Acórdão nº 335/13.2TBAGN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelALEXANDRE REIS
Data da Resolução03 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: M… intentou a presente acção contra A… e marido E…, pedindo que estes sejam condenados a: - demolir e recuar a parede do lado sul do seu edifício, de forma a deixar o espaço mínimo de metro e meio em relação à janela existente na parede do lado norte do prédio da A., porque, com tal abertura, se encontra constituído um direito de servidão de vistas sobre o prédio dos RR; - dotar o seu terraço, que deita para o prédio da A., de um parapeito de altura não inferior a metro e meio.

Os RR contestaram.

Na sentença, o Sr. Juiz, julgando a acção parcialmente provada e procedente, condenou os RR a servir o seu terraço de parapeito de altura não inferior metro e meio, na extensão de cerca de 2,5 metros que deita para o prédio da A. e absolveu-os do demais peticionado por esta.

Inconformada, a A. apelou, delimitando o recurso com conclusões que colocam as questões de saber se: - deve considerar-se provado que há mais de 15, 20 e até 35 anos, a A. e seus antecessores usufruíram de vistas, podendo abrir a abertura e devassar o prédio dos RR, ininterruptamente, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém, convictos de serem titulares do direito de servidão de vistas e de não lesarem direitos de quem quer que fosse; - sendo a dita abertura, existente na parede do lado norte do prédio da A., uma janela (não gradada), deve condenar-se os RR a fazer recuar a parede do lado sul do seu edifício, de forma a deixar o espaço mínimo de metro e meio em relação a tal janela.

São os seguintes os factos considerados provados pela 1ª instância: … Importa apreciar as questões enunciadas e decidir.

A matéria de facto.

Segundo a apelante, deve considerar-se provado que há mais de 15, 20 e até 35 anos, a A. e seus antecessores usufruíram de vistas, podendo abrir a abertura e devassar o prédio dos RR, ininterruptamente, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém, convictos de serem titulares do direito de servidão de vistas e de não lesarem direitos de quem quer que fosse. Para tanto, a apelante invocou o depoimento da testemunha …, conjugado com o resultado da inspecção ao local e o documento 3 da PI (planta de licenciamento apresentada pelos RR na CM).

Vejamos se, tal como pretende, a prova produzida implica a alteração do julgamento da 1ª instância por não se confirmar a razoabilidade da convicção probatória do julgador, à luz das regras da ciência, da lógica e da experiência.

Como em geral sucede, esta tarefa é norteada pela ideia de que a apreciação da prova, segundo o grau de confirmação que os enunciados de facto obtêm a partir dos elementos disponíveis, está vinculada a um conceito ou a um critério de probabilidade lógica preponderante e, especificamente, face a uma eventual divergência inconciliável de depoimentos de testemunhas, dotadas de uma razão de ciência sensivelmente homótropa, prevalecerão os contributos colhidos por essa via, que sejam corroborados por outras provas, ou que, ao menos, melhor se conjuguem com tais depoimentos.

Examinemos o sentido dos elementos de prova invocados nas conclusões de recurso, começando pelo testemunho explicitamente enunciado.

… No que concerne ao assunto trazido à nossa apreciação, o resultado da inspecção ao local está plasmado na decisão proferida quanto aos factos, que, neste segmento, não foi impugnada, e através dele se constata que a dita abertura existente ao nível do R/C, na parede norte da casa da A. tem, nomeadamente, as seguintes características: - mede 55 cm de largura e 78 cm de altura; - (no interior) dista da base do parapeito até ao soalho 87 cm; - (no exterior) possui uma grade de ferro encastrada na estrutura da abertura, com 1cm diâmetro do ferro, constituída por nove rectângulos, tendo cada um 16 cm de largura e 26,3 cm de altura, e, imediatamente atrás, uma rede de aço cobrindo integralmente a abertura e nela fixada, com uma malha de 1,3 cm por 1cm; - do interior, junto a tal abertura, uma vez aberto o respectivo caixilho, observa-se a existência da rede de aço e da grade em ferro supra referidas e, para o exterior, consegue-se ver parte da parede das escadas e da garagem e o portão do prédio dos RR, mas não é possível debruçar ou colocar a cabeça ou qualquer outra parte do corpo humano, seja da parte superior ou inferior da cintura humana, ou projectá-lo para fora dela; - a mesma abertura deita directamente sobre o prédio dos RR e está implantada na parede norte da casa da A., que dista 1,26 m da parede sul da garagem dos RR.

Por outro lado, mesmo admitindo que – como diz a apelante – possa resultar da planta com que os RR instruíram o pedido de licenciamento apresentado na CM que havia sido projectada a edificação que os mesmos vieram a concretizar com um afastamento de 1,5m em relação ao prédio da A., nenhumas ilações daí se poderiam retirar para a demonstração – por ela pretendida – dos invocados actos de posse correspondentes ao exercício do direito de servidão de vistas. Daí nada de útil se colheria para poder afirmar que a A. e seus antecessores usufruíram de vistas, que podiam abrir a abertura e devassar o prédio dos RR, convictos de serem titulares de tal direito.

Para rematar esta análise, registe-se que ao certo sabemos, sim, que a questionada abertura existe na casa da A. e aí se mantém com as referidas características, há, pelo menos, 35 anos, como também consta da decisão sobre os factos, sem impugnação.

Ora, perante o sentido dos referenciados e examinados elementos, não pode confirmar-se a versão da apelante: a manutenção, ao longo de, pelo menos, 35 anos, de tal abertura, cuja estrutura tem os contornos a que aludimos, apenas tem permitido à A. e seus antecessores as limitadas utilidades supra enunciadas: apesar da sua diminuta dimensão e dos demais dispositivos que a condicionam, como é grade de ferro e a rede fixa e não amovível – sublinhe-se –, com uma apertada malha, a abertura sempre deixa entrar na divisão (quarto) alguma claridade e também ar, uma vez aberto o respectivo caixilho para o permitir.

E é...

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