso.

    7. O Recorrente, entende que o engenho em causa, é uma arma pelo critério do uso, pois o engenho em causa tem como única e exclusiva finalidade ser utilizada como meio de agressão, e que não tem qualquer outro tipo de aplicação.

      IX. A interpretação que o Recorrente tem da lei (critério de uso do engenho), não é suportado pela lei, que veio estabelecer uma uniformização conceptual e impor definições legais.

    8. A lei opta claramente pelo critério da natureza do objeto, por uma definição/noção conceptual quanto à natureza dos objetos que se consideram armas.

    9. A Sentença recorrida é fundamentada, pelo menos invoca jurisprudência de Tribunais superiores, ao contrário do Recurso que não invoca sequer qualquer jurisprudência que fundamente a sua posição, quanto à interpretação da lei.

    10. Assim a interpretação sustentada pelo Recorrente de que o objeto dos autos se enquadra como produto explosivo ou incendiário improvisado, no sentido de que tem natureza artesanal e não autorizada, pelo critério do uso, vai muito além do previsto na lei... Viola o princípio da legalidade.

      Termos em que a douta sentença recorrida deve ser mantida, fazendo-se assim a necessária justiça.” 5. Também o arguido A... , desta feita a fls. 162 a 165, respondeu ao recurso concluindo do seguinte modo (transcrição): “1. O arguido A... concorda integralmente com o teor da douta sentença sob recurso.

  15. Tal sentença decidiu segundo critérios da mais estrita legalidade, sem violação, assim, de qualquer normativo legal.

  16. O douto recurso ora respondido limita-se a matéria de direito.

  17. Colocando-se a questão de saber se uma garrafa de plástico contendo no interior gasolina e no gargalo, um pano a arder, se enquadra na noção legal de arma constante no art° 5° n°2 n) da Lei 5/2006, de 23.02.

  18. Para que tal pudesse acontecer, teria ser utilizado substância ou produto explosivo ou incendiário, de fabrico artesanal não autorizado.

  19. É entendimento do douto aresto “sub judice” com o qual se concorda, sendo este o que decorre da lei, caracterizar o engenho explosivo ou incendiário, a natureza do produto utilizado. Assim, explosivo ou incendiário de fabrico artesanal não autorizado.

  20. Ao contrário, é entendimento do D.mo recorrente, com o qual se não concorda, que é critério para classificação como arma, o próprio engenho em si mesmo, ou a sua aptidão a ser usado como...

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