Acórdão nº 511/2002.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Março de 2015

Data17 Março 2015
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório A...

, casada, doméstica, residente na Rua (...), Figueira da Foz, intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário (hoje, comum), contra “B... Lda.”, com sede da Rua (...) Pombal, e contra C...

e marido D...

, residentes na Rua (...), Figueira da Foz ou em (...), Suíça, em que terminou pedindo a condenação dos réus a: “ (…) a) repor o terreno dos réus ao nível natural; b) refazer o muro de vedação entre o terreno dos réus e da autora dentro dos parâmetros legais; c) vedar o referido muro desde os alicerces até ao topo, através da colocação de tela; d) abrir uma vala junto ao referido muro onde deverão ser colocadas manilhas de dimensão suficiente que conduzam a água que aí se acumula para o poço que já se encontra feito; e) colocar, de forma permanente, uma bomba eléctrica que possibilite o bombeamento da água do poço para a rede pública; f) tapar todas as fissuras existentes no muro; g) indemnizar a autora por danos patrimoniais e não patrimoniais na quantia de € 13.225,00, acrescida dos juros legais desde a citação até efectivo e integral pagamento; h) indemnizar a autora de todos os danos que lhe venham a ser causados até efectiva resolução do problema de agravamento do escoamento para o seu terreno; (…)” Alegou, em síntese, ser dona dum prédio rústico (que identifica e com inscrição de aquisição a seu favor na Conservatória do Registo Predial) que confronta com três prédios (lotes de terreno destinados à construção urbana) dos RR., dois (os lotes B e C) da R. B... e um (o lote A) da R. C... e marido; três prédios/lotes estes em que a R. B... , no início de 2000, procedeu a aterro (superior a 2 metros de altura em alguns pontos) e à sua vedação com um muro de betão armado com altura média de 3 metros (atingindo em determinados pontos os 4 metros).

Acontece, segundo a A., que “tais obras foram realizadas sem que fosse assegurada uma conveniente drenagem das águas pluviais que se acumulam junto do muro e que posteriormente correm para o terreno da A. situado a jusante”; “provocando um agravamento significativo do escoamento das águas para o prédio da A”; até porque “no muro foram feitos diversos barbacãs, que deitam directamente sobre o prédio da A., atingindo jactos de 4 metros” e “o muro, apesar de recente, possui já inúmeras fissuras por onde também jorra água”.

Em face das constantes inundações, provocadas por tais obras, a R B... (através de acordo escrito feito com a A. em 26/02/2002) reconheceu o “problema”, comprometeu-se a solucioná-lo (executando para tal os trabalhos contantes do referido acordo – fls. 24 e 25 dos autos), mas nada fez (assim como os 2.º RR., também interpelados para o efeito).

O que casou e vem causando à A. os seguintes danos: na rede de vedação (que delimita o terreno da A.) e nos pilares de cimento que a suportavam, no valor de € 400,00; na parede dum curral, no valor de € 325,00; nas culturas, nas árvores e no pasto dos animais, o que, tudo junto, acarretou um prejuízo de € 6.500,00 (€. 3.250,00 em 2000 e de € 3.250,00 no ano de 2001); em termos emocionais e psicológicos, computando para a compensação dos danos não patrimoniais o montante de € 4.000,00; e a necessidade de recorrer a um médico psicólogo, no que despendeu cerca de € 2.500,00.

Ademais, referiu ainda, do lado dos lotes/prédios dos RR., entre o chão e o topo do muro apenas existem cerca de 30 cm de altura, o que provoca a devassa e facilita o lançamento de objectos ou detritos para o prédio da A., ao que esta se opõe.

A R. “ B... Lda.”, na sua contestação, começou por dizer, que foi ela, no desenvolvimento da sua actividade comercial, que procedeu ao loteamento que originou os lotes A, B e C referidos na PI, tendo vendido o lote A aos 2.º RR. e sendo ainda proprietária dos lotes B e C que se encontram ainda “no seu estado natural, rústico”; razão porque, segundo sustenta, é parte ilegítima, “pois os muros divisórios nada têm a ver com o loteador mas sim com a empresa construtora da habitação do lote A, fazendo parte do caderno de encargos”, “pois é alheia à construção da moradia, muros e restantes obras de drenagem da águas captadas no interior dos lotes”, esclarecendo que o acordo escrito (de 26/02/2002) referido na PI foi por lapso escrito no seu papel timbrado – quando devia ter sido em papel timbrado da T..., Lda., empresa construtora da habitação no lote A – “por o sócio gerente de ambas as empresas ser a mesma pessoa”.

Ademais, por impugnação, referiu (após insistir ser alheia à construção da moradia, muros e restantes obras) que os trabalhos executados pela Alpelsil foram correctamente executados e que a “solução” que consta do doc. de fls. 24 e 25 “foi correctamente cumprida pela Alpelsil”; que “a construção do muro ao longo da linha divisória dos prédios (…) resulta em que o prédio da A. deixou de receber águas que naturalmente não receberia se o muro não existisse”, o que “só pode trazer benefícios ao prédio da A.

”.

Concluiu, após impugnar os danos invocados, pela sua absolvição da instância ou, se assim não se entender, pela sua absolvição do pedido.

Os RR. C... e marido por sua vez, na sua contestação, invocam basicamente terem dado de empreitada à “ T...s, Lda.” a construção de uma moradia bifamiliar no seu lote, tendo sido tal empresa que teve a direcção de todos os trabalhos e obras; aliás, aquando da execução das obras encontravam-se a residir na Suíça e, acrescentam, não têm conhecimentos que lhes permitam dizer se foi ou não assegurada uma conveniente drenagem das águas pluviais ou se das obras resultou algum agravamento para o prédio da A.

Concluem assim pela sua absolvição, acrescentando que, “a provar-se a existência de qualquer dano alegado pela A., deverão ser condenados solidariamente com a construtora, reconhecendo-se, porém, que tais danos não resultaram de sua conduta culposa”.

A A. respondeu, articulado em que manteve o alegado na PI; e em que, à cautela, requereu a intervenção principal provocada de “ T..., Lda.”, contra quem dirige subsidiariamente o mesmo pedido, no caso de se concluir ser esta sociedade a responsável pelas obras nos prédios em causa.

Intervenção principal provocada da “ T..., Lda.”, com sede na Rua (...) Pombal, que foi admitida, do lado passivo, por despacho de fls. 103 a 108.

Citada tal interveniente T..., veio apresentar contestação, em que confirmou ter celebrado um contrato de empreitada com os RR. C... e marido para edificar uma moradia bifamiliar, executar redes de esgotos domésticos e de águas pluviais com ligação ao colector público, arranjos exteriores e muros envolventes; o que fez “respeitando todas as regras e procedimentos construtivos e utilizando as melhores técnicas e materiais”.

Assim, acrescentou, “todas as águas que caem, se depositam ou introduzem no lote A são captadas por um conjunto de tubos que interior e subterraneamente circundam o muro divisório do lote, sendo posteriormente drenadas para um poço. As águas pluviais são seguidamente bombeadas por uma bomba eléctrica para o colector público. Por outro lado, o muro delimitador está também forrado interiormente com uma malha geotêxtil, para evitar repasses de água”; razão porque “o prédio da A. não pode ter sofrido quaisquer inundações”, tanto mais que a “solução” que consta do doc. de fls. 24 e 25 “foi pontual e escrupulosamente cumprida”.

Referiu ainda “não ter procedido a quaisquer aterros, limitando-se a proceder a uma suave movimentação de terras para regularização do lote, quando se procedeu à construção do muro”, ocasião em que, por ordem da R. B... , “construiu também (…) o restante troço do muro situado a nascente e que separa o prédio loteado do da A.”.

Concluiu, após impugnar os danos invocados, pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

Foi proferido despacho saneador – que julgou a instância totalmente regular (julgando-se improcedente, sem censura, a ilegitimidade passiva suscitada pela R. B... ), estado em que se mantém – e organizada a matéria factual com interesse para a decisão da causa.

Foi entretanto admitida, em decisão proferida no apenso “A”, a intervenção de M...

e mulher N...

e de O...

e mulher P...

, todos com os sinais dos autos, na qualidade de adquirentes, respectivamente, dos lotes “B” e “C”.

Instruído o processo, iniciou-se o julgamento em 15/01/2009.

No decurso do mesmo, em 18/06/2009, veio a A. requerer (a fls. 945) “a alteração da base instrutória e a alteração do pedido”, solicitando que os RR. sejam também “condenados a reparar/ressarcir por todos os danos sofridos pela A. que se relegam para execução de sentença, por resultarem da continuação de aterros nos lotes identificados na acção e da conclusão das construções no loteamento B... e por serem continuados, conforme decorre das peritagens colegiais e da inspecção judicial com a deslocação do Tribunal ao local, continuando a verificar-se os danos e prejuízos reclamados decorrentes dos defeitos dos muros, escorrências e infiltrações provenientes dos muros do loteamento e dos lotes identificados na acção, até à data da sentença e efectivo e integral cumprimento”; o que foi mandado admitir por acórdão de 28/09/2010 deste Tribunal da Relação de Coimbra (tendo, em função disso, sido ampliada a BI) Concluiu-se o julgamento (respostas aos quesitos) em 11/06/2012, após o que foi proferida sentença, em que se concluiu do seguinte modo: “ (…) na procedência parcial da acção (…): Condenar os réus, solidariamente, a: Repor o terreno dos réus ao nível natural; Vedar o referido muro desde os alicerces até ao topo, através da colocação de tela; Abrir uma vala junto ao referido muro onde deverão ser colocadas manilhas de dimensão suficiente que conduzam a água que aí se acumula para o poço que já se encontra feito; Colocar, de forma permanente, uma bomba elétrica que possibilite o bombeamento da água do poço para a rede pública; Tapar todas as fissuras existentes no muro...

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